Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05514/12
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:12/04/2012
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL.
IRS.
CONCLUSÕES.
DIREITO DE AUDIÇÃO.
DATA DA REMESSA.
Sumário:1. Quando as conclusões recursivas sejam deficientes, obscuras ou complexas, deve a recorrente ser notificada para completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, sob pena de se não conhecer do recurso na parte afectada;

2. A falta de acatamento pelo recorrente do despacho que ordena tal correcção não implica que o objecto do recurso não seja conhecido na parte não afectada, a menos que tais conclusões se revelem, de todo, imprestáveis, para aquilatar da bondade do decidido na sua totalidade;

3. O direito de audição prévia exercido em tempo, mas remetido à autoridade administrativa através dos CTT, por carta registada com A/R, mostrando-se este assinado nesta, já depois de tal prazo ter expirado, implica o seu não exercício em tempo, por a data relevante neste caso consistir na assinatura de tal
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. A Exma Representante da Fazenda Pública (RFP), inconformada com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por José ………. e mulher Clara …………………, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


43º A douta sentença ora recorrida decidiu pela procedência da Impugnação, assentando a decisão no facto de o julgador entender que não foi permitido pela administração fiscal o exercício da audição prévia antes do relatório final de inspecção, o que constitui preterição de formalidade essencial, por violação do disposto no artigo 60.º da Lei Geral Tributária (LGT).
44° Assim, concluiu que "(...) deve a liquidação impugnada ser anulada por vício de por preterição do direito de audição prévia, ficando, deste modo, prejudicado o conhecimento das demais questões invocadas pela Impugnante (...)"
45° Não se conformando com a douta sentença e, salvo o devido respeito, discordando dos fundamentos em que se sustenta, apresenta-se o presente recurso.
46° Os Impugnantes foram notificados do projecto de correcções por carta registada de 26 de Novembro de 2007.
47º Nesse documento eram informados do facto de que, tal como previsto no artigo 60.º da Lei Geral Tributária (LGT), poderiam, se o entendessem, exercer o direito de audição no prazo de 10 dias.
48° No dia 11 de Dezembro de 2007 a Direcção Regional dos Assuntos Fiscais recebeu uma carta registada com aviso de recepção emitida pela sociedade de advogados Gilberto ………. e Gerthie ………., sem qualquer referência ao processo em causa, indicando que os Impugnantes não adquiriram o prédio pelo valor referido acima, uma vez que este teria sido construído pelos próprios.
49º Sobre o exercício do direito de audição referido foi elaborada informação complementar pelos Serviços de Inspecção.
50º Do conteúdo dessa informação foram os ora impugnantes notificados.
51º Na notificação para exercício do direito de audição,
expressamente referido que no caso de os sujeitos passivos optarem pela forma escrita para exercerem o seu direito o documento remetido para os serviços deveria fazer menção "(...) dos elementos constantes na N/ Referência."
52º Analisada a carta remetida pela sociedade de advogados acima referida verificou-se que não se indicou nem o processo nem o número de identificação fiscal dos ora Impugnantes
53º Esta situação constitui desde logo uma irregularidade na elaboração do referido requerimento.
Diga-se, ainda, e sem prescindir, que
54º Por outro lado, determina o artigo 65.º da LGT que:
"Têm legitimidade no procedimento os sujeitos passivos da relação tributária e quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido.”
55° No mesmo sentido, o n.º 1 do artigo 9.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) diz que:
"Têm legitimidade no procedimento tributário, além da administração tributária, os contribuintes (...) e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido."
56° De acordo com o n.º 3 do artigo 18.º da LGT:
"O sujeito passivo é a pessoa singular ou colectiva (...) que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável."
57º Sobre este assunto pronunciou-se Pedro ………..que sustenta que para este efeito importa considerar apenas o destinatário imediato do acto que será produzido no procedimento em causa, assim o contribuinte que exerce o direito de audição corresponde ao sujeito passivo definido no art, 18, n.º 3 da LGT (com o auxílio do n.º 4 do art. 22):
"(...) pessoa singular ou colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável (...)" - in, A Audição Prévia do Contribuinte - Problemas Fundamentais do Direito Tributário, 1999, Vislis Editores, pág, 323..
58° Em sentido contrário, Jorge Lopes de Sousa advoga uma mais ampla legitimação para o exercício deste direito, admitindo que este deve ser reconhecido a quaisquer outros intervenientes no procedimento tributário, cujos direitos e interesses possam nele ser afectados.
59° Em suas palavras, "o preceituado neste artigo (art. 60° da LGT) deverá ser aplicável em relação a quaisquer outros interessados, desde que, durante a pendência do procedimento tributário, tenham já direitos e interesses reais e actuais, e não meramente hipotéticos ou eventuais, a defender" - v. Código de Procedimento e Processo Tributário Anotado, 3a Edição, 2002, Vislis Editores.
60° Nesse sentido, a sociedade de advogados que exerceu o direito de audição é parte ilegítima na relação tributária.
61º Não é sujeito passivo.
62º Não é interessado.
63° Não demonstra que durante a pendência do procedimento tributário tenha qualquer direito ou interesse real e actual a defender.
64º Não faz prova da existência de poderes de representação, através da junção de procuração ou mandato.
65° Ou seja, nem na mais ampla opção interpretativa apresentada se aceita como parte legítima na relação tributária, logo, como tendo legitimidade para o exercício do direito de audição prévia, advogado sem poderes de representação.
66° Assim, o direito de audição encontra-se prejudicado pela ilegitimidade do requerente, tendo agido em conformidade com a lei a administração fiscal ao não o ter em consideração.
67º Por outro lado, e sem prescindir, no exercício do direito de audição são alegados factos e valores sem que deles seja feita qualquer prova, ao contrário do exigido.
68º Nesse sentido, ainda que tivesse sido regularmente apresentado e pudesse ser aceite não poderiam os factos invocados ser aceites pela administração fiscal e conduzir à alteração das conclusões da Inspecção Tributária, por não ser junto qualquer documento ou elemento probatório de qualquer natureza que permitisse comprovar os factos e valores invocados.
69° Os Impugnantes foram notificados do projecto de correcções por carta registada do dia 26 de Novembro de 2007, tal como se provou.
70° Nesse documento eram informados do facto de que, tal como previsto no artigo 60.º da Lei Geral Tributária (LGT), poderiam, se o entendessem, exercer o direito de audição no prazo de 10 dias.
71° No dia 11 de Dezembro de 2007 a Direcção Regional dos Assuntos Fiscais recebeu uma carta registada com aviso de recepção emitida pela sociedade de advogados Gilberto …………. e Gerthie …………, sem qualquer referência ao processo em causa, indicando que os Impugnantes não adquiriram o prédio pelo valor referido acima, uma vez que este teria sido construído pelos próprios.
72º Sobre o exercício do direito de audição referido foi elaborada informação complementar pelos Serviços de Inspecção.
73° Do conteúdo dessa informação foram os ora impugnantes notificados.
74° Na notificação para exercício do direito de audição, referida acima, era expressamente referido que no caso de os sujeitos passivos optarem pela forma escrita para exercerem o seu direito o documento remetido para os serviços deveria fazer menção "(...) dos elementos constantes na N/ Referência."
75° Analisada a carta remetida pela sociedade de advogados acima referida verificou-se que não se indicou nem o processo nem o número de identificação fiscal dos ora Impugnantes
76º Por outro lado, determina o artigo 65.º da LGT que:
"Têm legitimidade no procedimento os sujeitos passivos da relação tributária e quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido."
77° No mesmo sentido, o n.º 1 do artigo 9.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) diz que:
"Têm legitimidade no procedimento tributário, além da administração tributária, os contribuintes (...) e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido.”
78° De acordo com o n.º 3 do artigo 18.º da LGT:
"O sujeito passivo é a pessoa singular ou colectiva (...) que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável."
79° Sobre este assunto pronunciou-se Pedro Machete que sustenta que para este efeito importa considerar apenas o destinatário imediato do acto que será produzido no procedimento em causa, assim o contribuinte que exerce o direito de audição corresponde ao sujeito passivo definido no art. 18, n.º 3 da LGT (com o auxílio do n.º 4 do art. 22):
"(...) pessoa singular ou colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável (...)" - in, A Audição Prévia do Contribuinte - Problemas Fundamentais do Direito Tributário, 1999, Vislis Editores, pág, 323..
80º Em sentido contrário, Jorge Lopes de Sousa advoga uma mais ampla legitimação para o exercício deste direito, admitindo que este deve ser reconhecido a quaisquer outros intervenientes no procedimento tributário, cujos direitos e interesses possam nele ser afectados.
81º Em suas palavras, "o preceituado neste artigo (art. 60° da LGT) deverá ser aplicável em relação a quaisquer outros interessados, desde que, durante a pendência do procedimento tributário, tenham já direitos e interesses reais e actuais, e não meramente hipotéticos ou eventuais, a defender" - v. Código de Procedimento e Processo Tributário Anotado, 3a Edição, 2002, Vislis Editores,
82º Nesse sentido, a sociedade de advogados que exerceu o direito de audição é parte ilegítima na relação tributária.
83° Não é sujeito passivo.
84° Não é interessado,
85° Não demonstra que durante a pendência do procedimento tributário tenha qualquer direito ou interesse real e actual a defender.
86° Não faz prova da existência de poderes de representação, através da junção de procuração ou mandato.
87º Ou seja, nem na mais ampla opção interpretativa apresentada se aceita como parte legítima na relação tributária, logo, como tendo legitimidade para o exercício do direito de audição prévia, advogado sem poderes de representação.
88° Assim, o direito de audição encontra-se prejudicado pela ilegitimidade do requerente, tendo agido em conformidade com a lei a administração fiscal ao não o ter em consideração.
89° Por outro lado, e sem prescindir, no exercício do direito de audição são alegados factos e valores sem que deles seja feita qualquer prova, ao contrário do exigido.
90º Nesse sentido, ainda que tivesse sido regularmente apresentado e pudesse ser poderiam os factos invocados ser aceites pela administração fiscal e conduzir à alteração das conclusões da Inspecção Tributária, por não ser junto qualquer documento ou elemento probatório de qualquer natureza que permitisse comprovar os factos e valores invocados.

Nestes termos e nos melhores de Direito, que se requer a V. Exa. que se digne julgar improcedente a presente impugnação, aceitando e julgando procedente o presente recurso.
A liquidação adicional de IRS deverá ser integralmente mantida, assim como a liquidação de juros compensatórios a ela inerente.


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


Também os recorridos vieram a apresentar as suas alegações e nestas as respectiva conclusões, as quais igualmente na íntegra se reproduzem:


A) o prédio urbano que a fazenda nacional faz referência é na verdade um prédio rústico, que não foi adquirido em 30.04.2002, mas sim transformado de rústico em urbano, através da edificação de edifício com 8 apartamentos e quatro lojas comercias;
B) Pelo que o prédio rústico já existia na esfera dos bens dos recorridos à larga dezenas de anos, apenas foi objecto de transformação de rústico para urbano;
C) Pelo que estariam abrangidos nos termos do artigo 10° n.º 3 b do CIRS ;
D) No dia 28.11.2007 os contribuintes, ora recorridos, foram notificados para que no prazo de dez dias, exercerem o direito de audição, ao projecto de correcções do relatório de Inspecção, doc. 1 e 2, juntos com a p. i.
E) Sucede que, no dia 10.12.2007, antes de ter terminado o prazo dos dez dias úteis, por carta registada com aviso de recepção, os contribuintes responderam ao projecto de correcções, vide doc, 3 e 4 juntos com a p.i.
F) Com o fundamento de que não haviam adquirido qualquer prédio urbano, mas sim, haviam edificado um edifício sobre um prédio rústico, vide doc. 3 juntos com a p.i.
G) A resposta/carta dos recorridos foi recebida pela DRAF, no dia 11.12.2007, vide doc. 4 juntos com a p.i.
H) Sucede que a fazenda nacional por carta registada datada de 11.12.2007, conforme doc. 5 junto com a p.i., notificou os recorridos do relatório/conclusão/correcções resultantes de análise interna, vide doc. 5
I) E no dito relatório, a fls 5, do doc. 5. a DRAF/recorrentes alegam que os contribuintes/recorridos haviam sido notificados para exercer o direito de audição prévia, no prazo de 10 dias.
J) A verdade é que os ora impugnantes responderam dentro do prazo de dez dias úteis, vide doc. 3 e 4, juntos com a p.i.
K) Mais, por carta de 27.12.2008, os impugnantes responderam à DRAF, proferindo que haviam respondido ao projecto de correcções, dentro do prazo de 10 dias, vide doc. 6 e 7 juntos com a p.i.
L) A fazenda pública elaborou e notificou os contribuintes/recorridos do relatório final, no nono dia, ou seja, não esperou pelos dez dias úteis, nos termos do artigo 100º do CPA, respondendo antecipadamente, não esperando pela resposta dos impugnantes ao projecto de correcções do relatório de inspecções, vide doc. 5 junto com a p.i.
M) Se não vejamos: os impugnantes foram notificados no dia 28.11.2007;
N) E temos os seguintes dias úteis: 29, 30 de Novembro de 2007, 3, 4, 5, 6, 7, 10, 11, 12 de Dezembro de 2007, perfazendo os dez dias úteis, sendo que os dias 1, 2, 8 e 9, são Sábado e Domingos.
O) Assim sendo o prazo terminava no dia 12 de Dezembro de 2007.
P) Assim sendo, salvo melhor opinião, a DRAF violou o direito de audição, pelo que o relatório de análise interna, enfermava de vícios, nos termos dos artigos: 8.º, 59.º, 60.º, da LGT; 100 do CPA; e ainda dos artigos 268/3 CRP, 124 e 125 do CPA, e 45.º CPP
Q) Não é verdade o vertido pela fazenda nacional nos quesitos 22.º e 25.º.
R) Em primeiro lugar os nomes dos recorridos estão devidamente identificados: nome, residência, como ainda é feito uma referência no sentido que os recorridos estão respondendo á notificação da DRAF de 26-11-2007
S) Pelo que bastava a DRAF na sua base de dados escrever o nome dos recorridos.
T) Todavia, acresce a tudo isto, que os recorridos não podiam colocar o número de referência ou o número do processo, porque a fazenda nacional não os fez constar da notificação.
U) Ou seja: a fazenda nacional deixou em branco o número da referência, e ainda o número do processo doc. 1 juntos com a p.i. e quadro infra.
V) Daí que, a missiva dos requeridos/recorridos à DRAF fazem constar apenas V/Ref.;”
W) Não colocando o numero do processo ou número da referência, porque a DRAF não os forneceu
X) Mais, se a fazenda nacional tivesse fornecido o número da referência ou do processo, e se o contribuinte tivesse colocado o número da referência, a verdade que a fazenda nacional, mesmo assim, teria enviado o relatório final sem aguardar pelos 10 dias úteis.
Y) Atendendo que a fazenda pública elaborou e notificou os contribuintes do relatório final, no nono dia, ou seja, não esperou pelos dez dias úteis, nos termos do artigo 100° do CPA, respondendo antecipadamente, não esperando pela resposta dos impugnantes ao projecto de correcções do relatório de inspecções, vide doc. 5 junto com a p.i.
Z) Quanto à falta de mandato, nos termos do artigo 5.º e 6.º a 8 do CPPT e do artigo 17.º da LGT (gestão de negócios) os actos que não são puramente pessoal podem ser praticados por gestor de negócios. . . . Sendo obrigatória a constituição de advogado no caso de mandato judicial.
AA) Assim sendo, havendo qualquer irregularidade, falta ou insuficiência do mandato teria que ter sido afixado prazo para suprir a falta do mesmo;
BB) Sucede que os impugnantes nunca foram notificados pela DRAF para suprirem qualquer a falta de mandato, aliás a DRAF nunca suscitou qualquer problema
CC) tendo os impugnantes/recorridos posteriormente juntado procuração pelo que a audição prévia não está ferida por falta de mandato do advogado subscritor.
DD) E por fim dizemos que não existe nenhuma sociedade de Advogados, mas sim partilha de escritório, sendo que o advogado subscritor das peças foi o dr. Gilberto ……….., devidamente identificado em todos os requerimentos.

Nestes termos e nos melhores de direito e com o sempre mui douto suprimento de Vossa Excelência, deve ser ordenada a manutenção da decisão proferida pelo tribunal “a quo”, com todas as legais consequências.


A Exma Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser a recorrente convidada para aperfeiçoar as suas conclusões recursivas, mercê da sua complexidade, promoção que foi acolhida pelo despacho do Relator de fls 224, e a recorrente notificada para as vir apresentar, sob a legal cominação, o que esta não fez, tendo, então, a Exma PGA, emitido o seu parecer, propugnando que se não conhecesse do objecto do recurso.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. Se não se deve conhecer do objecto do recurso por falta de acatamento pela recorrente da decisão para apresentar conclusões devidamente sintetizadas; E se a data relevante para considerar efectivado a remessa à entidade administrativa do requerimento contendo o exercício do direito de audição prévia por parte dos sujeitos passivos, é aquele em que o respectivo A/R se mostrar assinado no destinatário.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório a M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
A) Os impugnantes foram objecto de um procedimento interno de inspecção, no âmbito do qual foram efectuadas alterações ao rendimento líquido em sede de IRS do exercício de 2003 (documento de fls. 21 e ss dos autos).
B) Os impugnantes foram notificados por ofício datado de 26/11/2007 para no prazo de 10 dias exercerem o direito de audição prévia, nos termos do art.º 60.º da LGT, sobre o projecto de relatório de inspecção tributária (documento de fls. 6 e ss dos autos).
C) Em 10/12/2007, na sequência da notificação dos impugnantes datada de 26/11/2007, foi remetido à Direcção à Direcção de Finanças do Funchal o documento escrito de fls 18 dos autos no qual os impugnantes alegam não ter adquirido o prédio em causa pelo valor de 10.510,10€ (documento de fls.18 e 19 dos autos).
D) Por despacho de concordância datado de 11/12/2007 proferido pelo chefe de divisão, projecto de relatório de inspecção passou a definitivo, no mesmo constando que "Os sujeitos passivos foram notificados para exercer o direito de audição, no prazo de 10 dias, pelo registo de saída n.º 10452, de 26-11-2007. Tendo terminado o prazo, e até a presente data, os sujeitos passivos não exerceram o direito de audição." (documento de fls. 21 e ss).
E) Por ofício datado de 11/12/2007 os impugnantes foram notificados das correcções ao rendimento líquido em sede de IRS de 2003, que foi alterado para 104.942,37€ (documento de fls. 20 dos autos).
F) Na sequência das correcções efectuadas em 20/12/2007 foi emitida a liquidação de IRS n.º …………………, referente a IRS do ano de 2003, no montante de 28.360,48€ (documento de fls. 32 dos autos).
G) A p.i. foi apresentada em 02/04/2008 (fls. 1 dos autos).
****
Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos, no processo administrativo em apenso.

Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.

A que, nos termos da alínea a) do n.º1 do art.º 712.º do Código de Processo Civil (CPC), se acrescenta mais um alínea ao probatório firmado na sentença recorrida, em ordem a nele figurar a data em que o A/R da correspondência com o requerimento dirigido à entidade administrativa para exercício do direito de audição, foi nela assinado:
H) O A/R dos ora recorridos, contendo o escrito cuja cópia consta a fls 18 dos autos, exercendo o seu direito de audição prévia, foi assinado na entidade destinatária em 11-12-2007 – cfr. doc. de fls 19 e 19 verso dos autos e confissão na matéria do art.º 4.º da sua petição de impugnação judicial.


4. Importa, desde logo, começar por conhecer do invocado não conhecimento do objecto do recurso propugnado pela Exma RMP, junto deste Tribunal, por a ora recorrente não ter dado cumprimento ao citado despacho do Relator que lhe ordenava a apresentação de conclusões devidamente sintetizadas mercê da complexidade das que havia apresentado, questão que é de conhecimento oficioso e logra prioridade de conhecimento, porque a proceder, nada mais haveria que conhecer no âmbito do presente recurso.

Desde logo convém ter presente que os recursos, como meios de reexame, para que um tribunal de grau hierárquico superior àquele que proferiu a decisão sob recurso a reaprecie, devem conter as concretas e precisas razões por que a recorrente entende que a decisão recorrida se mostra eivada de erro ou vício que afecte na sua validade e deve ser revogada ou alterada, em ordem a permitir ao tribunal superior emitir um juízo de censura sobre a mesma, com base em tais razões (ou outras de conhecimento oficioso que para o mesmo fim possam ter relevo), conducente à sua revogação ou alteração, sendo que tais razões invocadas pela recorrente, devem depois, em sede de conclusões, serem sintetizadas, como expressamente hoje se dispõe no n.º1 do art.º 685.º-A (1) do Código de Processo Civil (CPC), correspondente ao anterior art.º 690.º do mesmo Código.

E quando a matéria de tais conclusões sejam deficientes, obscuras ou complexas, deve o relator convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afectada, nos termos do n.º3 do mesmo art.º 685.º-A.

No caso, o despacho do Relator supra citado, ordenou-lhe a apresentação de conclusões “devidamente sintetizadas”, face ao entendimento, de que as apresentadas, se revelavam complexas e prolixas, não respeitando integralmente a sua verdadeira essência de conclusões, pelo que a parte afectada das mesmas, não poderá ser todo o objecto do recurso (2), como a Exma RMP, veio a pronunciar-se, no seu parecer, mas só as partes relativas à sua prolixa e complexa argumentação quanto ao não exercício do direito de audição pelos ora recorridos, desta forma se cingindo o objecto do presente recurso ao conhecimento das questões relativas a tal direito de audição, sem o balizamento por essa argumentação da ora recorrente, complexa e prolixa, da qual se não conhecerá.


4.1. Para julgar procedente a impugnação judicial deduzida considerou a M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que os ora recorridos foram notificados para o exercício do direito de audição prévia do projecto de conclusões do relatório de inspecção, por carta remetida em 26-11-2007, que estes o exerceram em 10-12-2007, tendo o mesmo sido exercido no prazo de 10 dias previsto para o efeito, pelo que a consideração dos elementos mencionados por estes deveria ter tido lugar, pelo que tendo a AT considerado que os mesmos não haviam exercido tal direito, constitui preterição de tal formalidade essencial, geradora de vício de forma conducente à anulação da posterior liquidação, não tendo conhecido dos demais vícios articulados pelos mesmos ora recorridos, por prejudicados.

Para a Fazenda Pública ora recorrente, de acordo com o âmbito em que a matéria das conclusões das suas alegações recursivas devem ser apreciadas, é, fundamentalmente, contra este exercício em tempo que vem a esgrimir argumentos tendentes a este Tribunal exercer um juízo de censura sobre a sentença recorrida em ordem à sua revogação, pugnando que tal direito de audição não foi validamente exercido, quer porque não foram os ora recorridos quem o veio a exercer mas sim uma sociedade de advogados, quer porque não foram juntas quaisquer provas do alegado, em tal direito de audição prévia.

Vejamos então.
Nos presentes autos, encontra-se em causa, a liquidação adicional de IRS relativa ao ano de 2003, dos ora recorridos, por alteração dos elementos por si declarados nas respectivas declarações de rendimentos, mercê da acção de inspecção e exame às mesmas declarações, conforme flui do respectivo relatório, cuja cópia consta de fls 21 a 26 dos autos.

Como se não controverte nos presentes autos, no final de tal relatório da inspecção tributária havia lugar à notificação para o exercício do direito de audição dos mesmos ora recorridos – cfr. alínea e) do n.º1 do art.º 60.º da LGT – a efectuar por carta registada – n.º4 do mesmo artigo – que no caso teve lugar em 26-11-2007, como flui da matéria da alínea B) do probatório firmado na sentença recorrida, pelo que, nos termos do disposto no n.º1 do art.º 39.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), tal notificação se tem por efectuada no terceiro dia posterior ao desse registo, em 29-11-2007 (quinta-feira), iniciando-se tal prazo de 10 dias em 30-11-2007 e decorrendo até 10-12-2007 (já que o seu último dia, o dia 9, foi domingo), nos termos do disposto nos art.ºs 279.º do Código Civil, ex vi do art.º 20.º, n.º1 do CPPT, no âmbito do procedimento tributário em que nos encontramos, contando-se tal prazo de forma seguida, que não como pretendem os ora recorridos, com o desconto dos seus dias feriados e domingos – cfr. matéria das suas conclusões J), L) e O) – que no caso, não irreleva tal apontada forma errada de contagem do prazo, porque ainda que os mesmos tenham remetido o seu direito de audição por registo dos CTT com A/R em 10-12-2007 – cfr. matéria da alínea C) do probatório da mesma sentença e respectivo “talão de aceitação” de fls 19 dos autos - ainda dentro desse prazo, ainda que no seu último dia, mas já foi recebido, no seu destinatário, nessa entidade administrativa, em 11-12-2007, assim, já no 1.º dia posterior ao termo de tal prazo, pelo que o mesmo não foi, em tempo, exercido.

Na verdade, nos termos do disposto no art.º 79.º do CPA, ex vi do art.º 2.º, alínea d) do CPPT, os requerimentos dirigidos a órgãos administrativos podem ser remetidos pelo correio, com aviso de recepção, neste caso valendo como data da prática do acto a data em que tal aviso se mostrar assinado na entidade destinatária (3), por força do disposto no n.º3 do art.º 39.º do CPPT, não sendo de aplicar nestes casos a norma do art.º 150.º do CPC, quer ainda porque embora as normas deste Código sejam de aplicação subsidiária no âmbito do direito tributário em que nos encontramos, mas só depois das relativas às do CPA, tendo em conta a respectiva ordem, quer por o caso omisso ser de natureza administrativa, no sentido em que tal direito de audição é remetido a um órgão da administração tributária, logo com expressa regulamentação na norma do citado art.º 79.º, ao qual assim deve ser subsumido, pelo que tendo tal A/R apenas sido assinado no dia 11-12-2007, o foi já depois do termo do prazo para tal exercício do direito de audição prévia ser exercido, pelo que a sentença recorrida que assim não entendeu não se pode manter, tendo de ser revogada, com a procedência do recurso, ainda que por fundamentação jurídica não coincidente com a avançada pela recorrente.


4.2. Revogada a sentença recorrida pelo fundamento nela conhecido, de falta de consideração dos elementos novos invocados no direito de audição prévia, caberia a este Tribunal, em substituição, nos termos do disposto no art.º 715.º, n.º2 do CPC, conhecer das demais questões, articuladas na petição inicial de impugnação judicial que, por via da procedência da impugnação por aquele fundamento ficaram prejudicadas, se para tanto os autos dispusessem dos elementos necessários.

Mas não fornecem. É que desde logo os ora recorridos, vieram arrolar testemunhas que não foram inquiridas, certamente para com os seus depoimentos virem provar que se mantiveram ausentes da sua habitação na altura em que tal notificação por afixação na porta da sua residência terá tido lugar – cfr. matéria do art.º 30.º da mesma petição – desta forma parecendo pretender não lhes ser imputável o não conhecimento da mesma dentro do prazo de caducidade do direito à liquidação, até 31-12-2007, pelo que os autos têm de baixar ao tribunal “a quo” para, após a devida aquisição processual, ser proferida decisão em conformidade, quanto ao outro fundamento da impugnação.


Procede assim, nestes termos, a matéria das conclusões das alegações do recurso, sendo de lhe conceder provimento e de revogar a sentença recorrida que em contrário decidiu, sendo os autos de baixar à 1.ª Instância para, após a devida aquisição processual, ser conhecido do outro fundamento da impugnação judicial, salvo se, entretanto, outro motivo ocorra que a tal obste.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em conceder provimento ao recurso e em revogar a sentença recorrida, ordenando-se a baixa dos autos para, após a devida aquisição processual, ser conhecido do outro fundamento da impugnação, salvo a ocorrência de motivo que a tal obste.


Custas pelos recorridos.


Lisboa,04 de Dezembro de 2012
Eugénio Sequeira
Joaquim Condesso
Lucas Martins

(1) Redacção do Dec-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, já vigente à data da instauração da presente impugnação judicial e a aplicável.
(2) Salvo se, pelas razões avançadas pela recorrente nessas conclusões, se não conseguisse lobrigar as razões por que a decisão recorrida deveria ser alterada, como no recurso n.º 909/09, do STA de 18-2-2010, o que não é, manifestamente, o caso destes autos.
(3) Cfr. neste sentido o acórdão deste TCAS, Secção de Contencioso Administrativo, de 27-11-2008, proferido no recurso n.º 2530/07, bem como a jurisprudência e a doutrina aí citadas.