Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06346/13
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:10/31/2013
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE 1ª. INSTÂNCIA RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO RECORRENTE.
NOTIFICAÇÃO COMO REQUISITO DE PERFEIÇÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO DE LIQUIDAÇÃO.
FALTA DE NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO ENQUANTO FUNDAMENTO DE OPOSIÇÃO A EXECUÇÃO FISCAL.
NOTIFICAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DO DIREITO DE AUDIÇÃO.
ARTº.38, Nº.1, DO C.P.P.T.
ÓNUS DA PROVA.
Sumário:1. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).

2. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

3. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.

4. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário). Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.

5. A natureza receptícia do acto tributário, enquanto acto administrativo, deve hoje ter-se como perspectiva devidamente sedimentada pela doutrina e jurisprudência, configurando-se a notificação como requisito de perfeição do acto tributário de liquidação.

6. No entanto, a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia, aliás, suprível por outras formas de conhecimento (cfr.artº.67, nº.1, do C.P.A.).

7. De acordo com a interpretação jurisprudencial do quadro normativo existente, à qual se adere, fica aberta, na fase executiva, pelos meios legais de oposição, a discussão da falta ou de eventuais vícios da notificação, designadamente por inexigibilidade da dívida, ao abrigo do disposto no mencionado artº.286, nº.1, al.h), do C. P. Tributário (cfr.artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário). Em resumo, o regime processual de defesa do contribuinte, nestas situações será o seguinte:
A-Se é instaurada uma execução fiscal e não foi efectuada notificação válida do acto de liquidação, o sujeito passivo pode sempre opor-se à execução ao abrigo da alínea i), do nº.1, do artº.204, do C.P.P.T., invocando a ineficácia do acto, que impede que a dívida seja exigível, sendo indiferente, para este efeito, que o acto de liquidação enferme de qualquer vício, inclusivamente o de extemporaneidade da liquidação;
B-Já se foi instaurada uma execução e efectuada notificação válida do acto de liquidação, mas a notificação foi realizada fora do prazo de caducidade previsto no artº.45, nº.1, da L.G.T. (ou outro prazo especial que for aplicável), o contribuinte pode opor-se à execução ao abrigo da alínea e), do nº.1, deste artº.204, do C.P.P.T. (trata-se de situação que, no seu teor literal, poderia caber na mencionada alínea i), pois não se engloba nela a apreciação da legalidade da própria liquidação nem é matéria da exclusiva competência da entidade que emite o título, mas que era dela afastada à face do entendimento jurisprudencial referido formado na vigência do C.P.T., reconduzindo-se a utilidade da alínea e) ao afastamento da aplicabilidade deste entendimento; a possibilidade de oposição ao abrigo da alínea e) existirá independentemente de a própria liquidação ser extemporânea, isto é, de ela própria ser ilegal, pois não está em causa no processo de oposição à execução fiscal a apreciação da legalidade da liquidação, mas a sua oponibilidade ao seu destinatário);
C-Por último, se foi efectuada uma liquidação fora do prazo de caducidade e, necessariamente, também a respectiva notificação foi efectuada fora do prazo, mas não foi ainda instaurada execução, o contribuinte pode impugnar judicialmente a liquidação, invocando a ilegalidade da sua extemporaneidade, porém, se o não fizer e não pagar a quantia liquidada, não ficará impedido de se opor à execução, ao abrigo da alínea e) referida, visto que, além da ilegalidade da liquidação, ocorrer também a sua inexigibilidade por falta de tempestiva notificação.

8. Nos termos do artº.60, nº.4, da L.G.T., a concessão do exercício do direito de audição no âmbito do procedimento administrativo/tributário deve ser notificada ao contribuinte para o seu domicílio fiscal e através de carta registada.

9. A liquidação sob cobrança coerciva na execução de que os presentes autos constituem apenso, embora se refira a imposto de natureza periódica (I.R.S.), envolve uma alteração da situação do contribuinte, dado constituir uma obrigação tributária que não existia anteriormente e cujos pressupostos não estavam já definidos (contrariamente ao que se verifica com a liquidação anual de impostos sobre o património, como seja o I.M.I.), pelo que devia ser notificada através de carta registada com a.r., nos termos do artº.38, nº.1, do C.P.P.T.

10. Não se cumprindo todas as formalidades da notificação e não se provando que, apesar de elas não terem sido cumpridas, foi atingido o objectivo que se visava alcançar com a mesma, esta é inválida. Neste caso, sendo sobre a Administração Tributária que recai o ónus da prova dos pressupostos de que depende o seu direito de exigir a obrigação tributária (cfr.artº.342, nº.1, do C.Civil; artº.74, nº.1, da L.G.T.), designadamente que houve uma notificação validamente efectuada ou foi atingido o fim por ela visado de transmitir ao destinatário o teor da liquidação, tem de se valorar processualmente a favor do destinatário da notificação a dúvida sobre estes pontos, o que se reconduz a que tudo se passe, para efeitos do processo, como se tal notificação não tivesse ocorrido.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Sintra, exarada a fls.67 a 72 do presente processo, na qual julgou totalmente procedente a oposição, intentada pela recorrida, Maria …………………., à execução fiscal nº…………………, processo que corre seus termos no 1º. Serviço de Finanças de Amadora, visando a cobrança coerciva de dívida de I.R.S., relativa ao ano de 2005 e no montante total de € 258.646,66.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.91 a 99 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-A douta sentença recorrida julgou procedente a oposição, por considerar existir falta de notificação da liquidação no prazo de caducidade do direito à liquidação de I.R.S. nº. …………., referente ao ano de 2005 e no montante de € 236.400,88;
2-A douta sentença considerou que nos autos não resulta que se tivesse observado o disposto no nº.1, do artº.66, e no nº.2, do artº.149, do C.l.R.S. (notificação da alteração por carta registada com aviso de recepção) ou que essa alteração tenha sido objecto de notificação para efeitos de direito de audição (nº.3, do artº.38, do C.I.R.S.), antes resultando que só foi expedida carta registada para notificação da liquidação efectuada;
3-Entendeu ainda a douta sentença que tendo havido alteração à matéria tributável que não foi objecto para efeitos de direito de audição, a notificação da liquidação em causa teria que ser feita por carta registada com aviso de recepção e não pela forma como foi feita por carta registada atento o disposto no nº.3, e nº.1, do artº.38, do C.P.P.T.;
4-Concluiu o Tribunal "a quo" que a liquidação em causa não foi notificada à oponente através da forma exigida por lei, uma vez que essa notificação teria que ser efectuada com carta registada e aviso de recepção;
5-A questão a dirimir é a de saber se a oponente deveria ser notificada com carta registada e aviso de recepção, como considerou a douta sentença;
6-Com o devido respeito e salvo melhor opinião não concordamos com tal decisão, pelo que contra a sentença recorrida convocamos a seguinte argumentação;
7-É relevante para a boa decisão da causa a seguinte factualidade:
a)Em 20/02/1987, a oponente casou com José …………….., em regime de separação de bens, tendo-se divorciado em 2006, por decisão transitada em julgado em 07/03/2006;
b)Em 09/05/2006 a oponente e o seu cônjuge entregaram pela internet a 1a declaração de l.R.S. do ano de 2005, tendo sido preenchido o anexo "G", dando lugar à liquidação de IRS nº………………, no montante de € 5.495,97;
c)Em 28/09/2006 foi efectuado o pagamento do I.R.S. mencionado na alínea anterior;
d)Em 28/04/2009, foi iniciada uma acção de fiscalização ao sujeito passivo José …………….., com referência ao ano de 2005, através da OI200900506 da Direcção de Finanças de Évora;
e)Na referida acção de fiscalização foi detectado que o contribuinte não mencionou no Anexo "……." da declaração de I.R.S. do ano de 2005, a alienação do prédio misto (artigo 10- secção B - parte rústica e artigo 269 - parte urbana) efectuada por escritura de compra e venda datada de 2005/11/03, lavrada no Cartório Notarial a cargo do notário Rui ……………., denominado "Herdade …………….", descrito na Conservatória do Registo Predial de Portel;
f)Através do ofício 4425, de 4/05/2009, foram os contribuintes José ……………….. e Maria ………………. notificados do projecto das correcções e para, querendo, exercer o direito de audição previsto no artº.60, da L.G.T. Esta notificação foi efectuada para a Rua ………….., nº.10-A, ……….;
g)Apesar de devidamente notificado os contribuintes não exerceram o direito de audição;
h)Pelo ofício 5283, de 25/05/2009, foram os contribuintes notificados das correcções resultantes da acção de inspecção, nos termos do artº.77, da L.G.T., e 62, do R.C.P.I.T., para a morada acima indicada;
i)Em 30/05/2009 foi emitida a liquidação de I.R.S. nº………….., no montante de € 236.400,88, ora posta em questão;
j)De acordo com o "print" de fls.28 do processo de execução fiscal a liquidação foi remetida em 9/06/2009 à oponente e ao seu marido a coberto do correio registado sob o nº.RY………………….;
l)No Serviço de Finanças de Amadora foi instaurado o processo de execução fiscal nº. ……………., em nome da oponente e do seu ex-cônjuge, para cobrança coerciva do I.R.S. do ano de 2005 no montante de € 258.646,66;
m)Em 10/02/2010, foi a oponente citada no processo de execução fiscal;
8-Como acima ficou espelhado a oponente e o seu ex-cônjuge foram notificados em 4/05/2009, através do ofício 4425 para exercer o direito de audição;
9-Foram ainda notificados das correcções resultantes da acção de inspecção, em 25/05/2009;
10-Diz-nos o nº.1, do artº.36, do C.P.P.T., que os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados;
11-Regra geral, as notificações são efectuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de recepção, sempre que tenham por objecto actos ou decisões susceptíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes, em cumprimento do artº.38, nº.1, do C.P.P.T.;
12-Porém, dispõe o nº.3 do mesmo preceito legal que as notificações relativas às liquidações de tributos que resultem de correcções à matéria tributável que tenha sido objecto de notificação para efeitos do direito de audição são apenas efectuadas por carta registada;
13-Ora, no caso vertente, conforme consta do relatório de inspecção, foi efectuada a notificação para exercício do direito de audição nos termos do artº.60, da L.G.T., e 60, do R.C.P.I.T., no decorrer do procedimento inspectivo instaurado, génese da liquidação adicional, em execução fiscal;
14-Pelo que, ao contrário do que entendeu o Tribunal “a quo”, a liquidação controvertida apenas teria de ser efectuada por carta registada;
15-A sentença recorrida, ao assim não entender, afigura-se ilegal por desconformidade com as normas legais, atendendo a que a Administração Fiscal actuou dentro do princípio da legalidade tributária, previsto no artº.8, da L.G.T., não merecendo por isso ser confirmada;
16-Nestes termos e com o douto suprimento de Vas Exas, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por douto acórdão que julgue improcedente na totalidade a presente impugnação, assim se fazendo a habitual JUSTIÇA.
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
Neste Tribunal foi a recorrente intimada com vista à junção de prova documental incidente sobre parte da factualidade alegada nas conclusões de recurso, o que se verificou, tendo os restantes intervenientes processuais sido notificados dos documentos ora incorporados ao processo (cfr.fls.110 a 134 dos autos).
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do provimento do presente recurso (cfr.fls.135 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.137 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.68 e 69 dos autos):
1-Em 20/02/1987, a oponente casou com José ……………., em regime de separação de bens, tendo-se divorciado deste em 2006, por decisão transitada em julgado em 7/03/2006 (cfr.documento nº.1 junto à p.i. a fls.12 dos presentes autos);
2-Em 9/05/2006, a oponente e o seu cônjuge entregaram pela internet a 1ª. declaração de I.R.S. do ano de 2005, tendo sido preenchido o anexo "G", dando lugar à liquidação de I.R.S. nº…………, no montante de € 5.495,97 (cfr.documento nº.2 junto à p.i. a fls.13 dos presentes autos; informação exarada a fls.19 e 20 dos presentes autos);
3-Em 28/09/2006, foi paga a liquidação de I.R.S. a que alude o nº.2 do probatório (cfr. documento nº.3 junto à p.i. a fls.14 dos presentes autos; informação exarada a fls.19 e 20 dos presentes autos);
4-Em 30/05/2009, foi emitida a liquidação de I.R.S. nº………….., no montante de € 236.400,88, em virtude dos Serviços de Inspeção Tributária da Unidade de Évora terem verificado que ocorreu no ano de 2005, a venda de dois imóveis, em nome do cônjuge da oponente e que foram omitidos no anexo "G" (cfr.documento junto a fls.17 do processo administrativo apenso; informação exarada a fls.19 e 20 dos presentes autos);
5-De acordo com o print de fls.28 do processo administrativo apenso, a liquidação de I.R.S. nº…………. foi remetida em 9/06/2009, à oponente e seu marido a coberto de correio registado sob o nº…………….. (cfr.documento junto a fls.28 do processo administrativo apenso; informação exarada a fls.19 e 20 dos presentes autos);
6-Dá-se como integralmente reproduzido o documento dos CTT obtido no programa informático de pesquisa de objectos, com referência ao registo nº.RY…………, no qual consta designadamente: “2009.06.12 - ENTREGA CONSEGUIDA” (cfr.documento junto a fls.31 do processo administrativo apenso; informação exarada a fls.19 e 20 dos presentes autos);
7-Corre termos do Serviço de Finanças Amadora, a execução fiscal nº…………….., instaurada contra a oponente e seu ex-cônjuge para, cobrança de dívida de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (I.R.S.) relativo ao ano de 2005, no montante de € 258.646,66 (cfr.documento junto a fls.33 do processo administrativo apenso; informação exarada a fls.19 e 20 dos presentes autos);
8-A fls.37 dos autos, consta uma informação emitida pelo Chefe do 1º. Serviço de Finanças Amadora da qual se extrai designadamente o seguinte: «Em 2010-02-01 o Representante de Maria ………… veio aos autos via fax, "arguir a nulidade da mesma notificação, uma vez que a mesma vinha desacompanhada de quaisquer elementos relativos à alegada dívida. Designadamente certidão de dívida, que permita o cabal exercício do direito à defesa constitucionalmente consagrado", conforme fls. 191 dos autos, tendo sido comprovado o alegado.» (cfr.documento junto a fls.37 dos presentes autos);
9-Em 10/02/2010, a oponente foi citada no processo de execução fiscal identificado no nº.7 do probatório (cfr.documentos juntos a fls.49 e 50 do processo administrativo apenso; informação exarada a fls.19 e 20 dos presentes autos);
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Inexistem outros factos sobre que o Tribunal deva pronunciar-se já que as demais asserções da douta petição ou integram antes conclusões de facto e/ou direito ou se reportam a factos não relevantes para a boa decisão da causa…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados no teor dos documentos referenciados em cada uma das alíneas do segmento fáctico…”.
X
Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso este Tribunal julga provada a seguinte matéria de facto que se reputa igualmente relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
10-Nos anos de 2009 e 2010, a opoente, Maria …………, com o n.i.f. …………, tinha o seu domicílio fiscal sito na Travessa José …….., nº.7, R/c Esq., ……, .-723 ……… (cfr.documentos juntos a fls.33, 46 e 47 do processo administrativo apenso);
11-Em 28/04/2009 foi iniciada uma acção de fiscalização ao sujeito passivo José ………….., com referência ao ano de 2005, através da OI200900506 da Direcção de Finanças de Évora (cfr.cópia de relatório de inspecção junta a fls.114 a 119 dos presentes autos);
12-Na referida acção de fiscalização foi detectado que o contribuinte não mencionou no Anexo "G" da declaração de I.R.S. do ano de 2005, a alienação do prédio misto (artigo 10- secção B - parte rústica e artigo 269 - parte urbana) efectuada por escritura de compra e venda datada de 23/11/2005, pelo montante total de € 1.200.000,00, lavrada no Cartório Notarial a cargo do notário Rui ………., denominado "Herdade ……….", descrito na Conservatória do Registo Predial ……….. (cfr.cópia de relatório de inspecção junta a fls.114 a 119 dos presentes autos; cópia da escritura de compra e venda junta a fls.123 e 124 dos presentes autos);
13-No âmbito do procedimento de inspecção identificado no nº.11 supra, através de carta registada em 9/5/2009, remetida para a Rua …….., nº.10-A., …….-111 ……., foram os contribuintes José ……………….. e Maria ……………… notificados do projecto de correcções em sede de I.R.S. proposto e para, querendo, exercer o direito de audição previsto no artº.60, da L.G.T. (cfr.documentos cuja cópia se encontra junta a fls.131 dos presentes autos);
14-Pelo ofício 5283, datado de 25/05/2009, foram os contribuintes José …………….. e Maria ……………….. notificados das correcções resultantes da acção de inspecção, nos termos do artº.77, da L.G.T., e 62, do R.C.P.I.T., remetido através de carta registada para a morada identificada no nº.13 supra (cfr.documentos cuja cópia se encontra junta a fls.113-verso e 114 dos presentes autos).
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Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos referidos em cada uma dos números do probatório.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar procedente a presente oposição, mais decretando a extinção da execução fiscal instaurada contra a opoente, tudo em virtude da falta de notificação da liquidação que constitui a dívida exequenda no prazo de caducidade.
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Em primeiro lugar, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em primeiro lugar e como supra se alude, que é relevante para a boa decisão da causa a seguinte factualidade:
a)Em 20/02/1987, a oponente casou com José …………., em regime de separação de bens, tendo-se divorciado em 2006, por decisão transitada em julgado em 07/03/2006;
b)Em 09/05/2006 a oponente e o seu cônjuge entregaram pela internet a 1a declaração de l.R.S. do ano de 2005, tendo sido preenchido o anexo "G", dando lugar à liquidação de IRS nº……………, no montante de € 5.495,97;
c)Em 28/09/2006 foi efectuado o pagamento do I.R.S. mencionado na alínea anterior;
d)Em 28/04/2009 foi iniciada uma acção de fiscalização ao sujeito passivo José …………., com referência ao ano de 2005, através da OI200900506 da Direcção de Finanças de Évora;
e)Na referida acção de fiscalização foi detectado que o contribuinte não mencionou no Anexo "G" da declaração de I.R.S. do ano de 2005, a alienação do prédio misto (artigo 10- secção B - parte rústica e artigo 269 - parte urbana) efectuada por escritura de compra e venda datada de 2005/11/03, lavrada no Cartório Notarial a cargo do notário Rui ……….., denominado "Herdade da …………", descrito na Conservatória do Registo Predial de ………..;
f)Através do ofício 4425 de 04/05/2009 foram os contribuintes José …………e Maria …………….. notificados do projecto das correcções e para, querendo, exercer o direito de audição previsto no artº.60, da L.G.T. Esta notificação foi efectuada para a Rua ……….., nº.10-A, …………..;
g)Apesar de devidamente notificado os contribuintes não exerceram o direito de audição;
h)Pelo ofício 5283 de 25/05/2009, foram os contribuintes notificados das correcções resultantes da acção de inspecção, nos termos do artº.77, da L.G.T., e 62, do R.C.P.I.T., para a morada acima indicada;
i)Em 30/05/2009 foi emitida a liquidação de I.R.S. nº……………, no montante de € 236.400,88, ora posta em questão;
j)De acordo com o "print" de fls.28 do processo de execução fiscal a liquidação foi remetida em 09/06/2009 à oponente e ao seu marido a coberto do correio registado sob o nº.RY……………;
l)No Serviço de Finanças de Amadora foi instaurado o processo de execução fiscal nº. ……………, em nome da oponente e do seu ex-cônjuge, para cobrança coerciva do I.R.S. do ano de 2005 no montante de € 258.646,66;
m)Em 10-02-2010 foi a oponente citada no processo de execução fiscal (cfr.conclusão 7 do recurso), com suporte em tal alegação, segundo entendemos, procurando consubstanciar erro de julgamento de facto da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13).
Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.
No caso concreto, não pode deixar de estar votado ao insucesso o fundamento do recurso em análise devido a manifesta falta de cumprimento do ónus mencionado supra, desde logo quanto aos concretos meios probatórios que deveriam fundamentar a alteração à matéria de facto defendida pelo recorrente.
Concluindo, este Tribunal não tem obrigação de conhecer do presente esteio da apelação.
Apesar de tudo, remete-se o recorrente para a matéria de facto aditada ao probatório por este Tribunal e supra exarada, após diligência probatória realizada ao abrigo do princípio da investigação (cfr.artº.13, do C.P.P.T.).
Argui o recorrente, igualmente e conforme supra se alude, que a questão a dirimir é a de saber se a oponente deveria ser notificada com carta registada e aviso de recepção, como considerou a douta sentença. Que no caso vertente, conforme consta do relatório de inspecção, foi efectuada a notificação para exercício do direito de audição nos termos do artº.60, da L.G.T., e 60, do R.C.P.I.T., no decorrer do procedimento inspectivo instaurado, génese da liquidação adicional, em execução fiscal. Pelo que, ao contrário do que entendeu o Tribunal “a quo”, a liquidação controvertida apenas teria de ser efectuada por carta registada nos termos do artº.38, nº.3, do C.P.P.T. (cfr.conclusões 5 e 10 a 15 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Apuremos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
A Constituição da República Portuguesa, após a revisão introduzida pela Lei Constitucional nº.1/82, de 30/9, prevê no seu artº.268, nº.3, que os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados na forma prevista na lei (lei ordinária), assim impondo à Administração um dever de dar conhecimento aos interessados, mediante uma comunicação oficial e formal, do teor dos actos praticados, comunicação essa que deve incluir também a própria fundamentação do acto que do mesmo faz parte integrante (cfr.J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4ª. Edição revista, II volume, Coimbra Editora, 2010, pág.824 e seg.).
É sabido que os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados (cfr.artº.36, nº.1, do C.P.P.T.).
A natureza receptícia do acto tributário, enquanto acto administrativo, deve hoje ter-se como perspectiva devidamente sedimentada pela doutrina e jurisprudência, configurando-se a notificação como requisito de perfeição do acto tributário de liquidação (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12; Alberto Pinheiro Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Almedina, 1972, pág.239 a 242; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.94 e seg.; Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.309 a 311).
No entanto, a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia, aliás, suprível por outras formas de conhecimento (cfr.artº.67, nº.1, do C.P.A.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/10/2012, proc.5673/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12).
De acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, há muito se fixou o entendimento de que a falta de notificação da liquidação, enquanto elemento integrante da eficácia externa da mesma, é fundamento de oposição a enquadrar no artº.286, nº.1, al.h), do C. P. Tributário (cfr.artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário), dado não colidir com a apreciação da legalidade da própria liquidação, não representar interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título, poder ser provado por documento e constituir facto modificativo posterior à liquidação e anterior à emissão da certidão executiva. Face a esta interpretação jurisprudencial do quadro normativo existente, à qual se adere, fica aberta, na fase executiva, pelos meios legais de oposição, a discussão da falta ou de eventuais vícios da notificação, designadamente por inexigibilidade da dívida, ao abrigo do disposto no mencionado artº.286, nº.1, al.h), do C. P. Tributário (cfr.artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário).
Em resumo, o regime processual da defesa do contribuinte, nestas situações será o seguinte:
1-Se é instaurada uma execução fiscal e não foi efectuada notificação válida do acto de liquidação, o sujeito passivo pode sempre opor-se à execução ao abrigo da alínea i), do nº.1, do artº.204, do C.P.P.T., invocando a ineficácia do acto, que impede que a dívida seja exigível, sendo indiferente, para este efeito, que o acto de liquidação enferme de qualquer vício, inclusivamente o de extemporaneidade da liquidação;
2-Já se foi instaurada uma execução e efectuada notificação válida do acto de liquidação, mas a notificação foi realizada fora do prazo de caducidade previsto no artº. 45, nº.1, da L.G.T. (ou outro prazo especial que for aplicável), o contribuinte pode opor-se à execução ao abrigo da alínea e), do nº.1, deste artº.204, do C.P.P.T. (trata-se de situação que, no seu teor literal, poderia caber na mencionada alínea i), pois não se engloba nela a apreciação da legalidade da própria liquidação nem é matéria da exclusiva competência da entidade que emite o título, mas que era dela afastada à face do entendimento jurisprudencial referido formado na vigência do C.P.T., reconduzindo-se a utilidade da alínea e) ao afastamento da aplicabilidade deste entendimento; a possibilidade de oposição ao abrigo da alínea e) existirá independentemente de a própria liquidação ser extemporânea, isto é, de ela própria ser ilegal, pois não está em causa no processo de oposição à execução fiscal a apreciação da legalidade da liquidação, mas a sua oponibilidade ao seu destinatário);
3-Por último, se foi efectuada uma liquidação fora do prazo de caducidade e, necessariamente, também a respectiva notificação foi efectuada fora do prazo, mas não foi ainda instaurada execução, o contribuinte pode impugnar judicialmente a liquidação, invocando a ilegalidade da sua extemporaneidade, porém, se o não fizer e não pagar a quantia liquidada, não ficará impedido de se opor à execução, ao abrigo da alínea e) referida, visto que, além da ilegalidade da liquidação, ocorrer também a sua inexigibilidade por falta de tempestiva notificação (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/9/2011, rec.473/11; ac.T.C.A.Sul, 25/10/2011, proc.2727/08; ac.T.C.A.Sul, 2/10/2012, proc. 5673/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P. Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.489 e seg.).
Examinemos agora, a forma e conteúdo da notificação do acto tributário de liquidação objecto dos presentes autos (recorde-se a natureza receptícia do acto tributário a que já supra se aludiu).
No caso vertente (cfr.nºs.5 e 6 do probatório), a liquidação que consubstancia a dívida exequenda no âmbito do processo de execução fiscal nº.3131-2009/106321.9 foi, alegadamente, notificada aos sujeitos passivos através de carta registada.
O Tribunal “a quo” considerou que o mesmo acto tributário deveria ter sido notificado aos contribuintes através de carta registada com a.r. nos termos do artº.38, nº.1, do C.P.P.T., dado não se verificarem as excepções previstas no nº.3, do mesmo preceito.
O recorrente defende o contrário, que a liquidação em causa devia ser notificada somente através de carta registada, dado que a alteração à matéria tributável em causa foi objecto de notificação para efeitos de direito de audição, nos termos do artº.38, nº.3, do C.P.P.T.
Ora, atenta a factualidade aditada ao probatório (cfr.nºs.10 e 13 da factualidade provada), os serviços de inspecção procederam à notificação dos contribuintes para efeitos do exercício do direito de audição, mas não para o domicílio fiscal da opoente/recorrida à época.
Nos termos do artº.60, nº.4, da L.G.T., a concessão do exercício do direito de audição no âmbito do procedimento administrativo/tributário deve ser notificada ao contribuinte para o seu domicílio fiscal e através de carta registada.
Revertendo ao caso dos autos, a notificação realizada pelos serviços de inspecção da A. Fiscal não reúne os requisitos legais, assim não valendo para efeitos de enquadramento na previsão do artº.38, nº.3, do C.P.P.T.
O regime de notificação da liquidação sob cobrança coerciva refere-se a imposto de natureza periódica (I.R.S.), sendo o mesmo constante do artº.149, nº.3, do C.I.R.S., normativo que nos diz dever a notificação ser efectuada através de carta registada, regra especial que se sobrepõe à geral constante do citado artº.38, do C.P.P.T.
Apesar disso, deve mencionar-se que não consta dos autos prova de que a Fazenda Pública enviou a carta registada de notificação do acto tributário em causa para o domicílio da opoente e ora recorrida, conforme se retira da concatenação dos nºs.5, 6, 10 e 13 do probatório (e recorde-se que a opoente declara que não foi notificada do mesmo acto de liquidação, assim erigindo tal vector como causa de pedir no âmbito do presente processo).
Nestes termos, não se provando que foi atingido o objectivo que se visava alcançar com a notificação, esta é inválida. Neste caso, sendo sobre a Administração Tributária que recai o ónus da prova dos pressupostos de que depende o seu direito de exigir a obrigação tributária (cfr.artº.342, nº.1, do C.Civil; artº.74, nº.1, da L.G.T.), designadamente que houve uma notificação validamente efectuada ou foi atingido o fim por ela visado de transmitir ao destinatário o teor da liquidação, tem de se valorar processualmente a favor do destinatário da notificação a dúvida sobre estes pontos, o que se reconduz a que tudo se passe, para efeitos do processo, como se tal notificação não tivesse ocorrido (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 6/10/2005, rec.500/05; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 8/9/2010, rec.437/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág. 384).
Tal não tendo acontecido, deve o Tribunal concluir que o acto de liquidação não pode produzir efeitos relativamente ao sujeito passivo, sendo, por essa razão, acto ineficaz, mais levando à extinção da execução devido a inexigibilidade da dívida exequenda, fundamento de oposição enquadrável no artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.T., dado não colidir com a apreciação da legalidade da própria liquidação, não representar interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título, poder ser provado por documento e constituir facto modificativo posterior à liquidação e anterior à emissão da certidão executiva (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/10/2012, proc.5673/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.495).
Atento tudo o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se procederá na parte dispositiva do acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 31 de Outubro de 2013



(Joaquim Condesso - Relator)
(Eugénio Sequeira - 1º. Adjunto)

(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)