Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 07292/14 |
Secção: | CT - 2.º JUÍZO |
Data do Acordão: | 03/13/2014 |
Relator: | BENJAMIM BARBOSA |
Descritores: | ACTOS PRATICADOS NO SISTEMA INFORMÁTICO DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA |
Sumário: | i O actos praticados no Sistema Informático vinculam a Administração Tributária se corresponderem a actos cuja autoria possa ser assacada a qualquer titular de órgão da mesma e desde que reúnam as características de acto administrativo em matéria tributaria, definidas pelo art.º 120.º do CPA. ii Estão nesta situação não só os actos directamente introduzidos no Sistema Informático de Penhoras Automáticas por vontade humana proveniente de alguém dotado das necessárias competências funcionais como também aqueles que são produzidos automaticamente pelo sistema com base em programação informática, na medida em que a sua automaticidade resulta de um programa informático com objectivos precisos e delineados previamente pelo programador, o mesmo é dizer, pela Administração Fiscal. Daí que devem ser considerados também actos administrativos em matéria tributária. iii Fora desses casos ficam quaisquer outros registos introduzidos no sistema que não correspondam à realidade, por erro de escrita, de cálculo, por lapso, etc. |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL:
1 - Relatório a) - As partes e o objecto do recurso ... - IMAGEM E COMUNICAÇÃO, LDA., não se conformando com a sentença do TT de Lisboa que em processo de reclamação deduzida ao abrigo do artigo 276.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), da decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa-8, datado de 13 de Maio de 2013, onde se informa da suspensão da contagem do prazo de prescrição nos termos do n.° 4 do art. 49° da Lei Geral Tributária, e no âmbito do processo de execução fiscal n.° 3107200201504320, em que a reclamante figura como executada, que considerou improcedente o pedido de anulação do citado despacho e consequentemente, a declaração da prescrição da dívida exequenda, veio interpor recurso jurisdicional cujas alegações remata com estas conclusões: * Sem vistos vem o processo à conferência. * 2 – Fundamentação a) - De facto * Nos termos do art.º 662.º, n.º 1, do CPC, adita-se o seguinte facto:(18). Por ofício datada de 12-12-2006 dirigido a Paul Hartmann, Ld.ª, foi efectuado um pedido de penhora de créditos da recorrente, tendo a referida Paul Hartmann respondido, por carta de 27-12-2006, não existir qualquer crédito a favor da recorrente. * b) - De Direito A sentença recorrida começou por enquadrar legalmente a questão da prescrição, tendo referido a esse propósito o seguinte: “A prescrição da obrigação tributária constitui questão de natureza substantiva, de conhecimento oficioso pelo juiz, nos termos do artigo 175° do CPPT. Quanto ao prazo de prescrição aplicável, haverá que ter em equação as distintas previsões legais do Código de Processo Tributário (CPT) e da Lei Geral Tributária (LGT). Previa o CPT que o prazo de prescrição seria de dez anos (artigo 34.°, n.° 1), vindo a LGT, que entrou em vigor no dia 01/01/1999, a encurtar o prazo de prescrição para oito anos (artigo 48.°). De acordo com o disposto no artigo 297.°, n.° 1, do Código Civil, "[a] lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar." No caso vertente, as dívidas exequendas respeitam a factos tributários ocorridos nos anos de 1998 e 1999, pelo que o prazo de prescrição se conta desde o início do ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário, in casu, no dia 01/01/1999 e 01/01/2000. Assim sendo, aplica-se o prazo de prescrição de oito anos previsto no art° 48° da Lei Geral Tributária (LGT), mesmo relativamente ao ano de 1998, porquanto, apesar de ter entrado em vigor apenas em 01-01-1999, falta menos tempo para o prazo de prescrição se completar de acordo com o regime da LGT, do que com o regime do CPT, que estabelecia um prazo de 10 anos (cfr. Art. 297°, n° 1 do Código Civil, aplicável ex vi artigo 5°, n° 1 do DL n° 398/98, de 17 de Dezembro, que aprovou a LGT). E sendo assim, o prazo de prescrição de 8 anos aplica-se a partir da entrada em vigor da LGT, ou seja, conta-se a partir de 01-01-1999, para a dívida respeitante a 1998 e a partir de 01-01-2000, para a dívida referente a 1999. Assim, caso não se verificasse qualquer causa de interrupção ou suspensão da prescrição, previstas no art. 49° da LGT, o prazo de prescrição completar-se-ia em 31 de Dezembro de 2006 (1998) e 31 de Dezembro de 2007 (1999)”. Esta argumentação é correcta e de resto não é posta em causa pela recorrente. * Depois de reconhecer que os processo de impugnação estiveram parados por mais de um ano e antes da revogação do art.º 49.°, n.° 2, da LGT pela Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro, a sentença argumentou em síntese que estando o processo de execução suspenso a pedido da exequente continuava interrompido o prazo de prescrição até decisão final das impugnações, uma vez que essa suspensão foi ditada a benefício da recorrente.Discorda a recorrente argumentando que o processo de execução não esteve suspenso porque nele foram efectuados actos de penhora. Na verdade, conforme resulta da matéria aditada ao probatório, “por ofício datada de 12-12-2006 dirigido a Paul Hartmann, Ld.ª, foi efectuado um pedido de penhora de créditos da recorrente, tendo a referida Paul Hartmann respondido, por carta de 27-12-2006, não existir qualquer crédito a favor da recorrente”. Este acto, todavia, não tem a relevância que a recorrente lhe empresta. Se é certo que não deveria ter sido praticado porque a execução estava suspensa não é menos verdade que também não concretizou qualquer penhora. Como, apesar da suspensão, o órgão da execução não está impedido de praticar actos no processo que não contendam com esfera patrimonial do executado, segue-se que esta tentativa de penhora nenhum efeito provoca no levantamento da suspensão. Com efeito, a suspensão da execução visa apenas evitar que a mesma prossiga com a apreensão de bens que respondem pela dívida e não para impedir a prática de todo e qualquer acto no processo. Isto é, desde que o património do executado não seja afectado, o exequente pode praticar actos que não concretizem uma agressão patrimonial ao executado, neles se incluindo actos preparatórios de eventual penhora, de indagação da existência de bens, etc. Fundamental é, portanto, que nenhum acto de apreensão de bens seja concretizado. Foi precisamente o que ocorreu no caso vertente. Daí que o acto praticado seja inócuo para o levantamento da suspensão. Mesmo que assim não fosse, também não o seria por outro motivo. Como os factos interruptivos ocorreram antes da revogação do n.º 2 do art.º 49.º da LGT, os efeitos das paragens foram afastados pela suspensão do processo executivo, já que não podendo a execução prosseguir a pedido da própria executada não seria aceitável que esta viesse também a beneficiar de cessão da interrupção da prescrição por tal motivo. Como o acto de notificação da penhora é praticamente contemporâneo da Lei n.º 53-A/2006, se considerássemos que a execução deixou de estar suspensa a partir da notificação então também nenhum efeito daí se poderia extrair porque logo em 01-01-2007 as paragens processuais deixaram de ser atendíveis para efeitos de prescrição. Conclui-se, deste modo, que bem andou a sentença quando não deu relevo ao acto de notificação de penhora efectuado em 12-12-2006. Mas como a recorrente invoca outros factos que em seu entender ditariam também o levantamento da suspensão da execução por iniciativa do exequente, importa esclarecer o seguinte: entre os registos que constam dos prints informáticos e a documentação da execução não existe integral coincidência quanto à prática dos actos. O único acto que está documentado e que portanto é fiável é o que acima se referiu. Logo, é o único que poderia ser incluído no probatório como efectivamente foi agora por aditamento. Quanto aos demais tratar-se-á, certamente, de erradas menções que todavia nada provam quanto à efectiva prática dos actos a que se reportam. Aliás, tal situação é patente quanto ao suposto acto que declarou a prescrição, que efectivamente nunca foi praticado como o esclareceu o órgão da execução a solicitação nossa (cfr. fls. 242/243). E daí que claudique toda a argumentação esgrimida pela recorrente quanto à “irrevogabilidade” dessa decisão, porque é inútil defender-se a proibição de revogação de um acto factualmente inexistente. Aliás, trata-se de questão nova, que a recorrente não suscitou na p.i e sobre a qual a sentença obviamente não se pronunciou nem podia pronunciar. Não se trata de questão de conhecimento oficioso e por isso consubstancia a dedução em recurso de uma questão nova que, como é jurisprudencialmente consabido, não pode ser conhecida em segunda instância e que determina a improcedência da nulidade suscitada a tal respeito. Quanto ao facto constante do art.º 6.º da p.i. adianta-se que é irrelevante para a decisão da causa; se a recorrente pretende demonstrar que a suspensão da execução apenas abrangia a reclamação incorre num vício de raciocínio, já que se deve entender que tal suspensão abrange não só a própria reclamação como o processado posterior destinado a obter uma decisão definitiva. Consequentemente, a suspensão da execução não foi levantada como defende a recorrente. O que conduz também à inutilidade do aditamento dos demais factos que a recorrente pretende ver acrescentados ao probatório. De resto, os pretensos “factos” constante dos artigos 20, 21, 22 e 23 da p.i. não são factos mas verdadeiras conclusões. Como tal nunca poderiam ser levadas ao probatório. Por conseguinte não existe qualquer nulidade da sentença e muito menos por omissão de pronúncia, sendo certo que a só a absoluta falta de factos é que provoca nulidade e não quando os factos elencados são escassos ou deficientes. E em qualquer caso não se trata de uma omissão de pronúncia já que é inconcebível que um facto possa consubstanciar uma questão processual. Quanto às demais nulidades elas são também inexistentes. Tendo adoptado o entendimento de que a suspensão da execução se prolongava até ao desfecho final das impugnações, não cabe falar em omissão de pronúncia “sobre a circunscrição do despacho que declarou a suspensão da execução apenas à pendência da reclamação graciosa”. No tocante “à panóplia de actos de execução que foram praticados depois do levantamento prático da suspensão, após o indeferimento da reclamação graciosa e que eram incompatíveis com a visão de que a Administração Fiscal estava impedida de executar e que a execução estaria suspensa” remete-se para o que já se disse a este respeito. O mesmo se diga quanto à “declaração de prescrição das dívidas exequendas aos 13 de Agosto de 2009 e a irrevogabilidade de tal decisão”, bem como “sobre a possibilidade de a exequente, tendo praticado actos de execução e penhora, bem como declarado a prescrição, poder vir, posteriormente, alegar que a execução esteve suspensa”, E quanto à pretensa “violação pela Administração Fiscal do disposto nos artigos 2°, 266°, n°2, da CRP e 6°A do CPA, por violação do princípio da boa-fé ao levantar a suspensão da execução, praticando actos de execução e penhora, declarando a prescrição para, posteriormente, vir invocar que a execução esteve suspensa e que estava impedida de executar”, tal questão está prejudicada pelo enfoque dado à resolução da questão atinente à suspensão da execução. Improcedem, por isso, todas as conclusões em contrário. Por fim, contrariamente ao que defende a recorrente os actos praticados no SIPA só vinculam a Administração Fiscal se corresponderem a actos cuja autoria possa ser assacada a qualquer titular de órgão da mesma e desde que reúnam as características de acto administrativo em matéria tributaria, definidas pelo art.º 120.º do CPA. Estão nesta situação não só os actos directamente introduzidos no SIPA por vontade humana proveniente de alguém dotado das necessárias competências funcionais como também aqueles que são produzidos automaticamente pelo sistema com base em programação informática, na medida em que a sua automaticidade resulta de um programa informático com objectivos precisos e delineados previamente pelo programador, o mesmo é dizer, pela Administração Fiscal. Daí que sejam também actos administrativos em matéria tributária. Fora desses casos ficam quaisquer outros registos introduzidos no sistema que não correspondam à realidade, por erro de escrita, de cálculo, por lapso, etc. É, precisamente o que sucede com os actos a que a recorrente alude, os quais - para além da tentativa de penhora já referida - não têm qualquer suporte na documentação dos autos de execução, como já se disse. Em resumo e para concluir, falecem todas e cada uma das conclusões da recorrente. A sentença é pois de manter, ainda que com diferente fundamentação, por ao recurso em análise dever ser recusado provimento. * 3 - Dispositivo: Em face de todo o exposto acordam em negar provimento ao recurso. Custas pela recorrente. D.n. Lisboa, 2014-03-13 _______________________________________ (Benjamim Barbosa) ___________________________________________ (Anabela Russo) ________________________________________ (Joaquim Condesso) |