Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:235/13.6BEFUN
Secção:CT
Data do Acordão:09/28/2017
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL
REGIME DAS MEDIDAS DE APOIO À CONTRATAÇÃO DE JOVENS À PROCURA DO PRIMEIRO EMPREGO.
Sumário:1) Por regra, as contribuições para a Segurança Social resultam da apresentação das declarações de remunerações pelo contribuinte, a quem compete também proceder à liquidação dos montantes a entregar (mediante aplicação das percentagens fixadas na lei sobre as remunerações).
2) Nessa situação, a lei permite a extracção de certidões de dívida perante a mera constatação de omissão de um pagamento, sem que haja um acto administrativo ou tributário prévio definidor da obrigação, motivo por que não é imposta por lei a notificação de qualquer acto antes da citação em processo de execução fiscal.
3) Competem à entidade empregadora as obrigações de declaração de remunerações dos trabalhadores a seu cargo, de registo e de liquidação das correspondentes contribuições, bem como o pagamento das contribuições e quotizações dos trabalhadores ao seu serviço.
4) A falta de preenchimento de qualquer condição estabelecida no regime das medidas de apoio à contratação de jovens à procura do primeiro emprego, aprovado pela Portaria n.º 130/2009, de 30.01, e pela Portaria n.º 125/2010, de 01.01, em relação a certa relação laboral objecto de apoio implica a restituição dos apoios concedidos, sem qualquer possibilidade de redução proporcional do mesmo.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

I- Relatório

F... interpõe o presente recurso jurisdicional contra a sentença proferida a fls. 102/107, que julgou improcedente a oposição deduzida à execução fiscal n.º ... e apensos, que corre termos no Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM, por dívidas de contribuições referentes ao período compreendido entre Setembro de 2009 a Janeiro de 2012, no montante de €7.062,95.

Nas alegações de recurso de fls. 133/140, o recorrente formula as conclusões seguintes:
i) Ficou provado que, antes da citação da presente execução, o recorrente jamais foi notificado pela Segurança Social para pagar as contribuições objecto dos autos.
ii) Ficou demonstrado que só com a contestação da oposição à execução, a Segurança Social informou ou comunicou ao recorrente que valores estavam por pagar, qual a natureza da dívida, a que respeitavam e a que período dizia respeito.
iii) Só com a contestação da Segurança Social veio o recorrente tomar conhecimento, pela primeira vez, que a dívida em questão referia-se a alegadas contribuições da segurança social em dívida das trabalhadoras D... e M....
iv) Se comprovou que, no momento da citação, o recorrente ignorava e desconhecia por completo que parte das contribuições em falta referiam-se à trabalhadora M....
v) Até hoje o recorrente desconhece que parte das alegadas dívidas se refere especificamente à trabalhadora M....
vi) A falta de notificação das contribuições da Segurança Social em data anterior à citação da execução impediu o recorrente de alegar ou produzir prova ou defesa no que respeita às contribuições da trabalhadora M....
vii) A falta de notificação da liquidação e respectiva fundamentação em data anterior à execução tornou a dívida sub judice inexigível.
viii) A falta da referida notificação e fundamentação impediu o recorrente de exercer o direito de defesa, em clara violação a princípios, direitos e garantias fundamentais previstos no artigo 268.º, n.º 3 e 4, da Constituição da República Portuguesa, como é o caso do direito à fundamentação e o direito à tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos e interesses legítimos;
ix) O tribunal a quo não se pronunciou sobre questão que devia ter apreciado, dada a sua relevância para a boa decisão da causa;
x) Ficou provado que, no dia 1 de Setembro de 2009, o ora recorrente celebrou contrato de trabalho sem termo com a trabalhadora D..., contrato esse que durou até 6 de Janeiro de 2012, isto é, durante 28 meses e 5 dias;
xi) Ficou comprovado que a trabalhadora D... era, à data da contratação, uma jovem à procura do primeiro emprego, de idade superior a 16 anos e inferior a 30 anos, e que nunca havia prestado actividade ao abrigo de contrato de trabalho por tempo indeterminado anteriormente;
xii) Se demonstrou que o recorrente sempre acreditou que estava isento do pagamento de contribuições para a segurança social dessa trabalhadora e que a isenção em questão havia sido oportunamente e formalmente requerida junto da Segurança Social pela referida trabalhadora D..., crença essa que era suportada pelo facto do mesmo jamais ter recebido qualquer correspondência ou notificação da Segurança Social a comunicar que estava em incumprimento e que tinha contribuições em atraso;
xiii) Ficou provado que a trabalhadora D..., enquanto empregada forense, tratava de toda a parte administrativa do escritório do recorrente, recebia as cartas dirigidas ao escritório e que era ela que usualmente lidava e dirigia-se aos serviços públicos, repartições de finanças e segurança social e câmaras, em representação do escritório, para apresentar requerimentos, entregar e levantar documentos;
xiv) Em caso de preenchimento dos requisitos legais para beneficiar da isenção de pagamento de contribuições, apenas poderia ser exigido ao recorrente o pagamento do valor correspondente a 8 meses de contribuições, dado ser esse período de manutenção do posto de trabalho que não foi cumprido (36 meses – 28 meses);
xv) O tribunal a quo errou no seu julgamento, mediante uma apreciação e valoração inapropriada e incorrecta dos factos e do direito aqui aplicáveis, valoração essa que deveria ter conduzido a uma decisão diversa da encontrada, designadamente, à procedência da oposição à execução, nos termos e com os fundamentos atrás invocados.


X

A fls. 142/149, o recorrido proferiu contra-alegações, pugnando pela manutenção do julgado.

Formula as conclusões seguintes:
1) Não tendo o recorrente deduzido a excepção de inexistência de acto prévio de liquidação/caducidade da liquidação na sua oposição, não assiste ao tribunal a quo o dever de se pronunciar sobre excepções não deduzidas na oposição ou em qualquer outro articulado superveniente;
2) Ainda que o recorrente tivesse deduzido a excepção de inexistência de acto prévio de liquidação, a mesma se traduziria num facto inócuo para a boa decisão da causa porque as dívidas de contribuições à Segurança Social e, neste caso concreto, dívida de contribuições e juros de mora, não carecem de qualquer acto prévio de liquidação;
3) As declarações de remunerações foram declaradas e autoliquidadas pela entidade empregadora (ora recorrente), pelo que necessariamente se conclui que o recorrente tinha pleno conhecimento das quantias que mensalmente tinha que pagar, não existindo qualquer ónus para a segurança social traduzido num non facere, no que à liquidação da taxa contributiva diz respeito;
4) O recorrente nunca beneficiou da isenção de pagamento de contribuições referente às trabalhadoras D... e M..., pelo facto de nunca ter requerido tal isenção com base em incentivos à contratação de jovens à procura de 1º emprego;
5) O ISSM, IP-RAM é alheio às razões pelas quais o recorrente, por sua livre e espontânea vontade procedeu ao pagamento somente de 11% (quotizações) do valor total das Declarações de remuneração por si declaradas e liquidadas;
6) E ainda que se colocasse a hipótese do recorrente ter requerido tal isenção, jamais teria beneficiado da mesma, dado que as trabalhadoras não estiveram a seu cargo pelo período de 36 meses, requisito esse imposto pela medida de apoio à contratação, neste caso de jovens à procura de 1ª emprego, nos termos das Portarias supra invocadas em articulação com o DL 89/95, de 6 de Maio;
7) Pelo que são exigíveis todas as contribuições (à taxa de 23,75%), referentes às trabalhadoras D... e M..., declaradas e liquidadas pelo próprio recorrente, referente ao período em litígio (todo o período que o recorrente erroneamente julgou estar isento) e que se encontra em dívida, por incumprimento das condições de atribuição dos apoios (arts.º 9.º e 8.º das Portarias n.º 130/2009, de 20.01 e n.º 125/2010, de 01 de Março e do DL invocado), e não apenas pelo período de 8 meses conforme o recorrente vem invocar nas suas alegações de recurso.
8) Concluindo, em margem para dúvidas, que não existe a necessidade de acto prévio de liquidação, nem caducidade da quantia exequenda nos presentes autos, sendo a mesma exigível, em conformidade com o que foi decidido pelo tribunal a quo, devendo-se confirmar a sentença recorrida, que julgou improcedente a oposição apresentada pelo contribuinte F....


X

O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr. fls. 157/159) no qual se pronuncia no sentido da recusa do provimento do presente recurso jurisdicional.

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II- Fundamentação

1.De Facto.

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:
1) O Oponente exerce a profissão de advogado desde 14/07/2006.
2) O Oponente encontra-se inscrito na CPAS, tendo pago de contribuições, na qualidade de beneficiário, no ano de 2011, o valor de €82,45 e, no ano de 2012, o valor de €989,40.
3) D... nasceu em 22/01/1990.
4) Em 01/09/2009, o Oponente celebrou um contrato de trabalho de duração indeterminada com D..., para o exercício das funções de escriturária - empregada forense.
5) Em 01/09/2009, D... foi inscrita no Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM, como trabalhadora por conta do Oponente.
6) Em 06/01/2012, foi comunicado ao Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM a cessação do contrato de trabalho de D... por iniciativa desta.
7) M... nasceu em 02/03/1990.
8) Em 19/05/2010, M... foi inscrita no Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM, como trabalhadora por conta do Oponente, tendo sido declarada como data de início de actividade 01/05/2010, para o exercício de empregada forense.
9) Em 31/07/2011, foi comunicado ao Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM a cessação do contrato de trabalho de M... por iniciativa da entidade empregadora, por extinção do posto de trabalho.
10) O Oponente não procedeu ao preenchimento e entrega do modelo n.º 1066, actualmente Modelo GTE 1/2012, no Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM.
11) Em 30/04/2013, o Oponente foi citado da instauração do processo de execução fiscal n.º ... e Apensos, para pagamento da quantia de €7.062,95, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, na qual consta, entre o mais:
"Objecto e Função da Citação:
Pelo presente fica citado(a) de que foi(ram) instaurado(s) nesta Secção de Processos contra V. Exa.(s) o(s) processo(s) de execução fiscal supra indicado(s), devendo proceder ao pagamento da dívida exequenda e acrescidos no prazo de 30 (trinta) dias a contar da concretização da citação. // (...)
Identificação da Dívida em Cobrança Coerciva:
Quantia exequenda: €5.940,95    Acrescidos: €1.122,00      Total: €7.062,95."
12) D..., à data da sua contratação pelo Oponente, nunca havia celebrado um contrato de trabalho sem termo.


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Em sede de «FACTOS NÃO PROVADOS» consignou-se:

«Com relevância para a decisão da causa inexistem factos alegados a dar como não provados. // Consigna-se que não se tomou em consideração a demais matéria alegada por esta integrar factos inócuos para a decisão da causa ou não integrar factos mas antes meras conclusões, juízos de direito e considerações subjectivas».


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Em sede de «MOTIVAÇÃO DE FACTO» consignou-se:

«A matéria de facto dada como assente nos presentes autos foi a considera relevante para a decisão da causa controvertida segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito. // O Tribunal formou a sua convicção, quanto aos factos provados, pela análise crítica efectuada dos documentos constantes dos autos e do processo de execução fiscal, conjugados comas declarações de parte do Oponente e os depoimentos das testemunhas D... e V....

O Oponente referiu-se à contratação de duas empregadas para o escritório de advogados (uma no Funchal e outra no Porto Santo), sendo situações de primeiro emprego para ambas. Afirmou que era o empregador e que tinham celebrado um contrato de trabalho por tempo indeterminado. Afirmou que não sabia se tinha requerido a isenção de pagamento das contribuições à Segurança Social e que as duas empregadas não permaneceram 36 meses ao serviço.

A testemunha D... prestou depoimento de forma isenta e credível. Afirmou que foi o seu primeiro emprego e que nunca foi à segurança social requerer o apoio para o Oponente ficar dispensado do pagamento das contribuições inerentes à sua contratação. Disse ainda que abria a correspondência respeitante a processos e aos Tribunais, mas que não o fazia quando a correspondência era pessoal relativamente ao Oponente.

A testemunha V... disse ao Tribunal que D... foi contratada depois de outro funcionário e que o objectivo do Oponente era beneficiar dos apoios relativos a jovens à procura de primeiro emprego. Referiu que desconhecia a existência de notificações da segurança social para o Oponente».


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Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
13) Em anexo à citação referida em 11), foram juntas as certidões de dívidas seguintes: i) n.º 2400/2012, de 07.02.2012, contribuições de 09/2009 a 11/2011, montante: €5.221,02; ii) n.º 2401/2012, de 07.02.2012, juros de 10/2009, montante de €5,56; iii) n.º 5268/2012, de 11.04.2012, montante de €719, 93 – fls. 4/6 e 7, do pef.
14) Em 14.10.2009, o recorrido remeteu ao recorrente ofício, sob assunto: “1º emprego / desempregados de longa duração // NISS ... // Benef_ ... // D...”, com o teor seguinte:
«Na sequência da solicitação apresentada a 2009-10-08, informa-se o seguinte:
- O Decreto-Lei n.º 89/95, de 6 de Maio, com as alterações introduzidas no Decreto-Lei n.º 34/96, de 18 de Abril, apenas prevê a dispensa temporária do pagamento de contribuições pelas entidades empregadoras que celebrem contratos de trabalho sem termo com jovens à procura do primeiro emprego ou desempregados de longa duração (art.ºs lº e 5.º).
- As entidades empregadoras só podem auferir a dispensa de contribuições se tiverem a respectiva situação contributiva regularizada, e se tiverem ao seu serviço um número de trabalhadores subordinados superior ao que se verificava no último mês do ano civil anterior (art.º 5.º);
- A dispensa de contribuições deve ser requerida à instituição de segurança social no mês seguinte ao da celebração do contrato (art.º 19.º);
- A dispensa de contribuições produz efeitos desde a data da celebração do contrato e é concedida por 36 meses (art.ºs 6.º e 23.º). Nos casos em que o requerimento seja apresentado fora de prazo a dispensa produz efeitos a partir do início do mês em que o mesmo dê entrada na instituição e vigora pelo período remanescente (art.º 23.º).
O apoio também pode ser requerido ao abrigo da Portaria n.º 130/2009, de 30 de Janeiro, se reunir o previsto no n.º 13 do art.º 7.º
Quaisquer esclarecimentos adicionais poderão ser prestados no Departamento de Informação do Centro, à Rua Elias Garcia, 14, Funchal, ou no Serviço Local de Segurança Social da área da sua residência, devendo fazer-se acompanhar pelo presente ofício» - fls. 43 do pef.

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2. De Direito.

2.2.1. Nos presentes autos, vem sindicada sentença proferida a fls. 102/107, que julgou improcedente a oposição deduzida à execução fiscal n.º ... e apensos, que corre termos no Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM, por dívidas de contribuições referentes ao período compreendido entre Setembro de 2009 a Janeiro de 2012, no montante de €7.062,95.

2.2.2. Para julgar improcedente a presente oposição, a sentença estruturou, em síntese, a argumentação seguinte:
«Os factos provados permitem-nos constatar que o Oponente tinha cabal conhecimento da obrigatoriedade de inscrição das suas trabalhadoras, D... e M..., no regime geral dos trabalhadores por conta de outrem, dado que a admissão de ambas foi comunicada à segurança social. (…) // Com efeito, D... foi inscrita na segurança social em 01/09/2009 (data em que celebrou o contrato de trabalho com o Oponente), tendo sido comunicada a cessação do seu contrato de trabalho em 06/01/2012. // Da mesma forma, M... foi inscrita no Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM, em 19/05/2010, como trabalhadora por conta do Oponente, tendo sido declarada como data de início de actividade 01/05/2010 e, em 31/07/2011, foi comunicado ao Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM a cessação do seu contrato de trabalho por extinção do posto de trabalho. // Ou seja, é manifesto que os contratos/postos de trabalho não se mantiveram pelo período de trinta e seis meses, pelo que o Oponente nunca poderia beneficiar da isenção do pagamento das contribuições, por falta de preenchimento de um dos pressupostos indispensáveis para tal».

2.2.2. A presente intenção recursória centra-se sobre a alegada omissão de pronúncia em que terá incorrido a sentença recorrida sobre a alegada falta de notificação e alegada falta de fundamentação do acto tributário em liça (i); erro de julgamento no que respeita à falta de notificação e de fundamentação do acto tributário em apreço (ii); erro de julgamento, porquanto, segundo alega o oponente/recorrente, sempre acreditou que estava isento do pagamento de contribuições para a segurança social e que a isenção em causa havia sido formalmente requerida pela trabalhadora D... (iii); erro de julgamento, porquanto apenas poderia ser exigido ao oponente o pagamento do valor correspondente a 8 meses de contribuições, dado ter sido esse período de manutenção do posto de trabalho que não foi cumprido (iv).

2.2.3. No que respeita à alegada omissão de pronúncia em que terá incorrido a sentença sob escrutínio sobre a questão da alegada falta de notificação e alegada falta de fundamentação o acto tributário em liça, da sentença recorrida consta o seguinte:

«O Oponente alega a falta de fundamentação como fundamento de oposição à execução fiscal, alegando que a citação não explicita a que se reportam as contribuições alegadamente em dívida.

A citação deve conter os elementos previstos nas alíneas a), c), d) e e) do n.º l do art. 163.º do CPTT, ou seja, deve cumprir com determinadas formalidades previstas na lei, entre as quais se inclui a natureza e proveniência da dívida e indicação do seu montante, cfr. art. 190.º, n.º l do CPPT. (…) // A nulidade da citação não consubstancia fundamento de oposição à execução fiscal, face ao elenco taxativo do art. 204.º do CPPT, devendo antes ser invocada perante o órgão da execução fiscal e conhecida no processo de execução fiscal. Perante uma eventual decisão desfavorável deste, poderá ser objecto de reclamação para o Tribunal Tributário, ao abrigo do art. 276.º do CPPT, conjugado com o disposto no art. 191.º, n.º l e n.º 2 do CPC.

Deste modo, nos presentes autos, o Tribunal não conhece deste fundamento alegado pelo Oponente».

Ao invés do alegado pelo recorrente, em face do trecho transcrito da sentença resulta que a mesma emitiu pronúncia sobre a alegada falta de fundamentação das liquidações em causa, enquadrando a mesma como nulidade da citação, pelo que alegada omissão de pronúncia não se comprova nos autos, nesta parte.

No que respeita à falta de notificação do acto tributário, cabe referir que, em sede de alegações pré-sentencias, o recorrente afirma que cabia ao recorrido notificar o oponente das contribuições em falta e da respectiva fundamentação, o que não aconteceu, cerceando, por esta via, as elementares garantias de defesa que lhe assistem; aí se consigna (alínea d das conclusões) que: «ao ter impedido o oponente de exercer o seu direito de defesa convenientemente, a Segurança Social violou flagrantemente princípios, direitos e garantias fundamentais previstos no artigo 268.º, n.º 3 e 4 da CRP, como é o caso do direito à fundamentação e o direito à tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos e interesses legítimos».

A questão da falta de notificação do acto tributário, enquanto dever que impende sobre a administração cuja preterição implica a ofensa às garantias constitucionais de defesa do contribuinte constitui questão de conhecimento oficioso[1], cujo conhecimento compete ao tribunal da causa.

A omissão de pronúncia sobre questões de que devesse tomar conhecimento é fundamento da nulidade da sentença (artigo 615.º/1/d), CPC). No caso, foi omitida  apreciação da presente questão.

Donde resulta que no que respeita à questão da falta de notificação do acto de liquidação em exame, existe omissão de pronúncia, o que determina a anulação da sentença recorrida, nesta parte.

Observado o contraditório prévio (fls. 163/165), impõe-se conhecer da questão em exame.

2.2.4. O recorrente censura a sentença em exame porquanto a mesma desatendeu à alegação segundo a qual não teve acesso à notificação das liquidações em causa, pelo que não logrou exercer os direitos de defesa e de impugnação em relação às mesmas. Invoca que antes da citação, jamais foi notificado pela Segurança Social para pagar as contribuições objecto dos autos; que apenas através da contestação foi informado sobre os valores que estavam por pagar, qual a natureza da dívida a que respeitavam e a que período dizia respeito; a falta de notificação da liquidação e respectiva fundamentação em data anterior à execução tornou a dívida sub judice inexigível, sustenta.

Por seu turno, o recorrido pugna pela improcedência da presente alegação. Afirma que ainda que o recorrente tivesse deduzido a excepção da inexistência de acto prévio de liquidação, a mesma traduzir-se-ia num facto inócuo para a boa decisão da causa, porquanto as dívidas de contribuições à Segurança Social não carecem de qualquer acto prévio de liquidação; as declarações de remunerações foram declaradas e autoliquidadas pela entidade empregadora, pelo que necessariamente se conclui que o recorrente tinha pleno conhecimento das quantias que mensalmente tinha que pagar.

Vejamos.

O artigo 29.º do Código Contributivo – [CC], aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro, (“Comunicação da admissão de trabalhadores”)[2], estatui o seguinte:
«1. A admissão dos trabalhadores é obrigatoriamente comunicada, pelas entidades empregadoras, através de qualquer meio escrito ou on line no sítio da Internet da segurança social, à instituição de segurança social competente. // (…)
3. Com a comunicação a entidade empregadora declara à instituição de segurança social o NISS, se o houver, se o contrato de trabalho é a termo resolutivo ou sem termo e os demais elementos necessários ao enquadramento do trabalhador».

Com a inscrição das trabalhadoras na segurança social constitui-se a relação jurídica laboral/contributiva que vincula a entidade empregadora e o trabalhador. Esta relação jurídica contributiva consubstancia-se no vínculo de natureza obrigacional que vincula os trabalhadores e as respectivas entidades empregadoras ao sistema previdencial (artigo 10.º do CC).

As obrigações contributivas são de duas espécies: as contribuições, a efectuar pelas entidades empregadoras, e as quotizações, a efectuar pelos trabalhadores (artigo 11.º/1 e 2, do CC). O montante das contribuições é determinado pela aplicação da taxa contributiva às remunerações que constituem base de incidência contributiva (artigo 13.º do CC)

«A instituição de segurança social competente procede ao registo das remunerações sobre as quais incidiram as contribuições e as quotizações, bem como dos respectivos períodos contributivos» (artigo 16.º /1, do CC).

«A obrigação contributiva constitui-se com o início do exercício de actividade profissional pelos trabalhadores ao serviço das entidades empregadoras» (artigo 37.º do CC). Compreende «a declaração dos tempos de trabalho, das remunerações devidas aos trabalhadores e o pagamento das contribuições e das quotizações» (artigo 38.º/1, do CC). «As entidades contribuintes são obrigadas a declarar à segurança social, em relação a cada um dos trabalhadores ao seu serviço, o valor da remuneração que constitui a base de incidência contributiva, os tempos de trabalho que lhe corresponde e a taxa contributiva aplicável» (artigo 40.º/1, do CC).

As declarações de remunerações são emitidas pela entidade empregadora e autoliquidadas por esta, não obstante poderem ser oficiosamente supridas pelo Instituto de Segurança Social, sempre que haja falta ou insuficiência das declarações de remunerações (artigo 40.º/3, do CC).

No caso em exame, do probatório resulta o seguinte.
i) D... nasceu em 22/01/1990.
ii) Em 01/09/2009, o Oponente celebrou um contrato de trabalho de duração indeterminada com D..., para o exercício das funções de escriturária - empregada forense.
iii) Em 01/09/2009, D... foi inscrita no Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM, como trabalhadora por conta do Oponente.
iv) Em 06/01/2012, foi comunicado ao Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM a cessação do contrato de trabalho de D... por iniciativa desta.
v) Em 14.10.2009, o recorrido remeteu ao recorrente ofício, dando conta das condições de acesso à redução de contribuições no quadro das medidas de apoio à contratação de jovens à procura do primeiro emprego.
vi) M... nasceu em 02/03/1990.
vii) Em 19/05/2010, M... foi inscrita no Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM, como trabalhadora por conta do Oponente, tendo sido declarada como data de início de actividade 01/05/2010, para o exercício de empregada forense.
viii) Em 31/07/2011, foi comunicado ao Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM a cessação do contrato de trabalho de M... por iniciativa da entidade empregadora, por extinção do posto de trabalho.
ix) O Oponente não procedeu ao preenchimento e entrega do modelo n.º 1066, actualmente Modelo GTE 1/2012, no Instituto de Segurança Social da Madeira, IP-RAM.

Da análise da factualidade descrita resulta que o recorrente, apesar de advertido pelo recorrido, não procedeu à entrega nos serviços deste último do requerimento tendente à obtenção de isenção/dispensa do pagamento de contribuições devidas pela contratação das trabalhadoras em causa. Não tendo requerido a isenção/redução, o recorrente é obrigado a liquidar as contribuições devidas, em relação a cada uma das trabalhadoras, com base na taxa contributiva não reduzida (artigos 38.º/1 e 40.º/1, do CC). O que não sucedeu. Tal facto determinou o vencimento das contribuições de 01.09.2009 a 31.12.2012, respeitantes à trabalhadora D..., bem como o vencimento das contribuições de 01.05.2010 a 31.07.2011, relativas à trabalhadora M..., com a consequente extracção de certidão correspondente e instauração do processo executivo[3].

No que respeita à alegação de que o apuramento do montante das dívidas de contribuições não terá sido notificado, cabe referir que «[p]or regra as contribuições para a Segurança Social resultam da apresentação das declarações de remunerações pelo contribuinte, a quem compete também proceder à liquidação dos montantes a entregar (mediante aplicação das percentagens fixadas na lei sobre as remunerações). // Nessa situação, a lei permite a extracção de certidões de dívida perante a mera constatação de omissão de um pagamento, sem que haja um acto administrativo ou tributário prévio definidor da obrigação, motivo por que não é imposta por lei a notificação de qualquer acto antes da citação em processo de execução fiscal»[4].

A presente orientação jurisprudencial não contende com as garantias constitucionais de defesa do contribuinte, porquanto apenas através da emissão da certidão de dívida se procede ao apuramento das contribuições a liquidar pelo seu devedor, pelo que somente através da oposição à execução fiscal é que o mesmo pode exercer a sua contestação contenciosa à liquidação em causa, dado que em momento anterior tal não seria possível, por falta de objecto[5].

Enquanto entidade empregadora, o recorrente tem obrigações legais de inscrição, de declaração e de autoliquidação das contribuições para a Segurança Social, em relação a cada uma das trabalhadoras que contratou; foi advertido pelos serviços do recorrido sobre a forma de requerer a isenção de contribuições, no âmbito das medidas excepcionais de apoio ao emprego jovem; requerimento que todavia não apresentou; o incumprimento das obrigações legais referidas por parte do recorrente determinou a extracção das certidões de dívida em causa nos autos; do regime legal transcrito não resulta a obrigação dos serviços do recorrido emitirem acto de liquidação oficiosa, em caso de não pagamento das contribuições devidas, sendo suficiente a extracção das certidões de dívida. Pelo que o recorrente não foi notificado do acto de liquidação em causa, nem, nos termos legais, tinha de o ser.

Do exposto se conclui que o presente fundamento da oposição é de julgar improcedente, termos em que se procederá no dispositivo.

2.2.5. No que respeita ao alegado erro de julgamento, porquanto o recorrente, segundo alega, sempre acreditou que estava isento de pagamento das referidas contribuições.

No quadro das medidas de apoio à contratação de jovens à procura do primeiro emprego, foram publicadas a Portaria n.º 130/2009, de 30.01 e a Portaria n.º 125/2010, de 01.01. Como se refere no preâmbulo da Portaria n.º 130/2009, citada, «[e]stas medidas - de isenção ou redução contributiva para a segurança social ou apoios directos à contratação - têm, pois, um particular enfoque sobre grupos com maiores dificuldades no mercado de trabalho na actual conjuntura, nomeadamente micro e pequenas empresas, jovens à procura de primeiro emprego, desempregados de longa duração, trabalhadores mais velhos ou trabalhadores precários».

Estatui o artigo 5.º, n.º 1, (“Apoio à contratação de jovens, de desempregados de longa duração e de públicos específicos”) da Portaria n.º 130/2009, de 30.01, o seguinte: «A entidade empregadora beneficia de isenção do pagamento das contribuições para a segurança social a seu cargo, pelo período de 36 meses, nas situações de contratação sem termo de: // a) Jovem à procura de primeiro emprego, entendendo-se como tal a pessoa com idade até aos 35 anos, inclusive, com o mínimo do ensino secundário completo ou nível 3 de qualificação ou a frequentar um processo de qualificação conducente à obtenção desse nível de ensino ou qualificação, e que não tenha tido contrato de trabalho sem termo».

Estabelece o n.º 8 do artigo 5.º citado, que «[o]s apoios previstos no presente artigo dependem cumulativamente de: (…) // c) Manutenção, pelo período de 36 meses, do contrato de trabalho criado». Idêntico regime decorre do disposto no artigo 4.º/1/a), n.º 3 e n.º 7 da Portaria n.º 125/2010, de 01.01.

O recorrente invoca que sempre esteve convencido de que estava isento de contribuições. Sem embargo, o mesmo foi informado da necessidade de apresentar requerimento, junto dos serviços do recorrido, nesse sentido[6], o que não se verificou. Recorde-se que competem ao recorrente, enquanto entidade empregadora, as obrigações de declaração de remunerações dos trabalhadores a seu cargo, de registo e de liquidação das correspondentes contribuições (artigos 37.º a 41.º do CC). Enquanto entidade empregadora, o recorrente é também responsável pelo pagamento das contribuições e quotizações dos trabalhadores ao seu serviço – artigo 42.º/1, do CC.

O recorrente nunca requereu ou beneficiou de qualquer isenção relativamente às trabalhadoras em causa, nos termos e para os efeitos do disposto na Portaria n.º 130/2009, de 30 de Janeiro, em articulação com o Decreto-Lei n.º 89/95, de 6 de Maio e na Portaria n.º 125/2010, de 1 de Março, apesar de ter sido informado pelos serviços do recorrido, nos termos e condições das referidas isenções[7].

Donde se impõe concluir que o alegado desconhecimento das suas obrigações legais que recaem sobre o recorrente não torna inexigíveis as dívidas à segurança social, contraídas pelo mesmo, enquanto entidade empregadora das trabalhadoras em apreço.

Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não enferma de erro de julgamento, pelo que deve ser confirmada, nesta parte.

Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.

2.2.6. O recorrente invoca erro de julgamento, porquanto as trabalhadoras em causa preenchem os pressupostos para a concessão do benefício em causa, tendo prestado serviço pelo período de 28 meses; o que significa que apenas deviam ser exigidas contribuições relativas a 8 meses, dado que foi este o período que não foi cumprido.

Por seu turno, o recorrido sustenta que, mesmo que o oponente tivesse beneficiado do deferimento dos apoios à contratação de trabalhadores à procura do primeiro emprego, tornar-se-ia imediatamente exigível a devolução das contribuições relativas aos períodos durante os quais tenha vigorado a dispensa, por incumprimento das condições de atribuição dos apoios (artigos 9.º e 8.º das Portarias n.º 130/2009 de 30.01 e n.º 125/2010, de 01.03).

Recorde-se o disposto no artigo 9.º/1 (incumprimento das condições de atribuição ou manutenção dos apoios) da Portaria n.º 130/2009 de 30.01[8]: «A cessação do contrato de trabalho por iniciativa do empregador com base em despedimento sem justa causa, despedimento colectivo, extinção do posto de trabalho ou despedimento por inadaptação torna imediatamente exigível a devolução das contribuições relativas ao período durante o qual tenha vigorado a dispensa».

Por outras palavras, «é manifesto que os contratos/postos de trabalho não se mantiveram pelo período de trinta e seis meses, pelo que o Oponente nunca poderia beneficiar da isenção do pagamento das contribuições, por falta de preenchimento de um dos pressupostos indispensáveis para tal»[9]. Ou seja, a falta de preenchimento da condição relativa ao tempo de duração da relação laboral objecto de apoio implica a restituição dos apoios concedidos, sem qualquer possibilidade de redução proporcional do mesmo, como pretende o recorrente. Pelo que, também, por esta via, as certidões de dívida que subjazem aos presentes autos executivos não enfermam de vício ou erro.

Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não merece censura, devendo ser mantida na ordem jurídica.

Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.


Dispositivo

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul no seguinte:
1) Anular a sentença recorrida na parte referida em 2.2.3.
2) Julgar improcedente a oposição, nos termos referidos em 2.2.4.
3) Quanto ao mais, negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente.

Registe.

Notifique.


(Jorge Cortês - Relator)

(Cristina Flora - 1º. Adjunto)

(Ana Pinhol - 2º. Adjunto)



[1] Artigo 204.º da CRP.
[2]  Idênticas obrigações declarativas e de autoliquidação das contribuições para a segurança social, a cargo das entidades empregadoras, resultam, no direito anterior, do disposto nos artigos 2.º a 15.º Decreto-Lei n.º 8-B/2002, de 15 de Janeiro.
[3] N.º 13 do probatório.

[4]  Acórdão do STA, de23.04.2013, P. 0744/12.
[5] Neste sentido, V. Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado, Vol. III, p. 497.
[6] N.º 14 do probatório.
[7] N.ºs 10 e 14 do probatório.
[8] Cujo teor é o idêntico ao disposto no artigo 8.º da Portaria n.º 130/2009 de 30.01
[9]       Como se refere na sentença recorrida.