Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:22/08.3BECTB
Secção:CT
Data do Acordão:10/22/2020
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:OPOSIÇÃO,
PRESCRIÇÃO
Sumário:I. Sendo aplicável o prazo de prescrição previsto na LGT, face à regra do art. 297.º, n.º 1 do Código Civil, cujo termo inicial ocorre, necessariamente, em 1 de Janeiro de 1999, e decorrendo, assim, todo o prazo prescricional na vigência da LGT, será esta lei a regular os efeitos dos factos interruptivos e suspensivos da prescrição, como decorre do n.º 2 do art. 12.º do Código Civil;
II. Por conseguinte, os atos interruptivos anteriores a que a LGT não reconheça esse efeito – como é o caso da instauração da execução fiscal – não produzem efeitos sobre a contagem deste novo prazo de prescrição iniciado na referida data.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco que julgou procedente a oposição deduzida por J..... no âmbito do processo de execução fiscal n.° 127…… e apensos, que contra si reverteu, na qualidade de responsável subsidiário, por dívidas de IVA, dos anos de 1991 e 1992, da devedora originária “J..... & F.....Lda”.

A recorrente apresentou as suas alegações e formulou as seguintes conclusões:
«a) Foram violados o artigo 180° do CPPT, o artigo 34/3 do CPT e o actual artigo 49° da LGT, 255° do CPT e o actual artigo 169° do CPPT, o artigo 29° do Código dos Processo Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência e o actual artigo 100° do CIRE e os artigos 326° e 327°, ambos do Código Civil
b) Desde logo se chama à colação o douto Acórdão n° 04899/11, de 27/09/2011, do TCA Sul, que teve como objecto dívidas à segurança social, da originária devedora sociedade comercial “J....., Lda.”, do período temporal de Dezembro/1993 e dos anos de 1994 a 1996, também objecto de reversão - proferido na sequência do recurso interposto pelo fazenda no processo de oposição n° 658/07.OBECTB que correu termos no TAF Castelo Branco -, Acórdão nos termos do qual e na parte directamente concernente aos autos em apreço, “...Antes de mais, importa desde já referir que o disposto no n° 3 do art. 48 da LGT não tem aplicação na situação em apreço e que os autos não contêm elementos suficientes para que se possa concluir pela prescrição das dívidas em causa, sendo que ela se possa ter verificado se os autos de falência ou de execução estiveram parados durante mais de um ano antes dos cinco anteriores à data da citação ocorrida em 17.09.2007 (nos presentes autos a citação do recorrido efectuou-se em 20/09/2007) ... Estas contribuições têm natureza tributária e, por isso, é-lhes aplicável o regime do CPT, LGT e Leis 17/2000, 32/2000 e 4/2007 quanto à contagem do respectivo prazo, sendo que as alterações em matéria de definição dos requisitos da prescrição estão sujeitas às mesmas regras que regulam a alteração dos prazos como se vem entendendo, maioritariamente, na doutrina e na jurisprudência. A lei reguladora do regime de prescrição das dívidas tributárias é a que vigorar à data da sua constituição e, potencialmente, nas dívidas em causa, serão aplicáveis, para o efeito, as regras sobre prescrição contidas nos art. 34° do CPT e 48 e 49 da LGT ... dado que, relativamente a essas dívidas, até hoje, já se sucederam os regimes de prescrição constantes desses diplomas, sendo o regime do CPT o vigente desde 1.7.91 a 1.1.99 e o da LGT desde 1.1.99....”
c) Continuando mais à frente o douto Acórdão, e por ser de aplicação às presentes dívidas em virtude das vicissitudes serem as mesmas, “...Na situação em apreço temos que, quanto às dívidas dos anos de 1993 a 1996, nos termos do art. 34 do CPT, o prazo de prescrição das de 1993 iniciou-se em 1.1.1994, das de 1994 em 1.1.1995, das de 1995 em 1.1.1996 e das de 1996 em 1.1.1997. Relativamente a essas dívidas o Io acto interruptivo foi a instauração das execuções e posteriormente ocorreu outro acto interruptivo em 17.9.2007 com a citação do oponente ora recorrido”.
d) Prosseguindo o douto Acórdão, “Já quanto à interrupção da prescrição dispõe-se no n° 3 do art. 48 da LGT que a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efectuada após o 5o ano posterior ao da liquidação. Com base nisto entendeu-se na decisão recorrida que por o devedor subsidiário só ter sido citado em 17.9.2007, muito para além do 5o ano posterior ao da liquidação, a interrupção da prescrição em relação ao devedor principal (com a instauração da execução) não produzia efeitos em relação ao subsidiário e daí se concluir pela prescrição das dívidas. No anterior CPT não se continha qualquer regra sobre esta matéria, mas vinha-se entendendo na jurisprudência que a interrupção da prescrição em relação ao devedor principal interrompia a prescrição em relação ao devedor subsidiário. Como refere Jorge Lopes de Sousa in Notas sobre prescrição, na aplicação no tempo do novo regime, deverá ter-se em conta o momento em que se produziram os factos com efeito interruptivo ... No caso em apreço, dado que o facto interruptivo da prescrição em relação ao devedor principal ocorreu na vigência do CPT, não se pode aplicar o n° 3 do art. 48 da LGT, pelo que a interrupção da prescrição em relação ao devedor principal produz efeitos também relativamente ao devedor subsidiário, não se verificando, pois, a prescrição das dívidas nos termos do decidido”.
e) Assim, nos termos do douto Acórdão, “Interrompida a prescrição com a instauração da execução, o prazo de prescrição só volta a correr se o processo estiver parado durante mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte somando-se nesse caso o tempo decorrido após o ano de paragem ao que decorreu desde o início do prazo até à autuação da execução. Resulta dos autos que as execuções foram apensadas ao processo de falência nos termos do art. 264° do CPT sem que antes tivessem estado paradas durante mais de um ano. Não consta dos autos qualquer paragem do processo de falência durante mais de um ano, mas também não consta quando findou o processo de falência sendo que os processos de execução deveriam ter sido devolvidos no prazo de oito dias a seguir à cessação da falência como resulta do n° 4 do art. 180° do CPPT. O processo de falência não interrompeu nem suspendeu o prazo de prescrição, pelo que só a paragem do processo durante mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte é que faria que voltasse a correr o prazo de prescrição. Importa, por isso, apurar das vissicitudes do processo de falência e se ele esteve parado durante mais de um ano e em que data para daí se apurar se se verifica ou não a prescrição das dívidas, sendo que dos elementos dos autos se pode já concluir com segurança que não decorreu o prazo de prescrição de dez anos previsto nos artigos 14° do DL 103/80 e 53° da Lei n° 28/84, mas poderá ter decorrido o prazo de 5 anos previsto no n° 2 do artigo 63° da Lei 17/2000, a partir da entrada em vigor desta lei em 5.2.2001 se o processo esteve parado por mais de um ano até 15.9.2002, o que importa averiguar para se decidir da invocada prescrição das dívidas ...”, decidindo o tribunal “ad quem” anular a decisão recorrida com devolução dos autos à Ia instância para apuramento da factualidade pertinente.
f) Na sequência do douto Acórdão supra, e após ser proferida segunda sentença a declarar novamente a prescrição da dívida exequenda - sentença proferida no processo de oposição n° 658/07.0BECTB -, a fazenda pública não conseguiu determinar se o tribunal “a quo” indagou no sentido de ser oficiado ao Tribunal Judicial de Seia a solicitar que informe se o Processo de Falência n° 86/1999, que correu termos no 2.º Juízo, esteve parado ininterruptamente por mais de um ano desde 05/02/2001 até 15/09/2002. Sendo certo que no ponto 7 daquela sentença, nos “factos provados”, é evidenciado que “...na sequência da pendência do processo que correu termos no Tribunal Judicial de Seia como autos de recuperação de empresa e de falência da sociedade devedora foram os autos de execução fiscal avocados ao mesmo, o que sucedeu em 27/03/1995. Por sentença de 22/10/1999 é decretada a falência da executada, transitada em julgado em 25/05/2000... Q processo de falência da executada originária não esteve parado por facto não imputável à mesma no período decorrente entre 05/02/2001 e 15/09/2002 (sublinhado nosso). Somente em 16/12/2004 foram os autos de execução devolvidos ao serviço de finanças depois de decorridas todas as vicissitudes processuais do processo de falência sem que os créditos em questão fossem satisfeitos, a solicitação do órgão de execução fiscal e para prosseguimento de tais processos”.
g) E, embora nos factos dados como provados da douta sentença supra - como já referido, proferida na Oposição n° 658/07.0BECTB conste que "o processo de falência da executada originária não esteve parado por facto não imputável à mesma no período decorrente entre 05/02/2001 e 15/09/2002”. o tribunal “a quo” não concluiu no sentido de que as dívidas em causa nos autos não se encontram prescritas, a conclusão a que necessariamente teria de chegar nos termos do douto Acórdão n° 04899/11 supra, em virtude dos autos de execução fiscal não terem estado parados durante mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, uma vez que, avocados ao processo que correu termos no Tribunal Judicial de Seia como autos de recuperação de empresa e de falência da sociedade devedora, com o n° 86/1999, com ele seguiram a sua normal tramitação, não se tendo verificado a paragem do processo de falência durante mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte.
h) De facto, conforme análise efectuada ao processo de recuperação e falência da originária devedora constatou-se que o processo de falência, até pelo menos 02/03/2004, nunca esteve parado durante mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte.
i) Temos, pois, que interrompendo-se o prazo de prescrição com a instauração do processo de execução fiscal em 11/06/1993 e citação da originária devedora, respectivamente, em 15/06/1993 e 06/07/1993, e correndo normalmente sem que estejam parados por período superior a um ano até 27/03/1995 - uma vez que em 19/10/1993 é interposto pela originária devedora processo de oposição com subsequente contestação pela fazenda pública, em 12/10/1994 a originária devedora faz o pedido de pagamento em prestações ao abrigo do D.L. n° 225/94, de 05/09 (Plano Catroga), inferido em 04/07/1995 e notificado em 07/07/1995 - sendo nesta data, 27/03/1995, avocados aos autos de recuperação de empresa que degenerou em falência da sociedade devedora, com o n° 86/99, com ele seguiram a sua normal tramitação, não se tendo verificado a paragem do processo de falência durante mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte pelo menos até 02/03/2004, devolvido este ao serviço de finanças em 16/12/2004, aquando da citação da reversão das dívidas contra o executado/oponente ora recorrido em 17/09/2007 (interrompendo a prescrição), não tinham ainda decorrido os 10 anos do prazo prescricional previsto no artigo 34° do CPT ou os 8 anos previstos no artigo 48° da LGT, que lhe sucedeu.
j) Interrupção que nos termos do antigo artigo 34° do CPT vem eliminar todo o tempo decorrido anteriormente, reiniciando-se novo prazo de contagem, sendo certo que o prazo prescricional é novamente interrompido com a citação da reversão em 17/09/2007, pelo que as dívidas em apreço não se encontram prescritas uma vez que, “Interrompido o prazo de prescrição pela citação fica inutilizado todo o prazo decorrido anteriormente (art. 326°, n° 1 do Código Civil) sendo que o novo prazo de prescrição de 8 anos previsto no n° 1 do artigo 48° da LGT não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (art. 327.°, n° 1 do Código Civil)”, cfr. por exemplo Acórdão do TCA Sul proferido no Processo n° 07038/13, de 04/02/2016, ou Acórdão do TCA Sul proferido no Processo n° 06464/13, de 03/03/2016, ou Acórdão do TCA Sul proferido no Processo n° 06446/13, de 18/06/2015, ou Acórdão do TCA Sul proferido no Processo n° 08542/15, de 19/03/2015, ou Acórdão do STA, datado de 27/01/2016, proferido no processo n° 01698/15, ou Acórdão do STA, datado de 07/01/2016, proferido no processo n° 01564/15.
k) As dívidas ora em causa não se encontram, pois, prescritas, não tendo ainda começado a correr o prazo de prescrição de oito anos, encontrando-se os processos de execução fiscal a correr termos.
l) No que se refere aos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida, eles constam dos documentos instrutórios juntos pela fazenda pública e pelo ora recorrido e da douta sentença.
Pelo que, com o mais que Vossas Excelências se dignarão suprir, deve ser dado provimento ao recurso e em consequência ser revogada a decisão recorrida.»

O recorrido J....., devidamente notificado para o efeito, apresentou as suas contra-alegações, tendo formulado as conclusões seguintes:
«1. A FP usa como seu único fundamento um acórdão que não foi a decisão final do processo em que foi proferido.
2. Nesses autos a prescrição veio a ser reconhecida.
3. A FP sabia disso e omitiu esse facto.
4. Por outro lado, a FP não impugnou a matéria de facto, nomeadamente os factos provados G) e M) da Douta Sentença.
5. Pelo que os argumentos usados naquele acórdão invocado pela FP não se aplicam nestes autos, uma vez que nestes autos, ao contrário daquele acórdão, se provou a verificação da paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, o que faz com que todas as citações efetuadas sejam aqui inaplicáveis.
6. Pelo que se deverá manter a Douta Sentença, que no merece reparo.
7. E bem assim deve a conduta da FP ser analisado, quanto mais seja, ao nível das custas processuais. 
Termos em que
Mantendo a decisão recorrida,
V. Ex.as, farão JUSTIÇA.»
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O Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

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A questão invocada pela recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir, consiste em aferir se a sentença enferma de erro de julgamento de facto e de direito, na medida em que entende que a dívida exequenda não se encontra prescrita.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

“A) Através da Ap. 03/820315, da Conservatória do Registo Comercial de Seia, foi registado o contrato de sociedade da “ J……. & F… Lda.” [cf. fls. 96 a 104 dos autos].
B) Em 31/12/1991 foram designados gerentes os sócios J....., J....., A....., J..... (ora oponente), J..... e L....., obrigando-se a sociedade com a assinatura de dois gerentes [cf. fls. 96 a 104 dos autos].
C) Em 11/06/1993, na Repartição de Finanças de Seia foi instaurado, contra a sociedade “J……, Lda.”, o processo de execução fiscal (PEF) n.° 12….., por dívidas de IVA e juros compensatórios, relativa ao período de Abril de 1992, pela quantia exequenda de 8.047.426$00 [cf. fls. 12 a 14 dos autos].
D) Em 15/06/1993, a sociedade executada foi citada no PEF n.° 1279- 93/100420.4 [cf. fls. 75 dos autos].
E) Em 29/07/1993 foi emitido mandado de penhora no PEF n.° 1279- 93/100420.4 [cf. fls. 79 dos autos].
F) Em 29/07/1993, no âmbito do PEF n.° 127….., foram penhorados os bens móveis descritos no auto de penhora de fls. 82 frente e verso dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
G) Desde 29/07/1993, o PEF n.° 12…..esteve parado, por mais de um ano, por motivo não imputável ao contribuinte [cf. fls. 82 a 83 e 93 dos autos].
H) Em 28/03/1995, o PEF n.° 12……foi remetido ao Tribunal Judicial da Comarca de Seia para apensação ao processo especial de recuperação de empresa n.° 1/95 - 2.° Juízo, em que é requerente a sociedade executada [cf. fls. 93 dos autos].
I) Em 01/07/1993, na mesma Repartição de Finanças e contra a mesma sociedade, foi instaurado o PEF n.° 12….., por dívidas de IVA e juros compensatórios dos períodos de Setembro a Dezembro de 1991 e de Maio a Julho de 1992, pela quantia exequenda de 156.316.231$00 [cf. fls. 15 a 32 dos autos].
J) Em 06/07/1993, a sociedade executada foi citada no PEF n.° 12….. [cf. fls. 77 e 78 dos autos].
K) Em 23/09/1993 foi emitido mandado de penhora no PEF n.° 12….. [cf. fls. 80 dos autos].
L) Em 27/09/1993, no âmbito do PEF n.° 12….., foram penhorados os bens móveis descritos no auto de penhora de fls. 81 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
M) Desde 27/09/1993, o PEF n.° 12……esteve parado, por mais de um ano, por motivo não imputável ao contribuinte [cf. fls. 81 a 83 dos autos].
N) Em 28/03/1995, o PEF n.° 12……. foi remetido ao Tribunal Judicial da Comarca de Seia para apensação ao processo especial de recuperação de empresa n° 1/95 - 2.° Juízo, em que é requerente a sociedade executada [cf. fls. 90 a 91 dos autos].
O) A sociedade executada foi declarada falida, por sentença de 22/10/1999, proferida no âmbito do processo n.° 86/98, do 2.° Juízo do Tribunal Judicial de Seia.
P) Em 18/02/2005, o PEF n.° 12….. foi apensado ao PEF n.° 1279- 93/100420.4, que passou a ser o processo principal [cf. fls. 93 dos autos].
Q) Em 13/09/2007, no âmbito do PEF n.° 127…… e apensos, o Chefe do Serviço de Finanças proferiu despacho de reversão, além do mais, contra o ora oponente, e do qual se destaca o seguinte teor:
«Na sequência dos despachos constantes de fls. 482/501 foram efectuadas as competentes notificações aos responsáveis subsidiários J….. (...), dando assim cumprimento ao disposto no n° 4 do art° 23 da LGT, ou seja, a possibilidade da audição antes da reversão.
A fls. 512/639 vem os responsáveis subsidiários usar o referido direito, alegando em comum a prescrição da dívida. Individualmente alegam resumidamente o seguinte:
(...)
J....., que nunca foi gerente de facto, e que entre outros nunca participou em qualquer reunião da gerência ou assinou qualquer documento enquanto gerente, e que desconhecia a existência de dívidas.
Em face do alegado pelos responsáveis subsidiários, e de acordo com os elementos que se indicam, verifica-se o seguinte:
(...)
J....., tinha conhecimento da existência das dívidas, como se pode verificar pelo relatório de gestão do ano de 1991 atrás indicado. A sua gerência poderá ser confirmada pela assinatura do referido relatório, e ainda pela assinatura de procurações para instauração de processos de oposição, cópias juntas a fls. 702/705, bem como do cheque para pagamento do IVA do período de 9608, junto a fls. 706/707.
Face ao exposto cumpre-me decidir:
Dispõe a alínea a) do n° 2 do art ° 153° do CPPT que “o chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação da inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores.”.
A originária devedora J..... SA, não possui quaisquer bens, tendo sido declarada falida por sentença de 22 de Outubro de 1999 no processo n° 86/98 do 2° juízo do Tribunal Judicial de Seia.
(...)
Assim, porque se encontra reunida a condição referida na alínea a) do n° 2 do art° 153 do CPPT, REVERTO a presente execução nos termos da alínea b) do N.° 1 do art.° 24.° da Lei Geral Tributária contra: (...) J....., NIF (...), o montante de € 435 163,97 referente a IVA e correspondente de juros compensatórios dos períodos de 1191, 1291, 0492, 0592, 0692, 0792 (...)»
[cf. fls. 41 a 42 dos autos].
R) Em 20/09/2007, o oponente foi citado na execução fiscal para proceder ao pagamento da quantia exequenda de 435.163,97€ [cf. fls. 43 e verso dos autos].
S) A presente oposição deu entrada na Repartição de Finanças de Seia em 18/10/2007 [cf. fls. 4 dos autos].
T) O oponente nunca trabalhou ou exerceu quaisquer funções na sociedade executada, antes se dedicava exclusivamente à gestão da sociedade F....., da qual era administrador.
U) Os irmãos do oponente, A..... e J....., tomavam todas as decisões da sociedade executada, davam ordens aos trabalhadores e apresentavam-se a terceiros como responsáveis pela sociedade.
V) Pontualmente, e para suprir a ausência de A..... ou de J....., o oponente assinava documentos na qualidade de gerente da sociedade.
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Com interesse para a decisão nada mais de provou.
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Motivação: A convicção do tribunal, no que respeita aos factos provados, assentou, desde logo, na prova documental junta aos autos, conforme indicado em cada um desses factos.
Quanto aos factos descritos em T) a V), a convicção do tribunal fundou-se nos depoimento das testemunhas A....., que exerceu funções de TOC, quer na sociedade executada, quer na sociedade F....., A....., Chefe da Secção da Contabilidade da sociedade executada durante 15 anos e até 1998, e C....., trabalhador da sociedade executada durante 36 anos, tendo terminado como Director de Recursos Humanos.
Todas as testemunhas relevaram conhecimento directo dos factos que relataram, tendo prestado depoimentos coerentes e convincentes.»

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Conforme resulta dos autos, com base na matéria de facto supratranscrita, o Meritíssimo Juiz do TAF de Castelo Branco julgou procedente a Oposição, entendendo que a dívida exequenda se encontrava prescrita.

Com efeito, é a seguinte a fundamentação da sentença recorrida:

“(I) DA PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA EXEQUENDA
Estão em causa nos autos dívidas de ivA e juros compensatórios relativa ao período de Abril de 1992 [PEF n.° 12…….] e aos períodos de Setembro a Dezembro de 1991 e de Maio a Julho de 1992 [PEF n.° 12…..].
Como ponto prévio, importa salientar que não existe regime especial de prescrição quanto aos juros compensatórios, os quais se integram na própria dívida de imposto e nessa medida estão sujeitos ao regime de prescrição aplicável à divida do tributo em causa [cf. Acórdão do STA de 26-05-1999, Proc. n.° 020653].
Vejamos, então, se ocorre a prescrição da dívida exequenda.

PEF n.° 12…….
A dívida exequenda no PEF n.° 12…… reporta-se a IVA e juros compensatórios do período de Abril de 1992.
À data da constituição do facto tributário estava em vigor o Código Processo Tributário (CPT), aprovado pelo Decreto-Lei n° 154/91, de 23 de Abril, cujo artigo 34.° previa um prazo de prescrição de dez anos [n.°1], contado desde o início do ano seguinte àquele em que ocorreu o facto tributário [n.°2].
Assim, em 01/01/1993 teve início o prazo de prescrição de 10 anos.
Porém, com a entrada em vigor da Lei Geral Tributária (LGT), em 01/01/1999, o artigo 34.° do CPT foi expressamente revogado, passando a matéria de prescrição a estar regulada nos artigos 48.° e 49.° da LGT, sendo que, nos termos do artigo 48.° da LGT, o prazo de prescrição sofreu um encurtamento para 8 anos.
E o artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 398/98, de 17 de Dezembro, diploma que aprovou a LGT estabeleceu que, com excepção dos impostos abolidos, se aplicava ao novo prazo de prescrição o disposto no artigo 297.° do Código Civil.
Nos termos do disposto no artigo 297.° do Código Civil, a lei que estabelecer um prazo mais curto do que o fixado em lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para se completar o prazo.
Deste modo, a lei nova só é de aplicar se, à data da sua entrada em vigor, faltar menos tempo para o prazo se completar, sendo que, no cômputo deste prazo, se atendem a todos os factos com eficácia suspensiva ou interruptiva da prescrição previstos na lei vigente no momento em que eles ocorrem, em obediência ao disposto na parte final do n.° 2 do artigo 12.° do Código Civil.
Cumpre, assim, averiguar qual o prazo que havia decorrido para a prescrição à data da entrada em vigor da lei nova.
No que concerne às causas suspensivas do prazo de prescrição não se detecta nenhuma com aplicação ao caso dos autos, sendo certo que, no âmbito do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência (CPEREF), aprovado pelo Decreto-Lei n.° 123/93, de 23 de Abril, não existia norma que determinasse a suspensão do prazo de prescrição [cf. Acórdão do Pleno da Secção do CT do STA, de 15-102014, proferido no Processo n.° 0431/14, disponível em www.dgsi.pt].
Quanto aos factos interruptivos do prazo de prescrição importa ter em consideração os previstos no CPT, cujo artigo 34.°, n.° 3 dispunha nos seguintes termos:
«[a] reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e a instauração da execução fiscal interrompem a prescrição, cessando, porém, esse efeito se o processo estiver parado por facto não imputável ao contribuinte durante mais de um ano, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação».
Assim, no domínio do CPT, a interrupção da prescrição tem sempre como efeito instantâneo a inutilização para a prescrição de todo o tempo anteriormente decorrido [artigo 326.°, n.° 1 do Código Civil] e obsta ao decurso do prazo de prescrição durante a pendência do processo que provoca o efeito interruptivo, a não ser que ocorra a paragem do processo por mais de um ano, por facto não imputável ao contribuinte [2a parte do n.° 3 do artigo 34.° do CPT].
In casu, verifica-se que, à data da entrada em vigor da LGT faltava menos tempo para o prazo de prescrição se completar pela lei antiga do que pela lei nova, senão vejamos.
O prazo de prescrição, iniciado em 01/01/1993, foi interrompido com a instauração da execução fiscal, em 11/06/1993 [cf. alínea C) do probatório], num momento em que haviam decorrido para a prescrição 5 meses e 11 dias.
Todavia, o processo de execução fiscal esteve parado desde 29/07/1993, e por mais de um ano, por motivo não imputável ao contribuinte [cf. alínea G) do probatório], razão pela qual, em 30/07/1994, cessou o efeito interruptivo do prazo de prescrição determinado pela instauração da execução fiscal.
Importa recordar que, nos termos do artigo 34.°, n.° 3, do CPT, cessando o efeito interruptivo por motivo de paragem do processo por mais de um ano, soma-se o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
Deste modo, verifica-se que, à data da entrada em vigor da LGT, em 01/01/1999, havia decorrido para prescrição 4 anos, 10 meses e 12 dias, faltando, assim, menos tempo para o prazo de prescrição se completar pela lei antiga do que pela lei nova.
Assim sendo, é manifesto que à data da citação pessoal do oponente para a execução fiscal, ocorrida em 20/09/2007 [cf. alínea R) do probatório], já há muito se havia completado o prazo de prescrição de 10 anos previsto no CPT.
Pelo exposto, concluímos que a dívida de ivA e juros compensatórios de Abril de 1992 se encontra prescrita.
PEF n.° 12…..
A dívida exequenda no PEF n.° 12….. reporta-se a IVA e juros compensatórios dos períodos de Setembro a Dezembro de 1991 e de Maio a Julho de 1992.
Começando pela dívida de Julho de 1992, e tendo em consideração enquadramento normativo acima referido, desde já se antecipa que a mesma se encontra igualmente prescrita.
Com efeito, o prazo de prescrição, iniciado em 01/01/1993, foi interrompido com a instauração da execução fiscal, em 01/07/1993 [cf. alínea i) do probatório], num momento em que haviam decorrido para a prescrição 6 meses.
No entanto, o processo de execução fiscal esteve parado desde 27/09/1993, e por mais de um ano, por motivo não imputável ao contribuinte [cf. alínea M) do probatório], razão pela qual, em 28/09/1994, cessou o efeito interruptivo do prazo de prescrição determinado pela instauração da execução fiscal.
Deste modo, verifica-se que, à data da entrada em vigor da LGT, em 01/01/1999, havia decorrido para prescrição 4 anos, 9 meses e 3 dias.
Assim sendo, é manifesto que à data da citação pessoal do oponente para a execução fiscal, ocorrida em 20/09/2007 [cf. alínea R) do probatório], já há muito se havia completado o prazo de prescrição de 10 anos previsto no CPT.
Prescrita a dívida de ivA e juros compensatórios de Julho de 1992, por maioria de razão, mostram-se prescritas as restantes dívidas exequendas, porque mais antigas.
Em face de todo o exposto, concluímos que toda a dívida exequenda se encontra prescrita, devendo, com tal fundamento, proceder a presente oposição.
Com a procedência da oposição com fundamento em prescrição da dívida exequenda, fica prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas, nos termos do artigo 660.°, n.° 2, do CPC/1961 - aplicável aos autos por força do disposto no artigo 6.°, n.° 4 da Lei 41/2013 - ex vi da alínea e) do artigo 2.°, do CPPT.”

A recorrente Fazenda Pública não se conforma com o decidido, invocando, para tanto, que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto e de direito, porquanto entende que a dívida exequenda não se encontra prescrita, fundando a sua pretensão na contagem efetuada no acórdão do TCAS de 27/09/2011, proc. n.º 04899/11.

A recorrida nas suas contra-alegações vem se insurgir contra o recurso da Fazenda Pública, entendendo, desde logo, que aquela não impugnou a matéria de facto.

Apreciando.

Efetivamente, a recorrente parece se insurgir, ainda que indiretamente, contra a matéria de facto assente. Ora, a verdade é que se a recorrente pretendia impugnar a matéria de facto deveria ter cumprido o ónus previsto no art. 640.º do CPC. Contudo, a recorrente não indicou os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, nem os concretos meios probatórios, constantes do processo que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, nem a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. Sendo certo que não basta, para além do mais, uma alegação genérica para os documentos junto aos autos (conclusão I) das alegações de recurso) e por essa razão, sempre será de rejeitar essa impugnação nos termos do n.º 1 daquele preceito legal.

Não obstante, considerando que está em causa a prescrição da dívida exequenda e que dos autos constam documentos que impõem decisão diferente da que foi proferida sobre a matéria de facto, este TCAS tem o poder de alterar oficiosamente tal decisão, nos termos do n.º 1, do art. 660.º do CPC, ex vi do art. 2.º, alínea e) do CPPT, e nessa medida, aditam-se os seguintes factos:

X) Em 28/01/1999 foi proferida decisão que declarou a cessação da gestão controlada na ação especial de recuperação de empresas referido na alínea N) (cf. certidão da conservatória do registo comercial de fls. 114);

Z) Na sequência do requerimento apresentado pela sociedade “J....., Lda.”, foi proferido, em 20/03/1995, despacho judicial de prosseguimento de ação especial de recuperação de empresas (cf. certidão da conservatória do registo comercial de fls. 100 dos autos).

Estabilizada a matéria de facto, cumpre então, conhecer dos fundamentos do recurso.

Como referimos, a recorrente não concorda com a decisão de prescrição da dívida, assentando a sua argumentação no acórdão do TCAS de 27/09/2011, proc. n.º 04899/11. Porém, cumpre referir que, por um lado, tal acórdão versava sobre a questão específica de paragem do processo até à data em que se iniciou a vigência da Lei nº 17/2000, estando em causa dívidas para a segurança social, enquanto nos presentes autos estão em causa dívidas de IVA, e por outro lado, tal acórdão acabou por ser revogado pelo acórdão do STA de 12/11/2014, proc. n.º 0406/14 que julgou procedente a oposição por se verificar a prescrição da dívida exequenda.

Não obstante, considera a recorrente que a dívida não se encontra prescrita, e portanto, cumpre aferir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento.

Vejamos.

Está em causa nos autos dívidas de IVA e respetivos juros compensatórios referentes aos períodos de abril de 1992 (cf. alínea C) dos factos provados) e de setembro a dezembro de 1991, e de maio a julho de 1992 (cf. alínea I) dos factos provados)

Vigorava, à época da constituição das dívidas, o Código de Processo Tributário (CPT) aprovado pelo DL 154/91, cujo art. 34.º que dispunha sobre o regime da prescrição, estabelecia que a obrigação tributária prescreve no prazo de 10 anos (n.º 1), contados desde o início do ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário (n.º 2), e que a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e a instauração da execução interrompem a prescrição, cessando, porém, esse efeito se o processo estiver parado por facto não imputável ao contribuinte durante mais de um ano, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação (n.º 3).

Posteriormente, em 1 de janeiro de 1999, entrou em vigor a Lei Geral Tributária (LGT) que estabeleceu um novo prazo de prescrição de 8 anos (art. 48.º da LGT).

Ao novo prazo de prescrição aplica-se o disposto no artigo 297.º do Código Civil (cf. art. 5.º e 6.º do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro, diploma que aprovou a LGT) que dispõe “a lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar”.

Portanto, cumpre determinar qual o prazo de prescrição aplicável neste caso, se o do CPT, ou se o da LGT.

Atento ao disposto no art. 297.º do Código Civil, in casu, há que averiguar se à data em que entrou em vigor a LGT (lei que encurtou o prazo de prescrição), faltava menos tempo para o prazo de prescrição se completar à luz da lei antiga (CPT), porque só se tal se verificar é que se aplicará o prazo do CPT (nesse sentido, vide, Ac. do STA de 21/08/2013, proc. n.º 01316).

Jorge Lopes de Sousa explicita como proceder à contagem: “[n]este momento da entrada em vigor da lei nova, à face dela falta todo o tempo que ela prevê, naturalmente. Por isso, apenas é necessário calcular o tempo que, nesse momento, falta para a prescrição à face da lei antiga. Se faltar menos tempo do que o previsto no novo prazo, é de aplicar a lei antiga.
Esta contagem do prazo que falta faz-se considerando tudo o que consta da lei antiga (início, causas de suspensão e de interrupção) como se depreende do texto da parte final do n.º 1 do art. 297.º do CPPT, ao referir que o novo prazo aplica-se «a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar»; «segundo a lei antiga» significa calcular o prazo de prescrição que decorreu até à data da entrada em vigor da lei nova nos termos que a lei antiga prevê a respectiva contagem” (Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2008, p.87.) [sublinhados nossos].

Nesse mesmo sentido escreveu-se no Acórdão do STA de 30/04/2013, proc. n.º 0443/13 o seguinte: “Como vem decidindo a jurisprudência dominante deste Supremo Tribunal Administrativo as causas de interrupção ou suspensão da prescrição atendíveis para o cômputo em concreto do prazo de prescrição são as previstas na lei vigente à data da respectiva ocorrência, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 12.º do Código Civil, e não, as previstas na lei cujo prazo for aplicável, independentemente do momento em que tais factos se tenham efectivamente verificado. Sobre a questão esclarece Jorge Lopes de Sousa, na sua obra Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª edição, pag. 118 «a solução do problema da aplicação da lei no tempo depende do momento em que ocorrer o facto interruptivo e não eventualidade de, face às regras do artº 297º do Código Civil, ser aplicável o regime do CPT ou da Lei Geral Tributária no que concerne à duração do prazo e prescrição». Em síntese, e como impressivamente se diz no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19.01.2011, recurso 629/09, in www.dgsi., pode-se concluir que a aplicação de diferentes regimes no tocante aos prazos prescricionais não determina a aplicação de um ou outro regime em bloco, porquanto o art.º 297.º só manda aplicar o prazo prescricional mais curto, e não as disposições legais que regem os termos em que esse prazo se conta e tudo o mais que releva para o seu curso.”


Para o cômputo concreto do decurso do prazo de prescrição importa ainda considerar que na sequência do requerimento apresentado pela executada originária foi proferido, em 20/03/1995, despacho judicial de prosseguimento de ação especial de recuperação de empresas (cf. alínea Z) dos factos provados aditados).

Nos termos do disposto no art. 29.º, n.º 1 do CPEREF, o despacho de prosseguimento de ação de recuperação suspende o prazo de prescrição da dívida exequenda (v. acórdãos do STA de 30/01/2019, proc. n.º 0451/10.2BESNT, e de 18/04/2018, proc. n.º 0235/18), suspensão que veio a terminar em 28/01/1999, quando proferida decisão que declarou a cessação da gestão controlada na ação especial de recuperação de empresas (cf. alínea X) dos factos provados aditados). Não obstante, porque estamos perante dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário, ainda que se entendesse não ser de aplicar aquele normativo face aos fundamentos do acórdão do Tribunal Constitucional n.º 557/2018, publicado no Diário da República de 14 de novembro de 2018, e jurisprudência anterior referente ao art. 100.º do CIRE, sempre a dívida sempre estaria prescrita. Ou seja, independentemente da existência de efeito suspensivo derivado da aplicação daquele preceito legal, sempre a dívida exequenda estaria prescrita, como melhor se verá infra.

Assim sendo, são as seguintes as datas de início de contagem do prazo de prescrição, e respetivos factos interruptivos do mesmo, e cessação desse efeito interruptivo, e a contagem do prazo até a entrada em vigor da LGT em 01/01/1999, considerando a suspensão operada por força do art. 29.º do CPREF desde 20/03/1995 até 28/01/1999:

i) relativamente às dívidas de referentes a abril de 1992, a contagem do prazo inicia-se a 1/01/1993. Interrompeu-se com a instauração da execução fiscal em 11/06/1993 (alínea C) dos factos provados), e, portanto, desde o início do prazo até a interrupção do mesmo decorreram 5 meses e 10 dias. O processo de execução esteve parado entre 29/07/1993 por mais de um ano por motivo não imputável ao contribuinte (alínea G) dos factos provados), pelo que em 30/07/1994 cessou o efeito interruptivo do prazo de prescrição, sendo que desde esta data até a suspensão do prazo em 20/03/1995 decorreram 7 meses, e 19 dias. Portanto, em 01/01/1999, havia decorrido pouco mais de um ano do prazo de prescrição de 10 anos previsto no CPT, e assim, faltava decorrer menos tempo para a prescrição se completar à luz do prazo da LGT, e assim sendo, aplica-se, por força do disposto no art. 297.º, n.º 1 do CC, o prazo de 8 anos previsto na LGT.

ii) relativamente às dívidas referentes a setembro a dezembro de 1991, a contagem do prazo inicia-se em 01/01/1992. Interrompeu-se com a instauração da execução fiscal em 01/07/1993 (alínea I) dos factos provados), e, portanto, desde o início do prazo até a interrupção do mesmo decorreu 1 ano, 6 meses. O processo de execução esteve parado entre 27/09/1993 por mais de um ano por motivo não imputável ao contribuinte (alínea M) dos factos provados), pelo que em 28/09/1994 cessou o efeito interruptivo do prazo de prescrição, sendo que desde esta data até a suspensão do prazo em 20/03/1995 decorreram 5 meses, e 22 dias. Portanto, em 01/01/1999, havia decorrido 1 ano, 11 meses e 22 dias do prazo de prescrição de 10 anos previsto no CPT, e assim, faltava decorrer menos tempo para a prescrição se completar à luz do prazo da LGT, e assim sendo, aplica-se, por força do disposto no art. 297.º, n.º 1 do CC, o prazo de 8 anos previsto na LGT.


iii) relativamente às dívidas referentes a maio a julho de 1992, a contagem do prazo inicia-se a 1/01/1993. Interrompeu-se com a instauração da execução fiscal em 01/07/1993 (alínea I) dos factos provados), e, portanto, desde o início do prazo até a interrupção do mesmo decorreram 6 meses. O processo de execução esteve parado entre 27/09/1993 por mais de um ano por motivo não imputável ao contribuinte (alínea M) dos factos provados), pelo que em 28/09/1994 cessou o efeito interruptivo do prazo de prescrição, sendo que desde esta data até a suspensão do prazo em 20/03/1995 decorreram 5 meses, e 19 dias. Portanto, em 01/01/1999, havia decorrido menos de um ano do prazo de prescrição de 10 anos previsto no CPT, e assim, faltava decorrer menos tempo para a prescrição se completar à luz do prazo da LGT, e assim sendo, aplica-se, por força do disposto no art. 297.º, n.º 1 do CC, o prazo de 8 anos previsto na LGT.

Aqui chegados importa então concluir, relativamente a todas as dívidas exequendas aplica-se o prazo de prescrição de 8 anos previsto no art. 48.º, n.º 1 da LGT - –v. acórdão do STA de 08/01/2020, proc. n.º 0826/07.4BEPRT: “I - O artigo 297.º, n.º 1, parte final, do Código Civil deve ser interpretado no sentido de que falta menos tempo para o prazo se completar segundo a lei antiga quando, considerando o tempo em concreto decorrido e o tempo que em abstrato importa decorrer, este último seja mais curto do que o prazo estabelecido pela lei nova. II - A ocorrência de um facto que inutilizou o prazo de prescrição decorrido no âmbito da lei antiga e que, à data da entrada em vigor da lei nova, ainda não tinha voltado a correr, implica a aplicação do prazo de prescrição da lei nova, contado da sua entrada em vigor, se este for o mais curto. III - Os efeitos jurídicos dos factos são determinados pela lei vigente no momento em que ocorrem – n.º 2 do artigo 12.º do Código Civil. (…)”

Importa também sublinhar que não releva para efeitos da contagem do prazo nos termos da LGT, o efeito interruptivo do prazo de prescrição fiscal ocorrida na vigência do CPT, nomeadamente, instauração da execução, uma vez que todo o prazo de prescrição decorre ao abrigo da LGT que não reconhece efeito interruptivo à instauração da execução fiscal (v. nesse sentido, acórdão do STA de 08/01/2014, proc. n.º 01843/13: ” I – Sendo aplicável o prazo de prescrição previsto na LGT, à face da regra do art. 297º, nº 1 do Código Civil, cujo termo inicial ocorre, necessariamente, em 1 de Janeiro de 1999, e decorrendo, assim, todo o prazo prescricional na vigência da LGT, será esta lei a regular os efeitos dos factos interruptivos e suspensivos da prescrição, como decorre da regra contida no nº 2 do art. 12º do Código Civil. II – Pelo que os actos interruptivos anteriores a que a LGT não reconheça esse efeito – como é o caso da instauração da execução fiscal – não produzem efeitos sobre a contagem deste novo prazo de prescrição iniciado na referida data.”

Ora, o prazo de prescrição de 8 anos conta-se da data de entrada em vigor desta Lei, ou seja, a partir de 01/01/1999 (cf. art. 297.º do Código Civil, aplicável ex vi do n.º 1 do art. 5.º do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro. Sucede que, in casu, a causa suspensiva do prazo de prescrição prolonga-se ao tempo de vigência da LGT, e, por conseguinte, o prazo de prescrição apenas começa a correr após cessar o efeito suspensivo.

Portanto, para todas as dívidas exequendas o prazo de prescrição de 8 anos previsto no art. 48º, n.º 1 da LGT conta-se a partir de 29/01/1999, completando-se em 29/01/2007, uma vez que não ocorre qualquer outra causa interruptiva ou suspensiva do prazo de prescrição.

Com efeito, pois como já referimos, a instauração da execução fiscal não releva para este efeito.

Por outro lado, importa ter presente que não constitui facto suspensivo do prazo de prescrição a declaração de falência e a remessa dos autos executivos àquele processo, porque na “vigência do CPEREF, a declaração de falência não suspende o prazo de prescrição, só determinando a sustação das execuções a fim de serem apensadas ao processo de falência para aí correrem os seus termos como reclamação dos créditos exequendos.” – Acórdão do Pleno do STA de 15/10/2014, proc. n.º 0431/14.

Finalmente, importa referir que não há que considerar a citação do oponente enquanto facto interruptivo do prazo de prescrição previsto no n.º 1 do art. 49.º da LGT, porque ocorre em 20/09/2007 (cf. alínea R) dos factos provados), ou seja, quando o prazo de prescrição já se completara.

Refira-se que a igual solução, do ponto de vista da prescrição, se chega se se considerar ser de aplicar ao art. 29.º do CPREF os princípios inerentes à jurisprudência do Tribunal Constitucional relativa ao art.º 100.º do CIRE, mutatis mutandi, desconsiderando-se, assim, a suspensão do prazo. Assim, nesse caso, o que sucede é que é aplicável o prazo de 10 anos previsto no CPT. Com efeito, atento o período ocorrido entre o termo inicial do prazo e o momento da instauração do PEF, por um lado, e, por outro, o período decorrido entre esta instauração e o decurso de mais de um ano por motivo não imputável ao contribuinte, à data de entrada em vigor da LGT já tinham decorrido mais de dois anos do prazo de prescrição. Logo, assim seria mais favorável a aplicação do prazo de 10 anos previsto no CPT. Ora, considerando a data de citação do Recorrido, nesse momento já se tinha completado o prazo de prescrição de 10 anos.

Em suma, a dívida exequenda se encontra prescrita, e nessa medida, será de confirmar a sentença recorrida, porém, com a presente fundamentação, e nessa medida, será de negar provimento ao recurso.

Em matéria de custas o artigo 527.º do CPC consagra o princípio da causalidade, de acordo com o qual paga custas a parte que lhes deu causa. Vencida na presente causa a recorrente, esta deu causa às custas do presente processo (n.º 2), e, portanto, deve ser condenada nas respetivas custas (n.º 1, 1.ª parte).

Sumário (art. 663.º, n.º 7 do CPC)

I. Sendo aplicável o prazo de prescrição previsto na LGT, face à regra do art. 297.º, n.º 1 do Código Civil, cujo termo inicial ocorre, necessariamente, em 1 de Janeiro de 1999, e decorrendo, assim, todo o prazo prescricional na vigência da LGT, será esta lei a regular os efeitos dos factos interruptivos e suspensivos da prescrição, como decorre do n.º 2 do art. 12.º do Código Civil;

II. Por conseguinte, os atos interruptivos anteriores a que a LGT não reconheça esse efeito – como é o caso da instauração da execução fiscal – não produzem efeitos sobre a contagem deste novo prazo de prescrição iniciado na referida data.
III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida com a fundamentação supra.
****
Custas pela Recorrente.
D.n.
Lisboa, 22 de outubro de 2020.

A Juíza Desembargadora Relatora

Cristina Flora


A Juíza Desembargadora Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo art. 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, os Juízes Desembargadores Tânia Meireles da Cunha e António Patkoczy.