Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1095/12.0BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:10/31/2019
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:IRC;
FATURAÇÃO FALSA;
INDÍCIOS SUFICIENTES;
MEIOS DE PAGAMENTO/CHEQUES.
Sumário:I-No âmbito da faturação falsa, não é exigível que a Administração Tributária efetue uma prova direta da simulação, tendo, no entanto, o dever de averiguar e reunir indícios conducentes ao afastamento da declaração apresentada pelo contribuinte. Uma vez cumprido esse ónus passa a competir ao sujeito passivo o ónus da prova da realidade subjacente à fatura, infirmando os indícios recolhidos pela entidade fiscalizadora.

II-A qualidade dos emitentes das faturas só quando é desacompanhada de outros elementos fáticos que revelem falsificação das faturas é que é manifestamente insuficiente para ilidir a presunção de veracidade de que goza a contabilidade do adquirente.

III-A apresentação dos meios de pagamento reveste grau de importância elevada em termos de prova da efetividade das operações, sendo que a junção de cheques não permite inferir, desde logo e sem mais, pela materialidade ou não materialidade das operações, sendo premente aferir-se do seu circuito comercial e cotejá-lo com a demais prova carreada para os autos.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACÓRDÃO

l – RELATÓRIO

O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (doravante Recorrente), veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional relativa a Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas (IRC) n.º 2011 .........., respeitante ao exercício de 2007, no valor de EUR 46.193,89.

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem:

“1. Na douta sentença ora recorrida, o Tribunal “a quo” julgou a impugnação parcialmente procedente por entender que, relativamente às correções que tiveram por base as faturas emitidas pela sociedade G.........., Lda.), havendo prova ainda que parcial do pagamento dessas faturas cuja veracidade se discute nos autos, impendia sobre a AT efetuar mais diligências no sentido de saber se, pelo menos, uma parte dessas faturas haviam sido efetivamente pagas à sociedade;

2. Decisão com a qual, e que com o devido respeito, que é muito por aquele Tribunal, não concordamos, nem nos conformamos, porque a mesma resulta de um errado julgamento da matéria de facto e de direito;

3. O Tribunal “a quo” não podia concluir que havia prova parcial do pagamento das faturas da sociedade G.........., Lda. cuja veracidade se discute nos autos, pois o que há na realidade, e o Relatório de Inspeção é nisso claro, são documentos (Notas de Pagamento) que nada provam;

4. O Tribunal “a quo” não podia concluir que a AT se limitou a desconsiderar os cheques apresentados pela impugnante quando, na verdade, a impugnante nunca apresentou quaisquer cheques;

5. Para o Tribunal “a quo”, apesar de todas as diligências efetuadas pelos serviços de inspeção tributária e todos os factos apurados, e mencionados no Relatório de Inspeção, era de fundamental relevância que a AT apurasse quem havia levantado os cheques que, repita-se, a impugnante não apresentou no decurso da ação de inspeção;

6. Atento o disposto no n.º 1, do artigo 13.º, do CPPT, se a Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo”, entendia que era de primordial importância apurar quem tinha levantado os referidos cheques, alegadamente emitidos em 2008, 2009 e 2010, para pagamento das 3 faturas da G.........., Lda., emitidas no 3.º trimestre de 2007, deveria ter ordenado as correspondentes diligências para apuramento da verdade material e não decidir no sentido em que decidiu, sem apurar dessa mesma verdade material;

7. O procedimento de inspeção em causa nos presentes autos é um procedimento interno, realizado na sequência do procedimento de inspeção efetuado à sociedade G..........., Lda.;

8. No relatório inspetivo resultante da ação de inspeção efetuada à impugnante não constam as diligências efetuadas pelos serviços inspetivos para apurar quem efetivamente havia levantado os referidos cheques porque a inspecionada nunca juntou quaisquer cheques;

9. Do relatório inspetivo resultante da ação de inspeção efetuada à impugnante consta que foi no decurso da ação de inspeção efetuada à sociedade G.........., Lda. que foi notificada a impugnante para enviar fotocópias dos extratos contabilísticos de conta corrente, dos autos de medição rececionados e que serviram de base à faturação por aquela sociedade, dos contratos celebrados e orçamentos aceites sobre os trabalhos realizados e dos comprovativos bancários dos pagamentos das faturas com fotocópias frente e verso dos cheques eventualmente utilizados nesses pagamentos;

10. Resulta do Relatório de Inspeção relativo à impugnante que, para prova dos pagamentos das faturas emitidas em 2007 pela sociedade G.........., Lda., a impugnante apenas apresentou ofícios endereçados àquela sociedade sob o título “Notas de Pagamento” e onde são mencionadas essas faturas e alguns cheques de valor parcial, sem que, de facto, as fotocópias frente e verso dos cheques eventualmente utilizados nesses pagamentos, alguma vez tenha sido remetidas aos serviços de inspeção tributária pela impugnante;

11. Impendendo o ónus da prova sobre a impugnante e não tendo esta, feito essa prova, não restava alternativa aos serviços inspetivos, senão desconsiderar a informação relativa aos cheques alegadamente utilizados para pagamento das 3 faturas da sociedade G.........., Lda., já que a mesma não estava sustentada na devida prova documental e, consequentemente, essas mesmas faturas;

12. Se a Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo”, ainda assim, entendia que o Relatório de Inspeção relativo à ação de que foi alvo a impugnante se apresentava insuficiente para a descoberta da verdade material, deveria ter, a coberto do disposto no n.º 1, do artigo 13.º, do CPPT, ordenado a junção aos autos do Relatório de Inspeção relativo à sociedade G.........., Lda.;

13. A sentença ora sob recurso ao concluir que a AT devia ter efetuado mais diligências de prova, nomeadamente para apurar quem havia levantado os referidos cheques é contrária ao disposto no n.º 1, do artigo 13.º, do CPPT;

14. Ao contrário do que parece ter sido o entendimento da Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo”, vertido na sentença ora sob recurso, os serviços inspetivos não se limitaram a desconsiderar a informação prestada pela impugnante relativa aos alegados cheques, por não ser habitual o pagamento fracionado;

15. Os serviços de inspeção tributária fizeram constar do respetivo relatório que a informação prestada, sobre aquisições e pagamentos carece de credibilidade e fizeram-no atendendo a todos os indícios da não prestação de serviços recolhidos no âmbito da ação de inspeção efetuada à sociedade G.........., Lda., aos quais acresceu a forma como alegadamente foram efetuados os pagamentos (desdobramento aleatório de cheques, periodicidade e oportunidade desses pagamentos) sem as correspondentes cópias frente e verso dos cheques alegadamente utilizados nesses pagamentos;

16. Apesar de notificada do projeto de relatório e poder apresentar, em sede do exercício do direito de audição, as provas necessárias para contrariar o que ali se projetava corrigir, a impugnante não o fez e optou por entregar uma declaração de substituição, pelo que, só pode concluir-se que a atuação dos serviços inspetivos se apresenta imaculada;

17. Nem nos presentes autos a impugnante juntou cópia dos cheques alegadamente utilizados naqueles pagamentos por forma a permitir (ou não) identificar o beneficiário dos mesmos;

18. Ao fazer recair sobre a AT o ónus da prova dos beneficiários dos cheques que a impugnante alega ter utilizado no pagamento das 3 faturas da sociedade G.........., Lda., emitidas em 2007, a Meritíssima Juíza do Tribunal “a quo” violou o disposto no artigo 74.º, da LGT;

19. Assim sendo como de facto é, e está devidamente provado nos presentes autos de impugnação judicial, não pode a sentença aqui em apreço manter-se na ordem jurídica, nos termos em que foi proferida, nem produzir quaisquer efeitos legais, impondo-se, por isso, a sua revogação na parte relativa às correções relacionadas com as faturas da sociedade G.........., Lda.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.a.s. Exas se dignem julgar procedente o presente recurso, por totalmente provado e, em consequência, ser a douta sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue totalmente improcedente a presente impugnação judicial, tudo com as devidas e legais consequências.”


***


A Recorrida, devidamente notificada para o efeito, optou por não apresentar contra-alegações.

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O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) junto deste Tribunal, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

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Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Subsecção do Contencioso Tributário para decisão.

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II – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

1. Por ofício nº ..... de 29/03/2010, remetido à Impugnante, foi-lhe solicitado o seguinte:


"Texto integral no original; imagem"


(cfr. doc. junto a fls. 62 dos autos);

2. Em 19/08/2010 a Impugnante remeteu à Direcção de Finanças de Setúbal a seguinte resposta:


"Texto integral no original; imagem"


(cfr. doc. junto a fls. 63 dos autos);

3. Em 29/09/2010, foi ouvida em “Auto de Declarações de Maria ..........”, e do qual consta o seguinte:


"Texto integral no original; imagem"


(cfr. doc. junto a fls. 65 dos autos);

4. Em 07/10/2010 foi ouvida em “Auto de Declarações” de Maria J.......... e do qual consta o seguinte:


"Texto integral no original; imagem"


(cfr. doc. junto a fls. 64 dos autos);

5. Em 21/01/2011 foi aberta a Ordem de Serviço Interna nº OI2011..... para efectuar a acção inspectiva à Impugnante (cfr. doc. junto a fls. 31 do processo instrutor junto aos autos);

6. Em 23/11/2011 foi remetido à Impugnante pela Direcção de Finanças de Setúbal – Divisão de Inspecção Tributária II, um ofício com o seguinte teor:


"Texto integral no original; imagem"


(cfr. doc. junto a fls. 66 dos autos);

7. Em 28/11/2011 foi efectuada a liquidação de IRC de 2007 – data da liquidação – mas tendo como data de emissão a data de 02/12/2011, com o nº 2011 .........., em nome da impugnante na qual foi apurado imposto no montante de 40.397,12 e juros compensatórios no montante de € 5.632,25, com data limite de pagamento de 11/01/2012, indicando-se como Matéria Colectável o valor de € 176.095,53 (cfr. doc. junto a fls. 41 do processo instrutor junto aos autos);

8. Em 13/12/2011, foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária, da Divisão de Inspecção Tributária II, da Direcção de Finanças de Setúbal, do qual consta o seguinte:

(…) ENQUADRAMENTO FISCAL
Em sede de IRC, a empresa esteve enquadrada no regime geral de tributação por opção, até 31/12/2008 e no regime geral desde 01/01/2009, nos termos da al. a) do nº 1 do artº 2º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), tendo-se registado pela actividade de “Aluguer de Máquinas e Equipamentos para a Construção e Engenharia Civil
(…) III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARTMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL Não aplicável ao caso em apreciação. VI. REGULARIZAÇÕES EFECTUADAS PELO SUJEITO PASSIVO NO DECURSO DA ACÇÃO INSPECTIVA VI. INTRODUÇÃO Conforme descrito no ponto III do Projecto de Relatório, no exercício de 2007 a sociedade N.........., Lda. (doravante designada apenas por “N.......... registou na sua contabilidade, como custos do exercício, facturas emitidas em nome da sociedade C.........., Lda., adiante apenas designada de “C.........., Lda” NIPC .........., no montante de 68.000,00€ e facturas emitidas em nome da sociedade G.........., Lda., adiante apenas designada de “G.........., NIPC: .........., no valor de 84.441,94 €. Os fornecedores mencionados, foram objecto de acções de inspecção por parte dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Setúbal, tendo-se detectado no âmbito dessas mesmas acções de inspecção, algumas irregularidades, conforme se segue e que levaram a concluir que as facturas emitidas em nome destas sociedades não titulam verdadeiras transacções, não representando por isso encargos reais para a sociedade Nova Temage.
VI.2 SUBCONTRATOS A) “C.........., LDA.” 1. CONTABILIZAÇÃO No que se refere a este fornecedor, a sociedade “N..........registou na sua contabilidade as seguintes facturas:
Fatura NºDataValor BrutoIVAValor Líquido
29121-01-200721.078,203.658,2017.420,00
29330-02-200728.749,604.989,6023.760,00
29530-03-200732.452,205.632,2026.820,00
TOTAL82.280,0014.280,0068.000,00
Estas facturas foram registadas como custos do exercício, na conta “62112 – Subcontratos tendo o IVA sido contabilizado na respectiva conta 24.3.2. e deduzido nas declarações periódicas correspondentes. Ver cópias das facturas e respectivos registos contabilísticos em anexo 1. 2. SITUAÇÃO TRIBUTÁRIA “C.......... iniciou a sua actividade a 27-09-2000, encontrando-se registada pela actividade de “Construção de Edifícios (Residenciais e não Residenciais)” a que corresponde o CAE 041200. Trata-se de um sujeito passivo em situação de incumprimento fiscal, encontrando-se em falta todas as declarações de IRC e de IVA relativamente ao exercício em análise. A sociedade foi objecto de acção inspectiva por parte de Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Setúbal, relativamente ao exercício de 2007. 3. ACÇÃO INSPECTIVA EFECTUADA À SOCIEDADE “C..........” No âmbito da acção inspectiva efectuada à empresa, e conforme consta do respectivo Relatório, foram verificados fortes indícios de que os serviços mencionados em todas as facturas emitidas em nome da “C.......... durante o exercício em análise não tenham sido prestado. Com efeito, durante a acção inspectiva efectuada a esta sociedade apuraram-se os seguintes factos: ELEMENTOS DA CONTABILIDADE Não foi possível obter os elementos da contabilidade, nem os respectivos documentos de suporte, não tendo igualmente sido possível localizar a sociedade, nem o seu responsável. Acresce ainda que, desde 03-06-2007, data da renúncia do TOC da sociedade (Maria J..........), a empresa não tem TOC responsável pela contabilidade.
ELEMENTOS RELATIVOS À ACTIVIDADE DA SOCIEDADE- Foram solicitadas informações à Segurança Social sobre o número de funcionários ao serviço e relação de descontos efectuados pela sociedade, relativamente ao período em analise e até à data. Da resposta obtida por aquele organismo, verifica-se que o sujeito passivo não declarou remunerações, durante o ano de 2007. (Ver anexo 2). – Da consulta efectuada às bases de dados da DGCI, verificou-se que desde o ano de 2006, inclusive, não existem quaisquer sujeitos passivos a declararem ter auferido rendimentos pagos pelo sujeito passivo, na qualidade de entidade empregadora (ver anexo 3). – Da consulta efectuada às bases de dados da DGCI, verificou-se que no ano em análise não constam quaisquer entidades que tenham declarado ter efectuado transmissões de bens ou serviços ao sujeito passivo (ver anexo 4). – Da consulta efectuada ao sistema informático da DGCI, verificou-se que não existem quaisquer veículos em nome do sujeito passivo. – Alvará/Titulo de Registo – Da consulta ao site www.inci.pt, foi verificada a existência do alvará de construção nº ....., em nome do sujeito passivo, o qual está cancelado desde 31-01-2007 (ver anexo 5).
“TRANSACÇÕES EFECTUADAS COM A N..........
No sentido de aferir da realidade das operações activas efectuadas pela sociedade “C.........., Lda., e no decurso da acção de inspecção a essa sociedade, conforme relatório de inspecção, solicitou-se à sociedade “N.........., para esta, proceder ao envio das fotocópias das facturas e respectivos recibos, fotocópias dos contratos celebrados, dos orçamentos sobre os bens transmitidos ou sobre os trabalhos realizados e dos autos de medição recepcionados que serviram de base à facturação emitida por aquele sujeito passivo, comprovativos bancários dos pagamentos das facturas e no caso de os pagamentos terem sido efectuados através de cheque, fotocópias frente e verso dos mesmos. Foi ainda solicitado, a identificação da pessoa ou pessoas responsáveis pela empresa com quem contactaram. Da informação solicitada e conforme anexos ao relatório de inspecção, a sociedade “N.........., apenas procedeu ao envio das facturas e ao envio de “Notas de Pagamento, não tendo apresentado qualquer outro documento justificativo dos serviços facturados, nomeadamente orçamentos e/ou contratos de empreitada. Da informação enviada pela “N.........., verifica-se o seguinte: Relativamente aos pagamentos, foram apresentados pela “N.........., diversos ofícios endereçados à “C.........., Lda., sob o título “Notas de Pagamento, numerados e datados, desde 31-12-2009 a 31-08-2010, onde são mencionadas as facturas acima descritas, mas por valores parciais, sendo que os valores atribuídos para pagamento mostram-se completamente aleatórios. Nessas “Notas de pagamento” não existe referência a cheques nem a outro modo de pagamento (Anexo 6). Nessas “Notas de Pagamento, verifica-se que os pagamentos apenas se iniciaram em 30/12/2009 e finalizaram em 31-08-2010- Tal periodicidade com que os pagamentos foram efectuados é contrária às práticas comerciais neste sector de actividade, não se percebendo a razão do sujeito passivo ter prestado serviços de construção civil a este cliente no 2º trimestre de 2007 e ter estado todo aquele tempo, sem ter recebido qualquer valor. ○ Solicitado que identificassem o nome da pessoa ou pessoas com quem contactavam, a propósito das relações comerciais que mantiveram com a sociedade “C.........., Lda. foi respondido que: -O nome da pessoa que falávamos era o “Sr. Romeu. Ora, esse nome não é conhecido como sendo responsável da sociedade “C.........., Lda. ou como tendo algum outro vínculo relativamente à mesma. No que se refere às facturas, verificou-se que não existe qualquer referência a quantidades nem a preços unitários.
4. CONCLUSÕES Em face dos elementos anteriormente descritos, verifica-se estarmos perante factos que comprovam que as facturas registadas na contabilidade da “N..........e emitidas em nome da “C.......... não titulam verdadeiras transacções, e como tal, também não representam encargos reais, sendo de realçar os seguintes aspectos:
-A inexistência de quaisquer elementos que comprove a realidade dos serviços mencionados nas facturas, nomeadamente, orçamentos, contratos de empreitada;
-A informação apresentada relativamente aos pagamentos, não merece qualquer credibilidade;
- A inexistência, por parte da “C.........., de uma estrutura empresarial compatível com as transacções descritas nas facturas, devido, essencialmente, à inexistência de meios humanos e materiais bem como de alvará de construção válido para a realizar as operações em causa.
- Sendo prática corrente neste sector de actividade o recurso a subempreiteiros, constatou-se que o número de contribuinte da “C.........., Lda.não consta do Anexo O da declaração anual, não existindo assim, qualquer evidência de que a sociedade tenha recorrido à subcontratação de terceiros para realização dos serviços.
- As facturas emitidas referem-se a serviços prestados, no entanto, os serviços nelas mencionados não estão devidamente quantificados ou têm designações genéricas.
B) G.........., LDA. 1. CONTABILIZAÇÃO
No que se refere a este fornecedor, a sociedade “N.......... registou na sua contabilidade as seguintes facturas:

Factura NºData
      Valor Bruto
Valor Líquido
39231-07-2007
      36.124,00
36.124,00
39331-08-2007
      19.475,94
19.475,94
39531-09-2007
      28.842,00
28.842,00
Total
      84.441,94
84.441,94

(…)
Estas facturas foram registadas como custos do exercício, na conta “62113 – SUBCONTRATOS, IVA INV: SUJ. PASSIVO, (Cópia das facturas e respectivos registos contabilísticos em anexo 7). As quantidades e valores constantes nas facturas referem-se a várias obras, não havendo qualquer descriminação por obra. 2. SITUAÇAO TRIBUTÁRIA A G.........., Lda., iniciou a sua actividade em 19-05-1995, encontrando-se registada pela actividade de “Construção de Edifícios (Residenciais e não Residenciais) a que corresponde o CAE 041200. Trata-se de um sujeito passivo em situação de incumprimento fiscal, encontrando-se em falta todas as declarações de IRC e de IVA relativamente ao exercício em análise. Trata-se de um sujeito passivo em situação de incumprimento fiscal, encontrando-se em falta todas as declarações de IRC e de IVA relativamente ao exercício em análise. A sociedade foi objecto de acção inspectiva por parte de Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Setúbal, relativamente ao exercício de 2007. 3.ACÇÃO INSPECTIVA EFECTUADA À SOCIEDADE “G..........” No âmbito da acção inspectiva efectuada à empresa G.........., Lda, e conforme consta do respectivo Relatório, foram verificados fortes indícios de que os serviços mencionados em todas as facturas emitidas em nome da G.........., durante o exercício em análise não tenham sido efectivamente prestados. Com efeito, durante a acção inspectiva efectuada a esta sociedade apuraram-se os seguintes factos: ELEMENTOS DA CONTABILIDADE Não foi possível obter os elementos da contabilidade, nem os respectivos documentos de suporte, tendo ainda, Maria .........., (…), na qualidade de sócia, gerente, por força do artigo 253º do Código das Sociedades Comerciais, ouvida em auto de declarações (ver anexo 8), ter declarado que: -Nada sabe acerca da empresa, dado que o falecido sócio, na altura seu marido, após a constituição da sociedade não lhe deu conhecimento de mais nada acerca da empresa e das suas actividades. Acresce ainda que estava separada do seu marido desde 2005, nada mais sabendo, a partir daquela data, sobre as actividades empresariais do seu marido e das sociedade de que era sócio ou gerente.-Também pelas razões acima descritas, não possui a contabilidade ou quaisquer documentos da empresa G.........., Lda. ELEMENTOS RELATIVOS À ACTIVIDADE DA SOCIEDADE: Durante a acção de inspecção foi também apurado que o Sr. Arlindo .........., gerente de facto da sociedade, teria estado preso em período coincidente com o anos objecto da acção. Com efeito, conforme informação da Direcção de Serviços Prisionais, o Sr. Arlindo .......... esteve preso de 27-09-2005 a 16-12-2008 (anexo 8). – Foram solicitadas informações à Segurança Social sobre o número de funcionários ao serviço e relação de descontos efectuados pela sociedade, relativamente ao período em analise. Da resposta obtida por aquele organismo, verifica-se que o sujeito passivo não declarou remunerações, durante o ano de 2007. (Ver anexo 10). – Da consulta efectuada às bases de dados da DGCI, verificou-se que no ano em análise, não constam quaisquer entidades que tenham declarado ter efectuado transmissões de bens ou serviços ao sujeito passivo (ver anexo 11). – Da consulta efectuada ao sistema informático da DGCI, verificou-se que não existem quaisquer veículos em nome do sujeito passivo. – Alvará/Titulo de Registo – Da consulta ao site www.inci.pt , foi verificada a existência do alvará de construção nº ....., em nome do sujeito passivo, o qual está cancelado desde 31-01-2006 (ver anexo 12).
“TRANSACÇÕES EFECTUADAS COM A N..........”
No sentido de aferir da realidade das operações activas efectuadas pela sociedade “G.........., Lda., procedeu-se, no decurso da acção de inspecção a esta empresa, ao envio de notificação à empresa “N.......... (anexo 13), a solicitar o envio de fotocópias dos extractos contabilísticos de conta corrente, dos autos de medição recepcionados e que serviriam de base à facturação emitida por aquela sociedade, dos contratos celebrados e orçamentos aceites sobre os trabalhos realizados e dos comprovativos bancários dos pagamentos das facturas (no caso de os pagamentos terem sido efectuados através de cheque, fotocópias frente e verso dos mesmos). Da informação solicitada e conforme anexos ao relatório de inspecção, a sociedade “N.........., apenas procedeu ao envio das facturas e ao envio de “Notas de Pagamento, não tendo apresentado qualquer outro documento justificativo dos serviços facturados, nomeadamente orçamentos e/ou contratos de empreitada.
Da informação enviada pela “N.........., verifica-se o seguinte:- Relativamente aos pagamentos foram apresentados pela “N..........diversos ofícios endereçados à “G.........., Lda., sob o título “Notas de Pagamento, onde são mencionadas as facturas de 2007 e os cheques, de valor parcial, que terão sido emitidos para o seu pagamento.-A forma, traduzida no desdobramento aleatório de cheques, e a periodicidade com que os pagamentos foram efectuados é contrária as práticas comerciais correntes neste sector de actividade, não se percebendo a razão do sujeito passivo continuar a prestar serviços de construção civil ao seu cliente sem receber qualquer contraprestação monetária, verificando-se ainda pela numeração das facturas emitidas com data de 2007, a G.........., Lda., terá trabalhado para a “N.......... durante todo o 3º trimestre daquele ano e conforme notas de pagamento que foram remetidas, esses serviços apenas terão sido liquidados a partir de 31-12-2008. - Foi solicitado que identificassem o nome da pessoa ou pessoas com quem contactavam, a propósito das relações comerciais que mantiveram com a sociedade “G.........., Lda. sujeito passivo objecto desta inspecção, foi respondido que: “As pessoas que falávamos eram a Srº .......... e o Srº .......... (encarregado ou responsável de obra). Ora, essas pessoas não são conhecidas como tendo alguma relação com o sujeito passivo, sendo que o apelido .......... é identificável, mas com a senhora Maria ........... -Verifica-se ainda que as facturas são processadas manualmente, contendo caligrafias diferentes, o que leva a concluir terem sido emitidas por pessoas diferentes, acrescendo ainda que a assinatura que nelas consta, a de José .........., não foi possível identificar, acrescendo ainda que não se conhece qualquer ligação desta pessoa com a sociedade “G.........., Lda., conforme já foi referido anteriormente. É assim de concluir que, a informação prestada, sobre as aquisições e pagamentos acima referidos, carece de credibilidade.
4. CONCLUSÕES
Em face dos elementos anteriormente descritos, verifica-se estarmos perante factos que comprovam que as facturas registadas na contabilidade da “N.......... e emitidas em nome da “G.........., Lda. não titulam verdadeiras transacções, e como tal, também não representam encargos reais, sendo de realçar os seguintes aspectos:
- A inexistência de quaisquer elementos que comprove a efectividade da realização daqueles serviços nomeadamente, orçamentos ou contratos de empreitada;
- A informação fornecida e relacionada com os pagamento não merece credibilidade;
- A inexistência, por parte da “G.........., Lda., de uma estrutura empresarial compatível com as transacções descritas nas facturas, devido, essencialmente, à inexistência de meios humanos e materiais bem como de alvará de construção válido para realizar as operações em causa.
- Sendo prática corrente neste sector de actividade o recurso a subempreiteiros, constatou-se que o número de contribuinte da “G.........., Lda. não consta em anexo O da declaração anual, não existindo assim, qualquer evidência de que a sociedade tenha recorrido à subcontratação de terceiro para realização dos serviços.
-A emissão das facturas foi efectuada por pessoas sem qualquer ligação à sociedade.
- O único sócio gerente conhecido da sociedade, esteve preso, no período ao qual as facturas dizem respeito.
VI.3 CONCLUSÕES
Dos factos expostos anteriormente conclui-se assim que as facturas emitidas em nome dos fornecedores referidos nos pontos anteriores e registadas na contabilidade da “N.......... como custos do exercício, não correspondem a serviços efectivamente prestados, e consequentemente também não representam encargos reais suportados pela empresa para a obtenção dos seus proveitos, uma vez que como ficou demonstrado, as empresas em causa não possuíam estrutura empresarial, ou seja de meios de produção suficientes para realizar as operações descritas nas facturas emitidas, pelo que se propôs as seguintes correcções:
1. Em sede de IRC Custos não aceites fiscalmente (Art. 23º do Código do IRC Dado que, as facturas emitidas em nome da “C.........., Lda. e da “G.........., Lda. não titulam custos indispensáveis à realização dos proveitos da empresa, vai-se, com base no artigo 23º do Código do IRC, acrescer ao resultado fiscal considerado, os montantes resultantes do somatório daquelas facturas. Assim, o montante total dos custos não aceites fiscalmente é o seguinte:

FornecedorValor Facturado
Facturas da “C.........., Lda”68.000,00
Facturas da “G.........., Lda”84.441,94
Total152.441,94
Assim, o resultado fiscal declarado pelo sujeito passivo, relativamente ao exercício objecto de análise, vai ser alterado da seguinte forma:
2007
Lucro Fiscal Declarado23.653,59
Correcções152.441,94
Lucro Fiscal Corrigido176.095,53
(…) (cfr. doc. junto a fls. 30 a 40 do processo instrutor junto aos autos);

9. Em 16/12/2011 é elaborado o Parecer do Chefe de Equipa concordando com o relatório identificado no ponto anterior do qual consta, nomeadamente, o seguinte: ¯Em sede de IRC, os custos titulados por aquelas facturas, no montante total de 152.441,96 eur, não é aceite fiscalmente, nos termos do artigo 23º do CIRC, pelo que, o resultado fiscal declarado seria corrigido da seguinte forma: Lucro Tributável Declarado: 23.653,59 eur Correcções: 152.441,96 eur Lucro Tributável corrigido: 176.095,53 eur (…) (cfr. doc. junto a fls. 30 e 31 do processo instrutor junto aos autos);

10. Em 16/12/2011 foi elaborado o Parecer do Chefe de Equipa do qual consta o seguinte: “Confirmo os fundamentos de facto e de direito expressos no relatório da acção inspectiva e parecer elaborados para o efeito. Notifique-se nos termos do art. 62º do RCPIT. À Consideração Superior Setúbal 2011.12.16 Maria .......... (cfr. doc. junto a fls. 30 do processo instrutor junto aos autos);

11. Em 16/12/2011 foi proferido o seguinte Despacho: “Concordo com as conclusões e propostas que constam dos pareceres dos Srs. Chefes de Equipa e Chefe de Divisão face aos fundamentos vertidos no relatório anexo. Proceda-se em conformidade. Setúbal, 2011.12.16 A Directora de Finanças Por Delegação O Director de Finanças Adjunto José ..........(cfr. doc. junto a fls. 30 do processo instrutor junto aos autos);

12. Em 23/01/2012 deu entrada no serviço de finanças de Setúbal … uma reclamação graciosa interposta pela Impugnante relativa à liquidação adicional de IRC do exercício de 2007 (cfr. doc. junto a fls. 3 a 26 do processo instrutor junto aos autos);

13. Por despacho de 12/02/2012 foi ordenado ouvir a Impugnante sobre a intenção de indeferir a reclamação graciosa identificada no ponto anterior (cfr. doc. junto a fls. 43 do processo instrutor junto aos autos);

14. Por despacho de 05/03/2012 foi indeferida a reclamação graciosa interposta pela Impugnante (cfr. doc. junto a fls. 54 do processo instrutor junto aos autos);

15. Em 02/04/2012 a Impugnante apresentou recurso hierárquico do indeferimento da reclamação graciosa (cfr. doc. junto a fls. 3 do processo do recurso hierárquico junto ao processo instrutor junto aos autos);

16. Por despacho de 24/07/2012 foi o recurso hierárquico indeferido (cfr. doc. junto a fls. 39 do processo do recurso hierárquico junto ao processo instrutor junto aos autos);

17. A sociedade Impugnante trabalhava na área da construção civil (depoimento da testemunha Mário ..........);

18. A sociedade recorria a subempreiteiros, especialmente depois de ter ficado com obras da V.......... (depoimento da testemunha Mário ..........);

19. As máquinas utilizadas eram da Impugnante (depoimento da testemunha Mário ..........);

20. A empresa trabalhava com pedreiros, calceteiros que eram quem aparecia. (depoimento da testemunha Mário ..........)


***
A decisão recorrida fixou como factualidade não provada a seguinte:
DOS FACTOS NÃO PROVADOS
a) Aos autos nenhuma prova foi junta do pagamento das facturas emitidas pela sociedade “C.........., Lda;
b) Não ficou provado que as sociedades “C.........., Lda. e “G.........., Lda. se encontravam inscritas na Segurança Social com trabalhadores ao seu serviço no ano de 2007 – nenhum documento foi junto aos autos pela Impugnante comprovativo desse facto;
c) Não ficou provado que os trabalhadores que trabalhavam nas obras da Impugnante não eram contratados por ela própria, mas sim pela “C.........., Lda” de facto do depoimento da única testemunha ouvida apenas resulta claro que a Impugnante tinha trabalhadores que iam variando ao longo do tempo/dias.
Dos factos constantes da impugnação, todos objectos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.”

***


A sentença consignou no item referente à motivação o seguinte:

MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO

A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, bem como do depoimento da testemunha arrolada e ouvida pelo Tribunal, o Sr. Mário .........., trabalhador da impugnante desde 2006/2007 e durante cerca de 3 ou 4 anos. Era manobrador e chefe de equipa na sociedade.

O depoimento desta testemunha foi pouco segura no que respeita à prestação de serviços por parte das duas sociedades cujas facturas estão em causa nos autos, tendo inclusivamente feito referencia ao Sr. Romeu como representante da “G.........., Lda..

Foi muito vago e generalista no que se refere a pagamentos. Afirmou que normalmente as pessoas não queriam trabalhar se não recebessem em numerário mas nada de muito concreto em relação às duas sociedades em causa.


***

Atento o disposto no artigo 662.º, n.º 1, do CPC, acorda-se em alterar a redação de parte da factualidade mencionada em II), em virtude de resultarem dos autos elementos documentais que exigem tal alteração.(1)

Nesse seguimento, procede-se à alteração da redação do facto que infra se identifica, por referência à sua enumeração efetuada em 1.ª instância:

1. No âmbito da ação de inspeção externa à sociedade “G.........., Lda”, a Divisão de Inspeção Tributária II-Direção de Finanças de Setúbal, expediu ofício nº ....., datado de 29 de julho de 2010, endereçado à “N.........., Lda”, com o seguinte teor:


"Texto integral no original; imagem"


(cfr. doc. junto a fls.63 dos autos)

***

Por se entender relevante à decisão a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada adita-se ao probatório, ao abrigo do preceituado no artigo 662.º, nº 1, do CPC, ex vi artigo 281.º do CPPT, a seguinte factualidade:

21. A 06 de outubro de 2010, no âmbito de pedido de esclarecimentos efetuados pela Divisão de Inspeção Tributária II-Direção de Finanças de Setúbal, à “N.........., Lda”, no decurso da ação de inspeção externa à sociedade “G.........., Lda”, foi apresentado requerimento com o seguinte teor:

“Assunto: Pedido de Elementos

Exmos Senhores,

Dos elementos solicitados via telefone por V. Exas, na sequência da nossa deslocação aos vossos serviços juntamos os seguintes elementos:

· Extracto de Conta Corrente

· Listagem dos Cheques já solicitados no BES

· Facturas e Recibos

· O nome da pessoa que falávamos era o Srº Romeu o contacto ..........”

(cfr. doc. de fls. 61 dos autos);


***


III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRC, do exercício de 2007, tendo sentenciado:

“- A procedência quanto às correções efetuadas relativamente às facturas da sociedade G.........., Lda;

- A Improcedência quanto às correções efectuadas relativamente às facturas da sociedade C.........., Lda”.

Em termos de delimitação da lide recursiva, importa salientar que apenas o IRFP interpôs recurso jurisdicional da sentença visada nos presentes autos, tendo, por isso, transitado em julgado as correções relativamente às faturas emitidas pela sociedade “C.........., Lda”.

Mais importa ter presente que em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se a sentença padece de erro de julgamento por errónea apreciação dos pressupostos de facto e de direito, competindo, para o efeito, analisar se os indícios recolhidos pela Administração Tributária são insuficientes para a desconsideração como custo fiscal dos valores faturados pela sociedade “G.........., Lda”, (doravante “G.........., Lda” como entendeu o Tribunal a quo, ou se mediante a prova produzida a Administração Tributária provou os factos que se circunscreviam na sua esfera jurídica.

Apreciando.

A Recorrente defende que o Tribunal a quo, incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito, relevando, para o efeito, que não podia concluir que havia prova parcial do pagamento das faturas da sociedade “G.........., Lda”, visto que a prova carreada no âmbito inspetivo e expressamente indicada no Relatório de Inspeção são meras notas de pagamento, nunca tendo sido apresentados quaisquer cheques.

Com efeito, sublinha a Recorrente que o Tribunal a quo não podia concluir que a Administração Tributária se limitou a desconsiderar os cheques apresentados pela Recorrida quando, na verdade, a mesma nunca apresentou quaisquer cheques.

Mais sublinha que se era de fundamental relevância, como reputa e fundamenta a decisão recorrida, que a Administração Tributária apurasse quem havia levantado os cheques, então a Meritíssima Juíza do Tribunal a quo, deveria ter ordenado as correspondentes diligências para apuramento da verdade material e não decidir no sentido em que decidiu, sem apurar dessa mesma verdade material, sob pena de incorrer em violação do artigo 13.º do CPPT.

Concretiza, para o efeito, que do teor do Relatório de Inspeção Tributária o que se extrai é que no decurso da ação de inspeção tributária ao fornecedor “G.........., Lda”, a Recorrida foi notificada para juntar um conjunto de documentação apta a demonstrar a efetividade das operações, mormente, comprovativos bancários dos pagamentos das faturas com fotocópias frente e verso dos cheques eventualmente utilizados nos pagamentos, limitando-se esta a apresentar ofícios endereçados à sociedade visada sob o título “Notas de Pagamento” e onde são mencionadas essas faturas e alguns cheques de valor parcial, sem que, de facto, as fotocópias frente e verso dos cheques eventualmente utilizados nesses pagamentos, alguma vez tenham sido remetidas aos serviços de inspeção tributária pela Recorrida.

Conclui, assim, que impendendo o ónus da prova sobre a Recorrida e não tendo esta, feito essa prova, não restava alternativa aos serviços inspetivos, senão desconsiderar a informação relativa aos cheques alegadamente utilizados para pagamento das três faturas da sociedade “G.........., Lda” já que a mesma não estava sustentada na devida prova documental e, consequentemente, essas mesmas faturas.

Ademais, importa valorar que a Recorrida na sequência da notificação do projeto de relatório optou por entregar uma declaração de substituição, pelo que, só se pode concluir que a atuação dos serviços inspetivos se apresenta imaculada.

Termina dizendo, que ao fazer recair sobre a Administração Tributária o ónus da prova dos beneficiários dos cheques que a Recorrida alega ter utilizado no pagamento das três faturas da sociedade “G.........., Lda”, emitidas em 2007, a Meritíssima Juíza do Tribunal a quo violou o disposto no artigo 74.º, da LGT.

Vejamos, então, se assiste razão quanto ao erro de julgamento, relevando, desde já, que a Recorrente não impugna a matéria de facto, entendendo apenas que o Tribunal a quo valorou erradamente a prova produzida, mormente, em termos de comprovativos de pagamento, e nessa medida concluiu desacertadamente pela falta de indícios recolhidos pela entidade fiscalizadora.

Ora, como visto, o erro de julgamento coaduna-se com a prova efetiva da materialidade das operações e a respetiva desconsideração fiscal dos custos respeitantes ao exercício de 2007, impondo-se, por isso, começar por aferir como se processa o direito adjetivo fiscal em sede probatória e quais as consequências que dimanam da sua regulamentação.

Em sede de procedimento administrativo tributário incumbe à Administração Tributária a prova dos factos constitutivos do ato administrativo, ou seja, compete à entidade fiscalizadora aquilatar e indagar sobre a verificação do facto tributável e demais elementos pertinentes à liquidação do imposto, porquanto, o procedimento só pode produzir uma liquidação em sentido estrito quando, face aos elementos apurados, estiver adquirida a plena convicção da existência e conteúdo do facto tributário.

De resto, tal conclusão resulta evidente em face do princípio da verdade material, ínsito nos artigos. 50.º, do CPPT e 58.º, n.º 1, da LGT.

Com efeito, o contribuinte goza da presunção de verdade da sua declaração, nos termos consignados no artigo 74.º, n.º 1 da LGT, logo compete à Administração Tributária o ónus da prova dos pressupostos legais da sua atuação, in casu a demonstração de que os indícios por si recolhidos no decurso da ação inspetiva são sérios e suficientes para concluir pela inexistência ou simulação de uma relação económica que sustente as faturas em apreço.

Nessa medida, tem a Administração Tributária o dever de averiguar e reunir indícios conducentes ao afastamento da declaração apresentada pelo contribuinte, ou melhor, “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém diretamente, mas indiretamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova(2)

De sublinhar, neste particular, que não é exigível que a Administração Tributária efetue uma prova direta da simulação, pelo que cumprindo a Administração Tributária aquele ónus e ilidindo, desse modo, a presunção de veracidade da declaração do sujeito passivo consagrada no referido artigo 74.º, n.º 1 da LGT, passa a competir, por seu turno, a este último o ónus da prova da realidade subjacente à fatura, infirmando os indícios recolhidos pela entidade fiscalizadora.

Uma vez analisada a questão da repartição do ónus da prova, importa transpor o direito para o caso em apreço.

Vejamos, então, se a Administração Tributária reuniu ou não os elementos necessários para legitimar a sua atuação, ou seja, se foram recolhidos indícios sérios e bastantes que permitam concluir pela simulação das operações constantes nas faturas.

Para o efeito, importa convocar o teor do Relatório da Administração Tributária, e atentar nos factos indiciários convocados pela Entidade fiscalizadora.

São evidenciados como factos indiciários os que infra se descrevem:

Ø Incumprimento declarativo em sede de IRC e IVA, no ano de 2007;

Ø Inexistência de quaisquer elementos que comprove a efetividade da realização dos serviços nomeadamente, orçamentos ou contratos de empreitada;

Ø Informação fornecida e relacionada com os pagamentos sem credibilidade;

Ø Inexistência, por parte da empresa “G.........., Lda., de uma estrutura empresarial compatível com as transações descritas nas faturas, consubstanciada na:

o Inexistência de meios humanos e materiais, concretamente:

-Ausência de declarações de remunerações junto da Segurança Social;

-Sem veículos registados em sua propriedade;

-Alvará de construção nº ..... cancelado, desde 31 de janeiro de 2006;

Ø Inexistência de qualquer evidência de que a sociedade tenha recorrido à subcontratação de terceiro para realização dos serviços, não constando número de contribuinte da sociedade “G.........., Lda” no anexo O da declaração anual;

Ø Desconexões na identificação da pessoa de contacto na sociedade “G.........., Lda.”;

Ø Emissão das faturas efetuada por pessoas sem qualquer ligação à sociedade.

Ø Único sócio gerente conhecido da sociedade, esteve preso, no período de 27-09-2005 a 16-12-2008.

Ø Auto de Declarações de Maria ...........

Concluindo, nessa medida, que as faturas emitidas pela sociedade “G.........., Lda” não correspondem a serviços efetivamente prestados, e consequentemente não representam encargos reais suportados pela empresa para a obtenção dos seus proveitos subsumíveis no artigo 23.º do CIRC, devendo, por isso, ser acrescido ao lucro fiscal o valor de €84.441,94.

Ora, atentando nos aludidos indícios, e contrariamente ao defendido pelo Tribunal a quo entende-se que os mesmos são de molde a justificar e desconsiderar a efetividade dos serviços contemplados nas faturas emitidas pela sociedade “G.........., Lda”.

Vejamos, então, porque assim o entendemos.

Com efeito, transpondo as regras do ónus da prova para o caso dos autos, concluímos que a Administração Tributária reuniu diversos factos, que fez constar do Relatório de Inspeção Tributária e que, no seu conjunto, permitem sustentar um juízo de forte probabilidade no sentido de que as referidas operações seriam fictícias, o que a levou a desconsiderar os custos, alegadamente, incorridos.

Conforme já devidamente enunciado anteriormente, a Administração Tributária não precisa de fazer prova da simulação apenas trazer à colação indícios suficientes para colocar em causa a veracidade da escrita.

No caso vertente, como visto, é convocada, desde logo, a inexistência de estrutura empresarial, consubstanciada na circunstância de inexistirem meios humanos e materiais para o exercício da atividade. Note-se, neste particular, que o alvará da sociedade visada encontra cancelado desde 31 de janeiro de 2006.

É certo que esses factos são, efetivamente, fatores exógenos que indiciam comportamento relapso do fornecedor e não da própria Recorrida, porém, também é verdade que a entidade fiscalizadora não deve descurar essa informação só pelo simples facto de se tratar de conduta de terceiro. Tal constatação pode e deve representar um ponto de partida para uma ação de inspeção, mas não exime a Administração Tributária de demonstrar os elementos, os factos que permitem concluir pela existência de indícios seguros de faturação falsa e legitimar as correções por operações simuladas.

Noutra formulação, a qualidade dos emitentes só quando é desacompanhada de outros elementos fáticos que revelem falsificação das faturas é que é manifestamente insuficiente para ilidir a presunção de veracidade de que goza a contabilidade do comprador, o que não é o caso dos autos.

Ter-se-á, portanto, de valorar enquanto circunstância indiciante a alegada inexistência de estrutura empresarial da fornecedora.

Adicionalmente, não se pode descurar a circunstância evidenciada no Relatório de Inspeção Tributária de que as quantidades e valores constantes nas faturas se reportam a várias obras, sem a concreta individualização da obra, o que sopesado com a circunstância de inexistirem contratos de empreitada e orçamentos, nos permite inferir, outrossim, pela falta de materialidade das operações.

Não pode, igualmente, ser descurada a circunstância das faturas terem sido objeto de emissão por pessoas sem qualquer ligação à sociedade “G.........., Lda”, de existirem desconexões na identificação do elo de contato da mesma e o facto do único sócio gerente conhecido da sociedade, ter estado preso durante o período em que, alegadamente, foram emitidas as competentes faturas.

Acresce que a inexistência de qualquer evidência de que a sociedade tenha recorrido à subcontratação de terceiro para realização dos serviços, mediante análise da declaração anual, balanceada com os demais indícios permite indiciar, de forma razoável, a existência de operações sem aderência à realidade.

Sendo que a alegada falta de credibilidade dos pagamentos permite, igualmente, atestar nesse sentido.

Senão vejamos.

No concernente ao pagamento das faturas em questão e ainda que a conduta da Recorrida não possa ser apelidada de falta de colaboração, a verdade é que a mesma não apresentou elementos fidedignos a atestar e a demonstrar o pagamento das faturas colocadas em causa.

Apreciando.

Do acerco fático dos autos, resulta que no âmbito da ação inspetiva externa à sociedade “G.........., Lda”, a Administração Tributária solicitou, em julho de 2010, mediante ofício endereçado à Recorrida os seguintes elementos relacionados com o pagamento das faturas em questão: “5.Comprovativos bancários dos pagamentos das faturas. No caso de os pagamentos terem sido efectuados através de cheque, fotocópias frente e verso dos mesmos”.

Sendo que, em resposta, a Recorrida apresenta, em agosto de 2010, uma listagem com identificação dos cheques emitidos para pagamento, os respetivos extratos de conta corrente e os correspondentes recibos, fazendo expressa alusão que já requereu os mesmos à Instituição Bancária.

Mais resulta da factualidade assente que, a Administração Tributária fez uma diligência adicional via contacto telefónico, tendo a Recorrida em resposta datada de outubro de 2010, (na qual se refere expressamente a esse contacto telefónico e à exigência dos documentos), voltado a sublinhar que a listagem dos cheques já havia sido solicitada ao Banco, apenas elencando um facto novo nessa resposta concernente com a identificação da pessoa que seria o elo de ligação entre a Recorrida e a empresa “G.........., Lda”.

Logo, do supra exposto resulta, efetivamente, que a Recorrida não apresentou os cheques, entenda-se cópia física, frente e verso, dos mesmos, pelo que no sentido apontado pela Recorrente o Tribunal a quo, partiu de uma premissa errónea, por não verificada.

Com efeito, os aludidos meios de pagamento nunca foram apresentados, sendo que tais elementos documentais revestem grau de importância elevada em termos de prova da efetividade das operações, pelo que a Recorrida não pode limitar-se a remeter meros documentos internos, e aduzir, singelamente, que já pediu os elementos às respetivas Instituições Bancárias, e depois nunca os exibir ou apresentar qualquer justificação para o efeito.

Aliás, do confronto da factualidade elencada nos pontos 1., 2., e 21., o que se atesta é que num período temporal de cerca de três meses, a Recorrida volta a apresentar exatamente a mesma resposta, ou seja, a frisar que já requereu os elementos sem nunca os apresentar.

Ademais, importa ter presente que, conforme evidenciado no Relatório de Inspeção Tributária, tais elementos não permitiam, tão-pouco, atestar a totalidade do pagamento das faturas, apenas pagamentos parciais.

Além disso, é preciso não perder de vista que a junção aos autos de cheques não permite inferir, desde logo e sem mais, pela materialidade ou não materialidade das operações, sendo premente aferir-se do seu circuito comercial e cotejá-lo com a demais prova carreada para os autos. Neste particular, convoque-se o Aresto do TCA Sul, proferido no processo nº 08666/15, de 25 de maio de 2017, disponível para consulta em www.dgsi.pt.

Porém, o certo é que, tendo sido insistentemente solicitados e não tendo sido sendo apresentados, não podem deixar de ser considerados como um indício forte de que os custos incorridos não têm aderência à realidade.

É certo, igualmente, que em sentido contrário ao evidenciado pela Recorrente a falta de exercício de audição prévia e a apresentação de declaração de substituição não permite inferir, per se, no sentido da assunção de custos fictícios, não só porque o artigo 60.º da LGT mais não representa que uma faculdade concedida ao contribuinte, como, in casu, não se pode retirar que a apresentação da declaração de substituição(3), decorreu de ato de iniciativa do contribuinte que com ele visasse corrigir um dado que inserira na sua declaração inicial de rendimentos, mas sim que surge na sequência de uma ação inspetiva.

De todo o modo, o Tribunal ad quem não pode descurar, tendo de valorar e ponderar, em conformidade, que a Recorrida não só não os apresentou em sede de ação de inspeção externa à sociedade “G.........., Lda”, como não os apresentou no âmbito da sua ação de inspeção, sendo que foi notificada do respetivo projeto de correções -do qual resultava, de forma clara e inequívoca o elenco dos indícios, com alusão expressa à fragilidade dos meios de pagamento e as propostas de correções-e ulteriormente em sede judicial.

Acresce, outrossim, que atentando no teor da petição inicial a Recorrida abandona a argumentação que radica no pagamento das faturas através de cheques nominativos à sociedade “G.........., Lda” , não fazendo qualquer alusão a esses meios de pagamento. Com efeito, atentando nos artigos 38.º e 39.º da p.i. a Recorrida alega que os pagamentos aos gerentes da sociedade “G.........., Lda”, foram feitos em dinheiro, justificando, nesse particular, que tal dimanava de uma exigência dos próprios fornecedores atentas as inibições bancárias impostas pelo Banco de Portugal e que por isso não tinham contas bancárias abertas.

Sublinhando, no artigo 40.º da p.i. que “estava-lhes vedada a possibilidade de depositar os cheques ou efectuar o respectivo endosso”.

Ora, face a todo o exposto, conclui-se que contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, não só não existe prova, ainda que parcial, do pagamento das faturas emitidas pela sociedade, como não existem elementos fidedignos que permitam inferir pela existência de indícios de pagamentos.

Pelo que, não precisando a Administração Tributária de fazer prova da falsidade/simulação das faturas, mas apenas evidenciar a consistência do seu juízo, afigura-se que, in casu, invocou factos que traduzem uma probabilidade séria de as operações constantes nas faturas serem simuladas, ilidindo, assim, o ónus probatório que sobre si impendia.

De relevar, in casu, que a Administração Tributária pautou toda a sua atuação pelo inquisitório, com pedidos de esclarecimentos e diligências evidenciadas no Relatório de Inspeção Tributária, com total colaboração, assegurando o contraditório e visando, inequivocamente, a descoberta da verdade material, não se vislumbrando, de todo, qualquer deficit instrutório.

Destarte, tendo a Administração Tributária cumprido o ónus probatório que recaía na sua esfera jurídica, competia à Recorrida ter apresentado prova capaz de destruir esses indícios, demonstrando que os serviços elencados nas faturas em causa são reais, isto é, que as faturas emitidas pela sociedade “G.........., Lda” têm subjacentes operações com materialidade, o que, in casu, não logrou fazê-lo.

Com efeito, atentando na factualidade assente, não impugnada, não resulta que a Recorrida tenha feito prova positiva da aludida materialidade das aquisições, não sendo, de todo, suficiente para cumprir o ónus que a este respeito lhe era legalmente imposto, a factualidade consignada nos pontos 17. a 20.

Dito de outro modo, a Recorrida não cumpre o ónus da prova de que as operações, efetivamente, se realizaram e que se verificam os pressupostos de que depende a sua dedutibilidade fiscal, com as genéricas asserções fáticas de que a sociedade trabalhava na área da construção civil, recorrendo, para o efeito, a subempreiteiros, sendo que as máquinas utilizadas eram da Impugnante, trabalhando, indistintamente, com pedreiros e calceteiros.

Assim, tudo visto e ponderado, conclui-se que a Administração Tributária elencou indícios consistentes, sérios e reveladores de uma alta probabilidade das faturas emitidas pela sociedade “G.........., Lda” não corresponderem a operações reais, os quais permitem suportar-atenta a falta de prova positiva por parte da Recorrida- objetivamente e à luz das regras da experiência comum, a conclusão a que chegou e que determinou as correções à matéria coletável de IRC, do exercício de 2007, relativamente às faturas emitidas pela aludida sociedade.

Uma nota final apenas quanto ao in dubio contra fiscum.

Dispõe expressamente o preceito legal 100.º do CPPT, sob a epígrafe de “Dúvidas sobre o facto tributário e utilização de métodos indiretos” que : “Sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o ato impugnado ser anulado”.

A letra do citado preceito legal consagra um princípio estruturante e inovador no direito tributário que estipula, per se, que a dúvida reverte a favor do contribuinte, em substituição do princípio “in dubio pro fiscum” que, na prática era considerado no regime anterior à Reforma Fiscal.

Neste sentido, importa ter presente os ensinamentos de Alberto Xavier que preconizam que a Administração Tributária só deve praticar o ato tributário-liquidação, quando : “formar convicção da existência e conteúdo do facto tributável”(4).

Ora, assim sendo, em caso de subsistência de dúvida “acerca do objeto do processo deve a Administração Fiscal abster-se de praticar o ato tributário, dando assim cumprimento ao princípio in dubio contra fiscum(5).

No caso vertente, não se verifica qualquer dúvida relativamente ao facto tributário ou à sua quantificação, uma vez da prova produzida em juízo e dos elementos carreados para os autos não resulta que tenha sido cometida qualquer ilegalidade pela Administração Tributária.

E porque assim é, não tem a Recorrida direito a fazer refletir negativamente esses custos declarados na determinação da respetiva matéria tributável, nos termos que decorrem do artigo 23.º do CIRC, pelo que a sentença que assim o não decidiu tem de ser revogada.


***


IV- Decisão

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul, em CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO E REVOGAR A DECISÃO RECORRIDA, em consequência, julgar improcedente a impugnação judicial, com a consequente manutenção do ato de liquidação e demais legais consequências.

Custas pela Recorrida.

Registe e Notifique.

Lisboa, 31 de outubro de 2019

(Patrícia Manuel Pires)

(Mário rebelo)

(Anabela Russo)


___________________________________________________
(1) Cfr. António dos Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2018, p. 286.
(2) Vide Acórdão do TCA Sul, proferido no processo nº 06418/13, de 7 de maio de 2013.
(3) Vide Acórdão do STA, proferido no processo nº 0901/14, de 28-01-2015.
(4) Alberto Xavier-Conceito e natureza do acto tributário, página 150.
(5) vide ob. citada, páginas 158 e 169.