Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:631/10.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/24/2021
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:FALTA DE NOTIFICAÇÃO
CARTA REGISTADA COM AR
OPOSIÇÃO
Sumário:
I. A presunção consagrada no art.º 39.º, n.º 5, do CPPT funciona quando ambas as notificações das liquidações foram remetidas para o domicílio fiscal do administrado, que, não tendo atendido no momento da distribuição da correspondência, foi avisado pelo distribuidor de correio postal para efeitos de levantamento dessa mesma correspondência e não o fez.

II. A presunção mencionada em I. é ilidível.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I. RELATÓRIO

A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 05.03.2019, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a oposição apresentada por M….. (doravante Recorrida ou Oponente), ao processo de execução fiscal (PEF) n.º ….., instaurado no Serviço de Finanças (SF) de Lisboa 10, para cobrança de imposto municipal de Sisa (doravante Sisa).

A Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos:

“A. Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão do tribunal de primeira instância que julgou procedente a oposição à execução fiscal, por entender que não se encontrava provado que o distribuidor do serviço postal tenha deixado avisos na caixa de correio do domicílio fiscal da ora recorrida, que dessem conta que as referidas cartas se encontravam na estação de correios para serem levantadas, não operando assim a presunção da notificação prevista no artigo 39° do CPPT.

B. Ora, salvo o devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com a douta decisão recorrida porquanto, não só a mesma não faz, uma correta eleição e apreciação da matéria de facto relevante para os autos, sendo que da prova produzida se não podem extrair as conclusões que lhe serviram de base, como também não procede a uma total e acertada interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis ao caso subjudice.

Vejamos,

C. Quanto à matéria de facto, sempre com o devido respeito e salvo melhor opinião, face aos meios de prova documentais que constam dos autos de primeira instância e à força probatória dos mesmos, pelo Tribunal de primeira instância deveriam ter sido considerados e relevados para a boa decisão da causa, determinados factos, nomeadamente, que em virtude da notificação efetuada através de carta registada com AR assinado em 14.10.2003 do relatório de inspeção do qual resultaram correções que deram origem à liquidação de SISA em crise, a ora recorrida tinha conhecimento de que iria ser, num curto prazo, notificada de tal liquidação oficiosa pois da mesma constava expressamente que “A(s) liquidação(ões) associada(s) a esta(s) correção(ões) será(ão), a breve prazo, notificada(s) pelos serviços competentes com a indicação dos prazos e meios de defesa contra a liquidação” (conforme resulta dos documentos juntos aos autos a fls 40 e verso).

D. Quanto à questão de fundo que aqui importa decidir, prende-se a mesma, essencialmente, com saber se releva e opera, in casu, a presunção de notificação da liquidação a que se referem os nºs. 5 e 6 daquele artigo 39º do CPPT.

E. A propósito do mencionado preceito tem defendido a jurisprudência que: ”(…) a presunção de notificação prevista nos n.ºs 5 e 6 do artigo 39.º do CPPT funciona em duas situações, a saber: recusa do destinatário a receber a notificação; não levantamento da carta no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se comprovar que entretanto o contribuinte comunicou alteração do seu domicílio fiscal.”. (Acórdão do STA de 21.01.2010, proferido do processo n.º 807/09).

F. No caso vertente, resulta da matéria assente (Pontos 4 a 7 do probatório), que a AT para notificar a liquidação sindicada, remeteu à recorrida, para o seu domicílio fiscal, uma primeira carta registada com aviso de recepção, a qual veio devolvida com indicação de “Não atendeu” e “Devolução…Não reclamado”. E, quanto à segunda carta expedida (Pontos 8 a 11 do probatório), também esta remetida para o domicílio fiscal da recorrida foi a mesma objecto de devolução com a menção de “Não atendeu” e “Devolução…Não reclamado.

G. Em face desta factualidade e preceitos legais, sendo certo que aqui só relevaria o motivo referente à devolução da 1ª carta para o funcionamento da mencionada presunção, o que resulta é que, verificando-se a situação de não levantamento da carta (pois que a informação de “Não atendeu” dos CTT indicia pelo menos que terá sido deixado aviso para levantamento da carta, ou qualquer outro elemento indicador de que o destinatário podia saber a razão pela qual a carta não fora entregue),

H. então ocorre, o requisito legal para que a AT pudesse recorrer ao envio da segunda carta nos 15 dias seguintes (nº 5 do artigo 39º do CPPT), por forma a que pudesse operar a presunção de notificação constante do nº 6 do mesmo normativo.

I. A presunção de notificação resultante da expedição das cartas registadas com aviso de receção não pode ser abalada pela circunstância do seu destinatário não ter procedido ao seu levantamento, na exata medida em que ela opera ainda que tal levantamento não tenha ocorrido; a ilisão da presunção apenas se verifica em caso de comprovação de justo impedimento do notificando (de carácter pessoal), ou de impossibilidade de comunicação de mudança de residência no prazo legal (art. 39° n° 5 último segmento CPPT).

J. Conforme é consabido e segundo dispõe o artigo 28.º do Regulamento do Serviço de Correios (aprovado pelo Decreto Lei n.º 176/88, de 18 de maio), caso não seja possível a entrega do objeto registado pelos serviços de distribuição postal ao destinatário do mesmo, estes serviços colocam um aviso na caixa postal do destinatário do objeto registado, com a indicação que este fica disponível para levantamento durante um determinado período de tempo no local indicado por esses mesmos serviços de distribuição.

K. Através deste procedimento, os serviços de distribuição postal garantem ao remetente de um objeto registado que o destinatário do mesmo tem a possibilidade de saber que existe um objeto (in casu, uma notificação) que lhe foi remetido através dos serviços de distribuição postal, e que o mesmo se encontra disponível para levantamento no local indicado por esses mesmos serviços.

L. Esta norma realça o efeito que a lei quer atribuir ao registo: trata-se de uma presunção juris tantum, pelo que se o registo da carta liberta a AT do ónus de provar que a mesma ficou em condições de ser recebida pelo destinatário, este tem o ónus de provar que, na situação concreta, não o recebeu.

M. Logo, a falta de reclamação/levantamento deste tipo de correspondência junto da estação dos correios implica que se tenha de imputar ao destinatário a sua falta de recebimento, fazendo espoletar a presunção legal de notificação contida no n.º 5 do artigo 39.º do CPPT; e porque a recorrida em momento algum questionou a expedição das duas cartas registadas com aviso de receção dirigidas para o seu domicílio fiscal, nem invocou nem demonstrou a inexistência de qualquer aviso para levantamento da carta, tendo-se limitado à simples alegação de que não foi notificada da liquidação, então nada nos autos permite dar por ilidida a referida presunção, tendo a AT presumido, corretamente, a sua notificação

N. E mesmo que se diga que tal situação levaria a impor à recorrida um ónus da prova de um facto negativo, o certo é que a mesma poderia ter indicado como prova testemunhal o carteiro que exarou aquelas indicações, ou indicado outras testemunhas que pudessem atestar que é recorrente a situação do carteiro não deixar a correspondência nas caixas postais, ou exibindo a comunicação dos serviços postais que demonstrasse não conter de forma clara, a identificação do remetente, ou ainda juntando como prova documental quaisquer outras diligências que tivesse efetuado junto dos CTT visando a comprovação da não entrega do aviso para levantar a carta registada, mas nem esses factos foram alegados nem tal prova não foi sequer ensaiada.

O. Por outro lado, pela AT, foram juntas aos autos, não só as notificações da liquidação, efetuadas e remetidas à ora recorrida, sob registo e com aviso de receção, às quais se encontram associados números de registo postal, mas também constam ainda os AR devolvidos pelo distribuidor do serviço postal que demonstram o envio de tais notificações à recorrida e que pelo menos sugerem que terá sido deixado aviso para levantamento da carta, como também consta a notificação do RIT à oponente, efetuada sob registo com AR assinado, o qual se mostra assinado, e do qual consta expressamente que “A(s) liquidação(ões) associada(s) a esta(s) correção(ões) será(ão), a breve prazo, notificada(s) pelos serviços competentes com a indicação dos prazos e meios de defesa contra a liquidação”,

P. pelo que, tendo conhecimento de que iria rececionar, num futuro próximo, a notificação da liquidação oficiosa, não bastava à recorrida alegar pura e simplesmente que não foi notificada daquela liquidação, teria que o provar através de factos que indiciassem a impossibilidade de receção da mesma, mas não o fez.

Q. Ora, estando devidamente comprovado nos autos que a AT remeteu a notificação da liquidação através de carta registada com aviso de receção, em cumprimento com o artigo 38.º nº 1 do CPPT, com repetição dessa notificação, em virtude da devolução da primeira, sendo que ambas as notificações foram entregues aos CTT para que através dos seus serviços procedesse à entrega das mesmas à ora recorrida,

R. e tendo sido as notificações devolvidas, com as indicações de “Não atendeu” e “Devolução…Não reclamado”, então a notificação presume-se recebida pelo destinatário no terceiro dia posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil, tal como estabelecem os n.ºs 5 e 6 do artigo 39.º do CPPT.

S. De facto, no que se refere à presunção do n.º 5 do artigo 39.º do CPPT, é isso mesmo, uma mera presunção, que pode ser ilidida mediante prova em contrário, conforme determina o artigo 350.º, n.º 2, do Código Civil (CC). A presunção legal é uma ilação que o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido, conforme artigo 349.º, n.º 1, do CC.

T. Por conseguinte, enviada a carta registada com AR, aposta a indicação pelos CTT que foi tentada a entrega e não tendo sido levantada a carta, presume-se que foi deixado o aviso necessário, em caso de ausência ou não atendimento por parte do destinatário no seu domicílio, sob pena de se subverter o próprio serviço público (à data ainda não tinha ocorrido a privatização dos CTT) prestado pelos serviços postais.

U. O recibo da apresentação da carta nos serviços de correio é de grande importância probatória do registo postal. O registo postal, com ou sem aviso de receção, apenas se justifica por uma questão de segurança probatória. É uma formalidade que a lei prevê para melhor garantir a certeza jurídica da cognoscibilidade do ato notificado, evitando o risco de se invocar a falta de notificação.

V. Na verdade, as fórmulas estandardizadas constantes das notificações - “Não atendeu” e “Devolução…Não reclamado” – apenas significam que foi tentada a entrega ao destinatário, e não tendo sido possível a mesma foi deixado aviso para levantamento da correspondência na estação, e ignorado, no prazo concedido, pelo avisado. O não recebimento da correspondência é, pois, imputável à recorrida.

W. Ora, in casu, tendo a recorrida conhecimento de que, após o procedimento de inspeção de que foi alvo e do qual resultaram correções em sede de SISA, de que iria ser notificada num breve prazo, da liquidação oficiosa resultante do mencionado procedimento, então teria todo o interesse em não atender quando verificasse que o carteiro tentava a entrega de uma carta registada com AR, nem levantar o aviso postal do qual consta expressamente o remetente – DGCI à data dos factos.

X. Pelo exposto, colhe-se que a AT observou todas as diligências legalmente determinadas, no que à notificação da recorrida diz respeito, sendo certo que, de acordo com a lei, nenhum outro comportamento era exigível à AT para a devida e correta notificação, nos termos do disposto nos artigos 38.º e 39.º do CPPT.

Y. Assim sendo, no modesto entendimento da Fazenda Pública – e salvo sempre melhor entendimento –, o Ilustre Tribunal recorrido, ao não considerar a recorrida notificada da liquidação oficiosa de SISA, incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito, fazendo uma errada interpretação do disposto no artigo 39.º n.ºs 3 a 6 do CPPT.

TERMOS EM QUE, CONCEDENDO-SE PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, DEVE A DOUTA SENTENÇA, ORA RECORRIDA, SER REVOGADA, ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA!”.

A Recorrida apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões:

I As presentes contra-alegações têm como referência as alegações e conclusões do recurso interposto pela Exma. Representante da Fazenda Pública, da sentença datada de 05.03.2019, proferida nos autos que correm seus termos sob o n.º 631/10.0BELRS, da 1ª Unidade Orgânica do Tribunal Tributário de Lisboa, a qual julgou procedente a ação aí instaurada, determinando, em sua consequência, a extinção do presente processo de execução fiscal nos termos da alínea i), do n.º 1, do artigo 204.º, do CPPT, por falta de notificação à Oponente/Recorrida da liquidação que está na origem da dívida exequenda.

II - A Fazenda Pública coloca em causa a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo apresentando dois argumentos, um quanto à matéria de facto e outro quanto à matéria de direito:

- Considera a RFP que, se mostra de extrema relevância para a decisão dos presentes autos, a notificação, efetuada em 14.10.2003, à Oponente, do relatório de inspeção, uma vez que, através do mesmo, a ora Recorrida teria conhecimento de que iria ser, num curto prazo, notificada da liquidação de SISA resultante da inspeção levada a cabo pelos serviços de inspeção tributária;

- Entende, ainda, a RFP que a AT observou todas as diligências legalmente determinadas, no que à notificação da Recorrida diz respeito, devendo a mesma considerar-se validamente notificada da mencionada liquidação.

III - Ora, não é o facto da Recorrida ter sido notificada, em 14.10.2003, do relatório de inspeção levado a cabo pelos serviços de inspeção tributária, do qual resultaram as correções em sede de SISA que deram origem à liquidação oficiosa em crise nos autos, que exonera a AT de promover pela válida notificação das mesmas à Recorrida.

IV - O relatório de inspeção é apenas uma das fases do procedimento levado a cabo pelos serviços de inspeção tributária, do qual resulta o ato de liquidação sindicável judicialmente. Este ato final de liquidação tem, impreterivelmente, de chegar ao efetivo conhecimento do destinatário ou à sua esfera de cognoscibilidade, mediante notificação para o efeito, caso contrário seria o procedimento de liquidação e cobrança um procedimento ilegal, inconstitucional e inacessível com o inerente esvaziamento jurídico-constitucional do direito à notificação por parte dos administrados/contribuintes.

V - No direito público e mormente no direito fiscal a notificação adquire a relevância de princípio essencial no procedimento administrativo, como direito e garantia dos administrados ex vi do disposto no artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa, prevendo o n.º 3 do citado artigo, que os atos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados na forma prevista na lei, assim impondo à Administração um dever de dar conhecimento aos mesmos, mediante uma comunicação oficial e formal, do teor dos atos praticados, comunicação essa que deve incluir também a própria fundamentação do ato que do mesmo faz parte integrante.

VI - A liquidação só produz efeitos em relação ao contribuinte, a partir do momento em que lhe é validamente notificada e, como bem sabe a Recorrente, o n.º 3 do artigo 268.º da CRP, bem como os artigos 11.º, n.º 6 da LGT e o artigo 36.º, n.º 1 do CPPT, exigem a notificação ao contribuinte de todos os atos em matéria tributária que afetem os direitos e interesses legítimos dos mesmos, designadamente, dos atos de liquidação de impostos, fazendo depender da notificação a produção de efeitos em relação a estes.

VII - Não é pelo facto de constar do relatório de inspeção tributária, levado a cabo pelos serviços de inspeção tributária, a informação: "A(s) liquidaçõo(ões) associada(s) a esta(s) correcçõo(ões) será(õo), a breve prazo, notificada(s) pelos serviços competentes com a indicação dos prazos e meios de defesa contra a liquidação", que se considera que o acto tributário chegou ao efectivo conhecimento da Recorrida e, que a mesma havia sido notificada validamente, pois, não é a menção do aludido relatório que coloca o acto de liquidação na esfera do contribuinte/Recorrida.

VIII- Assim, não pode a RFP considerar que a douta decisão recorrida fez uma incorreta eleição e apreciação da matéria de facto relevante para os autos, na medida em que a notificação, efetuada em 14.10.2013, à Oponente, do relatório de inspeção, não releva em nada para a decisão da causa, quer porque, como bem refere o Tribunal a quo: " (...) apresenta-se como única questão a decidir na presente pronúncia a de saber se a Oponente se deve ou não considerar notificada da liquidação da qual emerge a dívida exequenda nos presentes autos executivos", quer porque é a notificação do ato tributário que leva o mesmo ao conhecimento efetivo do contribuinte, e não a notificação do dito relatório.

IX - Por outro lado, e, salvo melhor entendimento, bem andou a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, ao concluir que, nos presentes autos, não se deu como provado que foi deixado aviso na caixa postal da Recorrida, não podendo a presunção de notificação constante no n.º 6 do artigo 39.º do CPPT operar.

X - É entendimento pacífico quer na doutrina, quer na jurisprudência que a aludida presunção só opera em duas situações:

- Recusa do destinatário em receber a carta;

- Não levantamento da carta no prazo previsto no regulamento dos serviços postais sem que se comprove que, entretanto, o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio fiscal.

se comprove que, entretanto, o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio fiscal.

XI - Em face da matéria de facto presente nos autos, há que concluir que não se prova qualquer recusa de recebimento da primeira ou da segunda carta, nem se prova, igualmente, que tenha sido deixado por parte do distribuidor do serviço postal na caixa postal da Recorrida o aviso indicativo de que a carta onde constava a notificação da liquidação se encontrava na estação de correios, onde podia ser levantada.

XII - Segundo o modelo oficial de carta registada e de aviso de receção aprovado e, sendo aplicável às notificações pessoais as regras da citação pessoal, ex vi do disposto nos artigos 38.º n.º 6,191.º e 192.º, todos do CPPT, o verso do envelope da segunda notificação enviada à Recorrida havia de se encontrar preenchido na parte inferior direita nele prevista, onde se declara que se deixou o aviso para o destinatário proceder ao levantamento do mesmo na estação de CTT indicada para o efeito, menção essa que não consta de qualquer documento junto aos autos.

XIII - Considera a Recorrida, que a informação - "Não atendeu..." e "Devolução...Não reclamado" - evidenciada nos motivos de devolução das presentes cartas, não faz prova que o aludido aviso tenha sido deixado no seu recetáculo postal, nem tampouco pode ser entendida como indiciadora que tal tivesse ocorrido, na medida em que a AT não logrou carrear aos autos quaisquer esclarecimentos/informações/documentos que, com razoável margem de segurança, permitissem concluir que a notificação foi validamente efetuada, por força da presunção em apreço nos autos.

XIV- Aliás, por forma a afastar o funcionamento da presunção prevista no n.º 6 do artigo 39.º do CPPT, não é necessário provar que não foi deixado o dito aviso na caixa postal da Recorrida, sendo bastante a ausência de informação e argumentação nos presentes autos, para apurar que inexiste qualquer "aviso para levantamento da carta" e, assim, não ser possível sustentar a efetiva notificação da liquidação em análise.

XV - Em boa verdade, não consta da documentação junta aos autos que o verso do envelope da segunda notificação enviada à Recorrida se encontre preenchido por parte do distribuidor do serviço postal, e que este tenha declarado que foi deixado o aviso para a Recorrida proceder ao seu levantamento junto da estação de CTT indicada para o efeito.

conhecido), se pode inferir que a notificação foi efetuada (facto presumido).

XVII - Ora, tendo sido dado como não provado que o aviso não havia sido deixado no recetáculo postal da Recorrida, nunca se poderá afirmar que a mesma não diligenciou pelo levantamento do mesmo, na medida em que este nem sequer constava da sua caixa postal, conforme se apura da factualidade presente nos autos.

XVIII- Afastada a presunção, é sobre a AT que recai o ónus de demonstrar que o aviso havia chegado ao conhecimento da Recorrida, provando que promoveu pela correta efetivação da notificação da liquidação em apreço, conforme dispõe o n.9 2 do artigo 43.º do CPPT.

XIX - Além de que, não pode esquecer-se a Recorrente que a falta de notificação é um facto negativo e que, por isso, a Recorrida não dispunha de qualquer documento suscetível de fazer a prova do alegado, o que significa que deve ser a AT a apresentar os documentos comprovativos da notificação, in casu, do aviso para levantamento na estação dos correios, podendo fazê-lo, solicitando aos CTT tal informação, o que não logrou obter e juntar aos presentes autos.

XX - Sendo certo que a AT apenas logrou provar a emissão das cartas contendo os atos de liquidação e a sua apresentação a registo nos CTT, mas não que aquelas tenham chegado ao efetivo conhecimento da Recorrida ou à sua esfera de cognoscibilidade, nem tampouco resulta dos autos qualquer garantia mínima e razoável de segurança e fiabilidade de que as ditas notificações haviam chegado à esfera da Recorrida.

XXI - Só assim se justifica que para validar uma "fictícia" notificação, a Recorrente tenha utilizado o argumento vazio e sem sentido, que é a notificação, em 14.10.2003, do relatório de inspeção, o qual, claramente, não é, nem nunca foi o meio de notificação dos atos de liquidação.

XXII - Em síntese, a remessa da correspondência que notifica o contribuinte da liquidação constitui um ónus da AT, sendo que a matéria de notificações de atos tributários, enquanto atos administrativos, contende com direitos e garantias constitucionalmente assegurados aos contribuintes, e, por conseguinte, deve resultar inequivocamente provada a efetivação da notificação, o que não sucede no caso dos autos.

XXIII - Por todo o supra exposto, dúvidas não restam que:

(i) o ónus de demonstrar a correta efetivação da notificação cabe à Administração Tributária;

(ii) a AT não logrou provar que o aviso foi colocado na caixa postal da Recorrida e, por conseguinte;

(iii) não logrou provar que a Recorrida teve a oportunidade de tomar conhecimento da liquidação adicional de SISA;

Pelo que outra conclusão não haverá, se não a que a Administração Tributária não notificou a Recorrida da dita liquidação.

XXIV - Porquanto, bem andou a douta sentença ao concluir que tendo em consideração que nos presentes autos se deu como não provado, nos termos indicados na respectiva motivação, que fora deixado aviso na caixa postal da Oponente dando a informação que as cartas contendo a notificação da liquidação da qual emerge a dívida exequenda é de se concluir, (...) que a presunção de notificação (...) não poderá operar, visto que em nenhuma das notificações enviadas sob registo e com aviso de recepção se apurou que tivesse sido deixado na caixa postal da Oponente aviso indicando que as referidas cartas poderiam ser levantadas na estação de correios respectiva. E não podendo operar a presunção da notificação, (...) outra solução não resta se não declarar que a Oponente não foi notificada da liquidação da qual emergiu a dívida exequenda nos presentes autos executivos."

XXV - Pelo que, outra solução não resta se não julgar procedente a oposição nos termos requeridos e consequentemente a extinção da presente execução fiscal, nos termos da al. i) do n.2 1 do artigo 204.2 do CPPT, com fundamento na inexigibilidade da dívida, por falta de notificação da liquidação adicional de SISA, que nunca entrou por qualquer meio na esfera de cognoscibilidade da Executada/Recorrida.

Nestes termos e nos mais de direito que V.Exas. doutamente suprirão, deverá ser negado provimento ao presente recurso e, em sua consequência, manter-se plenamente válida na ordem jurídica a sentença recorrida, assim fazendo V.Exas. a costumada

Justiça!”.

Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do então art.º 289.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT) vem o processo à conferência.

São as seguintes as questões a decidir:
a) Há erro na decisão proferida sobre a matéria de facto?
b) Verifica-se erro de julgamento, na medida em que a notificação efetuada produziu os seus efeitos?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“1. Com data de 05/05/2008 foi emitida pelo Serviço de Finanças de Lisboa – 10 a certidão de dívida n.º ….., no valor de 40.181,22€, em que consta como devedora a Opoente – cfr. fls. 2 do processo de execução fiscal junto aos presentes autos.

2. A certidão de dívida referida em 1. deu origem ao processo de execução fiscal n.º ….. – cfr. fls. 1 do processo de execução fiscal junto aos presentes autos.

3. A Opoente foi citada para o processo de execução fiscal referido em 2. através da afixação da citação na porta do seu domicílio fiscal em 26/04/2008 – cfr. fls. 9 a 12 do processo de execução fiscal e doc. n.º 1 junto com a petição inicial a fls. 15 a 18 dos presentes autos.

4. Com data de 01/08/2006 foi remetida, sob registo e com aviso de recepção, pelo Serviço de Finanças de Lisboa – 10 à Opoente a notificação da liquidação oficiosa de SISA identificada sob o n.º …..– cfr. doc. junto a fls. 41 e 42 dos presentes autos.

5. O aviso de recepção referido em 4. foi devolvido pelos serviços postais sem se mostrar assinado – cfr. doc. junto a fls. 42v dos presentes autos.

6. No envelope em que foi remetida a notificação referida em 4. foi aposta pelo distribuidor do serviço postal a informação “Não atendeu… Data: 06/08/07…” –cfr. doc. junto a fls. 42 dos presentes autos.

7. No envelope em que foi remetida a notificação referida em 5. foi aposta, em 17/08/2006, pelo distribuidor do serviço postal a informação: “Devolução…Não reclamado” – cfr. doc. junto a fls. 42 dos presentes autos.

8. Com data de 22/08/2006 foi remetida, sob registo e com aviso de recepção, pelo Serviço de Finanças de Lisboa – 10 à Opoente 2ª notificação da liquidação oficiosa de SISA identificada sob o n.º ….. – cfr. docs. juntos a fls. 45v a 47 dos presentes autos.

9. No envelope em que foi remetida a notificação referida em 8. foi aposta pelo distribuidor do serviço postal a informação “Não atendeu… Data: 06/08/24…” –cfr. doc. junto a fls. 46vdos presentes autos.

10. No envelope em que foi remetida a notificação referida em 8. foi aposta, em 04/09/2006, pelo distribuidor do serviço postal a informação: “Devolução…Não reclamado” – cfr. doc. junto a fls. 46v dos presentes autos.

11. O aviso de recepção referido em 8. foi devolvido pelos serviços postais sem se mostrar assinado – cfr. doc. junto a fls. 47 dos presentes autos”.

II.B. Relativamente aos factos não provados, refere-se na sentença recorrida:

“Com relevância para a pronúncia a emitir nos presentes autos dão-se como não provados os seguintes factos:

a. Pelo distribuidor do serviço postal foi deixado aviso na caixa de correio do domicílio fiscal da Opoente que desse conta de que a carta referida em 4. dos factos provados se encontrava na estação de correios para ser levantada.

b. Pelo distribuidor do serviço postal foi deixado aviso na caixa de correio do domicílio fiscal da Opoente que desse conta de que a carta referida em 8. dos factos provados se encontrava na estação de correios para ser levantada”.

II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“A decisão da matéria de facto, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes dos autos e no PA apenso, referidos em cada uma das alíneas do elenco dos factos provados, os quais não foram impugnados, merecendo a credibilidade do tribunal, em conjugação com o princípio da livre apreciação da prova.

Quanto aos factos não provados, os mesmos assim se deram em virtude da total ausência de prova que atestasse a sua existência”.

II.D. Atento o disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, acorda-se alterar a redação de parte da factualidade mencionada em II.A., em virtude de resultarem dos autos elementos documentais que exigem tal alteração[1].

Nesse seguimento, passa a ser a seguinte a redação dos factos 6., 7. e 9., referidos em II.A.:

6. O envelope em que foi remetida a notificação referida em 4. foi devolvido ao remetente e nele foram apostas pelo distribuidor do serviço postal as seguintes menções:

a) “Não atendeu”;

b) “Avisado // Não entregue no domicílio // Hora 10:30 // Data: 06/08/07…”;

c) “Avisado na Estação de Correios de Lumiar” – cfr. doc. junto a fls. 42 dos presentes autos.

7. No envelope em que foi remetida a notificação referida em 4. foi aposta, em 17/08/2006, pelo distribuidor do serviço postal a informação: “Devolução…Não reclamado” – cfr. doc. junto a fls. 42 dos presentes autos.

9. O envelope em que foi remetida a notificação referida em 8. foi devolvido ao remetente e nele foram apostas pelo distribuidor do serviço postal as seguintes menções:

a) “Não atendeu”;

b) “Avisado // Não entregue no domicílio // Hora 11:30 // Data: 06/08/24…”;

c) “Avisado na Estação de Correios de Lumiar” – cfr. doc. junto a fls. 46v dos presentes autos.

Face a esta alteração efetuada, eliminam-se os factos não provados, porque contraditórios com a mesma.

II.E. Atento o disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, acorda-se aditar o seguinte facto provado:

12. A citação mencionada em 3. e os ofícios mencionados em 4. e 8. foram remetidos para a seguinte morada: R….. Lisboa, correspondente ao domicílio fiscal da Oponente (cfr. fls. 41, 45 verso, 52 e 67 dos autos em suporte de papel).

II.F. Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto

Considera a Recorrente que o Tribunal a quo errou o seu julgamento, no tocante à decisão proferida sobre a matéria de facto, entendendo que deveriam ter sido dados como provados, atenta a prova documental junta aos autos, os seguintes factos:

i) Na sequência de uma ação inspetiva efetuada à oponente foi detetado, conforme auto de notícia e RIT juntos aos autos, que aquela não procedeu ao pagamento da SISA devida pela cedência da posição contratual, de acordo com o artigo 2º, § 2º do CIMSISSD, pelo que foram efetuadas correções em sede de SISA, que deram origem à liquidação em crise nos autos;

ii) A oponente foi notificada em 14.10.2003 do relatório de inspeção através de carta registada com AR assinado, do qual constava expressamente que “A(s) liquidação(ões) associada(s) a esta(s) correção(ões) será(ão), a breve prazo, notificada(s) pelos serviços competentes com a indicação dos prazos e meios de defesa contra a liquidação”.

Vejamos.

Considerando o disposto no art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão[2].

Assim, o regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC];
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. c), do CPC].

Como tal, não basta ao Recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo­‑se-lhe os ónus já mencionados[3].

Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se que foram, de forma que se entende suficiente, cumpridos os referidos ónus.

Estando cumpridas as exigências constantes do art.º 640.º do CPC, cumpre apreciar.

Desde já se refira que nem todos os factos alegados pelas partes, ainda que provados, carecem de integrar a decisão atinente à matéria de facto, porquanto apenas são de considerar os factos cuja prova (ou não prova) seja relevante face às várias soluções plausíveis de direito.

Ora, tal é o caso dos autos. Com efeito, é irrelevante para a apreciação dos presentes autos a circunstância de, na sequência de ação inspetiva, a Recorrida ter sido informada de que iria ser notificada das liquidações. O que releva é se foi ou não notificada dos atos de liquidação.

Como tal, indefere-se o aditamento requerido.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Do erro de julgamento

Considera a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, em virtude de se considerar a Oponente validamente notificada.

Vejamos.

A falta de notificação da liquidação constitui fundamento de oposição, enquadrável na alínea i) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT [cfr., por todos, o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, do Supremo Tribunal Administrativo, de 18.09.2013 (Processo: 0578/13)].

In casu, a administração tributária (AT) procedeu à remessa de ofícios com vista a notificar a Recorrida da liquidação que consubstancia a dívida exequenda, através de carta registada com aviso de receção (AR).

O que cumpre, pois, aferir é se todos os formalismos inerentes a este tipo de notificação foram respeitados, por forma a considerar-se a notificação perfeita.

Vejamos então.

Nos termos do art.º 39.º do CPPT, na redação então em vigor:

“5 - Em caso de o aviso de receção ser devolvido ou não vier assinado por o destinatário se ter recusado a recebê-lo ou não o ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se comprovar que entretanto o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio fiscal, a notificação será efetuada nos 15 dias seguintes à devolução por nova carta registada com aviso de receção, presumindo-se a notificação se a carta não tiver sido recebida ou levantada, sem prejuízo de o notificando poder provar justo impedimento ou a impossibilidade de comunicação da mudança de residência no prazo legal.

6 - No caso da recusa de recebimento ou não levantamento da carta, previstos no número anterior, a notificação presume-se feita no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil”.

O que está ora em discussão é o alcance dos n.ºs 5 e 6 deste art.º 39.º.

Como referido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 03.05.2018 (Processo: 032/18):

“No caso de o A/R ser devolvido ou se o mesmo não vier assinado por o destinatário se ter recusado a recebê-lo ou não o ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se comprovar que entretanto o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio fiscal, a notificação será efectuada nos 15 dias seguintes à devolução, por nova carta registada com A/R, presumindo-se a notificação se a carta não tiver sido recebida ou levantada, sem prejuízo de o notificando poder provar justo impedimento ou a impossibilidade de comunicação de mudança de residência no prazo legal.

E nestes casos de recusa de recebimento ou não levantamento da carta, a notificação presume-se feita no 3° dia útil posterior ao do registo.

Esta presunção de notificação só opera, portanto, nas duas referidas situações: (i) no caso de o destinatário se recusar a receber a notificação; (ii) no caso de não levantamento da carta (remetida para a notificação) no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se provar que, entretanto, o contribuinte comunicou à AT a alteração do seu domicílio fiscal (…).

(…) [R]elativamente à situação de não levantamento da carta, também Jorge Lopes de Sousa pondera o seguinte: (Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª ed., Vol. I, anotação 8 ao art. 39º, p. 386.)
«
Nesta perspectiva, o funcionamento da presunção referida dependerá, cumulativamente de

— ter sido deixado um aviso na residência do destinatário conhecida da administração tributária de que a carta com a notificação podia ser levantada;

— não se comprovar que, entretanto, o contribuinte comunicara à administração tributária a alteração da sua residência.

 Assim, conjugando estas situações com as formas admitidas de ilidir a presunção constata-se que a presunção de notificação deixa de valer quando se demonstrar

— que não foi deixado aviso para levantamento da carta;

— que, tendo sido deixado tal aviso, houve qualquer facto que obstou a que o destinatário fosse levantar a carta (justo impedimento);

— que o destinatário tinha mudado de residência e tinha já feito a comunicação da alteração à administração tributária;

— que o destinatário tinha mudado de residência há menos de 20 dias (prazo que lhe é concedido para comunicar a alteração de domicílio, no n° 1 do art. 43° do CPPT);

— que o destinatário tinha mudado de residência e provar que não pôde fazer tal comunicação no prazo referido.

Correlativamente, a presunção só valerá nos seguintes casos:

— quando tiver sido deixado aviso e não houver qualquer justo impedimento ao levantamento da carta;

— quando o destinatário tiver mudado de domicílio há mais de 20 dias e não tiver feito comunicação da alteração à administração tributária nem tenha estado impossibilitado de o fazer.»”.

Feito este breve enquadramento e atenta a matéria de facto provada, resulta que:
a) A 01.08.2006, foi remetido ofício registado com AR à Oponente, para o seu domicílio fiscal, visando a notificação da liquidação da Sisa;
b) A notificação em causa foi devolvida ao remetente, sendo que o AR foi devolvido sem estar assinado e os serviços postais apuseram no sobrescrito diversas menções, designadamente “não atendeu”, “avisado” e “não reclamado”;
c) Foi remetido novo ofício visando a notificação da Recorrida, a 22.08.2006, com AR e também para o seu domicílio fiscal;
d) Também esta notificação foi devolvida ao remetente, sendo que o AR foi devolvido sem estar assinado e os serviços postais apuseram no envelope, entre outras, as menções “não atendeu”, “avisado” e “não reclamado”.

Do referido art.º 39.º, n.º 5, do CPPT resulta que, no caso de notificações efetuadas via correio postal registado com AR e na circunstância de não haver levantamento dentro do prazo (e haver, pois, devolução da notificação e do AR por assinar), a notificação deve ser repetida nos 15 dias seguintes à devolução.

Tal repetição, como decorre da factualidade assente, sucedeu, dentro dos formalismos exigidos, vindo também desta vez o AR devolvido sem assinatura e tendo sido apostas no envelope (também ele devolvido ao remetente) as menções “não atendeu”, “avisado” e “não reclamado”.

O legislador consagrou, neste caso, uma presunção de notificação no caso de a carta não ter sido recebida ou levantada (cfr. n.º 6 do art.º 39.º do CPPT), presunção essa ilidível.

Imprescindível em situações como a dos autos é que, nos termos já mencionados supra, o destinatário da notificação tenha sido avisado, por parte do distribuidor de correio postal, de que a correspondência não entregue por ausência na residência está disponível para levantamento.

Ora, in casu, resulta provado, ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo e do que defende a Recorrida, que esta foi avisada pelo distribuidor dos serviços postais, como expressamente decorre dos envelopes devolvidos, nos quais consta que a Recorrida foi avisada para levantamento de toda a correspondência na estação de correios do Lumiar. Ademais, as notificações foram remetidas para o domicílio fiscal da Oponente.

Sublinhe-se a este respeito que carece de pertinência o alegado pela Recorrida, em termos de modelo de notificação previsto na Portaria n.º 953/2003, de 9 de setembro, dado que tal respeita a modelos de citação e notificação feitos no âmbito de processos judiciais e não em procedimentos administrativos e/ou tributários (onde se enquadram os procedimentos de liquidação).

Por outro lado, a Recorrida nunca alegou qualquer factualidade de permita afastar a presunção de notificação, sendo seu o ónus, como resulta do n.º 6 do art.º 39.º do CPPT.

Assim, funcionando a presunção de notificação consagrada no art.º 39.º, n.º 6, do CPPT e não tendo a mesma sido ilidida, a oponente considera-se validamente notificada, assistindo, pois, razão à Recorrente.

Como tal, carece de apreciação os demais argumentos aventados pela FP.

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:
a) Conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida, julgando-se improcedente a oposição e determinando-se o prosseguimento dos autos de execução fiscal nos seus normais termos;
b) Custas pela Recorrida em ambas as instâncias;
c) Registe e notifique.


Lisboa, 24 de junho de 2021


[A relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Senhores Desembargadores António Patkoczy e Mário Rebelo]

Tânia Meireles da Cunha


__________
[1] Cfr. António dos Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2018, p. 286.
[2] Cfr. António dos Santos Abrantes Geraldes, ob. cit., p. 169.
[3] V., a título exemplificativo, o Acórdão deste TCAS, de 27.04.2017 (Processo: 638/09.0BESNT) e ampla doutrina e jurisprudência no mesmo mencionada.