Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:5/95.1BTLRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/04/2020
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:AMORTIZAÇÕES.
OBRAS DE GRANDE REPARAÇÃO E BENEFICIAÇÃO.
ESPECIALIZAÇÃO DOS EXERCÍCIOS.
Sumário:i) Apenas relevam fiscalmente os custos com amortizações em relação a imóveis que estejam ao serviço da actividade do contribuinte.
ii) Não integram o conceito de obras de grande reparação e beneficiação as que visam repor a situação do edificado anterior à ocorrência de evento que os tenha danificado.
iii) Os proveitos e os custos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que digam respeito. Contabilizam-se créditos e débitos e não pagamentos e recebimentos.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão


I- Relatório

A S......................., S.A, deduziu impugnação judicial contra o acto tributário de liquidação n.º .................., de IRC referente ao exercício de 1989. O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida a fls. 229 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), datada de 12 de Fevereiro de 2019, julgou parcialmente procedente a impugnação.
A impugnante, S......................., S.A, e a Fazenda Pública, interpuseram recurso jurisdicional contra a sentença.
A) Recurso interposto pela impugnante:
Nas alegações de fls. 285 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), a recorrente formulou as conclusões seguintes:
«a) Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a impugnação ao acto de liquidação nº .................., de IRC referente ao exercício de 1989, relativamente às correcções de seguros e contribuição autárquica, no valor de 191.674$00 e 1.018.920$00 respectivamente.
b) O tributo objecto da presente impugnação respeita a IRC do exercício do ano de 1989, pelo que o prazo prescricional iniciou-se a 01/01/1990, e era inicialmente de 20 anos.
c) Esse prazo de 20 anos, à data aplicável, só perfez 1 ano e meio quando, em 01/07/1991, entrou em vigor o C.P.T., faltando ainda 18 anos e meio para o seu termo à luz do regime do CPCI.
d) Porque à luz do prazo previsto no C.P.T passaram a faltar apenas 10 anos, contando o mesmo desde 01/07/1991, terminaria, se não sofresse interrupções, em 01/07/2001.
e) A recorrente apresentou no Tribunal Tributário de Lisboa impugnação judicial no dia 07/09/1994, acto que levou à interrupção do prazo de prescrição.
f) No entanto o processo esteve parado desde 27/10/1997, paragem que perdurou por mais de 21 anos.
g) No dia 1 de Janeiro de 1999, entrou em vigor a Lei Geral Tributária, que reduziu o prazo de prescrição para 8 anos, prevendo o artigo 5º, da DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro, que ao novo prazo de prescrição aplicar-se-ia o disposto no artigo 297.º do Código Civil.
h) À data, já o processo de impugnação judicial estava parado por facto não imputável ao contribuinte há muito mais de um ano.
i) Continuou a prever o artigo 49.º, da LGT, que a impugnação interrompia a prescrição.
j) Mas, até à entrada em vigor da Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro, dispôs o nº 2, do mesmo artigo 49º, da LGT, que “a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.”
k) Tal disposição foi revogada pela mencionada Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro mas, nos termos do artigo 91º, do mesmo diploma legal, esta revogação só se aplicou aos prazos de prescrição em curso, objecto de interrupção, em que ainda não tivesse decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo.
l) Ora, nessa altura, o processo de impugnação judicial de cuja decisão ora se recorre já estava parado há cerca de 10 anos, designadamente desde Outubro de 1997, só tendo retomado os seus termos com a sentença recorrida, notificada à impugnante a 19/02/2019, depois de 21 anos de paragem do processo.
m) Assim, e pelo exposto, já há muito prescreveu a dívida tributária objecto do acto de liquidação impugnado, encontrando-se, assim, a mesma extinta, não podendo mais ser exigida à impugnante, o que se requer seja declarado.
n) Sem conceder, a recorrente não se conforma com a decisão recorrida, quando julgou improcedente o pedido de anulação da correcção efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira relativamente aos prémios de seguros que haviam sido contabilizados como custos a deduzir ao lucro tributável de IRC do exercício do ano de 1989.
o) A impugnante paga anualmente um prémio de seguro de incêndio, cujo vencimento ocorre a 1 de Novembro de cada ano, sendo que o corrigido no auto de liquidação que agora se impugna, diz respeito ao risco de incêndio coberto no ano civil de 1989 (Pontos CC e DD dos factos assentes).
p) Os prémios de seguros são encargos de natureza administrativa indispensáveis para a manutenção da fonte produtora, pelo que deverão ser contabilizados em custos e, sendo estes continuados, deverão ser levados a resultados numa medida proporcional à da sua execução (CIRC, art.º 18).
q) No ano civil de 1989 a impugnante beneficiou de doze meses de cobertura de risco de incêndio, pelo que levou a resultados o valor correspondente a uma anuidade no exercício do ano em causa.
r) Assim, deve a quantia de Esc. 191.674$00 ser considerada como custos devidamente justificados, pelo que se requer seja anulada a decisão recorrida proferida sobre tal matéria, e substituída por outra que julgada procedente o pedido de anulação da correcção efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
s) Acresce que, em 1989, a impugnante pagou Esc. 1.018.920$00 a título de contribuição predial pelo que declarou, em sede de IRC, as rendas recebidas da exploração dos seus prédios, que foram, de imediato, contabilizadas e integradas no lucro tributável desse ano (pontos EE e FF dos factos julgados provados).
t) Ora, a impugnante não pôde lançar em custos os montantes pagos a título Contribuição Predial porquanto o imposto de Contribuição Predial, liquidado após a entrada em vigor do C.I.R.C., não é dedutível na matéria colectável para efeito de determinação do lucro tributável em sede de I.R.C. (D.L., n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, art.º 3º, n.º 3).
u) Assim, a manter-se a decisão recorrida, sobre a mesma realidade económica - as rendas ou rendimentos prediais - recairão dois impostos distintos, IRC e Contribuição Predial.
v) Da conjugação dos artigos 37º e 89º do C.C.I. e dos artigos 41º e 74º do C.I.R.C., depreende-se que a exclusão dos custos das quantias despendidas para o pagamento do imposto de Contribuição Predial ou Contribuição Autárquica, respectivamente, só faz sentido se se fizer simultaneamente dedução à colecta.
w) Devendo admitir-se que a Contribuição Predial liquidada em 1989, não dedutível para efeito de lucro tributável, possa ser objecto de dedução à colecta, evitando-se, assim, a dupla tributação dos rendimentos prediais auferidos no ano de 1989.
x) Assim, requer seja anulada a decisão recorrida proferida sobre tal matéria e substituída por outra que julgue procedente o pedido de anulação da correcção efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira no valor Esc. 1.018.920$00, porque a mesma passível de dedução à colecta no IRC do exercício do ano de 1989.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser declarado extinto o tributo objecto da liquidação impugnada, pelo decurso do prazo de prescrição ou, caso assim não se entenda, deve ser anulado na íntegra o acto de liquidação impugnado.»
A recorrida não apresentou contra-alegações.
X
B) Recurso interposto pela Fazenda Pública.
Nas alegações de fls. 297 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), a recorrente formula as conclusões seguintes:
«a. Não concordando com a decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, porquanto se entende que a mesma ao julgar procedente a correção relativamente i) às reintegrações e amortizações não aceites como custos no valor de esc. 910.597$00 (€ 4.542,04) e a correção referente ii) às obras para construir os muros nos armazéns da Portela de Sacavém no valor de esc. 4.114.286$00 (€ 20.521,97), incorreu em vício na matéria de facto e violação de direito, vem a Administração Tributária apresentar o presente recurso.
b. Em sede de procedimento de exame à contabilidade da ora Impugnante detetou-se que foram efetuadas reintegrações nos armazéns do S..............., no valor de 45.000$00, e em 36 arrecadações, no valor de 865.597$00, os quais não entraram em funcionamento no ano de 1989, na medida em que não houve quaisquer rendas das mesmas e acresce ainda que a escritura de aquisição já foi efetuada no final do ano, em 27-12-1989.
c. É entendimento da Administração Fiscal que a aceitação como custo fiscal das amortizações/reintegrações do imobilizado em funcionamento/utilização é devida a partir do momento em que tal sucede. O que significa que a entrada em utilização dos imóveis, nas SGII, verifica-se a partir do momento em que existe a faturação das correspondentes rendas.
d. Decidiu-se na douta sentença que a Impugnante nas datas da celebração dos contratos de compra e venda – em 10 de julho e 3 de novembro de 1989, respetivamente, contratos-promessa de compra e venda de arrecadações e de armazém, sitos na 3 cave do lote 6 A, da Rua…………, em Lisboa – entrou na posse dos imóveis e desde aquele momento foram os imóveis utilizados para armazenamento de produtos e arrumo de veículos, tendo decidido que as respetivas reintegrações e amortizações devem ser consideradas como custos.
e. Daqui se retira que entendeu o tribunal “a quo” que a utilização dos imóveis «para armazenamento de produtos e arrumo de veículos» entraram em funcionamento.
f. Ora, não podemos concordar com tal entendimento, como demonstraremos infra.
g. O conceito “entrar em funcionamento ou em utilização” tem de ser interpretado de modo funcional, isto é, considerando a atividade desenvolvida pela Impugnante - a prática de todas as operações que a lei actual ou futura, sobre sociedades de gestão e investimento imobiliário, permite a esta praticar, nomeadamente, o arrendamento de imóveis próprios, adquiridos ou construídos pela sociedade e prestação de serviços conexos - o início de utilização das fracções adquiridas corresponderá ao momento em que as mesmas forem arrendadas.
h. A sociedade S......................., S.A, de acordo com o artigo 3.º dos seus estatutos, tinha «por objecto exclusivo a prática de todas as operações que a lei actual ou futura, sobre sociedades de gestão e investimento imobiliário, permite a esta praticar, nomeadamente, o arrendamento de imóveis próprios, adquiridos ou construídos pela sociedade e prestação de serviços conexos» (cfr. fls. 47 e 91 dos autos).
i. A aquisição das arrecadações e dos armazéns do S............... foi efetuada no âmbito da atividade da sociedade, e não para o uso que, efetivamente, lhes foi dado - armazenamento de produtos e arrumo de veículos.
j. O mesmo é comprovado pela isenção de sisa que a Impugnante beneficiou, nos termos da alínea a), do artigo 15.º, do Decreto-Lei n.º 291/85, de 24 de julho (cfr. fls. 37 da escritura pública celebrada em 27 de dezembro de 1989).
k. Previa a alínea a), do artigo 15.º, do Decreto-Lei n.º 291/85, de 24 de julho, que:
«As SGII que se venham a constituir, nos termos do presente diploma, no prazo de 5 anos a contar da data da sua entrada em vigor, e, bem assim, os respectivos sócios poderão beneficiar dos seguintes incentivos fiscais: a) Isenção de sisa para as aquisições de bens imóveis pelas SGII;».
l. Ora, face ao exposto, não há dúvidas de que os imóveis foram adquiridos no exercício da atividade da sociedade, pelo que tinham como destino o seu arrendamento.
m. Como é sabido, existem diferenças entre o tratamento contabilístico e o tratamento fiscal relativamente a algumas realidades, e a aceitar-se a reintegração (actual depreciação) dos imóveis sem ter em conta a sua finalidade no seio da sociedade, como foi decidido na sentença, representa uma clara violação do princípio da correlação dos gastos e rendimentos, pois admite-se que concorram para os gastos de um determinado período a reintegração de um ativo que não está a gerar rendimentos/réditos.
n. A Sentença ao considerar que os imóveis entraram em funcionamento porque os mesmos entraram na posse da Impugnante e porque foram utilizados para armazenagem de produtos e arrumo de veículos, ignorando totalmente a sua finalidade e, in casu, que relativamente aos mesmos não havia faturação de rendas, permitindo, assim, as reintegrações efetuadas, revelou erro de julgamento, violando o disposto no n.º 1, do artigo 32.º, do CIRC, a alínea a), do n.º 2, do artigo 1.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro.
o. Como referido supra, o conceito “entrar em funcionamento ou em utilização” tem de ser interpretado de modo funcional, isto é, considerando a atividade desenvolvida pela Impugnante, pelo que o início de utilização das frações adquiridas corresponderá ao momento em que as mesmas forem arrendadas e forem faturadas as respetivas rendas.
p. Assim, face à relevância da atividade desenvolvida pela Impugnante para apuramento do critério “entrar em funcionamento ou em utilização» dos imóveis para efeitos de reintegração aqui em causa, cremos que na matéria de facto dada como provada deverá constar expressamente que a S..............., S.A, tinha «por objecto exclusivo a prática de todas as operações que a lei actual ou futura, sobre sociedades de gestão e investimento imobiliário, permite a esta praticar, nomeadamente, o arrendamento de imóveis próprios, adquiridos ou construídos pela sociedade e prestação de serviços conexos» (cfr. consta a fls. 47 e 91 dos autos).
q. Face ao exposto, deverá ser decidido que as reintegrações e amortizações aos imóveis no valor de 910.597$00 (€ 4.542,04), não podem ser consideradas como custos na medida em que os imóveis em causa ainda não haviam entrado em funcionamento.
r. No referido procedimento de exame à contabilidade da ora Impugnante detetou-se ainda que o valor referente à construção dos muros nos armazéns da Portela de Sacavém, no total de 4.200.000$00 (anexo n.º 32), foi considerado pela sociedade como custo na totalidade no exercício de 1989, quando deveria ter sido contabilizado na rubrica ¯ imobilizações corpóreas – e depreciado, sendo admissível como custo apenas a depreciação respeitante àquele ano, de acordo com o disposto na nota explicativa à conta 422 do POC, aprovada pelo D.L. 47/77 de 7 de fevereiro, e reintegrado juntamente com o armazém em conformidade com a alínea a) do n.º 3 do art. 17.º do Código do IRC e do n.º 5 do art. 5.º do Decreto Regulamentar 2/90, de 12 de janeiro
s. Assim, considerou a administração tributária que deveria ser considerado custo do exercício a reintegração de 85.714$00 (4.200.000$00:49), resultante do cociente entre o valor de construção e o número de anos que falta para reintegrar os armazéns (49), pelo que se acresce ao lucro tributável do IRC de 1989 a diferença de 4.114.286$00$).
t. Sobre a referida correção decidiu o tribunal que as obras efetuadas pela Impugnante têm a ver com a manutenção e reparação dos armazéns pois destinaram-se a repor a situação que existia antes da inundação.
u. Ora, não podemos concordar com tal entendimento, como demonstraremos infra.
v. Da argumentação presente na sentença conclui-se que a mesma fez tábua rasa das regras referentes à admissão de custos no IRC designadamente os custos referentes a «imobilizações corpóreas», que apenas são admitidos custos referentes às respetivas reintegrações (atuais depreciações).
w. O ativo imobilizado das empresas é o conjunto de bens que revestem um caráter de permanência, ou seja, os bens que a empresa pretende manter por mais do que um exercício económico. Nesta perspetiva, o Plano Oficial de Contabilidade (P.O.C. aprovado pelo dec.lei 410/89, de 21/11, diploma aplicável ao caso "sub judice"), classificava o ativo imobilizado de acordo com a sua natureza - imobilizações financeiras, corpóreas e incorpóreas.
x. Por outras palavras, os elementos do ativo imobilizado (por contraposição ao ativo circulante) são os recursos que uma empresa utiliza para realizar as suas operações (objeto social) e que não se destinam a venda no âmbito da sua atividade operacional.
y. Tais elementos caraterizam-se pela sua aptidão para contribuírem para as operações do ente empresarial em causa durante um determinado período de tempo, sendo que, com algumas exceções, essa aptidão vai decrescendo ao longo da sua vida útil.
z. A vida útil de um elemento do ativo imobilizado é, para efeitos fiscais, o período durante o qual se reintegra ou amortiza totalmente o seu valor - cfr.artº.3, nº.1, do dec.reg.2/90, de 12/1.
aa. Torna-se, por isso, necessário reconhecer ao nível dos custos dos diversos exercícios em que decorre a vida útil dos bens do ativo imobilizado a expressão monetária da mencionada depreciação.
bb. O processo de imputação aos resultados dos exercícios contabilísticos anuais do custo de aquisição dos bens do ativo imobilizado designa-se por reintegração ou amortização, o qual deve ser elaborado de forma racional e sistemática, devendo estruturar-se em estrita observância do princípio contabilístico do balanceamento dos custos com proveitos.
cc. Assim se pode definir reintegração como o processo de registo contabilístico do valor do consumo anual dos elementos do ativo imobilizado corpóreo, valor este que podia imputar-se como custo de exercício para efeitos fiscais nos termos do decreto regulamentar 2/90, de 12/1 (cfr. anteriormente a portaria 737/81, de 29/8), o qual fixa as taxas máximas e mínimas a ter em conta para aquele efeito, assim como outras regras relacionadas com o problema contabilístico das reintegrações e amortizações.
dd. E podem ser objeto de reintegração e amortização os elementos do ativo imobilizado sujeitos a deperecimento.
ee. Ora, as obras realizadas, concretamente a construção dos muros é enquadrada na categoria «imobilizações corpóreas», devendo ser contabilizadas na conta 422 do POC, aprovada pelo D.L. 47/77 de 7 de fevereiro.
ff. O facto de as obras se realizarem na sequência de uma inundação não altera a natureza contabilística e fiscal das mesmas.
gg. Assim, mal andou o tribunal ao aceitar como custo a totalidade do valor das obras realizadas, não tendo em consideração o regime de custos admissíveis em sede de IRC conjugado com o regime das reintegrações e amortizações previsto na alínea a), do n.º 3, do art. 17.º e 23.º do Código do IRC e do n.º 5, do art. 5.º, do Decreto Regulamentar 2/90, de 12 de janeiro.
hh. Deve, assim, ser decido que apenas é aceite como custo do exercício a reintegração de 85.714$00 (4.200.000$00:49), resultante do quociente entre o valor de construção e o número de anos que falta para reintegrar os armazéns.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue a impugnação judicial improcedente quanto à matéria ora recorrida…».
*
Nas contra-alegações de fls. 312 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), a S......................., S.A, formulou as conclusões seguintes:
«a) Ainda que assistisse razão à apelante nos fundamentos do presente recurso, que não assiste, sempre se dirá que o tributo objecto da impugnação encontra-se extinto, por decurso do prazo de prescrição.
b) O tributo objecto da presente impugnação respeita a IRC do exercício do ano de 1989, pelo que o prazo prescricional iniciou-se a 01/01/1990; O prazo prescricional, de 20 anos, à data aplicável, só perfez 1 ano e meio quando, em 01/07/1991, entrou em vigor o C.P.T., faltando ainda 18 anos e meio para o seu termo à luz do regime do CPCI.
c) Porque à luz do prazo previsto no C.P.T passaram a faltar apenas 10 anos, há que aplicar esse novo prazo, em harmonia com o predito art. 297º do C. Civil, embora ele se conte apenas desde 01/07/1991, terminando, se não sofresse interrupções, em 01/07/2001.
d) A apelada apresentou no Tribunal Tributário de Lisboa impugnação judicial no dia 07/09/1994, acto que levou à interrupção do prazo de prescrição; mas depois da ora apelada ter apresentado as suas alegações, a 23/04/1997, somente recebeu do Tributal Tributário de 1ª Instância de Lisboa uma notificação datada de 27/10/1997, após o que de nada mais foi notificada, estando o processo, desde então, parado, paragem que perdurou por mais de 21 anos.
e) No dia 1 de Janeiro de 1999, entrou em vigor a Lei Geral Tributária, que reduziu o prazo de prescrição para 8 anos, prevendo o artigo 5º, da DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro, que ao novo prazo de prescrição aplicar-se-ia o disposto no artigo 297.º do Código Civil; mas à data, já o processo de impugnação judicial estava parado por facto não imputável ao contribuinte há muito mais de um ano.
f) Continuou a prever o artigo 49.º, da LGT, que a impugnação interrompia a prescrição, mas, até à entrada em vigor da Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro, dispôs o nº 2, do mesmo artigo 49º, da LGT, que “a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.”
g) Tal disposição foi revogada pela mencionada Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro mas, nos termos do artigo 91º, do mesmo diploma legal, esta revogação só se aplicou aos prazos de prescrição em curso, objecto de interrupção, em que ainda não tivesse decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo.
h) Ora, nessa altura, o presente processo de impugnação judicial já estava parado há cerca de 10 anos, designadamente desde Outubro de 1997, só tendo retomado os seus termos com a sentença recorrida, notificada à impugnante a 19/02/2019, depois de 21 anos de paragem do processo, pelo que já há muito prescreveu a dívida tributária objecto do acto de liquidação impugnado, encontrando-se, assim, a mesma extinta, não podendo mais ser exigida à impugnante ora apelada, o que se requer seja declarado.
i) No que respeita às reintegrações e amortizações não aceites pela Administração Tributária como custos, no valor de ESC. 910.597$00, previa o artigo 27º, nº 1, do CIRC, serem “aceites como custos as reintegrações e amortizações de elementos do activo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais os elementos do activo imobilizado que, com carácter repetitivo, sofrerem perdas de valor resultantes da sua utilização, do decurso do tempo, do progresso técnico ou de quaisquer outras causas.”
j) Nos termos do nº 2, do mesmo artigo 27º, do CIRC, “Salvo razões devidamente justificadas e aceites pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, os elementos do activo imobilizado só se consideram sujeitos a deperecimento depois de entrarem em funcionamento.”
k) Ficou demonstrado nos autos que os imóveis em causa – arrecadações sitas na 3ª cave do lote 6-A da Rua…………., em Lisboa e armazém sito no Rossio ao Sul do Tejo, Abrantes, no ano de 1989, faziam parte do activo imobilizado da impugnante e entraram em funcionamento – passaram a ser utilizadas para armazenamento no dia 10/07/1989 – factos assentes na fundamentação de facto da douta sentença recorrida nas alíneas F) , G) E H).
l) E que os armazéns sitos no Rossio ao Sul do Tejo entraram em funcionamento – passaram a ser utilizados para armazenamento - no dia 03/11/1989 - factos assentes na fundamentação de facto da douta sentença recorrida nas alíneas L), M) E O).
m) A apelante entende que os imóveis em causa só entraram em funcionamento a partir do momento em que ocorreu facturação de rendas, o que não decorre do texto da lei aplicável, não tendo a douta sentença violado qualquer das normas invocadas pela apelante.
n) No ano de 1989, estava em vigor a portaria nº 737/81, de 29 de Agosto, que veio rever a sistematização da regulamentação fiscal das reintegrações e amortizações, e que previa, no seu artigo 1º, que “podem ser objecto de reintegração e amortização os elementos do activo imobilizado sujeitos a deperecimento.”
o) Tal significa que o custo do exercício resulta da existência de deperecimento e que esta era independentemente da utilização em si, considerando-se inclusivamente nos termos do artigo 10º do mesmo diploma legal, que “… as reintegrações ou amortizações que não tiverem sido contabilizadas como custos ou perdas do exercício a que respeitam não podem ser deduzidas dos proveitos ou ganhos de qualquer outro exercício.
p) Também o Decreto Regulamentar n.º 2/90 refere, no nº1, do artigo 1º, invocado pela apelante, que “podem ser objecto de reintegração e amortização os elementos do activo imobilizado sujeitos a deperecimento”; e, no nº2 do mesmo artigo 1º, as reintegrações e amortizações só podem praticar-se: “relativamente aos elementos do activo imobilizado corpóreo, a partir da sua entrada em funcionamento.
q) A “entrada em funcionamento” não coincide com o início do arrendamento do bem, estando em causa o momento em que ocorre o termo de construção, e capacidade de ser utilizado, pelo contribuinte, para seu uso próprio ou para arrendamento, pois independentemente de estar arrendado, está sujeito a deperecimento.”
r) Tendo o contribuinte utilizando o método de depreciação previsto no artigo 5º do mesmo diploma legal, das quotas constantes “a quota anual de reintegração e amortização que pode ser aceite como custo do exercício determina-se aplicando aos valores mencionados no n.º 1 do artigo 2.º as taxas fixadas nas tabelas anexas ao presente diploma” ou seja aplica-se no ano do início de utilização, independentemente de se tratar da data de 1 de Janeiro ou 31 de Dezembro.
s) Nem pode a AT entender que deve haver um tratamento diferente das SGII das restantes sociedades no que se refere à aplicação das normas jurídicas que definem o regime de depreciações, não tendo fundamento o alegado pela apelante.
t) No que respeita às correcções referentes às obras para construir os muros nos armazéns da Portela de Sacavém no valor de ESC. 4.114.286$00, resulta da matéria de facto julgada provada, que o armazém em causa no ano de 1989 sofreu graves prejuízos provocados por inundações das águas da chuva, tendo a pressão dessas águas feito desmoronar um muro dos armazéns, provocando inundação interior, e que as mesmas águas danificaram gravemente os armazéns e mercadorias aí existentes, o que obrigou a impugnante a fazer obras de reconstrução dos armazéns, de modo a colocá-los nas mesmas condições em que se encontrariam caso não tivesse havido a inundação.
u) A douta sentença recorrida entendeu, e bem, que as obras efectuadas pela impugnante se destinaram a repor a situação que existia antes da inundação.
v) A Administração Tributária entende que se trata de uma grande reparação, e como tal deveria não ser custo de um exercício, mas de vários; ora o critério legal, para efeitos de reintegração e amortização, de qualificação de determinada obra realizada em bens do activo imobilizado corpóreo como “grande reparação ou beneficiação” é o do aumento do valor real ou da duração provável dos elementos a que respeitem (cfr. alínea a) do n.º 5 do artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro; alínea a) do n.º 5 do artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de Setembro, em vigor desde 1 de Janeiro de 2010).
w) Também a Portaria 737/81, na alínea c), do nº1 do artigo 5º, previa que fossem considerados custos do exercício “para as grandes reparações e beneficiações efetuadas em elementos do activo imobilizado: as calculadas com base no período de utilidade esperada dessas reparações ou beneficiações.”
x) Não houve qualquer aumento da utilidade esperada do ativo, pelo que se tratou efetivamente de uma reparação não de uma grande reparação, tal como prevista no nº 5, do artigo 5º, do Decreto Regulamentar 2/90, de 12 de Janeiro, invocado pela apelante, não tendo a douta sentença recorrida violado essa disposição legal, nem as demais invocadas pela apelante, pelo que deve a mesma manter-se, julgando-se improcedente a apelação da Fazenda Nacional. // PELO QUE REQUER QUE:
a) Seja declarada extinta a dívida tributária objecto do acto de liquidação impugnado, pelo decurso do prazo de prescrição;
b) Ou, caso assim não se entenda, seja julgada a apelação improcedente, por não provada, mantendo-se assim o decidido na douta sentença recorrida…».
X

O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, notificado para o efeito, juntou aos autos parecer no sentido de ser julgada verificada a excepção de incompetência absoluta deste Tribunal, em razão da hierarquia, nos termos das disposições combinadas dos art. 280º nº 1 do C.P.P.T., 26º, al. a) do E.T.A.F. e 96º al. a), 97º nº 1, 98º, 99º nº 2, 576º nº 1 e 2, 577º, al. a), e 578º do C.P.C., estes aplicáveis por força do disposto no art. 2º, al. e), do C.P.P.T.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
X
II- Fundamentação.
2.1. De Facto.
A sentença recorrida considerou provados os factos seguintes:
«A) Em cumprimento da credencial n.º 187/90 de 9 de novembro, os Serviços de Fiscalização de Empresas (SFE) procederam a exame à contabilidade da empresa “S..............., S.A, , relativamente aos exercícios de 1988 e 1989.
B) A ação inspetiva decorreu entre 15 de janeiro e 06 de fevereiro de 1991.
C) Os SFE elaboraram o relatório de exame à escrita (REE) que constitui fls. 85 e segs., que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.
D) Com interesse para a decisão, resulta do REE:





«imagens no original»




E) Sobre REE a que se refere a alínea anterior recaiu, em 93/11/05, o despacho de concordância de fls. 85, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
F) Em 10 de julho de 1989, a impugnante celebrou, respetivamente, contratos- -promessa de compra e venda de arrecadações, sitos na 3 cave do lote 6 A, da Rua……………, em Lisboa (conforme resulta de fls. 64 e 65 e depoimentos das testemunhas).
G) Na data a que se refere a alínea anterior a impugnante entrou na posse dos imóveis (conforme resulta dos depoimentos das testemunhas).
H) As arrecadações, desde a data a que se refere a alínea anterior foram utilizadas para armazenamento (conforme depoimentos das testemunhas).
I) Em 11/07/1989, a Impugnante pagou a título de sinal e princípio de pagamento das fações autónomas “XY”, “ZG”, “YC” e “YD”, a importância de 6.310.000$00 (conforme resulta do recibo de fls. 64).
J) Em 05/09/1989, a Impugnante pagou 4.000.000$00, referente à liquidação dos estacionamentos n.ºs 3404 e 3525 (QD e QI) (conforme resulta do recibo de fls. 62).
K) Em 02/11/1989, a Impugnante procedeu ao pagamento de 11.455.000$00, referente à liquidação da 1.ª prestação do valor de trinte e três arrecadações na 3.ª cave (conforme resulta do recibo de fls. 63).
L) Em 03/11/1989, entre J............... e M..............., na qualidade de promitentes vendedores e a Impugnante na qualidade de promitente compradora, foi celebrado o contrato promessa de compra e venda de uma casa destinada a armazém, sita no Rossio ao Sul do Tejo, freguesia e concelho de Abrantes, inscrito na matriz predial sob o artigo 867 (conforme resulta de fls. 169).
M) Na data a que se refere a alínea anterior a impugnante entrou na posse do imóvel (conforme resulta dos depoimentos das testemunhas).
O) Desde a data a que se refere a alínea anterior o imóvel foi utilizado para armazenamento (conforme resulta dos depoimentos das testemunhas).
P) Por contrato de cessão de espaço para parqueamento automóvel, celebrado em 01/11/1989, a Impugnante Cedeu à W............... (Portugal) Comércio e Indústria, Lda., o direito de utilização diária de um espaço no parque de estacionamento das Amoreiras, Cave três, para estacionamento de um veículo automóvel (conforme resulta de fls. 66 a 68).
Q) Em 27/12/2989, entre C..............., S.A, e a Impugnante foi celebrada a escritura pública de compra e venda de 38 frações autónomas, situadas na 3.ª cave do prédio designado por lote 7 e lote 7-A, sito em Lisboa, freguesia de Santa Isabel, inscrito na matriz urbana sob o artigo …. (conforme resulta de fls. 28 a 37).
R) A celebração do contrato a que se refere a alínea anterior, só foi possível na data referida por dificuldades burocráticas (conforme resulta dos depoimentos das testemunhas).
S) Em 30/04/1991, entre a Impugnante e J............... e mulher, foi celebrada a escritura pública de compra e venda de uma casa destinada a armazém, sita no Rossio ao Sul do Tejo, freguesia e concelho de Abrantes, inscrito na matriz predial sob o artigo ….. (conforme resulta de fls. 24 a 27).
T) A celebração do contrato a que se refere a alínea anterior, só foi possível na data referida por dificuldades burocráticas (conforme resulta dos depoimentos das testemunhas).
U) O preço relativo ao armazém foi de Esc. 3.000.000$00, pago integramente em 31 de maio de 1989 (conforme resulta de fls. 169).
V) A impugnante é proprietária e legitima possuidora de armazéns sitos na Portela de Sacavém, artigo ….., fração A, da freguesia da Portela, de valor superior a Esc. 200.000.000$00 (conforme resulta de fls. 38 a 45).
W) Em 06/05/1993, a 3ª Repartição de Finanças do Concelho de Loures – Moscavide, comunicou à Impugnante que o artigo ….., fração A, da freguesia da Portela, tinha direito a 10 anos de isenção de contribuição autárquica de 1989 a 1998 (conforme resulta de fls. 38).
X) O armazém está afeto ao exercício da atividade da impugnante (conforme resulta dos depoimentos das testemunhas).
Y) Em 1989, aqueles armazéns, sofreram graves prejuízos provocados por inundações das águas da chuva (conforme resulta dos depoimentos das testemunhas).
Z) A pressão das águas da chuva fez desmoronar um muro dos armazéns, provocando inundação interior (conforme resulta dos depoimentos das testemunhas).
AA) As águas danificaram gravemente os armazéns e mercadorias neles existentes (conforme resulta dos depoimentos das testemunhas).
BB) A impugnante teve que fazer obras para reconstruir os armazéns, de modo a colocá-los nas mesmas condições em que se encontrariam caso não tivesse havido inundações (conforme resulta dos depoimentos das testemunhas e dos documentos de fls. 176 e 177).
CC) A impugnante paga anualmente um prémio de seguro de incêndio, cujo vencimento é no dia 1 de novembro de cada ano (conforme resulta de fls. 46).
DD) O prémio de seguro de incêndio, corrigido no auto de liquidação que agora se impugna, diz respeito ao risco de incêndio coberto no ano civil de 1989.
EE) Em 1989 a impugnante pagou Esc. 1.018.920$00 a título de contribuição predial (invocado pela Impugnante e não contrariado pela AT).
FF) Naquele mesmo ano a impugnante declarou, em sede de IRC, as rendas recebidas da exploração dos seus prédios, que foram, de imediato, contabilizadas e integradas no lucro tributável da impugnante (invocado pela Impugnante e não contrariado pela AT).
GG) A impugnante foi constituída em 22 de julho de 1988 (conforme resulta de fls. 47).
HH) A impugnante foi tributada à taxa prevista na alínea a), do número um do art.° 26° do Estatuto dos Benefícios Fiscais (invocado pela Impugnante e não contrariado pela AT).
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2.2. FUNDAMENTAÇÃO DO JULGAMENTO.

A decisão da matéria de facto resultou do exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam e, também, dos depoimentos das testemunhas, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório. // A testemunha J............... é economista e detém uma procuração passada pela administração da Impugnante, desde a data da respetiva constituição, limitada a outorga de poderes para tratar de assuntos de expediente, juntamente com a assinatura de um administrador, efetuou o estudo e projeto da constituição da sociedade Impugnante e, porque a administração, à data, não tinha disponibilidade, ficou ele posteriormente a tratar dos assuntos da empresa, para o que lhe foi passada procuração que ainda hoje mantém. // A testemunha O.............. é empregado da impugnante com categoria de escriturário. // A testemunha A.............. é empregada na impugnante, com a categoria de primeira escriturária, desde janeiro de 1992, na parte de serviço de pessoal. Esclareceu que no local onde de trabalho funciona, além da impugnante, outras empresas, uma das quais a T.............., para quem a testemunha trabalhava desde abril de 1988, porque se trata de um espaço em “Open space” as conversas eram ouvidas mais ou menos por todos e, por outro lado, ela própria, depoente, deu apoio, nos anos de 1988 a 1989, aos serviços da contabilidade da Impugnante.


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2.3. FACTOS NÃO PROVADOS

Com interesse para a decisão inexistem fatos invocados que devam considerar-se como não provados.»

Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, aditam-se os elementos seguintes:
II) A sociedade impugnante – S…………………………, SA, tem por «objecto exclusivo a prática de todas as operações que a lei actual ou futura, sobre sociedades de gestão e investimento imobiliário, permita a este praticar, nomeadamente, o arrendamento de imóveis próprios, adquiridos ou construídos pela Sociedade e a prestação de serviços conexos» (artigo 3.º dos Estatutos).

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2.2. De Direito
2.2.1. Nos presentes autos, a impugnante e a impugnada interpõem recursos jurisdicionais contra a sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRC de 1989. A sentença julgou procedente a impugnação, no que respeita às correcções relativas a “reintegrações e amortizações não aceites como custos” e a “despesas não aceites como custos” e julgou improcedente a impugnação no que respeita às correcções relativas a “seguros”, “contribuição autárquica” e “taxa aplicada para a tributação das SGII”.
O recurso jurisdicional da Fazenda Pública incide sobre a parte do segmento decisório que lhe é desfavorável. O recurso jurisdicional da impugnante incide sobre os dois itens nos quais a parte decaiu.
2.2.2. Antes, porém, cumpre dirimir a excepção da incompetência absoluta do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS) para conhecer do objecto dos recursos jurisdicionais em presença, suscitada no parecer do ilustre Procurador-Geral Adjunto junto do TCAS.
Nos termos do artigo 280.º/1, do CPPT, das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância cabe recurso, no prazo de dez dias a interpor, entre outros, pelo impugnante, pelo representante da Fazenda Pública e por qualquer outro interveniente que no processo fique vencido, para o Tribunal Central Administrativo, salvo se a matéria for exclusivamente de direito, caso em que o recurso deve ser interposto, dentro do mesmo prazo, para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo. Esta norma que se aplica ao caso em exame, dado que se trata de acção instaurada antes de 01.01.2012, em relação à qual foi interposto recurso de decisão proferida antes da entrada em vigor da Lei n.º 118/2019, de 17 de Setembro(1).
«O recurso não versa exclusivamente matéria de direito, se nas suas conclusões se questionar matéria factual, manifestando-se divergência, por insuficiência, excesso ou erro, quanto à factualidade provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, quer, ainda, porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos. (…) // O critério jurídico para destrinçar se estamos perante uma questão de direito ou uma questão de facto, passa por saber se o recorrente faz apelo, nos fundamentos do recurso substanciados nas conclusões, apenas a normas ou princípios jurídicos que tenham sido na sentença recorrida supostamente violados na sua determinação, interpretação ou aplicação, ou se, por outro lado, também apela à consideração de quaisquer factos materiais ou ocorrências da vida real (fenómenos da natureza ou manifestações concretas da vida mesmo que do foro espiritual ou volitivo), independentemente da sua pertinência, merecimento ou acerto para a solução do recurso(2).
No caso em exame, cotejando o teor das alegações de recurso, quer do recurso interposto pela Fazenda Pública, quer do recurso interposto pela impugnante, verifica-se que as mesmas incidem, seja sobre o acerto das correcções à matéria colectável de IRC, objecto de apreciação por parte da sentença recorrida, seja sobre a questão da prescrição da dívida em causa nos autos. A aferição das questões em apreço implica a ponderação do direito aplicável, mas também da matéria de facto relevante para enquadrar de forma correcta as questões suscitadas.
Em face do exposto impõe-se concluir que «para solucionar a matéria alegada e controvertida pelas partes torna[-se] necessário fazer juízos sobre questões probatórias ou averiguar da materialidade alegada como eventualmente interessando a outras plausíveis soluções de direito»(3). De onde resulta que o objecto dos recursos jurisdicionais em exame não versa exclusivamente sobre questões de direito, pelo que assiste competência, em razão da hierarquia, a este tribunal para deles conhecer.
Termos em que se julga improcedente a presente excepção dilatória da incompetência absoluta do TCAS para conhecer do objecto do recurso.
2.2.3. Nas alegações de recurso, a impugnante, para além de outros fundamentos, invoca a prescrição da dívida emergente do acto tributário impugnado. Atendendo a que se trata de questão de conhecimento oficioso, importa tomar posição sobre a mesma, antes de entrarmos na apreciação do mérito de cada um dos recursos jurisdicionais.
Constitui jurisprudência fiscal assente a de que: «[a] impugnação judicial não é o meio próprio para aquele que foi chamado a responder subsidiariamente por coimas fiscais aplicadas à sociedade originária devedora de que foi gerente vir discutir a legalidade da decisão que aplicou aquelas coimas, sendo que essa discussão apenas poderia ter lugar, como tem vindo a sustentar este Supremo Tribunal Administrativo, em oposição à execução fiscal. // A prescrição da obrigação tributária não constitui causa de pedir do pedido de anulação da liquidação que lhe deu origem, apenas podendo ser conhecida em sede de impugnação judicial incidentalmente, como motivo de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide. // Esse conhecimento apenas deve ocorrer caso o processo forneça todos os elementos que permitam uma decisão segura sobre a matéria»(4).
«Só pode conhecer-se da prescrição da obrigação tributária, em impugnação judicial, incidentalmente, como eventual causa de inutilidade superveniente da lide, se o processo disponibilizar, sem necessidade de averiguação, todos os elementos factuais necessários»(5).
Compulsados os autos, verifica-se que dos mesmos não consta o processo de execução fiscal, pelo que o conhecimento da excepção perentória em apreço não pode ter lugar nesta sede, por falta de elementos necessários à sua apreciação.
Termos em que se determina não apreciar do presente fundamento do recurso interposto pela impugnante.
2.2.4. No que respeita ao recurso interposto pela Fazenda Pública, a recorrente censura a sentença recorrida, por erro de julgamento, no que respeita aos itens seguintes:
a) Correcção relativa reintegrações e amortizações não aceites como custos no valor de 950.597$00.
b) Correcção relativa a obras para construir os muros nos armazéns da Portela de Sacavém, no valor de 4.114.286$00.
2.2.4.1. No que respeita ao erro de julgamento, por referência à correcção relativa reintegrações e amortizações não aceites como custos no valor de 950.597$00, a recorrente alega que a «aceitação como custo fiscal das amortizações/reintegrações do imobilizado em funcionamento/utilização é devida a partir do momento em que tal sucede. O que significa que a entrada em utilização dos imóveis, nas SGII, verifica-se a partir do momento em que existe a faturação das correspondentes rendas; O conceito “entrar em funcionamento ou em utilização” tem de ser interpretado de modo funcional, isto é, considerando a atividade desenvolvida pela Impugnante - a prática de todas as operações que a lei actual ou futura, sobre sociedades de gestão e investimento imobiliário, permite a esta praticar, nomeadamente, o arrendamento de imóveis próprios, adquiridos ou construídos pela sociedade e prestação de serviços conexos - o início de utilização das fracções adquiridas corresponderá ao momento em que as mesmas forem arrendadas; A sociedade S......................., S.A, de acordo com o artigo 3.º dos seus estatutos, tinha «por objecto exclusivo a prática de todas as operações que a lei actual ou futura, sobre sociedades de gestão e investimento imobiliário, permite a esta praticar, nomeadamente, o arrendamento de imóveis próprios, adquiridos ou construídos pela sociedade e prestação de serviços conexos» (…); A aquisição das arrecadações e dos armazéns do S............... foi efetuada no âmbito da atividade da sociedade, e não para o uso que, efetivamente, lhes foi dado - armazenamento de produtos e arrumo de veículos».
A este propósito, escreveu-se na sentença recorrida o seguinte:
«Resulta do REE:
«C2– A Administração Fiscal aceita como custo fiscal as amortizações/reintegrações do imobilizado em funcionamento/utilização e a partir do momento em que tal sucede. Não foi, no entanto, esse o princípio seguido nesta sociedade. Para nós, a entrada em utilização dos imóveis, nas SGII, verifica-se a partir do momento em que existe a faturação das correspondentes rendas (3).
O que se verificou com as 36 arrecadações na 3ª cave, conforme mapa 1, com o valor de Balanço de 57 706 contos foi que, foram reintegradas par 866 contos no ano de 1989, quando nesse ano não houve quaisquer rendas das mesmas. Mais, a escritura de aquisição já foi efetuada no final do ano — 27/12/89. Em relação aos armazéns do S............... (mapa 1), com um valor de Balanço de 2 000 000$00, verificou-se, igualmente, que foram reintegrados em 1989, por 45 contos, quando, nesse ano, não houve quaisquer rendas dos mesmos, nem sequer escritura da sua aquisição ou contrato promessa de compra e venda.
Os cálculos dos acréscimos ao lucro tributável foram efetuados na análise à conta 68 - amortizações e reintegrações do exercício. O imóvel para escritórios é uma exceção ao princípio seguido da “faturação das rendas”. Neste caso, como não pode haver rendas, considerou-se que a entrada em utilização, para efeitos de reintegrações, foi a data da escritura de aquisição.»
Resulta do probatório que a Impugnante demonstrou:
Foram celebrados em 10 de julho e 3 de novembro de 1989, respetivamente, contratos-promessa de compra e venda de arrecadações e de armazém, sitos na 3 cave do lote 6 A, da Rua………….., em Lisboa.
Naquelas datas a impugnante entrou na posse dos imóveis.
Desde aquele momento, foram os imóveis utilizados para armazenamento de produtos e arrumo de veículos.
Os respetivos contratos definitivos foram realizados por escritura pública em 27 de dezembro de 1989 e 30 de março de 1991.
A realização daqueles contratos de compra e venda só foi possível naquelas datas, face às dificuldades encontradas, de ordem burocrática não imputáveis à impugnante.
Tais imóveis, fazendo parte do ativo imobilizado corpóreo da Impugnante, devem a partir da sua entrada em funcionamento, as respetivas reintegrações e amortizações, ser consideradas como custos».
Apreciação. «São aceites como custos as reintegrações e amortizações de elementos do activo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais os elementos do activo imobilizado que, com carácter repetitivo, sofrerem perdas de valor resultantes da sua utilização, do decurso do tempo, do progresso técnico ou de quaisquer outras causas» (artigo 27.º/1, do CIRC, versão vigente).
«Salvo razões devidamente justificadas e aceites pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, os elementos do activo imobilizado só se consideram sujeitos a deperecimento depois de entrarem em funcionamento» (artigo 27.º/3, do CIRC).
«Podem ser objecto de reintegração e amortização os elementos do activo imobilizado sujeitos a deperecimento»(6). // «Salvo razões devidamente justificadas, reconhecidas pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, as reintegrações e amortizações só podem praticar-se: // a) Relativamente aos elementos do activo imobilizado corpóreo, a partir da sua entrada em funcionamento»(7).
«O custo de aquisição de um elemento do activo imobilizado é o respectivo preço de compra, acrescido dos gastos acessórios suportados até à data da sua entrada em funcionamento»(8).
«Para efeitos contabilísticos, a depreciação/amortização de um activo inicia-se quando esteja disponível para uso, i.e., quando estiver na localização e condições necessárias para que seja capaz de operar da forma pretendida pela gerência; mas, já, para efeitos fiscais, salvo razões devidamente justificadas e aceites pela Administração tributária, as depreciações/amortizações só são consideradas (i) a partir da sua entrada em funcionamento ou utilização, relativamente a activos fixos tangíveis ….»(9). «Na prática, o início da depreciação/amortização para efeitos contabilísticos coincidirá. No entanto, caso o activo esteja disponível para uso, mas ainda não esteja em funcionamento/utilização, as depreciações/amortizações contabilisticamente efectuadas antes da entrada em funcionamento/utilização dos activos não deverão ser aceites para efeitos fiscais»(10). «As normas contabilísticas permitem que o custo de um activo integre quaisquer custos directamente atribuíveis para colocar esse activo na localização e condições necessárias para o mesmo ser capaz de funcionar da forma pretendida pela gerência. De acordo com as normas fiscais, os gastos acessórios devem ser capitalizados até à entrada em funcionamento ou utilização»(11). Por isso, se afirma que: «A tabela II anexa ao Decreto-Regulamentar nº2/90, de 12.01, não pode ser apreciada isoladamente, devendo outrossim ser interpretada em conjunto com o acervo normativo em que a mesma se encontra integrada. // Nesta medida, percorrendo todo o diploma, constatamos que o legislador não deixou de enquadrar a regulamentação das reintegrações e amortizações na perspectiva da actividade que o sujeito passivo desenvolve e na utilização dos bens que lhe afecta»(12) .
«O cálculo das reintegrações e amortizações do exercício far-se-á, em regra, pelo método das quotas constantes» (artigo 28.º/1, do CIRC).
«Os elementos do activo imobilizado são recursos que a empresa utiliza para realizar as suas operações e que não se destinam a venda no âmbito da sua actividade operacional. Tais elementos caracterizam-se pela sua aptidão para contribuírem para as operações das empresas durante um determinado período de tempo»(13).
No caso, a sociedade impugnante – S…………………………, SA, tem por «objecto exclusivo a prática de todas as operações que a lei actual ou futura, sobre sociedades de gestão e investimento imobiliário, permita a este praticar, nomeadamente, o arrendamento de imóveis próprios, adquiridos ou construídos pela Sociedade e a prestação de serviços conexos» (artigo 3.º dos Estatutos). Nos termos do artigo 1.º/1, do Decreto-Lei n.º 291/85, de 24.06, «As sociedades de gestão e investimento imobiliário, abreviadamente designadas por SGII, têm por objecto a gestão de imóveis próprios por estas adquiridos ou construídos, constituindo a sua actividade principal o arrendamento para habitação e a prestação de serviços conexos».
Dos elementos coligidos nos autos, verifica-se que, em momento posterior à posse pela impugnante dos imoveis em causa os mesmos foram postos ao serviço do objecto social da impugnante, através de arrendamento(14), pelo que a correcção em apreço, ao desconsiderar o custo imputado ao exercício em causa, com base no facto de os imóveis não estarem, para já, ao serviço da impugnante, no sentido da sua utilização ou colocação em funcionamento, não enferma de erro, devendo a mesma ser mantida.
A sentença recorrida, ao julgar em sentido discrepante, deve ser revogada e substituída por decisão que julgue a impugnação improcedente, nesta parte.
Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.4.2. No que respeita ao invocado erro de julgamento, por referência às obras de conservação e reparação, a recorrente alega, em síntese, que se detetou que o valor referente à construção dos muros nos armazéns da Portela de Sacavém, no total de 4.200.000$00 (anexo n.º 32), foi considerado pela sociedade como custo na totalidade no exercício de 1989, quando deveria ter sido contabilizado na rubrica ¯ imobilizações corpóreas – e depreciado, sendo admissível como custo apenas a depreciação respeitante àquele ano, de acordo com o disposto na nota explicativa à conta 422 do POC, aprovada pelo D.L. 47/77 de 7 de fevereiro, e reintegrado juntamente com o armazém em conformidade com a alínea a) do n.º 3 do art. 17.º do Código do IRC e do n.º 5 do art. 5.º do Decreto Regulamentar 2/90, de 12 de janeiro; as obras realizadas, concretamente a construção dos muros é enquadrada na categoria «imobilizações corpóreas», devendo ser contabilizadas na conta 422 do POC, aprovada pelo D.L. 47/77 de 7 de fevereiro; O facto de as obras se realizarem na sequência de uma inundação não altera a natureza contabilística e fiscal das mesmas».
A este propósito, escreveu-se na sentença recorrida o seguinte:
«Foram analisados os valores mais elevados, relativamente ao ano de 1989, num total de 6 035 contos, conforme anexo n.º 14, para verificar da eventual contabilização em custos de valores que deviam ser capitalizados.
Efetivamente o documento n.º 58 de operações diversas, no total de 4.200.000$00 (anexo n.º 32), refere-se à construção de muros nos armazéns da Portela de Sacavém; este valor foi considerado pela sociedade como custo na totalidade neste exercício, quando deveria ter sido contabilizado na rubrica “imobilizações corpóreas, de acordo com o disposto na nota explicativa à conta 422 do POC, aprovada pelo D.L. 47/77 de 7 de fevereiro, e reintegrado juntamente com o armazém em conformidade com a alínea a) do n.º 3 do art. 17.º do Código do IRC e do n.º 5 do art. 5.º do Decreto Regulamentar 2/90, de 12 de janeiro. (…) //
Resulta do probatório que:
- O armazém está afeto ao exercício da atividade da impugnante;
- Em 1989, aqueles armazéns, sofreram graves prejuízos provocados por inundações das águas da chuva;
- A pressão das águas da chuva fez desmoronar um muro dos armazéns, provocando inundação interior;
- As águas danificaram gravemente os armazéns e mercadorias neles existentes;
- A impugnante teve que fazer obras para reconstruir os armazéns, de modo a colocá-los nas mesmas condições em que se encontrariam caso não tivesse havido inundações.
Resulta do exposto que as obras efetuadas pela Impugnante têm a ver com a manutenção e reparação dos armazéns.
Assim, a correção dos SEE não se pode manter, porquanto as obras se destinaram a repor a situação que existia antes da inundação».
Apreciação. Na tese da recorrente, as obras em causa constituem obras de grande reparação, para efeitos do disposto no artigo 5.º/5/a)(15), do Decreto-Regulamentar n.º 2/90, de 12.01, pelo que devem integrar o activo imobilizado, com vista à amortização dos custos incorridos. A este propósito constitui jurisprudência fiscal assente a seguinte:
i) «Segundo o disposto no artigo 5º, n.º 5, alínea a), do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, para efeitos de reintegração e amortização, grandes reparações ou beneficiações são «as que aumentem o valor real ou a duração provável dos elementos a que respeitem». // O valor monetário referente ao custo da obra não pode, por si só, constituir fundamentação suficiente para qualificar tal obra como “grandes reparações”»(16).
ii) «As obras susceptíveis de aumentar a vida útil dos imóveis são obras de grande reparação ou beneficiação, pelo que se integram no imobilizado. // O conceito legal de obras de grande reparação ou beneficiação permite desconsiderar o custo invocado pelo contribuinte e a sua substituição pelo valor indicado na taxa de amortização correspondente. Ao cumprimento do dever de fundamentação expressa dos actos da Administração importa a enunciação das razões pelas quais as obras em concreto se subsumem no conceito legal em causa»(17).
Estão em causa as obras sobre os armazéns da Portela de Sacavém, propriedade da impugnante(18).
Dos elementos coligidos nos autos resulta que as obras em causa tinham em vista a reposição da situação dos imóveis anterior à ocorrência da intempérie, pelo que tais obras não integram o conceito de obras de grande reparação e beneficiação. Trata-se de reparar os imóveis, repondo a situação anterior, no que respeita a muros e edificado, e não de introduzir beneficiações que permitiriam acrescer valor ao estado existente do edificado. Pelo que os custos incorridos não estão sujeitos a amortização, dado que correspondem a obras de conservação do imobilizado, ao invés do que pretende a impugnada.
Ao decidir no sentido referido, a sentença recorrida não incorreu em erro, pelo que deve ser confirmada na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.5. No que respeita ao recurso jurisdicional interposto pela impugnante. A recorrente censura o veredicto que fez vencimento na instância, por referência aos itens seguintes:
Prémios de seguro (i) e contribuição autárquica (ii).
2.2.5.1. No que respeita ao ponto referido em (i), a recorrente assaca à sentença em crise erro de julgamento. Alega, em síntese, que: «Os prémios de seguros são encargos de natureza administrativa indispensáveis para a manutenção da fonte produtora, pelo que deverão ser contabilizados em custos e, sendo estes continuados, deverão ser levados a resultados numa medida proporcional à da sua execução (CIRC, art.º 18); No ano civil de 1989 a impugnante beneficiou de doze meses de cobertura de risco de incêndio, pelo que levou a resultados o valor correspondente a uma anuidade no exercício do ano em causa; Assim, deve a quantia de Esc. 191.674$00 ser considerada como custos devidamente justificados, pelo que se requer seja anulada a decisão recorrida proferida sobre tal matéria, e substituída por outra que julgue procedente o pedido de anulação da correcção efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira».
A este propósito, escreveu-se na sentença recorrida o seguinte:
«2.4.6 Relativamente aos custos diferidos, não aceites – seguros (ponto 3.2.11.2 do Relatório, fls. 103): o princípio da especialização dos exercícios determina que só possam ser imputados a cada ano os proveitos e os custos nele verificados, independentemente dos recebimentos e pagamentos verificados.
Tal terá sido o critério utilizado pelos serviços.
3.2.11.2. - Seguros (conta 6325)
Esta conta apresenta os seguintes saldos em 31 de dezembro:
1988 — 335 209$00
1989 — 4 329 944$00
Foi analisado o saldo de 1989, tendo-se concluído que, em relação aos documentos n.ºs 341 e 420, de caixa, não se seguiu o princípio da especialização dos exercícios, pelo que se acresce ao lucro tributável do I.R.C. de 1989 o valor de 191.674$00 conforme cálculos efetuados no anexo nº 15. Esta conta foi verificada conjuntamente com as contas 273 — Despesas antecipadas — seguros” e “723 — Seguros”. // (…) //
No caso dos autos a Recorrente invoca na douta petição inicial que “não obstante a admissão por parte da recorrente quer na reclamação quer no recurso hierárquico de que os questionados encargos poderiam ser custos com referência ao exercício de 1988 e não quanto àquele em que foram contabilizados, nada obsta a que se tenha por adequado o tratamento dado pela reclamante nas suas declarações fiscais com referência ao exercício de 1989” e que “facilmente se constata que, destinando-se as ofertas a que respeitam tais custos a futuros ou atuais clientes e só tendo sido celebrados contratos-promessa de compra e venda durante o exercício de 1989, está perfeitamente justificada a imputação temporal desses custos ao exercício de 1989”. (…) // O princípio da especialização (ou do acréscimo) consagrado no Plano Oficial de Contabilidade consagra a base de acréscimo, que assenta no pressuposto de que as transações e outros acontecimentos são reconhecidos quando ocorrem, escriturados nos registos contabilísticos dos períodos a que respeitam e relatados nas demonstrações financeiras dos respetivos exercícios ou períodos.
Assim, os custos com seguros imputados ao exercício de 1990 no montante de 191.646$00 não podem ser contabilizados no exercício de 1989, independentemente de ter sido neste exercício que ocorreu o pagamento».
Apreciação. Está em causa a correcção referida no ponto 3.2.11.2. do RIT.
Nos termos do princípio da especialização dos exercícios ou da “periodização do lucro tributável”, «[o]s proveitos e os custos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que digam respeito (artigo 18.º, n.º 1, do CIRC). Contabilizam-se créditos e débitos e não pagamentos e recebimentos. Do probatório resulta que o prémio de seguro em apreço respeita ao exercício de 1989(19), que é o exercício que está em causa nos autos, pelo que os pressupostos em que assenta a correcção em apreço não se confirmam. Deve, por isso, a mesma ser anulada. Ao julgar em sentido discrepante, a sentença recorrida enferma de erro, pelo que deve ser substituída por decisão que julgue procedente a impugnação, nesta parte.
Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.5.2. No que respeita ao ponto referido em (ii), a recorrente assaca à sentença recorrida erro de julgamento. Alega, para tanto e em síntese, que: «em 1989, a impugnante pagou Esc. 1.018.920$00 a título de contribuição predial pelo que declarou, em sede de IRC, as rendas recebidas da exploração dos seus prédios, que foram, de imediato, contabilizadas e integradas no lucro tributável desse ano (pontos EE e FF dos factos julgados provados); Ora, a impugnante não pôde lançar em custos os montantes pagos a título Contribuição Predial porquanto o imposto de Contribuição Predial, liquidado após a entrada em vigor do C.I.R.C., não é dedutível na matéria colectável para efeito de determinação do lucro tributável em sede de I.R.C. (D.L., n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, art.º 3º, n.º 3); Assim, a manter-se a decisão recorrida, sobre a mesma realidade económica - as rendas ou rendimentos prediais - recairão dois impostos distintos, IRC e Contribuição Predial; Da conjugação dos artigos 37º e 89º do C.C.I. e dos artigos 41º e 74º do C.I.R.C., depreende-se que a exclusão dos custos das quantias despendidas para o pagamento do imposto de Contribuição Predial ou Contribuição Autárquica, respectivamente, só faz sentido se se fizer simultaneamente dedução à colecta; Devendo admitir-se que a Contribuição Predial liquidada em 1989, não dedutível para efeito de lucro tributável, possa ser objecto de dedução à colecta, evitando-se, assim, a dupla tributação dos rendimentos prediais auferidos no ano de 1989».
A este propósito, escreveu-se na sentença recorrida o seguinte:
«Resulta do REE:
«5.5 — Contribuição autárquica
O valor deduzido na linha 4.3, do Quadro 19, relativo ao cálculo do IRC de 1989, foi de 1.018.920$00. Ora, esse valor refere-se à contribuição predial de 1988, relativa aos Armazéns da Portela que eram pertença da S………….., conforme ponto 3.2.12. Pelo que, só no ano de 1988 que o mesmo poderia ser deduzido à coleta da contribuição industrial, sendo incorreta, portanto, tal dedução à coleta do IRC (n.º 3 do artigo 3.º do DL 442-B/88, de 30/11).»
Prevê o artigo 3.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro:
«3 – Os impostos referidos na alínea c) do artigo 37.º do Código da Contribuição Industrial que, nos termos do número anterior, sejam liquidados após a entrada em vigor do Código do IRC não serão dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável neste imposto.»
Resultava do artigo 37.º, alínea c), do CCI:
Não se consideram custos ou perdas do exercício: (…)
c) A contribuição industrial, o imposto complementar, o imposto de mais valias e as contribuições e impostos cujas coletas são dedutíveis nos termos das alíneas a) e b) do artigo 89.º: (…)»
Dispunha o artigo 89.º, alínea b), do CCI:
«Da coleta liquidada aos contribuintes do grupo A, e até à concorrência da respetiva importância, deduzir-se-á: (…) //
b) A contribuição predial liquidada relativamente a prédios que façam parta do ativo da empresa; (…)» (…) //
De todo o exposto se conclui que a Contribuição Autárquica de 1988, liquidada em 1989, não é dedutível, para efeitos fiscais no exercício de 1989».
Apreciação. Em face dos dados coligidos nos autos, verifica-se que está em causa a invocada dedutibilidade do custo incorrido com o pagamento da contribuição predial de 1988 ao lucro tributável do exercício em causa – 1989.
Nos termos do artigo 3.º/3, do Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, «[o]s impostos referidos na alínea c), do artigo 37.º do Código da Contribuição Industrial (CCI) que, nos termos do número anterior, sejam liquidados após entrada em vigor do Código do IRC não serão dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável neste imposto». Por seu turno, o artigo 37.º/c), estatuía que «Não se consideram custos ou perdas do exercício: // (…) as contribuições e impostos cujas colectas são dedutíveis nos termos das alíneas a) e b), do artigo 89.». O artigo 89.º/b), do CCI, referia a contribuição predial.
Estava em causa a contribuição predial, liquidada e paga em 1989, mas respeitante ao exercício anterior, pelo que a mesma não é dedutível ao rendimento tributável em IRC. O artigo 3.º/3, do Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, corresponde a norma de direito transitório, que permite acomodar a passagem para o novo modelo de tributação decorrente da aprovação do CIRC. Não existe dupla tributação, dado que o imposto em causa podia ter sido deduzido à colecta da contribuição industrial, imposto vigente no exercício respectivo (1988) (artigo 89.º/b), do Código de Imposto Industrial).
Ao decidir no sentido referido, a sentença recorrida não incorreu em erro, pelo que deve ser confirmada na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
DISPOSITIVO
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder parcial provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública, e revogar a sentença na parte relativa a 2.2.4.1., julgando a impugnação improcedente, nesta parte, e, em conceder parcial provimento ao recurso interposto pela impugnante, revogar a sentença recorrida, na parte relativa a 2.2.5.1., julgando a impugnação procedente, nesta parte, mantendo a sentença recorrida quanto ao mais.

Registe.
Notifique.
(Jorge Cortês - Relator)




(1ª. Adjunta)

(2ª. Adjunta)

___________
(1)V. Ricardo Pedro, “Linhas gerais sobre as alterações ao regime de recursos jurisdicionais no âmbito do CPPT, em especial o recurso de revista excecional”, in Comentários à legislação processual tributária, Carla Amada Gomes et aliud, 2019, pp. 349/372, máxime, p. 366.
(2)Acórdão do TCAS, de 04.06.2013, P. 06465/13.
(3)Acórdão do TCAS, de 22.09.2009, P. 3314/09.
(4)Acórdão do STA, de 03.12.2014, P. 0639/14
(5)Acórdão do STA, 04-07-2018, P. 01433/17
(6)Artigo 1.º/1, do Decreto-Regulamentar n.º 2/90, de 12.01.
(7)Artigo 1.º/2/a), do Decreto-Regulamentar n.º 2/90, de 12.01.
(8)Artigo 2.º/2, do Decreto-Regulamentar n.º 2/90, de 12.01.
(9)Andreia Pereira da Costa, Depreciações e amortizações no SNC: alterações contabilísticas e impacto fiscal; Coimbra Editora, 2011, p. 99.
(10)Andreia Pereira da Costa, Depreciações e amortizações no SNC: alterações contabilísticas e impacto fiscal; Coimbra Editora, 2011, p. 100.
(11)Andreia Pereira da Costa, Depreciações e amortizações no SNC: alterações contabilísticas e impacto fiscal; Coimbra Editora, 2011, p. 108.
(12)Acórdão do TCAS, de 14.11.2019, P. 85/05.3BESNT.
(13)CIRC, anotado e comentado, F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Rei dos Livros, 1994, p. 232.
(14)RIT.3.2.14. e C2. e alíneas F) a K).
(15)«Para efeitos de reintegração e amortização, consideram-se: // a) Grandes reparações e beneficiações – as que aumentam o valor real ou a duração provável dos elementos a que respeitam»
(16)Acórdão do TCAS, de 27.04.2017, P. 154/08.8BELRS.
(17)Acórdão do TCAS, de 13.12.2019, P. 8348/15.3BCLSB.
(18)Ponto 3.2.11. do RIT e alíneas V) a BB), do probatório.
(19)Ponto 3.2.11.2. do RIT e alíneas CC) e DD) do probatório.