Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08341/15
Secção:CT
Data do Acordão:03/22/2018
Relator:ANA PINHOL
Descritores:EXECUÇÃO DE JULGADOS
PRAZO DE EXECUÇÃO ESPONTÂNEA
ARTIGO 43º Nº 5 DA LGT
Sumário:I.A execução de sentenças proferidas nos tribunais tributários é regulada pelas normas do CPTA por força do disposto no artigo 102º, n.º1 da LGT.
II.O dever de cumprir espontaneamente o julgado tributário surge com o trânsito em julgado deste e não com a remessa do processo ao órgão competente para a execução, sendo que o disposto na LGT prevalece sobre o CPPT, como resulta do artigo 1º do CPPT.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I.RELATÓRIO
... - SOCIEDADE INDUSTRIAL DE ...RANTES, S.A. requereu no TRIBUNAL TRIBUTÁRIO DE LISBOA, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 100.º e 102.º, nºs 1 e 2 da Lei Geral Tributária, 146.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 157 e 173º e seguintes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, - e por apenso ao processo de Impugnação Judicial nº189/07.8BEALM que correu por esse Tribunal - acção de execução da sentença, ali proferida, pedindo a condenação do MINISTÉRIO DAS FINANÇAS, no pagamento das seguintes quantias:
«EUR 1.044.231,39, a título de imposto e juros compensatórios, resultantes da liquidação adicional de IRC nº ..., relativa ao ano de 2003, anulada pela sentença exequenda;
- EUR 249.581,61, a título de juros indemnizatórios, incidentes sobre o montante de EUR 1.044.231, 39, contabilizados entre 28 de Dezembro de 2006 / 10 de Janeiro de 2007 e 17 de Dezembro de 2012, nos termos do artigo 43º nº1 da L.G.T.;
- EUR 46.478,71, a título de juros de mora, incidente sobre o montante de EUR 1.044.23, contabilizados entre 18 de Dezembro de 2012 e a presente data (29 de Abril de 2013), bem como dos juros de mora vincendos até integral pagamento, nos termos do artigo 102, nº 2 da L.G.T.;
- EUR 23.820,70, a título de juros de mora e acrescido pagos a 10 de Janeiro de 2007, no âmbito do processo de execução fiscal nº ..., nos termos do artigo 100ºda L.G.T.;
- EUR 56.303,42, a título de indemnização devida pelos prejuízos resultantes da constituição e manutenção da garantia bancária nº333.065, prestada no âmbito do processo de execução fiscal ns. ...; e
- EUR 2.304,00, a título de custas de parte»

Por sentença daquele Tribunal datada de 17 de Janeiro de 2014, foi julgada parcialmente verificada a situação de inexecução ilegítima de julgado e a Executada foi condenada, no prazo de 30 (trinta) dias, «ao pagamento à Exequente do montante em falta de EUR 2.267,53 e juros indemnizatórios calculados sobre o mesmo e até ao pagamento integral do capital em dívida», e declarou, quanto ao restante peticionado, a extinção «da instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do disposto no art 277°, alínea e), do CPC, aplicável ex vi do art. 2.°, alínea e), do CPPT.».

Não se conformando com o decidido vieram a Entidade Executada e a Exequente, recorrer para o SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO, formulando, para tanto, nas suas alegações as seguintes conclusões que na íntegra infra se reproduzem:
1. Da recorrente FAZENDA PÚBLICA:
«1. A par do contrato administrativo e do regulamento administrativo, a função administrativa dos órgãos da administração, consubstancia-se na prática actos administrativos e, no que à administração tributária diz respeito, estes podem traduzir-se em actos tributários, ou actos administrativos em matéria tributaria.
2. Certo e que, independentemente da sua natureza, todos os actos por si praticados serão sempre e só actos administrativos.
3. Qualquer decisão judicial que determine a anulação de um acto praticado pela administração tributária, esta sempre e necessariamente a anular um acto administrativo.
4. O dever de executar uma decisão judicial que anule tal acto administrativo passa assim, e desde logo, pela necessária constituição da administração, no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado (artigo 173º do CPTA).
5. O próprio Supremo Tribunal Administrativo assim o entendeu quando em 23.11.2005 o Pleno da Secção de Contencioso Administrativo afirmou, no acórdão proferido no processo nº032377A que "A anulação de um acto administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, o que passa pratica de todos os actos e operações materiais necessárias a colocar o interessado na situação que teria não fosse a prática do acto anulado o que exige não só a substituição do acto anulado por um acto validamente praticado, mas também a supressão dos efeitos resultantes da pratica do acto ilegal e a eliminação aos actos subsequentes da mesmo" (sublinhado nosso)
6. Desta conceptualização dos actos que consubstanciam a reconstituição da situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, resulta patente que a anulação de um acto administrativo não consubstancia única e exclusivamente o pagamento de uma quantia pecuniária, como da sentença parece resultar.
7. Na verdade, a anulação parcial da liquidação de imposto e juros compensatórios tem como consequência imediata a prática de actos e operações materiais que permitam determinar o quantum correspondente ao valor exacto a restituir a título de imposto.
8. Efectivamente e não resultando expresso no segmento decisório da sentença que apreciou a impugnação judicial, o montante a restituir - até porque, por força das vicissitudes dos impostos, a anulação de uma liquidação de imposto reconduz-se a alteração de um dos elementos que integram a liquidação (seja este a matéria colectável, a taxa de imposto, etc.) - não será configurável que a execução do julgado se reconduza ao pagamento de uma quantia pecuniária, que se mostre certa, líquida e exigível.
9. Donde, necessariamente, o prazo para execução espontânea do julgado, que determinou a anulação parcial da liquidação, será de 90 dias, por força do nº1 do artigo 175º do CPTA.
10. A estatuição do nº3 do artigo 175º do CPTA apenas terá aplicação quando a sentença anulatória determinar expressamente o quantum a restituir, pois que só assim se poderá entender que a execução da sentença consistira no pagamento de uma quantia pecuniária.
11. Pese embora entendendo o tribunal a quo que os prazos de execução espontânea são diferentes, consoante estejamos perante a restituição do imposto (30 dias) ou o pagamento de juros indemnizatórios (90 dias), veio este sufragar o entendimento de que os pagamentos efectuados deverão ser imputados inicialmente a juros, e só depois a imposto, por força da interpretação que e conferida ao nº4 do artigo 40º da LGT, quando entendido que aquele artigo, por razões de justiça e igualdade, deverá ser aplicável tanto no caso de dividas dos contribuintes a administração tributária, como na situação inversa.
12. Este entendimento e em si mesmo contraditório, já que, se por um lado afirma que a AT deve primeiramente pagar o imposto, uma vez que o prazo de execução espontânea daquele e inferior ao prazo para pagamento de juros, por outro lado afirma que qualquer pagamento concretizado pela AT deve ser inicialmente imputado a juros, e não a imposto.
13. Em termos operacionais, a anulação parcial de uma liquidação implica um acto de reapuramento (re- liquidação) do imposto devido pela contribuinte.
14. A sentença a quo deu como provado que a AT procedeu, em execução da sentença proferida no processo de impugnação, a pagamentos parciais das quantias devidas.
15. De acordo com a imputação efectuada pela AT dos montantes pagos a Exequente, a sentença mostra-se executada desde o dia 10.10.2013, tendo sido concretizada a restituição do imposto e acrescido (1.044. 231,39), dos juros indemnizatórios devidos (273.474,09, da indemnização pela garantia bancária que se mostrou indevida (56. 303,42), e das/custas de partes (2.304,00).
16. O tribunal a quo, pretendendo ver aplicável aos pagamentos devidos pela administração tributária aos contribuintes, em execução de julgados, a norma constante do nº4 do artigo 40º da LGT, entendeu que a imputação dos pagamentos, ditos parciais, efectuados pela AT, teriam que respeitar aquele normativo, concluindo assim estar em falta o pagamento do montante de €2.267,53, a título de imposto, a crescido de juros indemnizatórios.
17. E, fazendo apelo a regras de interpretação normativa, conclui que o legislador, no nº4 do artigo 40º da LGT regulou de forma igualitária e justa o regime de imputação dos pagamentos insuficientes, tanto das dívidas do contribuinte para com a administração tributária, como desta para com os contribuintes.
18. Não pode porem olvidar-se, que para além do artigo 40º da LGT, regulam o regime de imputação dos pagamentos parciais os artigos 89º e 262º, ambos do CPPT.
19. Tais normativos, concretizadores do artigo 40º da LGT, ao materializarem os termos em que devem ser feitas as imputação dos referidos pagamentos parciais, impõem a administração tributaria determinadas limitações.
20. Na verdade, o nº3 do artigo 262º (para o qual remete o nº2 do artigo 89º) "estabelece uma limitação quanto a amortização da dívida de juros de mora, que não poderá exceder metade do valor da amortização da divida de capital, incluindo os juros indemnizatórios" (cf. Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário — 6ª Edição — Vol. IV, pp 230)
21. Quer isto dizer que nas dividas dos contribuintes a administração tributária, que se subsumam a pagamentos parciais, a imputação dos pagamentos respeitara sempre a regra de que 50% do montante pago e imputado a capital.
22. Na análise conjugada deste quadro normativo, pergunta-se onde estaria a forma igualitária e justa, definida pelo legislador - de acordo com a interpretação veiculada pelo tribunal - ao determinar que nas dívidas dos contribuintes a administração haveria um limite mínimo de 50% imputado a capital, sendo que, no caso das dívidas da administração aos contribuintes, a imputação começaria necessariamente pelos juros, e só no fim de liquidados os juros seria de imputar os pagamentos parciais a capital?
23. Afigura-se pois que tal interpretação se traduziria numa manifesta desigualdade e injustiça, entre a administração e os contribuintes numa situação em que a AT não age no exercício do seu ius imperium.
24. Logo, a interpretação normativa do artigo 40º da LGT, acolhida pelo tribunal a quo, porque não atendeu ao integral quadro normativo, e se cingiu aquele artigo, não só desatendeu aos seus elementos literal e sistemático (pois que, não atendeu em pleno as normas do CPTT que concretizam aquela norma), como igualmente postergou os elementos racional e teleológico da norma (cujo fim único e regular as dividas dos contribuintes a administração, e não o contrario), quanto necessariamente interpretada em consonância com os artigo 89º e 262º do CPPT
25. A leitura a fazer deste quadro normativo e pois e necessariamente a de que tais normas se destinam exclusivamente a regular as dívidas dos contribuintes à administração, mas não o inverso.
26. Aliás, a leitura preconizada pela jurisprudência, mais não faz do que pôr em causa os princípios da igualdade e da justiça fiscal cuja promoção como aquela bem salientou constitui apanágio na própria LGT e da reforma fiscal por ela assumida.
27. Em suma, não só o prazo de execução espontânea das decisões judiciais que comportem tão só a anulação de actos administrativos (sejam estes tributários ou em matéria tributária) sem indicação expressa de quaisquer quantias a pagar, devera ser o previsto no nº1 do artigo 175º do CPTA (90 dias),
28. Mas também que, nos pagamentos efectuados pela administração em execução de sentença, a imputação dos pagamentos não pode ser efectuada nos termos do nº4 do artigo 40º da LGT, uma vez que tal comporta uma situação de desigualdade e injustiça.
Termos em que, deve o presente recurso jurisdicional ser julgado procedente, nos termos expostos, assim se fazendo a devida JUSTIÇA».

2. Da recorrente, ... - Sociedade Industrial de ...rantes, S.A.:

«A) Delimita-se o objecto do presente recurso á análise do direito da Recorrente à percepção de juros de mora à luz dos artigos 43º, nº 5, 100º, 102º, nº2, da LGT, e 61º, nº5, do CPPT, requerendo-se, em consequência, ao Douto Tribunal ad quem que sancione, aquando da prolação do seu acórdão, o sentido decisório perfilhado pelo Douto Tribunal a quo no que à presente matéria respeita;
B) Considera a Recorrente ter legitimidade para interpor o presente recurso nos termos do artigo 141º, nº1, do CPTA, na medida em que do sentido decisório preconizado pelo Douto Tribunal a quo resulta um prejuízo directo, efectivo, e actual para a sua esfera jurídica de EUR 108.717,09, por referência a 21 de Fevereiro de 2014;
C) Entende a Recorrente que o direito à percepção de juros indemnizatórios - sobre o imposto e juros compensatórios anulados judicialmente entre o seu pagamento indevido e a emissão da respectiva nota de crédito não colide com o direito á percepção de juros de mora - igualmente sobre o imposto e juros compensatórios anulados pelo tribunal entre o termo do prazo de execução voluntária da sentença e a restituição integral do imposto e juros compensatórios,
D) Um contribuinte que tenha obtido ganho de causa, com fundamento em erro imputável aos serviços, em sede de impugnação judicial de liquidação de imposto, tem direito quer a percepção de juros indemnizatórios computados entre o pagamento indevido do imposto e a emissão da respectiva nota de crédito, atento o disposto nos artigos 100º da LGT, na redacção da Lei n°64-B/2011, de 30 de Dezembro, e 612 nº5, do CPPT, quer a percepção de juros de mora entre o termo do prazo de execução voluntária da sentença e a restituição integral do imposto e juros compensatórios, face ao regime dos artigos 43º, nº5, na redacção da Lei n°64-B/2011, de 30 de Dezembro, e 102º, nº2, da LGT;
E) O direito ao pagamento dos referidos juros assenta em causas distintas o direito à percepção de juros indemnizatórios deriva do pagamento indevido do imposto (e juros compensatórios) pelo contribuinte, o direito à percepção de juros de mora resulta do atraso imputável à Administração Tributária na execução voluntária de decisão judicial que julgue ilegal a liquidação de imposto;
F) Enquanto o direito ao pagamento de juros indemnizatórios reveste um carácter eminentemente ressarcitório, visando compensar o contribuinte pela privação do imposto indevidamente pago; o direito ao pagamento de juros de mora impõe-se a título punitivo, visando sancionar a Administração Tributária pelo incumprimento do dever de execução das decisões judiciais nos respectivos prazos legais;
G) Perante o exposto, entende a Recorrente padecer o sentido decisório perfilhado pelo Douto Tribunal a quo, no que respeita ao seu direito à percepção de juros de mora, de erro de julgamento, não tendo aquele Douto órgão jurisdicional retirado as devidas consequências das alterações introduzidas pela Lei n°64-B/2011, de 30 de Dezembro, ao regime em apreço;
H) Acresce ter o Douto Tribunal a quo estribado a sua posição em entendimento doutrinário, entretanto, atenta a alteração legislativa acima referenciada, modificado;
I) Por outro lado, não resulta da lei em concreto, do regime previsto no artigo 43° da LGT, o qual regula os pressupostos do direito ao pagamento de juros indemnizatórios e de mora - o afastamento do direito à percepção destes últimos sempre que a ilegalidade da prestação tributária assente em erro imputável aos serviços da Administração Tributária e, por conseguinte, igualmente despolete o direito ao recebimento dos primeiros;
J) Uma interpretação do artigo 61°, nº5, do CPPT conforme à LGT não se coaduna com a desconsideração do regime ínsita no artigo 43º, nº5, da LGT, sempre que se verifique uma situação de erro imputável aos serviços da Administração Tributária;
K) Atenta a superveniência do regime previsto no artigo 43º, nº5, da LGT, face ao disposto no artigo 61º, nº5, do CPPT, se a intenção do legislador fosse restringir aquele direito (à percepção de juros de mora) aos casos em que a ilegalidade não decorresse de uma situação de erro imputável aos serviços da Administração Tributária, tê-lo-ia expressamente salvaguardado, atentas inclusive as divergências então já existentes quanto a compatibilização dos dois regimes, o que efectivamente não sucedeu;
L) Sendo certo que, na hipótese de se revelar impossível compatibilizar os referidos regimes (o que, sem conceder, apenas se admite por cautela de patrocínio), o preceituado no artigo 61º, nº5, do CPPT, sempre claudicaria perante o disposto no artigo 43º, nº5, da LGT, por força do artigo 7º, nº2, do CC;
M) Em consequência, mostra-se necessário recalcular os quantitativos legalmente devidas, considerando a Recorrente ter direito ao reembolso de IRC, relativo ao ano de 2003, no montante de EUR 104.229,40, bem como, por referência à presente data (21 de Fevereiro de 2014), à percepção de juras de indemnizatórios, na montante de EUR 1.724,78, de juros de mora, no montante de EUR 5.067,96, e, bem assim, dos respectivos juros (indemnizatórios e de mora) vincendos até integral restituição dos quantitativos legalmente devidos, todos contabilizados sobre o montante de IRC em falta (EUR 104.229,40);
N) Subsidiariamente, no cenário desse Douto Tribunal ad quem entender que os juros indemnizatórios e de mora possuem natureza idêntica no que não se concede e apenas se admite por mera cautela de patrocínio -, correspondendo ambos a uma indemnização atribuída com base em responsabilidade civil e destinando-se a reparar os prejuízos advindos ao contribuinte do desapossamento e consequente indisponibilidade da prestação tributária, entende a Recorrente que unia interpretação conforme a LGT exige que os juros indemnizatórios sejam computados ate que se complete o prazo de execução espontânea da decisão judicial, devendo, após esse prazo e até integral pagamento, serem devidos juros moratórias;
O) A luz deste entendimento, a Recorrente considera ter direito ao reembolso de IRC, relativa ao ano de 2003 no montante de EUR 78.324,09, bem como, por referência à presente data (21 de Fevereiro de 2014), à percepção de jures de mora vencidos, no montante de EUR 3.808,37, e vincendos até integral restituição dos quantitativos legalmente devidos, contabilizados sobre o montante de IRC em falta (EUR 78.324,08);
P) Por tudo quanto ficou exposto, requer-se ao Douto Tribunal ad quem que, atentos os erros de julgamento acima referidos e evidenciados na sentença recorrida diligencie pela sua revogação, condenando a Administração Tributária no pagamento dos quantitativos supra discriminados, tudo com as demais consequências legais.
Nestes termos e nos demais de Direito que doutamente se suprirão, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que conceda provimento ao presente recurso, considerando por via disso:
i.) Ter a Recorrente legitimidade processual para a sua interposição nos termos do artigo 141°, nº1, do CPTA;
ii.) Enfermar a sentença de 17 de Janeiro de 2014, proferida pelo Douto Tribunal a quo de erro de julgamento, com fundamento na incorrecta aplicação dos artigos 43°, n°5, 100º, 102°, nº2, da LGT, e 61°, nº5, do CPPT.
Em consequência, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que condene a Administração Tributária no pagamento à Recorrente de:
i.) IRC, relativo ao ano de 2003, no montante de EUR 104.229,40;
ii.) Juros indemnizatórios, no montante de EUR 1.724,78, vencidos até à presente data (21 de Fevereiro de 2014);
iii.) Juros de mora, no montante de EUR 5.067,96, vencidos até à presente data (21 de Fevereiro de 2014) e, bem assim, de
iv.) Juros indemnizatórios e de mora vincendos até integral restituição dos quantitativos legalmente devidos, tudo com as demais consequências legais.
Subsidiariamente, face aos argumentos acima expostos, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que condene a Administração Tributária no pagamento à Recorrente de:
i.) IRC, relativo ao ano de 2003, no montante de EUR 78.324,09;
ii.) Juros da mora, no montante de EUR 3.808,37, vencidos na presente data (21 de Fevereiro de 2014) e, bem assim, de
iii.) Juros de mora vincendos até integral restituição dos quantitativos legalmente devidos, tudo com as demais consequências legais.

Na medida da procedência do presente recurso, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que condene a Fazenda Pública no pagamento de custas judiciais, tudo com as demais consequências legais.»


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A FAZENDA PÚBLICA enquanto recorrida veio apresentar as suas contra-alegações, e ainda requereu a ampliação do âmbito do recurso, ao abrigo do disposto no artigo 636.º do CPC, tudo com base no seguinte quadro conclusivo:
«A - RELATIVAS A MATÉRIA DAS CONTRA-ALEGAÇÕES
1.Pretende a Recorrente ver reconhecido o seu direito a percepção de juros moratórios, entre o termo do prazo de execução espontânea e o pagamento da totalidade da divida tributária, apelando expressamente ao determinado nos artigo 43º, nº5, 100º e 102º, nº2 da LGT, e ainda no artigo 61°, n°5 do CPPT, sustentando que este direito a juros moratórios, entre o termo do prazo de execução espontânea e a integral restituição do imposto não colide com o direito à percepção de juros indemnizatórios, entre o pagamento indevido, e a emissão da respectiva nota de crédito.
2. A pretensão da R. e não pode merecer acolhimento, pois como já suficientemente reconhecido pela jurisprudência, destinando-se os juros indemnizatórios e moratórios a compensar o contribuinte pela mesma privação da disponibilidade da prestação tributária indevidamente liquidada, estes não serão temporalmente cumuláveis.
3. Assim o reconheceu já o Supremo Tribunal Administrativo, que no processo nº1003/08 de 11.02.2009 se pronunciou no sentido de que:
I - Tendo o legislador adoptado a indemnização sobre a forma de juros indemnizatórios na sequência de decisão anulatória de acto de liquidação presumindo o prejuízo patrimonial derivado da privação da quantia paga na sequência de um acto de liquidação ilegal, a interpretação do art.100° da LGT conforme a Constituição é a de que nele se reconhece o direito a juros indemnizatórios desde a data em que ocorreu a privação da quantia ilegalmente liquidada e não apenas a contar do termo do prazo de execução da decisão anulatória.
II - O art.61º nº3 do CPPT ao estabelecer como termo inicial da contagem de juros indemnizatórios o momento do pagamento, está em sintonia com o regime da LGT.
III- Não há cumulação de juros moratórios e indemnizatórios relativamente ao mesmo penado de tempo pois não se pode justificar uma dupla compensação pela mesma privação da disponibilidade da quantia indevidamente paga.
IV - Resultando dos arts. 100º da LGT e 61°, nº3, do CPPT, que, quando há lugar a juros indemnizatórios, eles cobrem todo o período que vai desde o pagamento indevido até à emissão da nota de crédito, tem de concluir-se que, nessas situações, não haverá lugar a pagamento de juros de mora, pois, se este fosse efectuado ocorreria uma cumulação de relativamente ao mesmo período de privação da quantia paga.
V - Sendo de entender que não pode haver lugar a cumulação de juros indemnizatórios e maratonas relativamente ao mesmo período de tempo a interpretação que permite compatibilizar o regime do art.100º da LGT, complementado com o do art.º 61º do CPPT e o do art.102º da mesma Lei e a de que quando há lugar a juros indemnizatórios, não tem aplicação o regime dos juros de mora previsto no art.102º, pois toda a dívida de juros é paga a título de juros indemnizatórios.
VI - Assim, é de interpretar restritivamente o art.102°, como aplicando-se apenas aos casos em que não há lugar a juros indemnizatórios, isto é, os casos em que a anulação não é motivada por erro imputável aos serviços, pois quando é esta a razão da anulação há sempre lugar a juros indemnizatórios (art. 43º, nº1 da LGT)." (sublinhados nossos)
4. A conclusão a retirar da interpretação vertida naquele acórdão, conjugada com a nova redacção do artigo 43° da LGT, que introduziu o seu nº5, outra não será, senão a de que, só fora dos casos em que se conclua pela existência de erro imputável aos serviços (em que não há lugar a juros indemnizatórios com fundamento em erro imputável aos serviços, mas tão só com fundamento no atraso da administração na restituição do tributo), serão devidos juros indemnizatórios, à taxa definida no n°10 do artigo 35º da LGT (por remissão do nº4 do artigo 37° da mesma LGT), sendo a administração penalizada, caso ultrapasse o prazo de execução espontânea da decisão que determinou a anulação da decisão no pagamento de uros moratórios à taxa prevista naquele nº5.
5. Nesses casos, face a impossibilidade de cumulação de juros moratórios e indemnizatórios, o cômputo final dos juros indemnizatórios coincidirá com o termo do prazo de execução espontânea, momento a partir do qual se iniciará o cômputo de juros moratórios.
6. Uma vez que na situação que nos ocupa foi entendido existir erro imputável aos serviços, apenas são devidos juros indemnizatórios e não moratórios.
7. Não merece igualmente acolhimento o entendimento, de que o nº5 do artigo 43º da LGT estabelece um regime excepcional que assim afasta o entendimento que vem sendo sustentado na jurisprudência do STA.
8. E isto porque a norma em si não regula a relação jurídica de forma oposta à que vinha sendo seguida (pois que já anteriormente eram devidos juros moratórios exactamente nos mesmos moldes que estão definidos), apenas se limitando a concretizar a taxa legal que é de aplicar, nos casos em que sejam devidos juros moratórios.
9. Logo, a introdução do nº5 do artigo 43º mais não veio do que definir a taxa aplicável, quando sejam devidos juros moratórios administração tributária (lacuna legal já reconhecida pela jurisprudência, como resulta do Acórdão do Pleno do STA de 24.10.2001 (Recurso n°01095/05).
10. A acolher a pretensa da R. e, a taxa de juros a suportar pela AT cifrar-se-ia num juro verdadeiramente usurário e sem paralelo na legislação vigente (note se que a penalização prevista no artigo 44.° da LGT - pela falta de pagamento da prestação tributária por parte dos contribuintes não cumula temporalmente com quaisquer outros juros).
11. A R. e entende, que os juros indemnizatórios assumem carácter ressarcitório, visando compensar a privação do montante indevidamente pago, enquanto que os juros moratórios assumirão um carácter punitivo, visando sancionar a devedora pela demora na restituição das quantias indevidamente pagas.
12. Não tem todavia a R. e razão na sua argumentação, pois como bem entendeu o STA no acórdão de 09.10.2013, proferido no processo nº01235/12, referindo-se à impossibilidade de incidência de juros moratórios sobre juros indemnizatórios, sustentou que "visando estes ressarcir os prejuízos pela privação da importância indevidamente paga, não se pode justificar uma dupla compensação pela mesma privação da disponibilidade daquela quantia”.
13. Na mesma linha seguia igualmente Jorge Lopes de Sousa, ("Juros nas relações tributarias", in Problemas fundamentais do Direito Tributário, vislis, 1999, pp. 175 a 183, ao reconhecer só haver lugar a juros moratórios nos casos em que não haveria lugar a juros indemnizatórios, assumindo em nota de rodapé que "nestes casos, na medida em que haja juros de mora, não haverá lugar a juros indemnizatórios, pois naturalmente não se poderia justificar uma dupla compensação pela mesma mora".
14. O mesmo será de concluir assim, a contrario, ou seja, havendo lugar a juros indemnizatórios, não haverá lugar a juros moratórios, por tal configurar um duplo ressarcimento pela mesma privação.
15. Na hipótese de o tribunal vir a acolher a pretensão da R. e, de ver reconhecido o seu direito a juros moratórios, valerá igualmente o que aqui ficou dito quanto à impossibilidade da sua cumulação temporal, o que necessariamente determinaria que o cômputo final dos juros indemnizatórios corresponderia ao último dia do prazo de execução espontânea da decisão judicial, pois que só assim se obviaria à cumulação ilegal de juros indemnizatórios e moratórios.
B - RELATIVAS AO PEDIDO DE AMPLIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
16. Sustenta a sentença a quo que "o prazo de execução espontânea conta-se a partir do trânsito em julgado da decisão exequente".
17. Reconhece ainda aquele tribunal que a parte da sentença cujo cumprimento envolve operações materiais referentes ao cálculo dos juros indemnizatórios encontra-se salvaguardada pelo prazo de 90 dias definido no nº3 do artigo 61° do CPPT.
18. Todavia, e relativamente à dívida tributária, entendeu o tribunal a quo que o prazo de execução espontânea seriam de apenas 30 dias, nos termos do nº3 do artigo 175° do CPTA.
19. Esta questão foi já aflorada no recurso jurisdicional apresentado em 21.02.2014, pelo que não será aqui reiterada, pese embora mereça o necessário enquadramento a luz do pedido de ampliação que agora e apresentado, nos seguintes termos:
20. Pretende a R. e que os juros moratórios tenham natureza punitiva - circunstância que fundamentará a eventual decisão de reconhecer o direito a juros indemnizatórios - consubstanciando a sua aplicação, um sancionamento da AT pela demora na restituição do tributo.
21. Não será porém de olvidar, que a punição de um agente pela prática de qualquer infracção (nomeadamente omissiva) terá necessariamente por referência a circunstância de este, estando objectivamente em condições de praticar o acto omitido, o não tenha feito.
22. No caso vertente, e sempre aliás que perante a necessidade de execução de um julgado anulatório de acto tributário, só quando objectivamente a AT se encontrasse em condições de executar o julgado, através da prática do, ou dos actos executórios, e o não fizesse, é que poderíamos admitir a possibilidade da sua punição, através da aplicação de juros moratórios.
23. Em termos práticos, só quando a AT tivesse ao seu dispor, na sua esfera jurídica, os elementos necessários para a execução do julgado, é que se poderia considerar estarem reunidas as circunstâncias para que, não o executando no prazo de execução espontânea, pudesse ser "punida" mediante a aplicação de juros moratórios.
24. Este reunir de condições para a prática do acto omitido, passaria necessariamente pela detenção, na sua esfera jurídica, dos autos do processo onde foi proferida a sentença a executar - onde se inclui necessariamente o denominado processo instrutor - sem o que não se poderá considerar que objectivamente a AT esteja em condições de dar plena execução ao julgado.
25. Esta detenção, na sua esfera jurídica, do processo que aliás a própria lei, no nº2 do artigo 146º do CPPT, exige, como marco inicial do cômputo do prazo de execução espontânea do julgado - consubstanciaria assim uma denominada condição objectiva de punibilidade do agente (AT), sem o que, não haveria lugar a sua punição.
26. A jurisprudência que mais recentemente tem recaído sobre a interpretação deste artigo 146°, n°2 do CPPT, tem sido dimanada na perspectiva de que a obrigação de a AT executar o julgado surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão, e não com a remessa do serviço competente para a sua execução, e em consequência, a aplicação prática do referido artigo apenas releva como salvaguarda do direito a desencadear o incidente de execução de execução de julgado.
27. A abordagem agora proposta àquele normativo legal, vai no sentido de que, pese embora a obrigação de executar o julgado surja imediatamente com o trânsito em julgado da sentença, o início do prazo de execução espontânea só se dará com a remessa do processo para os serviços competentes para a sua execução.
28. Assim, no contencioso tributário, o prazo para a execução espontânea da sentença de anulação de acto tributário ou em matéria tributária não se conta do trânsito em julgado desta, mas sim a partir da data em que o processo tiver sido enviado ao órgão competente para executar (cf. entre outros, o acórdão do STA de 03.12.2008, proferido no processo nº0708/08).
29. Como refere Jorge Lopes de Sousa em anotação aquele normativo "está subjacente a esta norma o entendimento legislativo de que só com o processo em seu poder a administração tributária estaria em condições de dar execução ao decidido, pelo que seria incongruente considerar iniciado a contagem do prazo de execução antes do momento em que esta recebe o processo e, por isso, naquele entendimento, estarão efectivamente em condições de lhe dar execução" (in CPPT Anotado e Comentado, 2011, Volume II, pp. 527).
30. Transpondo este entendimento para a questão que agora nos ocupa, forçoso será concluir que, estando a aplicação de juros moratórios condicionada ao decurso do prazo de execução espontânea, o cômputo deste só se iniciará com o envio do processo ao órgão competente para a sua execução.
31. A remessa do processo ao órgão competente para execução comporta assim uma dupla funcionalidade, pois se por um lado funciona como marco inicial da contagem de prazo de execução espontânea, por outro lado, funciona como condição objectiva de punibilidade.
32. E não se avente que ao representante da fazenda pública estava defendo o dever de requerer a remessa do processo para execução, pois que tal não se mostra legalmente previsto.
33. O mesmo já não se dirá, todavia, do direito que impende sobre o interessado, de requerer a remessa do processo, prevista naquele mesmo artigo.
34. Ademais, pretendendo este (o interessado) obter uma vantagem, decorrente de uma omissão de cumprimento por parte da AT, a mesma só se poderá considerar objectivamente devida, se igualmente se mostrarem verificados os pressupostos de que a mesma depende.
35. Logo, sendo-lhe permitido impulsionar a remessa do processo ao órgão competente, não poderá este pretender que sem a remessa do mesmo a AT se considere em incumprimento, para efeitos de sujeição a juros moratórios.
36. Assim, o eventual reconhecimento do direito a juros moratórios, assumindo estes natureza punitiva, exigirá uma ponderação dos condicionalismos inerentes à sua aplicação, nomeadamente aferindo da verificação de condições objectivas de punibilidade, como seja a circunstância de a AT reunir condições objectivas de dar execução ao julgado, tendo na sua esfera jurídica o processo físico, no qual foi prolatada a sentença a executar.
37. Se a AT não dispõe desses elementos na sua esfera jurídica, não se poderá entender que esta em condições de dar execução ao decidido.
38. Logo, não cometeu objectivamente uma omissão que pressuponha uma punição.
39. Logo, não poderá ser sancionada com juros moratórios.
40. Assim, o prazo de execução espontânea, para efeitos no n°5 do artigo 43º da LGT não poderá iniciar-se antes da remessa do processo, prevista no artigo 146° do CPPT.
41. E, a condição objectiva de punibilidade da AT, no pagamento de juros moratórios só se poderá considerar verificada com a efectiva remessa do processo, e não em momento anterior.
42. Sendo ainda relevante acrescentar que, entendendo o tribunal a quo que o prazo de execução espontânea do pagamento dos juros indemnizatórios será o de 90 dias, nunca o prazo de execução espontânea previsto no nº5 do artigo 43º da LGT poderá ser inferior àqueles 90 dias, pois que só então estaria objectivamente verificada a omissão de execução espontânea no prazo legal.
43. O que nos conduz ainda a questão de saber se efectivamente terá aqui aplicação a regra de imputação do n°4 do artigo 40° da LGT questão já suscitada no recurso jurisdicional interposto em 21.02.2014, e que aqui ganha uma nova perspectiva, pois que aquele normativo pressupõe uma imputação prévia de pagamentos parciais, em juros moratórios, quando na verdade estes poderão ainda não ser devidos, face ao que acima vem exposto.
44. Não contemplando a sentença a executar, o reconhecimento do direito a juros moratórios, É não sendo estes devidos, fora dos condicionalismos acima mencionados, nunca os pagamentos parciais poderão ser primordialmente imputáveis aqueles.
Termos em que, deve o presente recurso jurisdicional ser julgado improcedente, ou a se julgado procedente, deverá o pedido de ampliação do seu objecto ser julgado deferido, no, termos supra expostos, assim se fazendo a devida JUSTIÇA.».

A ...-SOCIEDADE INDUSTRIAL DE ...RANTES, S.A., notificada das alegações da Fazenda Pública, veio contra-alegar, concluindo nos termos que se seguem:
«A) A sentença de anulação de um acto tributário de liquidação de imposto que implique para Administração Tributária a restituição ao contribuinte do imposto indevidamente pago deve se executada no prazo de 30 dias, previsto no artigo 175°, n°3, do CPTA, independentemente dos actos tributários que a Administração Tributária tenha de praticar, concomitantemente à restituição desse imposto;
B) Nos termos da sentença proferida no processo de impugnação judicial nº189/07 8BEALM, que antecedeu os presentes autos, a liquidação de imposto impugnada foi anulada, e a Administração Tributária foi condenada a restituir o imposto indevidamente pago pela ora Recorrida;
C) O recurso sub judice, é improcedente na parte respeitante ao alegado erro de julgamento do Douto Tribunal a quo no cômputo do prazo de execução da sentença proferida no processo de impugnação judicial nº189/07.8BEALM, porquanto a Administração Tributária apenas dispunha do prazo de 30 dias para a execução dessa sentença, nos termos do artigo 175 °, n 3, do CPTA;
D) O artigo 40º, n°4, da LGT, regula tanto os pagamentos parciais de dívidas dos contribuintes à Administração Tributária como os pagamentos parciais de dívidas da Administração Tributária aos contribuintes, face ao respectivo teor literal, sistemático e teleológico dessa norma;
E) É irrelevante para o caso em apreço nos presentes autos o regime ínsito nos artigos 89° e 262° do CPPT, na medida em que tais normas revelam um carácter de especialidade face à norma geral constante do artigo 40°, n° 4, da LGT, apenas sendo aplicáveis nos casos de compensações de dívidas tributarias por iniciativa da Administração Tributaria;
F) A imputação dos pagamentos parciais realizados pela Administração Tributária no âmbito da execução da sentença proferida no processo de impugnação judicial n°189/07.8BEALM, é regulada pelo disposto no artigo 40°, nº4, da LGT, devendo o recurso sub judice ser julgado improcedente na parte relativa ao alegado erro de julgamento do Tribunal a quo na aplicação da referida norma.

Nestes termos, e nos demais de Direito que V Exas. doutamente suprirão, não pode a pretensão do Recorrente deixar de ser desatendida, negando-se provimento ao recurso, o que com as demais consequências legais se requer.»

A ... – SOCIEDADE INDUSTRIAL DA ...RANTES, S.A veio ainda pronunciar-se sobre o pedido de ampliação do âmbito do recurso apresentado pela Fazenda Pública, conforme o seguinte:
«1. DA FALTA DE PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS LEGAIS DO PEDIDO DE AMPLIAÇÃO DO ÂMBITO DO RECURSO
1. Dispõe o artigo 636.º do CPC, atinente à ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido, o seguinte:
«No caso de pluralidade de fundamentos da acção ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respectiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação [n.º 1];
Pode ainda o recorrido, na respectiva alegação e a título subsidiário, arguir a nulidade da sentença ou Impugnar a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pelo recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas» [n.º 2].
2. No presente caso, não tendo o Recorrido, no âmbito das contra-alegações apresentadas a 28 de Abril de 2014, arguido a nulidade da sentença de execução de Julgados proferida pelo Douto Tribunal a quo nem impugnado a matéria de facto nela dada como provada, assume a Recorrente ter o pedido de ampliação do âmbito do recurso deduzido nas referidas contra-alegações tido lugar ao abrigo do n.º 1 da disposição legal supra.
3. Ora, o mencionado número visa acautelar a posição da parte vencedora, Impossibilitada de Interpor recurso da sentença por nela ter obtido vencimento e, desse modo, carecer de legitimidade nos termos do artigo 631º, n.º 1, do CPC, permitindo, no entanto, que os fundamentos em que a mesma decaiu possam ser apreciados pelo tribunal de recurso a seu pedido, devendo este pedido ser formulado em sede de contra-alegações.
4. Ora, na situação em presença, não só o Recorrido não assume a qualidade de parte vencedora no âmbito da sentença de execução de Julgados como a questão relativa ao momento a partir do qual se inicia a execução voluntária da sentença proferida no âmbito da Impugnação Judicial n.º 189/07.8BEALM não constitui fundamento em que efectivamente tenha decaído.
5. Com efeito, como indubitavelmente reflecte o recurso que interpôs a 21 de Fevereiro de 2014, o Recorrido obteve decaimento em sede da Acção de Execução de Sentença n.º 189/07.8BEALM-A, não tendo a questão relativa ao momento que marca o inicio da execução voluntária da decisão proferida no âmbito da impugnação judicial acima identificada revestido carácter controvertido entre as partes - em momento algum, na pendência da acção de execução de sentença, o Recorrido suscitou tal questão, não o tendo igualmente feito em sede do recurso que apresentou a 21 de Fevereiro de 2014.
6. Perante o exposto, entende a Recorrente não se mostrarem preenchidos os requisitos que permitiriam a formulação do pedido de ampliação do âmbito do recurso previsto no artigo 636.º, n.º 1, do CPC, sendo certo que a sua admissão, por parte do Douto Tribunal ad quem, permitiria ao Recorrido, que por lapso não integrou aquela questão nas alegações que apresentou a 21 de Fevereiro de 2014, ter direito à abertura de uma nova via de recurso, colmatando desse modo a omissão que cometera, o que se mostra totalmente inadmissível.
7. Em consonância com o entendimento acima exposta, pronuncia-se a jurisprudência dos tribunais superiores:
«Só quem obteve em primeira instância ganho de causa tem legitimidade para requerer a ampliação do objecto do recurso jurisdicional Interposto pela contra parte, ao abrigo do disposto no artigo 684.º-A do Código de Processo Civil [actual artigo 636.º do CPC], aplicável por força do disposto no artigo 140.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [...]. A lei confere ao recorrido (parte vencedora que não recorreu por, afinal, ter tido ganho de causa) a possibilidade de, precavendo-se da eventualidade de o recorrente lograr procedência do recurso, requerer ao tribunal ad quem, o conhecimento do fundamento ou dos fundamentos em que decaiu». - cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 17 de Fevereiro de 2012, proferido no âmbito do processo n.º 01292/10.2BEBRG.
«Todas as questões colocadas pelo autor poderiam ser apreciadas se tivesse interposto recurso subordinado (trata-se de questões em que a sentença não lhe foi favorável), nos termos do artigo 682.º do Código de Processo Civil e artigo 81.º, n.º 4, do Código de Processo do Trabalho. Só que o autor não interpôs recurso dos pedidos em que claudicou, nem a título principal nem a título subordinado. Não o fez e, como se viu, a opção pela via da ampliação do recurso não é a própria. Assim, não tendo recorrido da sentença, não lhe é permitido, ao abrigo do artigo 684.º-A do Código de Processo Civil [actual artigo 636.º do CPC], aplicável por força do disposto no artigo 140.º do Código de, suscitar a reapreciação dos pedidos julgados improcedentes pelo tribunal da 1.ª instância».
- cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 25 de Janeiro de 2007, proferido no âmbito do processo n. 1226/04.3TTCBR.C1
8. E, bem assim, ABÍLIO NETO:
“O recorrido não pode, pois, lançar mão da faculdade de ampliação do recurso para obter uma decisão absolutamente contrária à pretendida pelo recorrente, pois que, para tanto e posto que em parte ficou vencido, mister se tornava que, ele próprio, interpusesse recurso (Ac. RE, de 2.3.2000: BMJ, 486.º- 379)».
- cfr. ABÍLIO NETO, Código de Processo Civil Anotado”, Ediforum, 18ª Edição Actualizada, Setembro de 2014, página 952.
9. Perante o exposto, requer-se ao Douto Tribunal ad quem que se digne rejeitar, com fundamento na falta de preenchimento dos pressupostos previstos no artigo 636.º do CPC, o pedido de ampliação do âmbito do recurso deduzido pelo Recorrido, tudo com as demais consequências legais.
10. Não obstante, a título subsidiário, no cenário do Douto Tribunal ad quem pugnar pela admissibilidade do pedido de ampliação do âmbito do recurso deduzido pelo Recorrido, o que, sem conceder, apenas se admite por dever de patrocínio, constitui entendimento da Recorrente não merecer acolhimento a posição sustentada por aquele no sentido de ser aplicável o regime insito no artigo 146.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), nos termos do qual «O prazo de execução espontânea das sentenças e acórdãos dos tribunais tributários conta-se a partir da data em que o processo tiver sido remetido ao órgão da administração tributária competente para a execução, podendo o interessado requerer a remessa no prazo de 8 dias após o trânsito em julgado da decisão”, como em seguida explanará.
II. DA INAPLICABILIDADE DO REGIME ÍNSITO NO ARTIGO 146.º, N.º 2, DO CPPT
11. Conforme teve oportunidade de expor na petição de execução de sentença - em consonância, aliás, com a posição perfilhada pelo Douto Tribunal a quo em sede de sentença e, até à apresentação das suas contra-alegações de recurso, pelo próprio Recorrido - entende a Recorrente que o prazo destinado à execução voluntária da sentença proferida no âmbito da Impugnação Judicial nº 189/07.8BEALM se Iniciou com o seu trânsito em Julgado, o qual teve lugar a 15 de Novembro de 2012, em conformidade com o disposto no artigo 160.º, n.º 1, do CPTA, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea c), do CPPT, e, bem assim, com o preceituado no artigo 100.º da Lei Geral Tributária (“LGT”), não sendo aplicável o regime ínsito no artigo 146.º, nº 2, do CPPT, nos termos do qual «O prazo de execução espontânea das sentenças e acórdãos dos tribunais tributários conta-se a partir da data em que o processo tiver sido remetido ao órgão da administração tributária competente para a execução [...]».
12. Neste contexto, importa atentar à posição perfilhada por LOPES DE SOUSA, a qual inteiramente se sufraga, relativa à impossibilidade de aplicação do disposto no artigo 146.º, n.º 2, do CPPT face ao preceituado no artigo 100.º da LGT:
«O regime que resulta deste n.º 2 do art. 146.º, consubstanciando-se, por um lado, em fazer depender do requerimento do interessado a obrigação de a administração tributária executar o acto e, por outro, em criar uma dilação para a constituição da obrigação da administração tributária dar execução ao Julgado, não se harmoniza com o carácter imediato e incondicional que naquele art. 100.º é atribuído a essa obrigação».
- cfr. LOPES DE SOUSA, “Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado”, volume II, Áreas Editora, 6ª Edição, 2011, página 528.
13. É pois notória a existência de uma inequívoca oposição entre os dois preceitos legais, a qual, à luz da supremacia da LGT face ao CPPT - expressamente reconhecida pelo artigo 1.º do CPPT -, toma ilegal a norma ínsita no artigo 146.º, n.º 2, do CPPT, razão pela qual a mesma não é susceptível de aplicação ao presente caso.
14. Por outro lado, o artigo 146.º, n.º 2, do CPPT é desconforme ao sentido da autorização legislativa concedida ao Governo para aprovar o CPPT, a qual visava compatibilizar as normas deste código com as normas da LGT.
15. No mesmo sentido pronuncia-se LOPES DE SOUSA:
«Em face da supremacia da LGT sobre o CPPT, reconhecida no art. 1.º deste, e do sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar este Código, que é o de compatibilização das normas do CPT com as da LGT e regulamentação das disposições desta dela carecidas (alínea c), do nº 1 do art. 51.º da Lei n.º 87-B/98, de 31 de Dezembro), parece não ser admissível que no CPPT se estabeleça um regime incompatível».
- cfr. LOPES DE SOUSA, “Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado”, Volume II, Áreas Editora, 6ª Edição, 2011, página 528.
16. Tal facto é agravado pela circunstância do preceituado no artigo 146.º, n.º 2, do CPPT - ao regulamentar o regime da execução de sentença - se reportar à matéria das garantias dos contribuintes. É que muito embora o artigo 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição da República Portuguesa (‘CRP’), em sede de reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, tão-somente se refira à criação dos impostos e ao sistema fiscal, tal normativo deve ser compatibilizado com o conteúdo do artigo 103.º, n.º 2, da CRP, o qual estabelece que a lei determina a Incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes.
17. Desta forma, as matérias elencadas no artigo 103.º, nº 2, da CRP - entre as quais constam as garantias dos contribuintes - constituem uma explicitação das matérias incluídas naquela reserva,
18. Por conseguinte, tal matéria integra-se na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, não podendo o Governo legislar, no que à mesma concerne, em sentido diverso do constante da já referida autorização legislativa.
19. Assim sendo, é inequívoca a inconstitucionalidade orgânica da norma ínsita no artigo 146.º, n.º 2, do CPPT, bem como a sua consequente impossibilidade de aplicação ao caso concreto.
20. No mesmo sentido pronuncia-se o Autor supra citado, salientando o seguinte:
«As normas relativas ao regime de execução de julgados reportam-se às garantias dos contribuintes, pelo que o Governo não podia legislar nesta matéria em sentido diferente ao da referida autorização legislativa, pois tal matéria integra-se na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República. Na verdade, embora no art. 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP, em que se define esta reserva, se faça referência à criação de impostos e sistema fiscal, esta norma deve ser integrada com o conteúdo do nº 2 do art. 103.º da mesma, em que se refere que a lei determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes, que constitui uma explicitação do âmbito das matérias incluídas naquela reserva (...). Tratando-se, assim, de matéria englobada naquela reserva relativa de competência legislativa, o Governo não podia legislar sabre ela em divergência com o sentido indicado na lei de autorização legislativa em que se baseou (arts. 112.º, nº 2, e 198.º, n.º 1, alínea b), da CRP), pelo que, não respeitando tal obrigação, o referido n.º 2 deste art. 146.º do CPPT, na parte referente em que condiciona o dever de execução de julgados a pedido do interessado e em que difere o momento de contagem do prazo, será organicamente inconstitucional, se entendido como criando um período posterior ao trânsito em julgado em que não há dever de executar, um período durante o qual a administração tributária não suporta as consequências de ter praticado um acto Ilegal».
- cfr. LOPES DE SOUSA, “Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado”, Volume II, Áreas Editora, 6.ª Edição, 2011, página 529.
21. As considerações acima expostas vieram, de resto, a ser sufragadas no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 3 de Dezembro de 2008, proferido no âmbito do processo nº 0570A/08 e disponível no sítio www.dgsi.pt, no qual se concluiu:
«Sendo assim e como bem anota o Ex.º Procurador-Geral Adjunto no seu douto parecer “a interpretação adequada dos referidos preceitos é pois a de que o prazo para que a Administração Fiscal dê cumprimento espontâneo às decisões dos tribunais se inicie com o trânsito em julgado e não com a remessa do processo ao serviço de finanças competente”».
[sublinhado nosso]
22. Em síntese, e uma vez mais citando LOPES DE SOUSA, dir-se-á o seguinte:
«[…] o que importa é concluir que a obrigação da administração tributária executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial, que não é necessário requerimento do interessado para existir essa obrigação e que a falta de tal requerimento no prazo indicado no n.º 2 do art. 146º do CPPT não faz precludir o direito deste a exigir perante a administração tributária e os tribunais a execução do julgado»
- cfr. LOPES DE SOUSA, “Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado”, Volume II, Áreas Editora, 6ª Edição, 2011, página 530.
23. Nestes termos, carece de fundamento a posição sustentada pelo Recorrido em sede do pedido de ampliação do âmbito do recurso, quanto ao momento que marca o início do prazo de execução voluntária da sentença proferida na impugnação judicial, e, por via disso, quanto aos efeitos jurídicos que dessa posição pretende retirar, nomeadamente no que respeita ao direito da Recorrente à percepção de juros de mora.
24. Perante o exposto, entende a Recorrente ser inadmissível a argumentação jurídica aduzida pelo Recorrido quanto à interpretação e aplicação do artigo 146.º, n.º2, do CPPT, o que não poderá deixar de ser sindicado aquando da prolação de acórdão no âmbito dos presentes autos, requerendo-se ao Douto Tribunal ad quem que considere ter o início do prazo destinado à execução espontânea da sentença, proferida no âmbito da Impugnação Judicial n.º 189/07.8BEALM, tido lugar a 15 de Novembro de 2012, com o respectivo trânsito em julgado, em conformidade com a aplicação conjugada dos artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP, 100.º da LGT, 1.º do CPPT e 160.º, n.º 1, do CPTA.
Nestes termos, requer-se ao Douto Tribunal ad quem que se digne rejeitar, com fundamento na falta de preenchimento dos pressupostos previstos no artigo 636.º do CPC, o pedido de ampliação do âmbito do recurso deduzido pelo Recorrido, tudo com as demais consequências legais.
A titulo subsidiário, no cenário do Douto Tribunal ad quem considerar preenchidos os referidos pressupostos legais, requer-se que julgue improcedente o pedido de ampliação em referência, atento o disposto nos artigos 103º, nº 2, e 165º, nº 1, alínea i) da CRP, 100º da LGT, 1,º do CPPT e 160º, nº 1, do CPTA, tudo com as demais consequências.».

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Por Acórdão de 03 de Dezembro de 2014, julgou-se verificada a excepção da incompetência em razão da hierarquia da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, para conhecer do presente recurso, declarando-se competente para esse efeito este Tribunal Central Administrativo, ao qual o processo foi remetido.

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Após remessa dos autos a este Tribunal Central o MINISTÉRIO PÚBLICO foi notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146º, nº1 do CPTA, ex vi artigo 27º, nº2 da Lei 10/2011, mas remeteu-se ao silêncio.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir em Conferência.

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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Face às conclusões formuladas, as questões submetidas à nossa apreciação consistem em saber:
-recurso da Fazenda Pública
- saber se o prazo para a execução de sentença anulatória de acto de liquidação é de 90 dias, por força do nº1 do artigo 175º do CPTA ou de três meses por aplicação no n.º3 do mesmo preceito legal;
- saber qual a ordem por que devem ser imputados pagamentos efectuados pela administração tributária, em execução do julgado anulatório.
-recurso da ... - SOCIEDADE INDUSTRIAL DE ...RANTES, S.A.
- saber se os juros de mora com taxa agravada previstos no artigo 43º, n.º 5 da LGT, são ou não cumuláveis, no mesmo período de tempo - compreendido entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado até à data da emissão da nota de crédito - com os juros indemnizatórios que sejam devidos.

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III. FUNDAMENTAÇÃO
A. DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:
«1. No dia 27 de Outubro de 2006, a ora Exequente teve conhecimento da liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) n°... relativa ao exercício de 2003, no montante total de EUR 1.044.476,54, correspondendo EUR 937.505,01 a imposto e EUR 106.971,53 a juros compensatórios (cf. cópia da demonstração de liquidação, a fls. 32 dos autos).
2. No dia 5 de Dezembro de 2006, a ora Exequente teve conhecimento da liquidação adicional de IRC n°... relativa ao exercício de 2004, no montante global de EUR 879.259,45, equivalendo EUR 796.160,13 a imposto e EUR 83.099,32 a juros compensatórios (cf. cópia da demonstração de liquidação, a fls. 32 dos autos).
3. Em 28 de Dezembro de 2006 a dívida exequenda objeto do processo de execução fiscal n°... foi compensada com crédito de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) no montante total de EUR 1.041.668,01 (cf. impressões a fls. 38 e 39 dos autos).
4. No dia 2 de Janeiro de 2007, por ter omitido o pagamento voluntário da liquidação adicional de IRC de 2003 n°..., a ora Exequente foi citada da instauração do processo de execução fiscal n°... pelo Serviço de Finanças de ..., tendente à respectiva cobrança coerciva (cf. "citação pessoal" a fls. 36 dos autos).
5. Em 10 de Janeiro de 2007, a ora Exequente efectuou o pagamento da quantia exequenda subsistente no processo de execução fiscal n°..., no montante global de EUR 26.629,23, sendo EUR 2.808,53 a título de IRC e juros compensatórios e EUR 23.820,70, a título de juros de mora e acrescido, resultante da liquidação adicional de IRC n°... (cf. cópia do comprovativo de pagamento, a fls. 41 dos autos).
6. No dia 12 de Fevereiro de 2007, por ter omitido o pagamento voluntário da liquidação adicional de IRC n.°..., a ora Exequente foi citada da instauração do processo de execução fiscal n°..., tendente à respetiva cobrança coerciva, por parte do Serviço de Finanças de ... (cf. cópia da "citação pessoal", a fls. 43 dos autos).
7. No dia 26 de Fevereiro de 2007, por ter discordado parcialmente da prolação das referidas liquidações adicionais de imposto n°... e n°..., nos montantes de EUR 1.044.231,39 - sendo EUR 937.286,96 de imposto e EUR 106.944,43 de juros compensatórios-, relativo a 2003, e EUR 835.687,60 - sendo EUR 756.615,18 de imposto e EUR 79,072,42 de juros compensatórios -, relativo a 2004, a ora Exequente apresentou, perante o Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, impugnação judicial, aqui se dando por integralmente reproduzido o teor da respectiva petição inicial (cf. cópia da PI a fls. 47 a 179 dos autos).
8. A impugnação judicial referida no ponto anterior correu os seus termos, sob o n°189/07.8BEALM perante a 2.ª Unidade Orgânica do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada e, subsequentemente, perante a 2.ª Unidade Orgânica do Tribunal Tributário de Lisboa.
9. No dia 20 de Março de 2007, com vista a suspender o processo de execução fiscal n°..., a ora Exequente apresentou, junto do Serviço de Finanças de ... a garantia bancária nº333.065 emitida pelo BANCO ..., S.A. no montante total de EUR 1.426.304,03 (cf. cópia da garantia, a fls. 45 dos autos).
10. Por sentença de 8 de Outubro de 2012, notificada à ora Exequente a 15 de Outubro de 2012, foi julgada procedente a impugnação judicial n°189/07.8BEALM, resultando da sentença proferida a anulação das liquidações adicionais de IRC n°..., relativa ao ano de 2003, no montante global de EUR 1.044.231,39, e n.°..., relativa ao ano de 2004, no montante global de EUR 835.687,60, incluindo os respetivos juros compensatórios, e condenada a Administração Tributária "a devolver o imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios, contados desde a data do pagamento indevido, até à data da emissão da respetiva nota de crédito e ao pagamento de indemnização por prestação indevida de garantia", bem como a pagar a totalidade das custas judiciais (cf. cópia do ofício de notificação e da sentença, a fls. 181 a 230 dos autos).
11. A ora Exequente suportou com a constituição e manutenção da garantia n°333.065 despesas a título de comissões, impostos e cancelamento no montante total de EUR 56.303,42 (cf. cópias dos descritivos das despesas emitidos pelo Banco ... a fls. 523 a 546 dos autos).
12. A 30 de Outubro de 2012 a ora Exequente apresentou perante a Direcção de Finanças de Setúbal nota discriminativa e justificativa das custas judiciais suportadas no âmbito da impugnação judicial, no montante global de EUR 2.304,00 (cf. cópia do requerimento a fls. 240 a 242 dos autos).
13. No dia 27 de Novembro de 2012 a ora Exequente solicitou perante o Serviço de Finanças de ... o levantamento da garantia bancária prestada no âmbito do processo de execução fiscal n°... (cf. cópia do requerimento, a fls. 234 a 236 dos autos).
14. Através do ofício n°8.788, datado de 11 de Março de 2013, foi devolvida à ora Exequente a garantia bancária 33065 (cf. cópia do requerimento e do ofício, a fls. 234 a 236 e 238 dos autos).
15. A 28 de Março de 2013 a ora Exequente requereu perante a Direcção de Finanças de Lisboa o pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, no montante global de EUR 56.303,42 (cf. cópia do requerimento, a fls. 314 a 321 dos autos).
16. Em 26 de Junho de 2013, a ora Exequente recebeu através de transferência bancária operada pelos serviços da Administração Tributária, o montante de EUR 2.304,00, tendo este pagamento sido efetuado com a intenção de ressarcir custas de parte (cf. cópia do ofício da AT n°20513, datado de 2013/06/26, a fls. 578 dos autos).
17. Em 17 de Julho de 2013, a ora Exequente recebeu através de transferência bancária operada pelos serviços da Administração Tributária, o montante de EUR 1.044.231,39, tendo este pagamento sido efetuado com a intenção de ressarcir o IRC do exercício de 2003 (cf. cópias das demonstrações de acerto de contas nºs 2013 00002216827, 2013 00002216828, 2013 00002216829, 201300002216830 e 201300002216831, a fls. 592 a 596 dos autos e informação G71827 de 2013/11/06 da AT e impressão de listagem de reembolsos constante na base de dados da AT a fls. 665 e 666 a 677 dos autos).
18. Em 17 de Julho de 2013, ora Exequente recebeu através de transferência bancária operada pelos serviços da Administração Tributária o montante de EUR 1.406,20, tendo este pagamento sido efetuado com a intenção de ressarcir o pagamento feito em excesso no âmbito do processo de execução fiscal n°... relativo ao IRC 2004 aquando da regularização da dívida de imposto não impugnada judicialmente (cf. cópias das demonstrações de acerto de contas n°s 2013 00002216832, 2013 00002216833 e 2013 00002216834, a fls. 598 a 600 dos autos e informação G71827 de 2013/11/06 da AT e impressão de listagem de reembolsos constante na base de dados da AT a fls. 665 e 666 a 677 dos autos).
19. Em 23 de Setembro de 2013, a ora Exequente recebeu através de cheques provindos da AT o montante de EUR 273.474,09 (cf. cópia das demonstrações de acerto de contas n.°s 2013 00002964550 e 2013 00002964551, a fls. 637 e 638 dos autos e informação G71827 de 2013/11/06 da AT e impressão de listagem de reembolsos constante na base de dados da AT a fls. 665 e 678 a 686 dos autos).
20. Em 10 de Outubro de 2013 a ora Exequente recepcionou a transferência bancária efectuada pela AT no montante de EUR 56.303,42 (cf. cópia da demonstração de acerto de contas n°2013 00003060159, a fls. 657 dos autos e informação G71827 de 2013/11/06 da AT e impressão de listagem de reembolsos constante na base de dados da AT a fls. 665 e 687 a 688 dos autos).
21. Em 7 de Maio de 2013 a PI da presente execução de julgados deu entrada no Tribunal Tributário de Lisboa (cf. carimbo aposto a fls. 2 dos autos)»

A título de fundamentação da matéria de facto, diz-se na Sentença recorrida que: «A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos.
A matéria de facto constante no ponto 9 dá-se como provado por se tratar de facto notório de que o Tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções [cf. art. 514.°, n°2 do CPC, aplicável ex vi art.2° alínea e) do CPPT], atendendo à circunstância de a ora titular o ter sido igualmente nos autos de impugnação 189/07.8BEALM e de o facto ali provado ser comprovável por mera consulta ao SITAF».

E, em sede de factualidade não provada, exarou-se na Sentença recorrida que: «Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir».
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B. DE DIREITO
Nos presentes autos foi proferida sentença pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou parcialmente verificada a situação de inexecução ilegítima de julgado, e condenou a Fazenda Pública (executada), no prazo de trinta dias, ao pagamento à exequente do montante em falta de EUR 2.267,53 e juros indemnizatórios calculados sobre o mesmo e até ao pagamento integral do capital em dívida, tendo sido declarado, quanto ao restante pedido, a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do disposto no artigo 277.º, alínea e) do CPC, aplicável ex vi do artigo 2.º, alínea e) do CPPT.
DO RECURSO DA FAZENDA PÚBLICA
A recorrente [Fazenda Pública] manifesta a sua discordância com a sentença sob recurso, alegando, que o prazo para execução espontânea do julgado, que determinou a anulação parcial da liquidação, é de 90 (noventa) dias, por força do nº1 do artigo 175º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).
Para fundamentar a sua afirmação, refere que: « A estatuição do nº3 do artigo 175º do CPTA apenas terá aplicação quando a sentença anulatória determinar expressamente o quantum a restituir, pois que só assim se poderá entender que a execução da sentença consistira no pagamento de uma quantia pecuniária.»[Conclusão 10].
Sem razão, todavia.
Como sabemos, a execução de sentenças proferidas nos tribunais tributários é regulada pelas normas do CPTA por força do disposto no artigo 102º, n.º1 da LGT (diz o preceito: «A execução de sentenças dos tribunais administrativos e aduaneiros segue o regime previsto para a execução das sentenças dos tribunais administrativos»).
E, sobre o «Prazo para a execução e causas legítimas de inexecução» estabelece o artigo 175.º, nos seus n.ºs 1 e 3 do CPTA (na redacção aplicável aos factos ajuizados):
«1 - Salvo ocorrência de causa legítima de inexecução, o dever de executar deve ser integralmente cumprido no prazo de três meses.
2 - (…)
3 - Sem prejuízo do disposto no artigo 177.º, quando a execução da sentença consista no pagamento de uma quantia pecuniária, não é invocável a existência de causa legítima de inexecução e o pagamento deve ser realizado no prazo de 30 dias.».
Da literalidade do preceito, resulta à evidência que o CPTA prevê na execução de sentenças de anulação de actos administrativos, um prazo de execução espontânea de trinta dias, no caso de pagamento de quantia certa, e de três meses nos restantes casos, nos termos do artigo 175º, nºs.1 e 3, do citado diploma.
A propósito da natureza dos prazos enunciados no parágrafo anterior pode ler-se no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 25.03.2009, proferido no processo n.º 0777/08: «O prazo de três meses previsto no artº 175º, nº 1 do CPTA não tem natureza procedimental, não se lhe aplicando o disposto no artº 72º do CPA.
II - Tal prazo, em caso de inércia da Administração, forma com o prazo de seis meses, previsto no nº 2 do artº 176º para o interessado instaurar a execução judicial, uma unidade temporal que aquele terá de respeitar, sob pena de caducidade do seu direito de acção.
III - E, por isso, deve ser contado nos mesmos termos que o referido prazo de caducidade, ou seja, nos termos do artº 144º do CPC, nos termos aplicáveis do disposto no artº 58º, nº 3 do CPTA.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Pode reconhecer-se, pois, que os prazos peremptórios previstos no artigo 175.º, nºs.1 e 3, do CPTA, são prazos procedimentais, pelo que são contados de harmonia com o disposto no artigo 72.º, nº.1, do CPA, à data em vigor, suspendendo-se nos sábados, domingos e feriados, pois apenas em prazos legalmente fixados em mais de seis meses esses dias se incluem, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito (Acórdãos do STA de 02.02.2006 e 28.01.2010, proferidos nos processo n.ºs04817/A e 091/95, Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.531 e seg.; Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao C.P.T.A., Almedina, 3ª.edição, 2010, pág.1125).
Importa, agora saber, qual o prazo legal aplicável na situação concreta destes autos.
Será que é aplicável o prazo previsto no artigo n°3 do artigo 175.° do CPTA (trinta dias), como decidiu a primeira instância?
Ou, será aplicável o prazo previsto no n.º1 do artigo 175º do CPTA (noventa dias), como defende a recorrente.

No caso vertente, pese embora a sentença anulatória do acto de liquidação adicional de IRC nº ..., relativa ao ano de 2003, não tenha condenado a recorrente [... - SOCIEDADE INDUSTRIAL DE REGRIGERANTES, S.A.] na restituição do imposto indevidamente pago deve vincar-se que a execução dos julgados anulatórios de actos de liquidação, nos casos em que a quantia liquidada foi cobrada e o acto não pode ser renovado, reconduzir-se-á ao pagamento ao contribuinte da quantia indevidamente paga, acrescida, ou não, de juros indemnizatórios. Por isso, relativamente ao imposto indevidamente cobrado, a execução espontânea da decisão anulatória deverá efectuar-se no prazo de 30 dias (cfr. Jorge Lopes de Sousa, ob. cit. II volume, pág.532).
Deste modo, não pode deixar de se considerar que foi intenção do legislador incluir no n°3 do artigo 175.° do CPTA a execução de actos administrativos cujos efeitos se consubstanciam no pagamento de quantias pecuniárias, pois de outro modo, e atenta a previsão do citado artigo 170°, aquela disposição ficaria esvaziada de conteúdo.
Consideramos, pois, que bem andou a sentença recorrida ao consignar que: « uma adequada interpretação sistemática leva à conclusão de que à execução da sentença, no que diz respeito ao reembolso do imposto indevidamente pago em face da ilegalidade da correspondente liquidação ali anulada, e que, aliás, consubstancia uma quantia certa e líquida, é inteiramente aplicável o disposto do prazo de 30 dias previsto no n°3 do art.175° do CPTA, ex vi art.146° do CPPT.».
Conclui-se, assim, que nenhum dos argumentos da recorrente procede, pelo que nesta parte, improcede o recurso.
Prossegue a recorrente divergindo da posição assumida na sentença recorrida quando à aplicação do artigo 40º, n.º4 da LGT e fá-lo dizendo o seguinte: «[a] imputação dos pagamentos não pode ser efectuada nos termos do nº 4 do artigo 40º da LGT, uma vez que tal comporta uma situação de desigualdade e injustiça.».
Na sentença recorrida escreveu-se quanto a esta questão: «Quanto à questão da aplicação ao caso do disposto no art.40°, nº4 da LGT no que diz respeito à ordem pela qual deve ser feita a imputação dos pagamentos efetuados pela AT, que ascendem à quantia total de EUR 1.376.312,90 (não se considerando neste montante a quantia de EUR 1.406,20 paga em 2013/07/17, uma vez que diz respeito a IRC de 2004 não peticionado nos autos), tem também razão a Exequente.
Dispõe-se no n°4 do art.40° da LGT, sob a epígrafe "Pagamento e outras formas de extinção das prestações tributárias", que "em caso de o montante a pagar ser inferior ao devido, o pagamento é sucessivamente imputado pela seguinte ordem a: a) Juros moratórios; b) Outros encargos legais; c) Dívida tributária, incluindo juros compensatórios; d) Coimas."
Quanto a esta questão adere-se na íntegra e sem reservas ao decidido no acórdão proferido pelo STA em 2012/01/08 no rec. 01113/11 (disponível para consulta em vwwv.dgsi.pt/jsta) no sentido de que, e ainda que esta norma não esclareça expressamente "se o regime nela previsto se aplica apenas às dívidas de que são credoras entidades públicas ou também às dívidas de que estas entidades são devedoras em relação a particulares" se aplica também a estas últimas, por ser a solução que resulta da melhor interpretação da lei por apelo ao elemento racional e teleológico, já que a respetiva aplicação não é afastada pelo seu teor literal ou por apelo ao elemento sistemático, concluindo-se que "a solução mais razoável, que se tem de presumir ter sido legislativamente adoptada (art.9°, n°3, do Código Civil), é a de que naquele n°4 do art.40° da LGT se regulou, de forma igualitária e justa, o regime de imputação de pagamentos insuficientes tanto das dívidas do contribuinte para com a administração tributária como as desta para com os contribuintes." (destacado nosso), conclusão a que não é alheia o facto de a própria LGT visar "promover «uma maior justiça fiscal entre a Administração e os contribuintes», particularmente em matéria do regime de juros a favor da administração tributária e dos contribuintes [como se conclui da alínea 19) do art.2° da Lei n°41/98, de 4 de Agosto, que autorizou o Governo a aprovar a LGT]" (cf. acórdão proferido pelo STA em 2012/01/08 no rec. 01113/11, de que transcrevem os excertos citados).
(…) relativamente aos pagamentos já efetuados até ao momento à Exequente, há que concluir que, e como foi já referido, se encontram pagas as quantias relativas à indemnização pela prestação de garantia indevida e ao pagamento de custas de parte, respectivamente nos montantes de EUR 56.303,42 e EUR 2.304,00, devendo quanto a esta parte do pedido ser julgada extinta a instância por inutilidade superveniente da lide
Concordamos inteiramente com esta argumentação que foi, de resto, suportada no entendimento do Supremo Tribunal Administrativo no seu acórdão de 08.02.2012, proferido no processo n.º 1113/11 (citado na sentença) que decidiu em sentido contrário àquele que é propugnado pela recorrente.
Temos de concluir portanto pela improcedência desta questão.
Improcede na íntegra o recurso.
RECURSO DA RECORRENTE ...- SOCIEDADE INDUSTRIAL DE REGRIGERANTES, S.A.
O Tribunal Tributário de Lisboa entendeu não haver lugar a cumulação de juros indemnizatórios e moratórios relativamente ao mesmo período do tempo. É contra este segmento decisório da sentença que reage a recorrente pugnando que o direito à percepção de juros indemnizatórios não colide com o direito á percepção de juros de mora.
A questão da atribuição cumulativa de juros indemnizatórios e de juros moratórios que a recorrente definiu como objecto do presente recurso, corresponde, substancialmente, à que já foi apreciada no âmbito do Acórdão do STA (Pleno da Secção do Contencioso Tributário) de 07.06.2017, proferido no processo n.º 0279/17.
Não havendo motivos para divergir da fundamentação exarada no mencionado Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, aderimos à mesma, reproduzindo os excertos mais significativos nos termos seguintes: «O disposto no artigo 43º, n.º 5, bem como o disposto no artigo 44º, n.º 3 (a taxa de juros de mora é a definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas, excepto no período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data do pagamento da dívida relativamente ao imposto que deveria ter sido pago por decisão judicial transitada em julgado, em que será aplicada uma taxa equivalente ao dobro daquela), ambos introduzidos pela referida LOE para 2012, tiveram unicamente como objectivo exercer pressão sobre os devedores para que solvam rapidamente as suas obrigações. Na verdade, não se encontra na previsão de tais preceitos qualquer fundamento ressarcitório ou indemnizatório.
Como já vimos, o contribuinte é ressarcido – relativamente ao período de tempo em que esteve indevidamente desapossado do imposto pago e não devido- por via dos juros indemnizatórios ou moratórios, a administração tributária é ressarcida –relativamente ao período de tempo em que esteve indevidamente desapossada do imposto devido- por via dos juros compensatórios, cfr. artigo 35º, n.º 1 (são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária) e por via dos juros moratórios, cfr. artigo 44º, n.º 1 (são devidos juros de mora quando o sujeito passivo não pague o imposto devido no prazo legal), ambos da LGT, sendo que os juros compensatórios se integram na dívida de imposto, cfr. art. 35º, n.º 8 e, portanto, sobre os mesmos incidirão os respectivos juros moratórios quando devidos.
Ou seja, o legislador ao elevar para o dobro a taxa dos juros de mora devidos pelo contribuinte, nos termos do artigo 44º, n.º 3 e ao instituir a obrigação do pagamento de juros de mora, a favor do contribuinte, a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas, cfr. artigo 43º, n.º 5, sendo que incluiu tal obrigação de pagamento de juros de mora no preceito legal que dispõe sobre os juros indemnizatórios também a favor do contribuir, não pretendeu, claramente, estabelecer um regime legal em que os juros indemnizatórios e moratórios fossem alternativos ou que mutuamente se excluíssem.
Antes pretendeu instituir uma sanção para as situações de incumprimento grave, e tal como refere a recorrente, a par das restantes sanções já legalmente previstas, a sanção pecuniária compulsória, cfr. artigo 169º e a responsabilidade civil e disciplinar da administração e dos seus órgãos, cfr. artigo 159º, ambos do CPTA.
Enquanto que os normais juros indemnizatórios, compensatórios e de mora são estabelecidos, essencialmente, na perspectiva do credor, de modo a que se diminuam as suas perdas pela privação da quantia que lhe é devida, estes juros de mora agravados são estabelecidos na perspectiva do devedor, de modo a que o mesmo se sinta efectivamente compelido a efectuar o pagamento em falta.
E, na verdade, compreende-se que assim seja, uma vez que tal sanção foi estabelecida numa época de grandes dificuldades económicas (que parcialmente se mantêm) em que era essencial que todos contribuíssem atempadamente para a economia comum, uns por via do rápido pagamento de impostos, outra, a administração tributária, pela rápida devolução aos contribuintes das quantias indevidamente pagas a título de impostos (sobre a razão de ser do regime dos juros de mora agravados, diz J. Maria Fernandes Pires e outros, Lei Geral Tributária, Comentada e Anotada, págs. 378 e 392: “O legislador estabeleceu uma taxa de juros de mora agravada no n° 3 do artigo 44° da LGT. A excepção constante do n° 3 do artigo 44° -foi introduzida pela Lei n° 64-B/2011, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2012). A introdução deste regime no ordenamento jurídico tributário foi um dos compromissos assumidos por Portugal no âmbito do plano de assistência financeira assinado em 11 de Maio de 2011. Essa medida consta do ponto 3.34 – ii do Memorando de Entendimento entre Portugal, a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o FMI (a chamada Troika). O objectivo do regime dos juros de mora agravados foi o de aplicar um juro legal especial ao não cumprimento das decisões dos tribunais tributários pelos sujeitos passivos. Para o efeito, estabeleceu-se a aplicação de uma taxa de juros de mora agravada, correspondente ao dobro da taxa de juros de mora por dívidas ao Estado e outras entidades públicas (prevista nos n°s 1 e 2 do artigo 3° do Decreto-Lei n° 73/99, de 16 de Março, com a redacção da Lei n° 3-B/2010, de 28 de Abril, e do Decreto-Lei n° 32/2012, de 13 de Fevereiro) sempre que houver uma decisão transitada em julgado, ou seja, definitiva (porque insusceptível de recurso), e da qual resulte a obrigação de pagamento (pelo contribuinte) de certo montante de imposto, e que não seja cumprida no prazo de execução espontânea da sentença. Esta medida tinha como objectivo diminuir a litigância, o excesso de pendências de processos nos tribunais tributários, o tempo médio de resolução dos processos e ainda o incumprimento das decisões judiciais com expedientes dilatórios utilizados nos processos executivos.
Na verdade, a razão fundamental que está na origem da instituição do mecanismo dos juros de mora em dobro é a dissuasão do incumprimento do dever de pagamento pelos contribuintes, nos casos em que a litigância é utilizada até ao extremo para protelar o pagamento do imposto, incluindo no processo executivo (como resulta do n° 3 do artigo 44° da LGT). A instituição do mecanismo dos juros demora a favor do contribuinte é uma opção de política legislativa reflexa daquela que se encontra prevista no n° 3 do artigo 44º da LGT, destinando-se a garantir um princípio de igualdade e de reciprocidade nas relações entre os sujeitos da relação jurídica tributária.”.
Aliás, e como já anteriormente se disse, a única interpretação das normas legais em apreço que respeita o disposto nos artigos 9º do Código Civil e 11º da LGT, que dispõem sobre a interpretação dos preceitos legais, é precisamente aquela que leva à conclusão de que nas situações previstas no artigo 43º, n.º 5 há uma efectiva cumulação dos juros indemnizatórios com os juros de mora contados ao dobro da taxa dos juros legais para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas, sob pena de tal norma perder qualquer sentido útil.
Se assim não fosse, e nas situações de incumprimento grave, ou seja, quando se mantém o incumprimento já após o fim do prazo de cumprimento voluntário das decisões transitadas em julgado, apenas o contribuinte seria onerado com tal “sanção”, à AT bastar-lhe-ia proceder ao pagamento dos juros indemnizatórios para não mais lhe ser aplicável tal preceito legal. Efectivamente, nas situações em que o contribuinte se mantenha faltoso após a data do termo do prazo de execução espontânea da decisão judicial transitada em julgado, e até ao pagamento efectivo do imposto devido, tem que arcar sempre com os juros de mora contados ao dobro da taxa legal, sendo certo que tais juros agravados incidem, também, sobre o montante dos juros compensatórios que sejam devidos.» ( disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Ora, sufragando-se estas considerações, temos de concluir que a sentença sob recurso padece de erro de julgamento ao entender que o pagamento de juros indemnizatórios colide com o pagamento de juros de mora.
Finalmente, no que respeita à taxa aplicável, por força do artigo 43.º, n.º5 da LGT (foi aditado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, que entrou em vigor em 01/01/2012 (cfr. artigo 215.º) , cuja redacção é a seguinte: «No período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.», é hoje claro que os juros de mora são os definidos na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.
Chegados aqui, é altura de apreciar a questão suscitada no articulado de ampliação de recurso apresentado pela recorrida Fazenda Pública, cujo núcleo central gira em torno do marco inicial do prazo para a execução espontânea da sentença.
Desde já se aponta que, ao contrário do que afirma a recorrida, a obrigação da administração tributária executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial.
Com efeito, sobre este particular aspecto (início do prazo de execução espontânea) o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12.02.2014, proferido no processo n.º 01528/13, no respectivo sumário, esclarece: « I - O dever de cumprir espontaneamente o julgado tributário surge com o trânsito em julgado deste e não com a remessa do processo ao órgão competente para a execução. II - Se o requerimento de execução de julgado anulatório deu entrada no Tribunal decorridos mais de três meses sobre a data em que presumivelmente o trânsito em julgado da sentença exequenda se verificou não pode concluir-se ter sido prematuramente apresentado. III - O interessado dispõe de mera faculdade, que não do dever, de requerer a remessa dos autos ao órgão da administração competente para a execução da decisão judicial tributária. IV - Se o facto de não ter em seu poder o processo físico dificulta o cumprimento por parte da Administração tributária do seu dever de cumprir o julgado, caberá ao Representante da Fazenda Pública procurar superar essa dificuldade (artigo 15.º n.º 1, alínea a) e n.º 2 do CPPT), designadamente requerendo ao Tribunal a devolução do processo ao órgão competente para a execução ou solicitando os elementos tidos como necessários para cabal cumprimento do julgado.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Note-se que o Supremo Tribunal Administrativo, muito antes do acórdão citado, tinha decidido em formação alargada em 02.12,2009, no processo n.º 0570-A/08, em idêntico sentido: «A obrigação da Administração Tributária de executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial e não com a remessa, a requerimento do contribuinte, do processo para o serviço competente para a execução» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Não merece, assim, censura a douta sentença recorrida, quando considerou que a obrigação da administração tributária executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial.
Segundo o artigo 102º, n.º2 da LGT: « Em caso de a sentença implicar a restituição de tributo já pago, são devidos juros de mora a partir do termo do prazo da sua execução espontânea.». E, preceitua o artigo 43º, n.º5 da LGT:«No período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.».
E, portanto, na ausência de reacção contenciosa da recorrida quanto ao segmento da sentença em que fixou o trânsito em julgado da sentença em execução no dia 15.11.2012 (por força do disposto no art.144°, n°1 do CPTA, aplicável por força do disposto no art.279°, n°2 do CPPT, e do qual resulta que o "prazo para a interposição de recurso é de 30 dias e conta-se a partir da notificação da decisão recorrida", a sentença exequenda, proferida em 8 de Outubro de 2012 e notificada em 15 de Outubro de 2012 (facto 12 do probatório), tem-se por transitada em julgado no dia 15 de Novembro de 2012) assiste à recorrente o direito a juros de mora, calculados sobre o montante a cujo pagamento foi o Estado condenado por decisão judicial a partir da data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado, ou seja, desde o dia 29.12.2012 (o último dia para executar o julgado foi dia 28.12.2012) até a data da emissão de cada nota de crédito, no caso correspondente às datas identificadas no probatório relativas às transferências bancárias operadas pelos Serviços da Administração Tributária.
DA DISPENSA DO PAGAMENTO DE REMANESCENTE DE TAXA DE JUSTIÇA
Conforme entendimento expresso no acórdão do STA de 07.05.2014, proferido no processo n.º 01953/13 a que aderimos, «A norma constante do nº7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes),iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Considerando que o valor da presente causa ultrapassa o patamar de 275.000€ (valor da causa no presente processo fixou-se em € 1.422.719,83 €) e que a mesma não assumiu especial complexidade nem a conduta assumida por qualquer uma das partes, em recurso, pode considerar-se num nível reprovável.
Nada obsta que a recorrente seja dispensada, do pagamento do remanescente da taxa de justiça, atendo o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade.
IV. CONCLUSÕES
I.A execução de sentenças proferidas nos tribunais tributários é regulada pelas normas do CPTA por força do disposto no artigo 102º, n.º1 da LGT.
II.O dever de cumprir espontaneamente o julgado tributário surge com o trânsito em julgado deste e não com a remessa do processo ao órgão competente para a execução, sendo que o disposto na LGT prevalece sobre o CPPT, como resulta do artigo 1º do CPPT.
V.DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em:
a) negar provimento ao recurso interposto pela recorrente Fazenda Pública;
b) conceder provimento ao recurso interposto pela recorrente ...- SOCIEDADE INDUSTRIAL DE ...RANTES, S.A. e consequentemente condenar a Fazenda Pública ao pagamento de juros moratórios, calculados sobre o montante a cujo pagamento foi o Estado condenado por decisão judicial, a partir da data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado, ou seja, desde o dia 29.12.2012 até a data da emissão de cada nota de crédito, no caso correspondente às datas identificadas no probatório relativas às transferências bancárias operadas pelos Serviços da Administração Tributária, contabilizados uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.

Custas a cargo da Fazenda Pública enquanto recorrente e recorrida com dispensa, pelas partes remanescente da taxa de justiça.

Lisboa, 22 de Março de 2018.
[Ana Pinhol]

[Jorge Cortês]

[Cristina Flora]