Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03931/10
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:04/13/2010
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
NATUREZA E REGIME DE SUBIDA DA RECLAMAÇÃO NOS TERMOS DO ARTº 276º DO CPPT
Sumário:I) -A reclamação dos despachos proferidos pelo Chefe do Serviço de Finanças ou por outras autoridades da administração tributária prevista no artº 276º do CPPT, corresponde a um verdadeiro recurso, sendo como tal denominado no velho CPT e em outras vigorantes normas como é o caso do art.º 97.º n.º1 n) do próprio CPPT.

II) – Em regra, a reclamação só sobe ao tribunal, a final, depois de realizadas a penhora e a venda.

III) – Mas, fundando-se a reclamação em prejuízo irreparável, a sua subida é imediata e segue as regras dos processos urgentes.

IV) – E a irreparabilidade do prejuízo não está circunscrita aos casos elencados nas várias alíneas do n.º3 do art.º 278.º do CPPT já que essa limitação inquinaria a norma de inconstitucionalidade material, antes devendo ficar por ela abrangidos todos os casos de ocorrência para os interessados de um prejuízo irreparável, em consideração do princípio da tutela judicial efectiva que a norma do art.º 268.º n.º4 da CRP consagra.

V) – Assim, está garantida a subida imediata de todas as reclamações quando a sua retenção importe perda de toda a sua utilidade, por força da consagração do direito de impugnar ou de recorrer de todos os actos lesivos previsto na LGT e ser esse o regime geral dos agravos contido no norma do art.º 734.º n.º2 do CPC.

VI) -Porém, não basta a mera invocação de prejuízo irreparável cabendo ao recorrente provar em que consiste tal prejuízo com a não suspensão imediata da execução fiscal e com a não subida imediata da reclamação, sob pena desta só subir a final.

VII) -Não se enquadra em nenhuma das sobreditas situações o caso de imóvel penhorado que não foi adjudicado à CGD, nos termos a para os feitos do estatuído no artigo 900º do CPC, quando é certo que a própria adjudicação não consubstancia uma verdadeira venda do imóvel se não estamos perante uma venda mediante proposta em carta fechada, mas perante uma venda por negociação particular no âmbito da qual a venda do imóvel só se efectiva com a celebração da escritura pública, nos termos do estatuído no artigo 875° do CPC, escritura pública que, ainda não se efectuou.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acorda-se, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo:


1. - A EXCELENTISSIMA REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, inconformada com a sentença da Mm.ª Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a reclamação deduzida por A..., contra o acto do órgão de execução que, no âmbito do processo de execução fiscal n.°1520200201018680, ordenou a penhora da fracção autónoma identificada na petição inicial, dela recorre para este TCAS concluindo a sua alegação com as seguintes conclusões:
“I- O regime regra da subida das reclamações das decisões do órgão da execução fiscal é o da subida diferida (art°. 278°, n° 1 do CPPT)
II- Não se encontra fundamento prejuízo irreparável causado por qualquer das ilegalidades indicadas nas alíneas a) a d) do n°3 do art° 278° do CPPT, para que a mesma seja conhecida de imediato.
III- No caso sub judice o não conhecimento imediato da não faz perder a sua utilidade.
IV- A segunda penhora não deverá ser considerada "ilegal” com o fundamento, como na douta sentença de se tratar de bem já adjudicado.
V- Não se verifica a existência de duas penhoras (em vigor) sobre o mesmo imóvel, uma vez que a "primeira" penhora caducou nos termos dos art.°s 10° e 12° do Código do Registo Predial (na redacção anterior ao Decreto-Lei n°116/2008, de 4 de Julho), inexistindo qualquer norma que sustente a manutenção da mesma para lá daquele termo legal, designadamente que fundamente a decisão do aresto recorrido de que a mera "adjudicação" do bem penhorado tenha esse efeito.
VI - Deverá ser mantida a penhora automática de 12.05.2009, efectuada através do "SIPA", prosseguindo os autos de execução fiscal com a realização da escritura pública de compra e venda do imóvel supra.
VII - Viola a Lei a douta sentença recorrida quando considera a penhora ilegal com o fundamento de que "operou-se a transmissão da propriedade do mesmo, e sendo assim a segunda penhora efectuada é ilegal por se tratar de bem já adjudicado".
VIII- Tendo a sentença recorrida considerado que houve transferência da propriedade do imóvel para a CGD, a Executada deixou poder utilizar este meio judicial, a Reclamação, pois não é lesada com a penhora de um imóvel de que, necessariamente, não é proprietária, termos em que, não tendo qualquer direitos ou interesses legítimos a acautelar, não dispõe de "interesses em agir através do presente meio processual.
IX - Caso em que, verificar-se-ia a utilização indevida e inapropriada da Reclamação, prevista nos art.°s 276 e seguintes CPPT, o qual determina que "as decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária que no processo afectem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiro são susceptíveis de reclamação para o tribunal tributário de primeira instância".
Nestes termos, Deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, a sentença recorrida revogada, com todas as demais consequências legais, fazendo-se JUSTIÇA”.
Houve contra -alegações, assim concluídas:
“A- Não pode a aqui Recorrida assentir com o plasmado da Recorrente, porquanto, é irrepreensível a douta decisão, só se entendendo o teor das alegações porque apresentadas "ex ofício", não assistindo razão à Recorrente quando requer seja revogada a decisão ora posta em crise.
B- No caso sub iudice estamos notoriamente face a um caso que se enquadra no N. 1 do art.° 278.o CPPT e assim, foi considerado e bem pelo douto tribunal recorrido. Porquanto, o imóvel objecto de penhora foi efectivamente adjudicado (vendido) em 24/05/2001, logo, é nos termos da lei a altura certa para apreciar da Reclamação.
C- Pelo que será de manter intacta, quanto a este ponto, a sentença recorrida.
D- Só por inércia, negligência e violação da legalidade é que a Administração Fiscal, aqui Recorrente, deixou caducar o registo da penhora sem formalizar a escritura pública, não lhe assistindo razão quando em sede do presente recurso, confunde deliberadamente os institutos legais.
E- A adjudicação (acto pelo qual, na venda em acção executiva se transmite, se entrega a coisa, acto pelo qual se declara quem tem direito a, entregar em praça ao maior licitante), é a forma correcta e completa de aquisição em sede de execução fiscal. Pelo que, adjudicado que foi o imóvel, transmitiu-se a propriedade do mesmo,
F- Pelo que se saiba, nos autos de execução nada consta em contrário, não foi requerida a anulação da referida adjudicação, logo a mesma, como muito bem decidiu a douta sentença recorrida, mantém-se na ordem jurídica, pelo que não comporta o instituto de compra e venda. Porquanto,
G- É anómalo, por ilegal, que após ser adjudicado o bem, logo completa a venda na acção executiva, o mesmo bem imóvel seja entregue para venda na modalidade de venda por negociação particular. Atente-se que o bem imóvel como a própria Recorrente admite e conforme prova autos, já tinha sido vendido ao proponente que apresentou a maior proposta em carta fechada, a CGD.
H- Mas mais, no caso em apreço acontece que o despacho de adjudicação é posterior ao despacho de determinação de venda por negociação particular do imóvel penhorado, facto que a Recorrente não pode ignorar dado que os dois despachos são de sua autoria, pelo que só em má fé ou mero expediente dilatório se pode encontrar justificação para o alegado pela Recorrente, não podendo por isso proceder a alegação da Recorrente.
I- Ademais, a lei não permite a dupla penhora na mesma acção executiva cfr. o preceituado no art.° 871.0 do CPC aplicável ex vi art. 2º al. e) CPPT. Pelo que andou bem o douto tribunal recorrido, sendo portanto de manter a sentença também quanto a este ponto.
J- Erra igualmente a Recorrente, quando alega que a primeira penhora caducou. Em boa verdade, o que caducou foi o registo da penhora, por violação por parte da Recorrente do estipulado no n.º2 do art. 900º CPC e art.º 824 CC.
K- A adjudicação põe fim à execução fiscal, pelo que desde a data da adjudicação que a execução deveria ter sido arquivada pela AT, ora Recorrente. Pelo que mais uma vez, por inconsistentes erróneas e juridicamente infundadas são de afastar todas as alegações da Recorrente e de manter a decisão posta em crise.
L- A legitimidade das partes, em processo, depende de cada uma delas ter na acção um interesse directo, Cfr. art.° 26.° CPC. O interesse em agir define-se como sendo o interesse da parte activa em obter tutela judicial de uma situação subjectiva através de um determinado meio processual e o correspondente interesse da parte passiva em impedir a concessão daquela concessão.
M- Salienta Anselmo de Castro, in " Direito Processual Civil Declaratório” Volume II, pág. 253 : " O interesse em agir surge, pois, da necessidade de obter do processo a protecção do interesse substancial, pelo que pressupõe a lesão de tal interesse e a idoneidade da providência requerida para a sua reintegração ou tanto quanto possível integral satisfação".
N- No caso em apreço é bastante o recurso á definição dos conceitos, para, seguindo o percurso cognoscitivo do presente processo, explanado supra, artº 23.° a 27.o das motivações do presente recurso, é evidente da aqui Recorrida.
O- Dúvidas não restam de que desde a data do despacho de adjudicação e consequente emissão de certidão para escritura pública, que todos os actos processuais posteriores praticados no processo de execução, contra a aqui Recorrente, são ilegais, para além de configurarem enriquecimento sem causa da Recorrente.
P- Após adjudicação, deveria a AF ter passado a cobrar o IMI à CGD, contudo continuou até ao presente a cobrar o IMI à aqui Recorrente, cfr. Doc. que se junta. Ora não sendo a partir dessa data a Recorrida o sujeito passivo de tal imposto, e apesar das múltiplas reclamações feitas ao balcão dos serviços de finanças competentes, viu penhorados os seus rendimentos da prestação de aposentação e foram-lhe aplicadas coimas e juros de mora - TUDO ILEGAL.
Q-A Recorrente, tentou ainda junto da CGD resolver o problema em que esta instituição em "conluio" com o serviço de finanças, aqui Recorrente, a colocaram, as quais recusaram resolver, arrastando o problema há 9 anos.
A Recorrente com a sua inércia deixou arrastar um processo executivo para além do legalmente permitido, praticou actos ilegais por acção e omissão que causaram graves prejuízos á Recorrida, ainda assim, não se absteve de vir por em crise uma decisão justa equitativa e irrepreensível na sua fundamentação de facto e de direito, tornando-se claro que o presente recurso não passa de mero expediente dilatório utilizado pela mesma.
Pelo que, com a experiência e sabedoria jurídica que lhe é prerrogativa será de o Tribunal ad quem manter a sentença ora recorrida.
Nestes termos e nos mais de direito que V. Ex.as, Venerando Juízes Desembargadores, sapientemente suprirão deve o presente recurso interposto pela Recorrente improceder, mantendo-se na íntegra a douta sentença do tribunal a quo, Fazendo-se assim a acostumada JUSTIÇA!”
O EPGA pronunciou-se no sentido de que deve ser alterado o probatório no sentido de que não houve adjudicação do bem e qualquer venda no mesmo, pelos fundamentos a que adiante se fará alusão.
Os autos vêm á conferência com dispensa de vistos.
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2- Na sentença recorrida com base nos elementos constantes dos autos e com interesse para a presente decisão, foram julgados provados os seguintes factos:
A) Corre termos no serviço de finanças de Loures 1 o processo de execução fiscal n.° 1520200201018680 em nome da reclamante e de B....
B) No âmbito do processo de execução fiscal foi efectuada em 16/12/1997 e registada em 22/12/1997 a penhora da fracção designada pela letra "I" inscrito na matriz sob o art.° 472 da freguesia de ..., descrita na Conservatória do Registo Predial de Loures, sob o n.°00835.
C) Por despacho de 04/08/2000 do chefe do serviço de finanças foi determinada a venda por negociação particular do imóvel penhorado.
D) Por despacho do chefe do serviço de finanças de 24/05/2001 foi o imóvel adjudicado à Caixa Geral de Depósitos, S.A. (cfr. documento a fls 136 do PEF).
E) Em 18/06/2001 é passada certidão para efeitos da realização da escritura pública do imóvel.
F) Em 12/05/2009 foi efectuada penhora automática do imóvel supra identificado através do "SIPA" (cfr. documento a fls 61 dos autos).
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A nosso ver e em concordância com o EPGA, impõe-se a alteração impõe-se a alteração oficiosa da factualidade apurada nos termos do disposto no artigo 712°/l/a) do CPC.
Na verdade, ao invés do que se verteu na alínea D) do probatório, o imóvel penhorado não foi adjudicado à CGD, nos termos a para os feitos do estatuído no artigo 900º do CPC.
Isso porque a alegada adjudicação não consubstancia a alegada venda do imóvel, já que, em rigor, não estamos perante uma venda mediante proposta em carta fechada, mas perante uma venda por negociação particular, conforme facto assente na alínea C) do probatório. É que, como bem observa o EPGA, a venda do imóvel só se efectiva com a celebração da escritura pública, nos termos do estatuído no artigo 875° do CPC, escritura pública que, ainda não se efectuou.
Assim sendo, na al. D) do probatório passa a constar a seguinte factualidade:
D) -Por despacho do respectivo Chefe do Serviço de Finanças de 24/5/2001, foi autorizada a venda do imóvel penhorado pelo preço de 6.700.0000$00, à CGD.
E adita-se ao probatório mais uma alínea do seguinte teor:
G) A escritura de venda do imóvel penhorado, por negociação particular, ainda, não foi outorgada.
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A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos dos lutos e no processo de execução fiscal em apenso.
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FACTOS NÃO PROVADOS
Não se provaram outros factos relevantes para a decisão da causa, para além dos supra mencionados
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2.–A questão decidenda consiste em saber se, ao não subir imediatamente, a presente reclamação perde utilidade e já não poderá aproveitar ao recorrente, causando-lhe prejuízo irreparável, ainda que venha a ser atendida.
A decisão recorrida julgou procedente a reclamação judicial, porque, entendendo que devia subir imediatamente, julgou ilegal a penhora feita em 12 de Maio de 2009, por alegadamente, o bem penhorado ter sido já antes adjudicado nos autos de PEF, à CGD.
A recorrente FªPª insurge-se contra o assim fundamentado e decidido no entendimento de que a decisão recorrida violou o regime regra da subida das reclamações das decisões do órgão da execução fiscal, que é o da subida diferida (art°. 278°, n° 1 do CPPT), não se encontrando fundamento prejuízo irreparável causado por qualquer das ilegalidades indicadas nas alíneas a) a d) do n°3 do art° 278° do CPPT, para que a mesma seja conhecida de imediato nem, tão pouco, o não conhecimento imediato faz perder a utilidade da reclamação.
Aquilatemos, então, se estamos, ou não, perante um dos casos previstos no art. 278° do CPPT para que o Tribunal conheça das reclamações das decisões dos Órgãos de Execução Fiscal em momento anterior ao da penhora e da venda.
Evidenciam os autos que no âmbito do processo de execução fiscal foi efectuada em 16/12/1997 e registada em 22/12/1997 a penhora da fracção designada pela letra "I" inscrito na matriz sob o art.° 472 da freguesia de ..., descrita na Conservatória do Registo Predial de Loures, sob o n°00835.
Por despacho de 04/08/2000 do chefe do serviço de finanças foi determinada a venda por negociação particular do imóvel penhorado.
Por despacho do respectivo Chefe do Serviço de Finanças de 24/5/2001, foi autorizada a venda do imóvel penhorado pelo preço de 6.700.0000$00, à CGD.
Embora em 18/06/2001 fosse passada certidão para efeitos da realização da escritura pública do imóvel penhorado, por negociação particular, ainda, tal escritura não foi outorgada.
Entretanto, em 12/05/2009 tinha sido efectuada penhora automática do imóvel supra identificado através do "SIPA".
Vejamos, se, face a tal circunstancialismo fáctico foi «in casu» respeitado o regime de subida da reclamação como pretende, em primeira linha, a recorrente FªPª.
É certo que o artº 276º do CPPT dispõe que “As decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal (...) que no processo afectem os direitos e interesses legítimos do executado são susceptíveis de reclamação para o tribunal tributário de 1ª instância”.
Esta reclamação dos despachos proferidos pelo Chefe do Serviço de Finanças ou por outras autoridades da administração tributária, corresponde a um verdadeiro recurso, assim sendo denominada no anterior CPT e também ainda hoje, em outras normas, designadamente na do art.º 97.º n.º1 n) do próprio CPPT.
Em regra, a subida do recurso é diferida visto que do nº 1 do artº 278º do CPPT resulta que a reclamação só será conhecida a final, devendo o processo ser remetido para o efeito ao TT 1ª Instância depois da realização da penhora e da venda.
Mas o nº 3 excepciona que se a reclamante invocar prejuízo irreparável decorrente da imediata execução da decisão reclamada causado por alguma das ilegalidades indicadas nas diversas alíneas daquele nº 3, o processo subirá imediatamente ao tribunal, nos 8 dias subsequentes à sua apresentação (nº 4), salvo, evidentemente, se a decisão ou o acto tiver sido revogado, entretanto, pelo órgão da execução fiscal.
Mas será que, atento o teor literal do nº 3 do artº 278º do CPPT bastava a mera invocação do prejuízo irreparável para que o processo subisse imediatamente ao tribunal?
O preceituado nos artºs 276º e ss do CPPT insere-se no quadro de garantias dos contribuintes, de consagração constitucional (nº 4 do art. 268 da CRP) e legal (artº 9º da LGT) ao permitir recurso judicial das decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades que afectem os seus direitos e interesses legítimos em processo de execução fiscal.
Todavia, como se disse, o disposto no n.º1 do artº 278º do CPPT não tem aplicação quando a reclamação se fundar em prejuízo irreparável causado por qualquer das seguintes ilegalidades:
a)Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que foi realizada;
b)Imediata penhora dos bens que só subsidiariamente respondem pela dívida exequenda;
c)Incidência sobre bens que, não respondendo, nos termos de direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido abrangidos pela diligência;
d)Determinação da prestação de garantia indevida ou superior à devida. (n.º3 do art.º supra).
Em qualquer destes casos, a reclamação subirá no prazo de oito dias ao tribunal e segue as regras dos processos urgentes – n.ºs 4 e 5 do art.º supra.
No entendimento de Jorge Lopes de Sousa In Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado, 2.ª Edição revista e aumentada, 2000, VISLIS, pág. 1064., não poderá restringir-se a subida imediata das reclamações aos casos indicados no n.º3 daquele artigo, sob pena de inconstitucionalidade material de tal norma, porque a CRP garante o direito à tutela judicial efectiva de direitos e interesses legítimos em matéria de contencioso administrativo (art.º 268.º n.º4) em que se engloba o tributário.
O alcance da tutela judicial efectiva, não se limita à possibilidade de reparação dos prejuízos provocados por uma actuação ilegal, comissiva ou omissiva, da Administração, exigindo antes que sejam evitados os próprios prejuízos, sempre que possível.
E vai mesmo mais longe, ao entender que deve assegurar-se a subida imediata das reclamações sempre que, sem ela, elas percam toda a utilidade Ob. cit, pág, cit. Nota 6., prosseguindo a este propósito:
“...
Nos casos em que a subida diferida faz perder qualquer utilidade à reclamação, a imposição deste regime de subida reconduz-se à denegação da possibilidade de reclamação, pois ela não terá qualquer efeito prático, o que é incompatível com a LGT e o referido sentido da lei de autorização legislativa.
Por isso, também nestes casos, se terá de aceitar a possibilidade de subida imediata.
Um exemplo de situação em que a subida diferida faz perder qualquer utilidade à reclamação é a decisão que recuse suspender o processo de execução fiscal...” Ob. cit. pág. 1065. .
Como se afirma no Acórdão proferido em 06-07-2004 na Secção de Contencioso Tributário - 2º Juízo do TCAS, no Recurso nº 00177/04, é “…também de trazer à colação o regime geral dos recursos de agravo cuja norma do art.º 734.º n.º2 do CPC, dispõe que estes devem subir imediatamente, sempre que a retenção os tornasse absolutamente inúteis, e que é aplicável subsidiariamente aos recursos no âmbito do processo tributário (art.º 281.º do CPPT), não sendo tal reclamação mais do que um verdadeiro recurso, assim sendo de resto denominada no anterior CPT (art.º 355.º) e também em alguns artigos de outra legislação fiscal, como no art.º 62.º n.º1 g) do ETAF, 10.º n.º1 do RCPT e no art.º 97.º n.º1 n), do próprio CPPT.”
O Mº Juiz «a quo» entendeu que era caso de a reclamação subir de imediato ao Tribunal para o seu conhecimento, porquanto está em causa um bem imóvel que já havia sido penhorado e anteriormente adjudicado, pelo que já se encontra realizada a venda a que alude o disposto no art.° 278° n°1 do CPPT.
Ora, ainda na senda de Jorge Lopes de Sousa in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado, 3a edição, 2002, páginas 1165 e 1166, “…, no processo de execução fiscal, estando em causa apenas a cobrança de dívidas, não será viável, fora de casos extremos em que estejam em causa quantias invulgarmente avultadas, considerar que a eventual necessidade de suspensão do processo de execução fiscal possa provocar uma grave lesão do interesse público que se possa sobrepor ao interesse do particular em não ver concretizada uma irremediável lesão dos seus direitos ou interesses legítimos. Aliás, mesmo nos casos em que a demora da efectivação da penhora possa constituir risco sério para a cobrança dos créditos, a posição da Administração Tributária estará suficientemente salvaguardada pela possibilidade que tem de requerer ao tribunal a adopção das medidas cautelares que sejam necessárias, designadamente o arresto de bens, que tem o mesmo efeito da penhora a nível da eficácia em relação ao processo de execução fiscal dos actos do executado (arte. 622° e 819° do CPC).
Parece mesmo dever ir-se mais longe e assegurar-se a subida imediata das reclamações sempre que, sem ela, elas percam utilidade.
Na verdade, prevendo-se na LGT a obrigatoriedade de assegurar a possibilidade de reclamação de todos os actos lesivos (arts. 95°, n°s l e 2, alínea j), e 103°, n.° 2 da LGT) e sendo reconhecida a supremacia das normas da LGT sobre as do CPPT (art. l.° deste e alínea c), do n.° l do art. 51° da Lei n.° 87-B/98, de 31 de Dezembro) este Código não poderá afastar a possibilidade de reclamação em todos os casos em que o acto praticado no processo de execução fiscal seja potencialmente lesivo.
Na verdade, sendo o sentido da autorização legislativa constante da referida Lei n.° 87-B/98 o da compatibilização das normas do CPT com as LGT e regulamentação das disposições desta dela carecidas, estará ferida de inconstitucionalidade orgânica a actuação do governo em dissonância com aquela lei no que concerne a matérias incluídas na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República (arts. 103°, n.° 2, e 165°, n.° l, alínea p), da CRP), pois estava limitado pelo sentido da lei de autorização legislativa em que se basear (arts. 122°, n.° 2 e 198°, n.° 1. alínea b) da CRP).
A definição das possibilidades concedidas aos contribuintes e outros obrigados tributários de impugnarem contenciosamente decisões da administração tributária, inclui-se, sem dúvida, nas garantias dos contribuintes a que se refere o n.° 2 do art. 103° da CRP, matéria que se deve considerar englobada na referida reserva de competência legislativa.
Nos casos em que a subida diferida faz perder qualquer utilidade à reclamação, a imposição deste regime de subida reconduz-se à denegação da possibilidade de reclamação, pois ela não terá qualquer efeito prático, o que é incompatível com a LGT e o referido sentido da lei de autorização.
Por isso, também nestes casos, se terá de aceitar a possibilidade de subida mediata".
Idêntica doutrina dimana do Acórdão do STA, de 6 de Março de 2008, proferido no recurso n.° 058/08, disponível no sítio da Internet www.dgsi.pt., como bem assinala o EPGA no seu douto parecer.
Sucede que, contra o que erradamente se considerou na sentença recorrida, o imóvel penhorado não foi adjudicado à CGD, nos termos a para os feitos do estatuído no artigo 900º do CPC e a adjudicação não consubstancia uma verdadeira venda do imóvel, já que, em rigor, não estamos perante uma venda mediante proposta em carta fechada, mas perante uma venda por negociação particular.
Não obstante, retenha-se que, sendo controvertida na doutrina e na jurisprudência a definição do momento em que ocorre a transmissão da propriedade na venda efectuada em processo de execução fiscal -se no momento da aceitação da proposta do adquirente, se com a adjudicação dos bens -jurisprudência foi produzida no sentido de que a transmissão da propriedade opera com a aceitação da proposta sendo esse "o momento a atender para definir a titularidade do direito de propriedade relevante, para efeitos de sujeição passiva a Contribuição Autárquica, nos termos do n° 1, do art. 8° do Código da Contribuição Autárquica" (cfr. o douto Ac. do STA de 31-05-2000, in Rec.025030; cfr. também, Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado, 2002, anot. 10 ao art. 256°).
Destarte, só se existisse adjudicação é que devia considerar-se que já operara a transmissão dos bens, até porque a adjudicação só tem lugar após o pagamento integral do preço e cumprimento das obrigações fiscais inerentes à transmissão, sendo estes elementos indiciadores materiais da ocorrência desse facto (art. 900°, n° 1 do CPC).
No entanto, terá sempre de se atender à natureza dos bens, pois que deve-se considerar que, na venda executiva, quem vende é o Estado e não o executado que sofre a venda, nem o exequente que a promove(1), sendo a venda judicial, na verdadeira acepção, uma venda forçada efectuada pelo Estado que assim se substitui ao dono da coisa que for objecto da penhora. Dito de outro modo: a venda judicial é um acto misto, de direito público em relação ao vendedor e de direito privado em relação ao adquirente(2).
Todavia, o regime da venda executiva não difere substancialmente do da venda privada tendo, por isso, a mesma força alienatória e regulando-se pelos mesmos princípios legais.
Nesse sentido, o Ac. do S.T.J. de 17/11/1977, B.M.J. 271º-166 e Pires de Lima e Antunes Varela, "Código Civil Anotado", Vol. II, pág. 87.
Sendo assim, o regime da venda era subsidiariamente aplicável em tudo o que não esteja especialmente determinado no Código de Processo Tributário.
Donde que, independentemente de existir a falada adjudicação, tratando-se da venda de um bem imóvel, a mesma só se efectivava com a celebração da escritura pública, nos termos do estatuído no artigo 875° do CPC, escritura pública que, ainda não se efectuou.
Por esse prisma, o despacho reclamado, ao qual a recorrente imputa várias ilegalidades e que se consubstancia na efectivação da penhora em 12/05/2009, não é subsumível em nenhuma das hipóteses referidas no artigo 278.°/3 do CPPT.
Acresce que a reclamante não alega nem demonstra qualquer outro facto concreto susceptível de determinar prejuízo irreparável.
Não sendo alegados factos que permitam concluir pela existência de prejuízo irreparável, não se trata de situação enquadrável na previsão do n° 3 do art. 278° do CPPT, pelo que não existe fundamento para que o Tribunal conheça da reclamação antes de efectuada a venda.
A reclamante não veio juntar prova quer documental, quer testemunhal, ou requerer diligências no sentido de demonstrar que a existência de prejuízo irreparável e a emanação de tal ónus da prova para a reclamante resultava, quer da norma geral do art.º 342.º n.º1 do Código Civil, quer da norma do art.º74.º n.º1 da LGT, que dispõe que, o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.
Na senda do Conselheiro João António Valente Torrão In Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 2005, Almedina, pág. 935, nota 3, embora não se refira aqui a necessidade de indicação de prova na reclamação ao contrário do que a lei determina noutros processos (v. os artigos 108.º, n.º3, 146.º-B, n.º3, 146.º-C, n.º2 e 206.º), a verdade é que tem de ser admitida a prova no caso de ela ser necessária à defesa do direito que se invoca como violado, não obstante a reclamação correr no processo de execução (artigo 97.º, n.º1, alínea n) do Código).
Neste mesmo sentido decidiu também o então Tribunal Central Administrativo, no seu acórdão de 6.7.2004, recurso n.º 177/04, ao doutrinar, no ponto 3. do seu sumário: “Mesmo admitindo que o artigo 278.º, n.º3 citado permite a subida do recurso nos casos em que da sua retenção possa resultar prejuízo irreparável para o recorrente, necessário é que este efectue a prova do prejuízo irreparável perante o órgão de execução fiscal para que este possa mandar subir imediatamente o recurso.”
Acresce que, como também salienta o EPGA chamando à colação os Acórdãos do STA, de 2009.02.25 e 2009.04.02, proferidos nos recursos números 01082/08 e 0167/09, respectivamente, disponíveis no sítio da internet www.dgsi.pt., a subida diferida da reclamação só é completamente inútil quando o prejuízo eventualmente decorrente da decisão não possa ser reparado, o que não é, manifestamente, o caso dos autos.
Como expende o Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado e comentado, II volume, 2007, página 668/669,casos em que a subida diferida fará perder qualquer utilidade à reclamação serão, v. g., o da decisão que recuse suspender o PEF, nos termos do artigo 172.° do CPPT, o de fixação de valor base para venda e o da reclamação de despacho do órgão de execução fiscal que não considera um crédito litigioso e ordena a notificação do respectivo devedor para depositar o crédito, sob a cominação de ser executado pelas importância respectiva, no próprio processo.
O argumento utilizado pela sentença recorrida para sustentar a subida imediata da reclamação não tem fundamento fáctico, pois que, como já se referiu, o imóvel não chegou ser vendido pelo que, não era de fazer subir imediatamente a reclamação por estar fora daqueles casos em que, sem ela, toda a sua utilidade do recurso se quede perdida, por aplicação, subsidiária, da norma do art.º 734.º n.º2 do CPC.
Esta norma do CPC para a subida imediata do recurso apenas tem por objecto aqueles casos de inutilização absoluta do recurso em si, que não para a inutilização eventual de actos processuais praticados e que depois vêm a ser anulados por efeito da decisão, ou seja, apenas vale para os casos em que a retenção faça perder a razão de ser do recurso; a sua utilidade e a eficiência deste depende da subida imediata, como se pronunciou o Prof. Alberto dos Reis, in Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 86.º, pág. 41.
Ora, não foi neste âmbito sequer, que a reclamante veio alegar tendo em vista obter a subida imediata do recurso, continuando sempre a ser possível apreciar se a própria venda poderá ficar sem efeito nos termos do disposto no art.º 909.º n.º1 c) e 201.º do CPC, não se mostrando assim, também, preenchido este requisito para que este recurso pudesse subir imediatamente. (3)
Sendo assim, como é, a reclamação deve ter subida diferida, tendo a decisão recorrida feito um incorrecto julgamento de facto, no que à questão da venda do imóvel penhorado se refere e uma incorrecta interpretação e aplicação do direito à situação em análise.
Destarte, porque não se prova o prejuízo irreparável para a ora recorrente com a subida ao tribunal da reclamação em causa apenas depois de realizada a venda do imóvel, que ainda não ocorreu, e nem ser completamente inútil a reclamação se só conhecida a final, é de conceder provimento ao recurso e de não conhecer por ora, do restante objecto do recurso, devendo os autos baixarem ao órgão da execução fiscal para aí prosseguirem os ulteriores termos, se a tal não sobrevierem outras questões que o impeçam.
Pelas razões expostas, procedem as conclusões recursivas sob análise, o que acarreta a prejudicialidade da cognição das demais.
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3. Nestes termos, acorda-se, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida devendo os autos baixarem ao órgão da execução fiscal para aí prosseguirem os ulteriores termos devendo a reclamação apenas subir após a venda do bem penhorado.
Custas pela recorrida em ambas as instâncias.
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Lisboa, 13 de Abril de 2010
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Aníbal Ferraz)



1 - Nesse sentido, o Acórdão deste TCAS de 23/04/2008, no Recurso nº 227/08, relatado pelo relator desta formação.
2 - Tese perfilhada no Ac. do S.T.J. de 9/1/1979, no B.M.J., 283º-196,
3 -Neste sentido se pronunciou o Acórdão do TCAS de 29-01-2008, tirado no Recurso nº 02189/08.