Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:803/20.0BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:09/10/2020
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores: INTIMAÇÃO PARA A PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES;
LEI DAS COMUNICAÇÕES ELETRÓNICAS;
ATIVIDADE DE FISCALIZAÇÃO DA ANACOM.
Sumário:I. Não prevendo a lei a possibilidade de apresentação de um articulado de resposta às contra-alegações de recurso, nelas sendo invocado uma causa impeditiva do conhecimento do fundamento do recurso, como se configura ser a alegação da Recorrida de um dos fundamentos do recurso constituir uma questão nova que está subtraída do conhecimento do Tribunal ad quem, é de admitir tal pronúncia da Recorrente ao abrigo dos poderes de gestão processual e de adequação formal, previstos nos artigos 7.º-A do CPTA e 547.º do CPC.

II. Revelando o teor do requerimento de acesso à informação não procedimental, da Administração aberta ou do open file apresentado, que a informação pretendida se apresenta configurada no âmbito do exercício do direito à informação administrativa, por a Requerente ter vindo solicitar informação que está na disponibilidade da Entidade Requerida, encontra-se concretizado o direito de acesso à informação.

III. O acesso à informação relativa ao pedido de informações sobre a atuação da Entidade Requerida em matéria da Lei das Comunicações Eletrónicas, nos exatos termos requeridos pela Requerente, não respeita a processo contraordenacional, pelo que, além de serem aplicáveis as normas da Constituição, do CPA, da LADA e do CPTA, respeitantes ao exercício do direito fundamental à informação, não está subtraída a competência jurisdicional dos tribunais administrativos.

IV. Não tendo a Entidade Requerida, na resposta apresentada em juízo, invocado considerar aplicável a restrição ao direito de acesso que consta do artigo 6.º, n.º 7, a), da LADA, limitando-se a mencionar o teor do documento de resposta enviada à Requerente onde se mostra invocada essa matéria, mas sendo esse documento posterior à instauração da presente intimação, não existiu o conhecimento na sentença recorrida quanto a tal matéria.

V. A invocação como fundamento do presente recurso da aplicação ao pedido de prestação de informações apresentado pela Requerente do disposto no artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA, não constitui uma questão nova que esteja subtraída do conhecimento do Tribunal ad quem, não só por integrar o objeto do recurso, mas sobretudo, por estar em causa o conhecimento oficioso do direito pelo juiz, nos termos do artigo 5.º, n.º 3 do CPC, segundo o qual o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.

VI. Cabe à Entidade Requerida, concretizar no plano do facto e no plano do direito a existência de qualquer obstáculo ou restrição ao direito de acesso à informação, o que no presente caso apenas logra acontecer no plano do direito.

VII. Não se verificando o enquadramento do pedido de prestação de informações requerido, nem no artigo 6.º, n.º 6 da LADA, por tal questão ter sido negada na sentença recorrida e não ter sido objeto do presente recurso, nem no artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA, por não estar em causa o acesso a informação de qualquer processo contraordenacional, sendo mais vasta a competência da Entidade Requerida em matéria de fiscalização e não proceder a Entidade Requerida à concretização factual da sua atuação, não se verificam tais fundamentos para a restrição do acesso à informação requerida.

VIII. Não se configura a existência de contrainteressados, por estar apenas em causa a prestação de informações referentes à atuação da Entidade Requerida, não se vislumbrando a afetação dos direitos dos terceiros, operadores de telecomunicações.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:


I. RELATÓRIO

A Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM), devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 25/05/2020 que, no âmbito do processo de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões requerido pela V………., S.A., julgou a intimação procedente e intimou a Requerida a prestar, em dez dias, as informações requeridas.


*

Formula a Entidade Requerida, aqui Recorrente, nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“[acesso a informações sobre processos de contraordenação]

i. O pedido de acesso a procedimento de contraordenação, esteja em que fase estiver, não se rege nem pelo CPA nem pela LADA antes pelo regime jurídico próprio que regule o processo contraordenacional e, subsidiariamente, o Código de Processo Penal, porquanto;

ii. Dispõe o artigo 1.º n.º 4 alínea b) da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto que regula o acesso aos documentos administrativos e à informação administrativa (LADA) que aquela lei não prejudica a aplicação do disposto em legislação específica quanto ao acesso a informação e a documentos relativos à instrução tendente a aferir a responsabilidade contraordenacional, e que esta se rege por legislação própria;

iii. E dispõe o Art. 41.º do RGCO que sempre que o contrário não resulte deste diploma, são aplicáveis, devidamente adaptados, os preceitos reguladores do processo criminal”,

iv. … e o Art. 48.º n.º 3 do RGCO estatui que o processo contraordenacional se inicia com uma participação ou uma denúncia (a decisão de facto dá como provada a existência de denúncias), portanto, existe já, desde esse momento, um processo contraordenacional.

v. Porque a forma de atuar das autoridades administrativas obedece ali a um procedimento próprio, de natureza sancionatória e moldado a partir do processo penal pelo que será com o processo penal que se articulam e sistematicamente se inserem as disposições que regulam a atuação dessas autoridades nesse procedimento, em todos os seus momentos.

vi. … pelo que o pedido de acesso a processos de tal natureza não se enquadra no direito de informação não procedimental ou extraprocedimental, posto que não visa o acesso a documento administrativo mas a documentos ou informações, que nunca foram, não são e nunca serão, administrativos.

vii. E a partir desse momento, são-lhe inaplicáveis os Arts. 82.º e ss. do CPA, bem como o regime da LADA;

viii. A linha que separa a informação administrativa e a informação contraordenacional não resulta da identidade de quem a pede, inteiramente irrelevante para a qualificação daquela informação como administrativa ou não administrativa (uma ou outra, e não as duas à vez, como se entendeu na sentença);

ix. É sendo o processo das contraordenações um todo que se desdobra por várias fases, pouco sentido faria que o mesmo procedimento tivesse em simultâneo dois direitos subsidiários distintos e em paridade, o Código do Procedimento Administrativo e o Código de Processo Penal, como se entendeu na douta sentença recorrida que considerou a mesma informação, na mesma fase, para o arguido, contraordenacional, e para o denunciante administrativa.

x. A própria CADA já se pronunciou, repetidamente, sobre o acesso a processos de contraordenação, tendo considerado que, enquanto estes se encontram em curso, o acesso não se regula pelas disposições da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto (LADA), nem está sequer sujeito a apreciação da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, mas pelas disposições do CPP, designadamente, no Parecer n.º: 47 de 2019-02-19 – em que refere “O acesso a procedimento contraordenacional pendente não se rege pela LADA, antes pelo regime próprio aprovado pelo DL n.º 433/82, de 27 de outubro, sendo subsidiariamente aplicável o Código de Processo Penal”.

[A alínea a) do n.º 7 do artigo 6.º da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto]

xi. Ainda que, por absurdo, se não considerasse aplicável o RGCO e se devessem aplicar as normas da LADA e do CPA, ainda assim, tal informação não poderia ser prestada por versar a atividade fiscalizadora da Recorrente;

xii. A sentença é explicita: a recorrente deverá informar quais as medidas concretas adotadas sobre a sua atividade fiscalizadora, sem distinção sequer entre as já realizadas e as programadas que se poderão ainda vir a realizar.

xiii. A douta sentença não ponderou sequer a necessidade de garantir condições de eficácia da investigação e de preservação de possíveis meios de prova a que se refere o Art. 6.º n.º 7 a) da LADA, em que se fundou também a recusa da recorrente; aparentemente, a mera constatação de que a requerente não será arguida no procedimento em que é denunciante afasta todos os riscos;

xiv. É da natureza das coisas que qualquer ação de investigação em curso só é eficaz se não for antecipadamente conhecida, pelo que as buscas domiciliárias não são antecipadamente agendadas com os alvos nem se advertem previamente os suspeitos de que o são e que as comunicações que fizerem irão ser intercetadas ou que algumas já o foram;

xv. E também se não deve revelar, seja a quem for, metodologias e instrumentos de investigação, em especial a quem possa vir a ser investigado;

xvi. Dar conhecimento do conteúdo de ações de fiscalização, realizadas ou programadas e suas metodologias afeta a eficácia dessas ações, como foi invocado, sendo que nada garante que a informação que possa ser transmitida não venha, propositada ou involuntariamente, a ser disseminada, tornando absolutamente ineficaz tais ações.

xvii. Refere a douta sentença, e bem, que a requerente não é diretamente interessada para efeitos de aplicação do Art. 82.º n.º 1 do CPA, porém, julgou aplicável o Art. 85.º do CPA;

xviii. Ora, o direito de acesso à informação procedimental regulado nos arts. 82º a 85º do CPA, respeita aos procedimentos administrativos em curso, entendidos de acordo com a definição do art. 1º, nº 1, do CPA, como “a sucessão ordenada de actos e formalidades relativos à formação, manifestação e execução da vontade dos órgãos da Administração Pública”;

xix. E, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 85.º do CPA, este direito - à informação procedimental nos termos referidos – o que nem é o caso da informação pretendida pela Reqte. – poder ser extendido “a quaisquer pessoas que provem ter interesse legítimo no conhecimento dos elementos que pretendam”, dependendo o seu exercício, neste caso, “de despacho do dirigente do serviço, exarado em requerimento escrito, instruído com os documentos probatórios do interesse legítimo invocado”.

xx. E não consta da fatualidade provada que existisse sequer o requerimento a que alude o Art. 85.º do CPA e, todavia, antecipando tal requerimento que não existiu e a resposta que não existiu ao inexistente requerimento foi a Requerida condenada nos termos sobreditos.

E, como se verá nas conclusões seguintes, os interesses, quer da investigação, quer da proteção da imagem dos arguidos são fundamento bastante para recusar o acesso à informação ou, assim não se entendendo, para não consentir na divulgação da mesma informação sem contraditório do mesmos arguidos porque contrainteressados.

Sem prescindir;

Incompetência material

xxi. O Art. 55.º números 1 e 3 do RGCO que estatui, no que interessa referir, que as decisões administrativas proferidas nos termos das conclusões anteriores que decretem ou indefiram a sujeição a segredo, ou impeçam o acesso ao processo com fundamento no segredo, são suscetíveis de recurso de impugnação… para o tribunal nele referido, de cuja decisão não haverá recurso,

xxii. Dispõe o Art. 112.º n.º 1 da referida Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, que “compete ao tribunal da concorrência, regulação e supervisão conhecer das questões relativas a recurso, revisão e execução das decisões, despachos e demais medidas em processo de contraordenação legalmente suscetíveis de impugnação: […] d) da Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM)”.

xxiii. Paralelamente, também dispõe o Art. 104.º do CPTA que a providência requerida visa a satisfação de “pedidos formulados no exercício do direito à informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos” - e não toda e qualquer informação dado que o Art. 4.º n.º1 b) do ETAF estatui que a competência material dos tribunais administrativos e fiscais versa, a fiscalização da legalidade das normas e demais atos jurídicos emanados por órgãos da Administração Pública, ao abrigo de disposições de direito administrativo ou fiscal.

xxiv. Pelo exposto, há que concluir, citando o douto Ac. do STA de 22.10.2008 no Proc. 0583/08, que “O TAF é incompetente, em razão da matéria, para conhecer do pedido de intimação de uma autoridade administrativa a satisfazer o pedido de informações formulado por um arguido no âmbito de um processo contraordenacional”;

Ilegitimidade

xxv. Considerou o Tribunal a quo, a fls. 23 a 25 da douta sentença, muito em síntese, que a informação a prestar respeitava à vida interna da Requerida, às suas condutas e não às de terceiros pelo que não existiriam contrainteressados. Ora,

xxvi. Ninguém que esteja a ser objeto de uma investigação vê com indiferença a divulgação desse facto e muito menos lhe é indiferente a divulgação à concorrência (a requerente, precisamente) dos resultados da mesma, sejam buscas, apreensões, ações inspetivas, o que for, porque a mera divulgação de que se está a ser investigado é suscetível de gerar quebra de negócio a favor da concorrência.

xxvii. Não tem o arguido interesse em não ver publicamente revelados factos que podem não vir a ser provados sem que com isso se evitem graves prejuízos para a sua reputação e dignidade? Ou, tudo o que a autoridade judiciária ou administrativa fizer ou decidir em relação a ele deve ser visto, como o declara a sentença, como uma mera questão da vida interna da autoridade?

xxviii. A informação requerida reporta-se à vida interna da Requerida e dos denunciados que são contrainteressados e cuja identidade a Requerente, autora das denúncias, conhece e identifica nas mesmas.

xxix. Estatui o n.º 2 do Art. 107.º do CPTA, um dos cinco artigos que regulam diretamente o presente processo de intimação, que “deduzido o pedido de intimação, a secretaria promove oficiosamente a citação da entidade demandada e dos contrainteressados para responder no prazo de 10 dias”.

xxx. Dispõe o Art. 78.º n.º 2 b) do CPTA que deve o requerente/autor indicar os nomes, domicílios ou sedes e, sempre que possível, números de identificação civil, de identificação fiscal ou de pessoa coletiva, profissões e locais de trabalho dos contrainteressados – o que não fez.

xxxi. A falta de identificação dos contrainteressados é causa de ilegitimidade passiva (Art. 89.º n.º 4 do CPTA).

xxxii. Uma vez que a tramitação do processo apenas admite dois articulados, deveria ter logo julgado a pretensão improcedente porque qualquer eventual convite ao aperfeiçoamento constituiria uma nulidade processual por não estar tal ato previsto nem ser compatível com o caráter urgente do processo e, nesta conformidade, haveria que julgar procedente a exceção da ilegitimidade passiva da Reqda, por preterição de litisconsórcio necessário passivo e absolvê-la do pedido ou, assim se não entendendo, da instância, nos termos do artigo 89º nº4 alínea e) do CPTA e dos nº 1 d) do artigo 278º, do nº2 do artigo 576º, da alínea e) do artigo 577º e do artigo 578º, todos do CPC.

xxxiii. A douta sentença, mantendo um entendimento diverso, contrariou todas as normas supramencionadas.”.

Pede que o recurso seja julgado procedente e revogada a sentença, sendo julgadas procedentes as exceções de ilegitimidade passiva, por falta de indicação dos contrainteressados e de incompetência material, e absolvida a demandada do pedido ou, assim não se entendendo, da instância ou, caso assim se não entenda, ser indeferida a intimação requerida, por não provada.


*

A Requerente, ora Recorrida, notificada, apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões:

“I. O presente Recurso vem interposto pela Requerida, ora Recorrente (adiante também designada por “ANACOM”), da douta Sentença, de 25.05.2020, que julgou procedente o pedido de intimação apresentado pela Requerente, ora Recorrida, e, consequentemente, intimou a ANACOM a prestar as informações solicitadas – cfr. texto acima, n.ºs 1 a 5;

II. O recurso é totalmente improcedente, não enfermando a douta Sentença de qualquer erro de julgamento – cfr. texto acima, n.ºs 1 a 5;

III. Todo o procedimento da ANACOM (anterior ao presente processo e no presente processo), é revelador de uma estranha falta de transparência e, por essa razão, indiciador que, aparentemente, por motivos que não ficam claros, nada terá feito relativamente aos vários Requerimentos apresentados pela Requerente - já desde 2016 – cfr. texto acima, n.ºs 1 a 5;

IV. A Requerente, ora Recorrida, não teve outra alternativa se não iniciar e manter o presente processo de intimação para a emissão de informações, para saber o que foi feito com o seu Requerimento de 07.01.2020 (e anteriores – v. n.º 1 dos factos provados), e, obviamente, para verificar se existe, ou não, uma conduta omissiva da Requerida e, assim, poder definir diligências futuras, nomeadamente ao nível de ação judicial de condenação da Requerida para adoção de conduta e/ou indemnização pelos prejuízos causados por uma conduta omissiva (v. art. 268.º/4 da CRP e art. 37.º/1/h)/i) e k) do CPTA) – cfr. texto acima, n.ºs 1 a 5;

V. A ora Recorrente não impugna a decisão de facto, mas, nas suas Alegações faz transcrições seletivas e descontextualizadas de partes da decisão de facto, numa clara tentativa de induzir em erro, como se o que é dito em mensagens eletrónicas da Requerida, dadas como provadas, constituísse, também, factos provados - o que está provado são as mensagens eletrónicas, a sua data e teor, mas não está dado como provado o que é dito nas mesmas – cfr. texto acima, n.ºs 5 e 6;

VI. É o caso da alegada decisão do Presidente do Conselho de Administração da Recorrente, de 22.04.2020, que a Recorrente, agora, sublinha e negrita na pág. 4 das suas Alegações (numerada com o n.º 5), mas que nem sequer invocou na sua Oposição e muito menos provou, sendo que, mesmo se constituísse mais uma, informação sigilosa, além de tal não impedir a sua invocação em sede de Oposição, não afastava a possibilidade de a Recorrente juntar a mesma aos autos com a sua Oposição, ocultando a informação que considerasse confidencial, o que não fez – cfr. texto acima, n.ºs 1 a 5;

VII. O alegado nas Conclusões i) a x) das Alegações da Recorrente, relativamente a processo contraordenacional, é totalmente improcedente – cfr. texto acima, n.ºs 7 a 13;

VIII. Não se encontra, de todo, provada a existência de qualquer processo contraordenacional, nomeadamente tal não resulta dos factos provados na douta Sentença recorrida, não impugnados pela Recorrente – cfr. texto acima, n.ºs 7 a 13;

IX. Sendo que, (i) nas anteriores “respostas” aos pedidos de informação da Requerente nunca a ANACOM sequer aludiu à existência de um processo contraordenacional (v. n.ºs 3 e 6 dos factos provados na douta Sentença recorrida), e, (ii) na Oposição que apresentou no presente processo, apesar de tentar utilizar argumentação relativa a processos contraordenacionais, nunca alegou e, muito menos, provou, que existiria um processo contraordenacional – cfr. texto acima, n.ºs 7 a 13;

X. Sem prejuízo do acima referido, é totalmente improcedente o que a Recorrente agora alega no sentido de “denúncias” constituírem o início de processos contraordenacionais, pois, além de o art. 48.º/3 do RGCO, invocado pela Recorrente para esse efeito, não determinar o início de processo contraordenacional, o mesmo é relativo a atos da polícia e dos agentes de fiscalização, o que, manifestamente, não é o caso da ora Recorrida – cfr. texto acima, n.ºs 7 a 13;

XI. As competências atribuídas à ANACOM no âmbito da fiscalização e supervisão não se restringem a processos contraordenacionais, conforme resulta dos arts. 107.º e segs. da Lei das Comunicações Eletrónicas, aprovada pela Lei 5/2004, de 10.02, com várias alterações, pelo que não se poderia concluir, sem provar, que existe um processo contraordenacional – cfr. texto acima, n.ºs 7 a 13;

XII. Mesmo no que respeita a processos contraordenacionais (que se desconhece se existem ou não), o art. 20.º da Lei 99/2009, de 04.09, que aprovou o regime quadro das contraordenações do sector das comunicações, estabelece expressamente que o processo de contraordenação é público – cfr. texto acima, n.ºs 7 a 13;

XIII. Como bem referido na douta Sentença recorrida, relativamente a outras decisões judiciais invocadas pela Requerida (e é aplicável à decisão da CADA invocada nas suas alegações), as mesmas respeitam a pedidos de informação por arguidos em processos contraordenacionais, o que não é o caso da Requerente, que não é arguida em qualquer processo, nem tal é invocado pela Recorrente – cfr. texto acima, n.ºs 7 a 13;

XIV. Conforme também bem referido na douta Sentença recorrida, mesmo por forma a, querendo, a Requerente possa lançar mão da prerrogativa de consulta dos autos de (eventual) processo contraordenacional e obtenção de certidões prevista no art. 90.º do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º do RGCO, “à mesma terá necessariamente que assistir a possibilidade de requerer informações acerca da existência de tais processos” – cfr. texto acima, n.ºs 7 a 13;

XV. O alegado nas Conclusões a xi) das Alegações da Recorrente, relativamente à al. a) do n.º 7 do art. 6.º da LADA, também é totalmente improcedente – cfr. texto acima, n.ºs 14 a 17;

XVI. A Recorrente não invocou na Resposta / Oposição ao pedido de intimação, que apresentou no presente processo, esta al. a) do n.º 7 do art. 6.º da LADA, nem os pressupostos da mesma – cfr. texto acima, n.ºs 14 a 17;

XVII. Trata-se, assim, de questão nova, que não é de conhecimento oficioso, pelo que é manifesto que esta matéria não pode integrar o âmbito da presente Recurso – cfr. texto acima, n.ºs 14 a 17;

XVIII. Sem prejuízo do exposto, sublinhe-se, ainda, que nunca a Requerida, ora Recorrente, juntou aos autos o alegado despacho do Presidente do Conselho de Administração da Recorrente, de 22.04.2020 (posterior ao pedido de informação da Requerente), nem mesmo em versão confidencial, nem juntou qualquer outro documento com a sua Oposição, sendo que, além da questão não ter sido invocada pela ora Recorrente na respetiva Oposição, nunca seria possível ao douto Tribunal a quo “ponderar (oficiosamente?), se estaria em causa informação cujo conhecimento fosse suscetível de afetar a eficácia da fiscalização ou supervisão, como, agora, a Recorrente alega o douto Tribunal devia ter feito – cfr. texto acima, n.ºs 14 a 17;

XIX. Além disso, de acordo com o que a Recorrente destaca na pág. 3 das suas Alegações (numerada como n.º 4), estariam em causa factos que, em 2018, já a Recorrente dizia que “se encontrava(m) sob investigação”, pelo que, a ser verdadeira essa informação (o que as circunstâncias levam a que se suscitem dúvidas), não é crível que, em 2020, ainda fosse afetada a eficácia da fiscalização ou supervisão – cfr. texto acima, n.ºs 14 a 17;

XX. De resto, atendendo ao solicitado, sempre seria possível “expurgar a informação relativa à matéria (que fosse considerada) reservada”, conforme expressamente previsto no art. 6.º/8 da LADA (sombreado nosso), o que também demonstra a improcedência do alegado, em termos vagos e genéricos, nas Alegações da Recorrente – cfr. texto acima, n.ºs 14 a 17;

XXI. O alegado nas Conclusões a xvii) a xx) das Alegações da Recorrente, relativamente ao direito da Requerente a aceder à informação, também é totalmente improcedente – cfr. texto acima, n.ºs 18 a 22;

XXII. É totalmente incompreensível que a Recorrente pretenda defender que a Requerente não tenha o direito de obter informação sobre o que foi feito pela ANACOM, relativamente aos Requerimentos que apresentou – cfr. texto acima, n.ºs 18 a 22;

XXIII. É manifesto o direito da Requerente à informação em causa, nos termos do art. 268.º/1 e 2 da CRP e dos arts. 82.º a 85.º do CPA, conforme decidido na douta Sentença recorrida – cfr. texto acima, n.ºs 18 a 22;

XXIV. Além de a informação solicitada pela Requerente se reportar aos Requerimentos apresentados pela mesma, pelo que é aplicável in casu o art. 82.º do CPA (ou, pelo menos, o art. 85.º do CPA, como decidido na douta Sentença recorrida), no Requerimento da Requerente, de 07.01.2020, e no subsequente pedido de informação relativamente ao mesmo, de 19.03.2020, está amplamente demonstrado e fundamentado o interesse da Requerente em obter a informação em causa (v. n.ºs 1 a 5 do Requerimento da Requerente transcrito no n.º 1 dos factos provados e n.ºs 1 e segs. do Requerimento da Requerente transcrito no n.º 2 dos factos provados) – cfr. texto acima, n.ºs 18 a 22;

XXV. De resto, conforme já acima referido, a informação pretendida (saber o que foi feito com o Requerimento da Requerente, de 07.01.2020, e anteriores), é desde logo necessária para se verificar se existe, ou não, uma conduta omissiva da Requerida e, assim, poder definir diligências seguintes, nomeadamente ao nível de ação judicial de condenação da Requerida para adoção de conduta e/ou indemnização pelos prejuízos causados por uma conduta omissiva – cfr. texto acima, n.ºs 18 a 22;

XXVI. O alegado nas Conclusões a xxi) a xxiv) das Alegações da Recorrente, relativamente à incompetência material do Tribunal, também é totalmente improcedente – cfr. texto acima, n.ºs 23 a 26;

XXVII. Dá-se, assim, por reproduzido o já acima referido nas Conclusões VII) e segs. das presentes Contra-Alegações, quanto a não estar sequer demonstrada ou provada a existência de qualquer processo contraordenacional – cfr. texto acima, n.ºs 23 a 26;

XXVIII. Sendo que, além disso, todas as decisões invocadas pela Recorrente respeitam a casos em que, quem pede as informações, é arguido em processo contraordenacional, o que nunca seria aqui o caso (nem tal é invocado pela Recorrente) – cfr. texto acima, n.ºs 23 a 26;

XXIX. Note-se que, conforme já acima referido, a Requerente pretende obter informações sobre Requerimento seu, que apresentou na sequência de vários outros Requerimentos que tem vindo a apresentar já desde 2016, que terão que, pelo menos, ter dado origem a um procedimento administrativo – cfr. texto acima, n.ºs 23 a 26;

XXX. Sendo que, repita-se, também, que se desconhece que exista algum processo contraordenacional - a ANACOM nunca o disse e, na verdade, também não o diz (e muito menos demonstra), no presente processo, apesar de argumentar por essa via, o que, por si só, retira toda e qualquer base de sustentação quanto ao que a Recorrente alega relativamente à exceção de incompetência do douto Tribunal – cfr. texto acima, n.ºs 23 a 26;

XXXI. Finalmente, o alegado nas Conclusões a xxv) a xxxii) das Alegações da Recorrente, relativamente ilegitimidade, também é totalmente improcedente – cfr. texto acima, n.ºs 27 a 34;

XXXII. Conforme bem decidido na douta Sentença recorrida, não existe qualquer ilegitimidade, por falta de indicação de contrainteressados – cfr. texto acima, n.ºs 27 a 34;

XXXIII.A este respeito, a Recorrente enverada por um conjunto de suposições, não demonstradas, e que nem sequer têm correspondência com o pedido formulado pela Requerente e com o decidido pelo douto Tribunal – cfr. texto acima, n.ºs 27 a 34;

XXXIV.Para ser aplicável o art. 107.º/1 do CPTA é necessário que existam, de facto, contrainteressados, em concreto 3.ºs “a quem o provimento do processo (…) possa diretamente prejudicar” (v. art. 57.º do CPTA), o que não é o caso – cfr. texto acima, n.ºs 27 a 34;

XXXV.Na Oposição apresentada em 1.ª instância a ora Recorrente nunca indicou em que medida seriam diretamente prejudicados terceiros pelo provimento do presente processo, o que, por si só, determinava a improcedência da exceção que invoca, por não provada – cfr. texto acima, n.ºs 27 a 34;

XXXVI.Sem prejuízo do exposto, note-se, ainda, que o presente processo é apenas de intimação para prestação de informação e não, por exemplo, para a condenação da ANACOM a adotar condutas relativamente a terceiros - em concreto, através do pedido de informação, a ora Requerente pretende saber o que a ANACOM fez com os anteriores Requerimentos que a Requerente apresentou, nomeadamente o que fez com o Requerimento que a Requerente apresentou em 07.01.2020 (n.º 1 dos factos provados), e não quaisquer Requerimentos de empresas terceiras, nem aceder a quaisquer documentos que contenham segredos comerciais, industriais de empresas terceiras, nem mesmo, sobre a vida interna de qualquer empresa de terceira – cfr. texto acima, n.ºs 27 a 34;

XXXVII.É manifesto que o que a ANACOM terá ou não feito na falta de registo de/por operadores junto da ANACOM, como legalmente imposto (cfr. art. 21.º/1 da Lei das Comunicações Eletrónicas), não constitui qualquer segredo comercial ou industrial – cfr. texto acima, n.ºs 27 a 34;

XXXVIII.O que está aqui em causa quanto a vida interna é, tão somente, vida interna da ANACOM (que esta pretende ocultar, apesar das obrigações que impendem sobre a mesma, como entidade pública e como autoridade reguladora de um sector) – cfr. texto acima, n.ºs 27 a 34;

XXXIX. Além disso, conforme já acima referido, além de se desconhecer se existe ou não algum processo contraordenacional, as competências atribuídas à ANACOM no âmbito da fiscalização e supervisão não se restringem a processos contraordenacionais, conforme resulta dos arts. 107.º e segs. da Lei das Comunicações Eletrónicas, pelo que não procedem as referências da Recorrente relativamente a processos contraordenacionais, também em sede de ilegitimidade – cfr. texto acima, n.ºs 27 a 34;

XL. E, mesmo no que respeita a processos contraordenacionais, o art. 20.º da Lei 99/2009, de 04.09, que aprovou o regime quadro das contraordenações do sector das comunicações, estabelece expressamente que o processo de contraordenação é público, não carecendo o acesso a esses processos, nomeadamente, de qualquer autorização dos respetivos arguidos ou outros – cfr. texto acima, n.ºs 27 a 34;

XLI. A douta Sentença recorrida não enferma, assim, de qualquer erro de julgamento.”.

Pede a improcedência do recurso.


*

O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não emitiu parecer.

*

A Recorrente veio pronunciar-se sobre as alegadas questões novas invocadas pela Recorrida nas contra-alegações de recurso, o que motivou a apresentação do requerimento da Recorrida a invocar nulidade processual, por tal pronúncia da Recorrente não ser admissível, pedindo o seu desentranhamento e a sua condenação em multa pelo incidente anómalo.

Em sequência, veio a Recorrente novamente pronunciar-se sobre o alegado e requerido pela Recorrida.


*

O processo vai, sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento, por se tratar de um processo urgente.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo certo que o objeto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

As questões suscitadas pela Recorrente resumem-se, em suma, em decidir:

1. Erro de julgamento de direito, quanto à aplicação do regime do CPA e da LADA ao processo de contraordenação;

Se assim não se entender,

2. Erro de julgamento de direito, por a informação não poder ser prestada por versar sobre a atividade fiscalizadora da Recorrente, nos termos do artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA;

3. Incompetência material do Tribunal, por ser da competência do tribunal da concorrência, regulação e supervisão conhecer das medidas em processo de contraordenação;

4. Ilegitimidade passiva, por falta de indicação dos Contrainteressados.

Na sequência da pronúncia apresentada pela Recorrente às contra-alegações de recurso apresentadas pela Requerente, a Recorrida veio suscitar:

5. Nulidade processual, traduzida na apresentação de uma resposta que não é processualmente admissível, importando o seu desentranhamento e restituição à Recorrente e a sua condenação em multa pelo incidente anómalo.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos:

“1. Em 07.01.2020, a Requerente apresentou um requerimento junto da Requerida, subordinada ao assunto “Denúncia por prestação de serviços de comunicações eletrónicas sem registo prévio”, cujo teor se reproduz parcialmente infra:

FACTOS

1. A V............, S.A (“V............”) é um prestador de serviços de comunicações eletrónicas com atividade em diversos países em todo o mundo

2. Em Portugal, a V............ está registada junto da Autoridade Nacional de Comunicações (“ANACOM") desde 2007, ao abrigo do regime de autorização geral, para a prestação de serviço telefónico em local fixo, serviço de voz através da Internet (VoIP), e para o serviço de cartões virtuais de chamadas.

QUESTÕES

3. Nos últimos anos, a V............ tem partilhado com a ANACOM, numa base de confidencialidade, as suas preocupações relativas à inobservância, por diversos operadores, do quadro legal das comunicações eletrónicas, em particular da Lei n.° 5/2004, de 10 de fevereiro, com alterações (“Lei das Comunicações Eletrónicas”).

4. Trata-se de operadores que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas em Portugal sem estarem devidamente registados junto da ANACOM conforme exigido pelo artigo 21.º, n.° 1, da Lei das Comunicações Eletrónicas.

5. A (in)ação daqueles operadores tem como resultado uma distorção séria e atendível do panorama concorrencial e compromete a existência de um level-playing field no mercado português, suscetível de promover a concorrência na oferta de redes e serviços de comunicações eletrónicas e de recursos e serviços conexos.

6. Em particular, a V............ enviou no passado à ANACOM as seguintes comunicações:

• A 7 de abril de 2016, foi enviada uma carta relativa à oferta de determinados serviços no mercado português, nomeadamente serviços móveis, por um operador (N............) que não encontrava registado junto da ANACOM.

• A 6 de janeiro de 2017, a V............ submeteu um requerimento à ANACOM, nos termos do qual solicitou informação sobre o estado da investigação e requereu o acesso ao processo. Neste seguimento, a ANACOM deferiu o acesso ao processo, através do qual foi possível à V............ confirmar que a ANACOM:

i. Concluiu preliminarmente que a N............ poderia estar a desenvolver a sua atividade sem cumprir as regras aplicáveis;

ii. Visitou o site da N............, enquanto medida de investigação, embora os resultados dessas visitas tenham sido confidencializados;

iii. Não chegou a adotar qualquer outra medida após 16 de outubro de 2016.

• Em março de 2017, a V............ desistiu temporariamente de prosseguir a sua denúncia por forma a poder avaliar todas as opções e possíveis rumos de ação que se encontravam à sua disposição;

• Em janeiro de 2018, a V............ observou, novamente, junto dessa Autoridade que determinados operadores por si identificados, incluindo a N............, estavam (ou continuavam) a oferecer serviços, apesar de não cumprirem os requisitos legais aplicáveis, e decidiu retomar a sua denúncia inicial perante a ANACOM;

• A 24 de julho de 2018, a ANACOM informou a V............ que a sua denúncia ainda se encontrava sob investigação;

• A 8 de agosto de 2018, a V............ reiterou junto da ANACOM as preocupações expressas anteriormente em relação às condições em que a N............ desenvolve a sua atividade em Portugal;

• A 4 de julho de 2019, a V............ enviou uma nova denúncia à ANACOM sobre estas matérias.

7. Ou seja, apesar dos esforços contínuos da V............ para evitar uma situação de concorrência ilícita no mercado português de comunicações eletrónicas, a situação nesse mercado não melhorou, sob esse prisma, e diversos operadores continuam a prestar serviços sem cumprirem as regras básicas que regem a sua atividade.

8. Em particular, operadores como a N............ e T............ (cfr screenshots em anexo), não estão registados junto da ANACOM, embora continuem a oferecer os seus serviços no mercado português.

9. Esta circunstância conduz, necessariamente, a V............ a concluir que se trata de uma prática generalizada no mercado, segundo a qual determinados players oferecem serviços sem respeitarem (ou considerarem) os requisitos aplicáveis à respetiva atividade, conforme definidos pelo legislador europeu e português

10. É inquestionável que o eventual favorecimento de um (grupo de) operador(es) em detrimento de outros - ao não se exigir o mesmo nível de cumprimento das regras aplicáveis - tem um efeito nefasto e implicações extremamente negativas num mercado de comunicações que se deseja equilibrado e em condições equitativas para todos os operadores e que, por força disso, se traduzam em benefícios efetivos para os cidadãos.

11. Na verdade, a impunidade perante situações de incumprimento acarreta ainda um problema adicional, designadamente por contribuir para diminuir os standards de compliance em Portugal e para um nivelamento por baixo de todo o mercado suscetível de prejudicar os consumidores, as empresas e a inovação.

12. Se a V............ dever cumprir mais requisitos e normas do que os seus concorrentes diretos, tais como a N............, M............ e T............, então a sua posição competitiva está irremediavelmente prejudicada.

QUADRO JURÍDICO

13. De acordo com os artigos 4° e 5.° da Lei da Comunicações Eletrónicas, compete à ANACOM desempenhar as funções de regulação, supervisão, fiscalização e sancionamento previstas naquela lei. Em particular, a ANACOM deve assegurar “a inexistência de distorções ou entraves à concorrência no sector das comunicações electrónicas” e “que, em circunstâncias análogas, não haja discriminação no tratamento das empresas que oferecem redes e serviços de comunicações electrónicas”.

14. A ANACOM está igualmente sujeita à obrigação de determinar em que medida é que um determinado mercado relevante é efetivamente concorrencial, por forma a impor, manter, alterar ou suprimir obrigações às empresas.

15. Conforme referido acima, a prestação de serviços de comunicações eletrónicas requer a notificação prévia junto da ANACOM, nos termos do regime de autorização geral, conforme previsto no artigo 21.° da Lei das Comunicações Eletrónicas.

16. Para este efeito, a empresa deve comunicar à ANACOM que pretende iniciar a oferta de redes e serviços de comunicações eletrónicas antes de iniciar a sua operação, incluindo nessa comunicação uma descrição do serviço ou rede, bem como a indicação da data prevista para o início da atividade. Após essa comunicação, a ANACOM emite declaração na qual confirma a sua entrega e sumaria os direitos do operador em matéria de acesso e interligação e de instalação de recursos.

17. Note-se que, entre outras situações, o incumprimento das obrigações descritas acima, constitui contraordenação grave, conforme resulta do Artigo 113.°, n.° 2, al. b), da Lei das Comunicações Eletrónicas.

18. Sendo aquele tipo contraordenacional punível com coima que pode ascender a 1.000.000€, no caso de ser praticada por grande empresa, de acordo com o artigo 113.°, n.º 8, da mesma Lei.

19. Finalmente, além das referidas coimas, poderão ser aplicadas, sempre que a gravidade da infração e a culpa do agente o justifique, sanções acessórias.

CONCLUSÃO

20 A ANACOM, enquanto autoridade reguladora nacional para as comunicações eletrónicas, tem a incumbência de promover a concorrência na oferta de redes e serviços de comunicações eletrónicas; contribuir para o desenvolvimento do mercado interno das redes e serviços e comunicações eletrónicas; e promover os interesses dos cidadãos, de acordo com os objetivos de regulação estabelecidos pelo artigo 5.º da Lei das Comunicações Eletrónicas.

21. Em concreto, e de acordo com os seus estatutos, conforme aprovados pelo Decreto-Lei n° 39/2015 de 16 de março (“Estatutos da ANACOM”), a ANACOM “tem por missão a regulação do setor das comunicações”, sendo ainda sua atribuição a promoção da concorrência na oferta de redes e serviços. Este objetivo consta igualmente, com destaque relevante, do plano plurianual 2019-2021 da ANACOM, no qual essa Autoridade reafirma a sua missão de garantia e promoção de uma “concorrência leal e dinâmica" (primeiro objetivo estratégico).

22. A esse título, os Estatutos da ANACOM preveem que, por forma a poder realizar as suas missões, a ANACOM é equipada com poderes regulatórios, de supervisão, de monitorização e sancionatórios, os quais incluem, inter alia, o poder para monitorizar "o cumprimento das leis, dos regulamentos e dos demais atos a que se encontram sujeitos os destinatários da sua atividade”.

23. Cabe-lhe ainda fiscalizar "o cumprimento das obrigações a que, nos termos da lei, regulamentos, demais normas aplicáveis e determinações por si emitidas, os destinatários da sua atividade se encontrem sujeitos". Neste âmbito, o artigo 12.°, n.° 1 dos Estatutos da ANACOM estabelece que a “ANACOM deve efetuar pontualmente inspeções e auditorias, em execução de planos previamente aprovados e sempre que se verifiquem circunstâncias que indiciem perturbações no respetivo setor de atividade”.

24. A V............ considera que a ANACOM desempenha um papel crucial na garantia de que todas as empresas ativas no setor das comunicações em Portugal operam segundo as mesmas regras e que estas mesmas regras não discriminam ou beneficiam determinadas empresas em detrimento de outras.

25. Impõe-se assim, que a ANACOM se oponha a um status quo que configura uma situação de concorrência desleal e que adote as medidas necessárias por forma a garantir um level playing field e assegurar que os utilizadores obtêm o máximo beneficio em termos de escolha, preço e qualidade.

26. Face ao exposto, a V............ respeitosamente requer que essa Autoridade atue face à flagrante violação, pelos operadores atrás identificados, das obrigações de registo que lhes advêm do artigo 21.º da Lei das Comunicações Eletrónicas, adotando, com caráter de urgência, todas as medidas apropriadas relativamente a essas empresas de modo a repor a legalidade.

27. Solicita-se ainda, uma reunião em ordem a podermos apresentar o teor da presente comunicação junto dessa Autoridade” (cf. cópia do requerimento junta a fls. 29-34 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

2. Em 19.03.2020, a Requerente apresentou novo requerimento junto da Requerida por referência ao requerimento a que se alude no ponto anterior, cujo teor se reproduz parcialmente infra:

1. A ora Requerente, pela comunicação referida acima, expôs um conjunto de preocupações relativas à inobservância, por determinados operadores, do quadro legal das comunicações eletrónicas, em particular da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro, com alterações (“Lei das Comunicações Eletrónicas”).

2. Em concreto, conforme transmitido naquela comunicação e em anteriores comunicações, aqueles operadores não estão a cumprir as regras de registo junto da ANACOM, cfr. artigo 21.º, n.º 1, da Lei das Comunicações Eletrónicas, o que, consequentemente, cria uma situação insustentável de distorção séria e atendível do panorama concorrencial no setor em Portugal, em que operadores a desenvolver atividades equivalentes estão, aparentemente, sujeitos a enquadramentos regulatórios distintos.

3. Pese embora a V............, S.A., apenas ter identificado dois operadores, não será razoável excluir que aquela prática esteja absolutamente disseminada na oferta de redes e serviços de comunicações eletrónicas e de recursos e serviços conexos, em claro prejuízo para os cidadãos e também para os restantes operadores concorrentes.

4. Por conseguinte, o status quo em Portugal, em concreto o desrespeito das normas legais aplicáveis aos operadores, é suscetível de conduzir a um claro favorecimento de determinados operadores em detrimento de outros, o que contraria de forma evidente as incumbências da ANACOM de zelar pelo cumprimento da lei; promover concorrência na oferta de redes e serviços de comunicações eletrónicas; contribuir para o desenvolvimento do mercado interno das redes e serviços e comunicações eletrónicas; e promover os interesses dos cidadãos (cfr. objetivos de regulação estabelecidos pelo artigo 5.º da Lei das Comunicações Eletrónicas).

5. Ademais, cabe à ANACOM monitorizar o cumprimento do quadro jurídico e demais obrigações a que os regulados se encontrem sujeitos, devendo atuar sempre que se verifiquem circunstâncias que indiciem perturbações no setor (cfr. artigo 12.º, n.º 1, dos Estatutos da ANACOM, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 39/2015, de 16 de março).

6. Foi precisamente com esse propósito, e por considerar que a ANACOM desempenha um papel fundamental na regulação da oferta de redes e serviços de comunicações eletrónicas e de recursos e serviços conexos, que a V............, S.A., enviou a comunicação de 7 de janeiro de 2020, a qual, no entanto, foi já o culminar de um conjunto de interações prévias mantidas entre a V............ e a ANACOM, que sempre versaram sobre as mesmas preocupações.

7. De facto, a V............, S.A., enviou anteriormente à ANACOM, nomeadamente, as seguintes comunicações: i enviada uma carta relativa à oferta de determinados serviços no mercado português, nomeadamente serviços móveis, por um operador que não se encontrava registado junto da ANACOM; termos do qual solicitou informação sobre o estado da investigação e requereu o acesso ao processo. Neste seguimento, a ANACOM deferiu o acesso ao processo, através do qual foi possível à V............ confirmar que a ANACOM:

o Concluiu preliminarmente que a N............ poderia estar a desenvolver a sua atividade sem cumprir as regras aplicáveis;

o Visitou o site da N............, enquanto medida de investigação, embora os

resultados dessas visitas tenham sido ocultados;

o Não chegou a adotar qualquer outra medida após 16 de outubro de 2016; que determinados operadores por si identificados nessa comunicação, estavam (ou continuavam) a oferecer serviços, apesar de não cumprirem os requisitos legais aplicáveis, e decidiu retomar a sua denúncia inicial perante a ANACOM; ainda se encontrava sob investigação; expressas anteriormente em relação às condições em que a N............ desenvolve a sua atividade em Portugal; estas matérias; a em epigrafe, cuja cópia se junta em anexo, a requerer, nomeadamente, que essa Autoridade atue face à flagrante violação, pelos operadores na mesma identificados, das obrigações de registo que lhes advêm do artigo 21.º da Lei das Comunicações Eletrónicas, adotando, com caráter de urgência, todas as medidas apropriadas relativamente a essas empresas de modo a repor a legalidade.

8. Porém, não temos conhecimento que os contínuos esforços da V............, S.A., nesta matéria tenham sido atendidos, sendo que o referido panorama de distorção concorrencial não se alterou e operadores em causa, nomeadamente a N............ e a T............, continuam a atuar no mercado sem cumprir os requisitos legalmente exigidos, designadamente continuam a não estar registados junto da ANACOM.

9. Na verdade, não só a situação no setor não se alterou, como a V............, S.A., ainda não recebeu qualquer indicação firme nesse sentido por essa autoridade, não obstante ter desenvolvido os seus melhores esforços de interação com a ANACOM, no que respeita à evolução da análise das suas comunicações.

10. Ora, nos termos do art. 82.º/1/2 e 3 do CPA,

“1 - Os interessados têm o direito de ser informados pelo responsável pela direção do procedimento, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos procedimentos que lhes digam diretamente respeito, bem como o direito de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas.

2 - As informações a prestar abrangem a indicação do serviço onde o procedimento se encontra, os atos e diligências praticados, as deficiências a suprir pelos interessados, as decisões adotadas e quaisquer outros elementos solicitados.

3 - As informações solicitadas ao abrigo do presente artigo são fornecidas no prazo máximo de 10 dias.”

11. Caso as informações em causa não sejam fornecidas no referido prazo legal, a ora Requerente será forçada a desencadear o respetivo processo de intimação judicial, o que não é, de todo, a sua intenção.

Nestes termos, requer-se a V. Exas., nos termos do art. 82.º/1 e 2 do CPA, a emissão de informação com a identificação dos atos e diligências praticados na sequência do requerimento da ora Requerente, de 07.01.2020, e dos demais requerimentos identificados no n.º 7 do presente requerimento, bem como sobre as decisões que tenham sido adotadas no seguimento daquele requerimento de 07.01.2020 e dos demais requerimentos identificados no n.º 7 do presente requerimento, enviando-se cópia das mesmas” (cf. cópias do requerimento e mensagem electrónica juntas a fls. 14-19 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

3. Em 03.04.2020, a Requerida remeteu uma mensagem electrónica à Requerente, cujo teor se transcreve parcialmente infra:

Em resposta ao pedido apresentado em 19.03.2020 e para além da informação já transmitida à vossa empresa através das comunicações desta Autoridade de 23.01.2017 e de 24.07.2018, informamos que:

1) A 14.12.2017, a ANACOM aprovou o Regulamento n.º 6/2018, de 5 de janeiro, que veio especificar os deveres de comunicação impostos às empresas que pretendem oferecer ou que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas, relativamente à sua identificação, aos seus contactos e ao início, à alteração e à cessação da sua atividade, e estabelecer as regras aplicáveis à manutenção do respetivo registo;

2) Desde a entrada em vigor daquele Regulamento e nos termos previstos no respetivo artigo 31.º, a ANACOM tem vindo a desenvolver um processo de atualização de todo o registo das empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas, que inclui não só a atualização das atuais inscrições já efetuadas, como também:

1. Por um lado, o fecho dos processos relativos às comunicações de início de atividade já apresentadas pendentes quer do suprimento de deficiências ou da prestação de informação por parte das próprias empresas, quer do devido enquadramento de natureza técnica e jurídica quanto à atividade comunicada em concreto; e

2. Por outro lado, sempre que assim for considerado adequado, a inscrição oficiosa das empresas que se constate oferecerem redes ou serviços de comunicações eletrónicas sem qualquer comunicação prévia à ANACOM, nos termos que, para esse fim, ficaram expressamente previstos nos n.os 2 e 3 do artigo 19.º do referido Regulamento n.º 6/2018, de 5 de janeiro; e

3) Por último e sem prejuízo do exercício dos seus poderes de supervisão, fiscalização e, quando seja o caso, sancionatórios, mas pretendendo, de igual modo e para o futuro, promover a atualização e a transparência do regime aplicável à utilização de recursos de numeração, assim como a concorrência na oferta de redes e serviços de comunicações eletrónicas, a ANACOM aprovou, a 17.10.2019, o início de procedimento de elaboração de um regulamento relativo às condições aplicáveis à subatribuição de recursos E.164 do plano nacional de numeração, que terá por objeto:

1. Por um lado, a definição das condições aplicáveis à subatribuição de recursos E.164 do Plano Nacional de Numeração cujos direitos de utilização tenham sido primariamente atribuídos pela ANACOM, por parte da empresa titular desses direitos a uma outra empresa que, tal como a primeira, pretenda oferecer os serviços de comunicações eletrónicas associados a esses recursos; e

2. Por outro lado, a definição das condições de utilização de recursos E.164 do Plano Nacional de Numeração que tenham sido objeto de subatribuição.” (cf. cópia da mensagem electrónica junta a fls. 45-46 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

4. Em 07.04.2020, a Requerente apresentou novo requerimento junto da Requerida, cujo teor se reproduz parcialmente infra:

1. A ora Requerente apresentou, em 19.03.2020, pedido de informação sobre o que havia sido efetuado pela ANACOM relativamente ao requerido pela V............ no seu Requerimento, de 07.01.2020, bem como em requerimentos anteriores.

2. Em 03.04.2020, foi rececionado por mandatário da V............ um e-mail da ANACOM, em que se afirmava que era enviado “em resposta” àquele pedido, mas apenas se aludia, genericamente, a Regulamento da ANACOM e a início de procedimento de elaboração de um outro Regulamento.

3. Com o devido respeito, neste e-mail da ANACOM, de 03.04.2020, não se responde àquele pedido de informação, pois nada se diz de concreto quanto ao requerido pela V............ naquele Requerimento, de 07.01.2020, nem se diz o que foi feito com esse Requerimento, nem com os Requerimentos anteriores da V.............

4. Com efeito, conforme referido no n.º 7 do pedido de informação da V............, apresentado, em 19.03.2020, naquele Requerimento, de 07.01.2020 (relativamente ao qual era pedida informação), a V............, requereu, nomeadamente, que essa Autoridade atuasse “face à flagrante violação, pelos operadores na mesma identificados, das obrigações de registo que lhes advêm do artigo 21.º da Lei das Comunicações Eletrónicas, adotando, com caráter de urgência, todas as medidas apropriadas relativamente a essas empresas de modo a repor a legalidade” (v. n.º 26 do Requerimento da V............ de 07.01.2020).

5. Ora, é manifesto que naquela “resposta” da ANACOM, de 03.04.2020, não se responde a esta questão, nada se dizendo, em concreto, sobre o que foi feito pela ANACOM relativamente àquele Requerimento da V............ de 07.01.2020, e, nomeadamente, quanto àqueles operadores que se encontram em incumprimento das regras aplicáveis.

6. A mera referência genérica a Regulamentos aprovados (anteriores aquele Requerimento da V............), não responde àquelas questões.

7. Note-se, aliás, que nos demais números do pedido de informação reiterava-se o já referido naquele requerimento da V............, de 07.01.2020 - relativamente ao qual se pedia a emissão de informação -, quanto à existência de operadores que não estão a cumprir aquelas regras e quanto ao facto de o “panorama de distorção concorrencial não se (ter) alter(ado) e operadores em causa, nomeadamente a N............ e a T............, continua(rem) a atuar no mercado sem cumprir os requisitos legalmente exigidos, designadamente continu(arem) a não estar registados junto da ANACOM” (…).

8. O que, repita-se, não foi objeto de resposta pela ANACOM no mencionado e-mail, de 03.04.2020, em que, nomeadamente, não se dá qualquer informação concreta quanto ao que foi feito ao Requerimento da V............, de 07.01.2020, especificamente com relação àqueles operadores. Tal como nada foi dito relativamente ao que foi feito aos anteriores Requerimentos da V............ identificados no pedido de informação.

9. Aliás, nos termos do n.º 3 do artigo 19.º do Regulamento n.º 6/2019, publicado a 5 de Janeiro, da ANACOM, a própria eventualidade de inscrição oficiosa de empresas que não cumpriram o dever de comunicação de início de atividade não afasta o procedimento sancionatório a que possa haver lugar.

10. Assim sendo, reitera-se o pedido de informação, solicitando que a mesma seja emitida no prazo máximo de 5 dias.

Nestes termos, reitera-se o pedido a V. Exas., já formulado em 19.03.2020, para, nos termos do art. 82.º/1 e 2 do CPA, ser emitida informação sobre o que foi feito pela ANACOM com o Requerimento da ora Requerente, de 07.01.2020, nomeadamente que medidas concretas foram adotadas pela ANACOM relativamente aos Operadores identificados nesse Requerimento e que medidas foram adotadas quanto a esses Operadores no âmbito do poder de fiscalização e sancionatório dessa Autoridade.

Mais se solicita idêntica informação relativamente aos demais Requerimentos da ora Requerente identificados no n.º 7 daquele Requerimento de 19.03.2020” (cf. cópias da mensagem electrónica e requerimento junta a fls. 51-55 dos autos no SITAF, documentos que se dão por integralmente reproduzidos).

5. Às 12h16 de 22.04.2020, a Requerente apresentou a juízo o r.i. dos presentes autos de intimação (cf. comprovativo de entrega junto a fls. 1-3 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

6. Às 16h51 de 22.04.2020, a Requerida remeteu uma mensagem electrónica à Requerente, cujo teor se reproduz parcialmente infra:

Em resposta à comunicação recebida a 07.04.2020, encarrega-me o Presidente do Conselho de Administração da Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) de transmitir o seguinte:

Antes de mais, reiteramos e remetemos para a informação já transmitida no nosso email de 03.04.2020, em resposta à comunicação recebida a 19.03.2020, designadamente e no essencial:

1) Que, a 14.12.2017, a ANACOM aprovou o Regulamento n.º 6/2018, de 5 de janeiro, relativo aos deveres de comunicação e ao registo das empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas;

2) Que, desde a entrada em vigor daquele Regulamento, a ANACOM tem vindo a desenvolver um processo de atualização de todo o registo das empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas, incluindo:

a) O fecho dos procedimentos relativos às comunicações de início de atividade já apresentadas e pendentes quer do suprimento de deficiências ou da prestação de informação, quer do devido enquadramento de natureza técnica e jurídica quanto à atividade comunicada; e

b) Sempre que adequado, a inscrição oficiosa das empresas que se constate oferecerem redes ou serviços de comunicações eletrónicas sem qualquer comunicação prévia à ANACOM; e

3) Que, sem prejuízo do exercício dos seus poderes de supervisão, fiscalização e, quando seja o caso, sancionatórios, a ANACOM aprovou, a 17.10.2019, o início de procedimento de elaboração de um regulamento relativo às condições aplicáveis à subatribuição de recursos E.164 do plano nacional de numeração.

Neste contexto e tendo agora presente a concretização apresentada no vosso pedido recebido a 07.04.2020, nomeadamente em relação a “que medidas concretas foram adotadas pela ANACOM relativamente aos Operadores identificados nesse Requerimento” e a “que medidas foram adotadas quanto a esses Operadores no âmbito do poder de fiscalização e sancionatório dessa Autoridade”, informamos o seguinte:

1) No que respeita a medidas concretas adotadas em eventuais procedimentos de inscrição no registo das empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas que se encontrem em curso:

a) A V............, S.A., ao contrário do que parece vir sustentar, não goza do direito de acesso previsto nos artigos 82.º a 85.º do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que não é diretamente interessada nos mesmos (nos termos previstos no artigo 82.º), não tendo também sequer alegado, e provado, qualquer interesse legítimo no seu conhecimento (tal como exigido pelo artigo 85.º);

b) Neste pressuposto e no que respeita ao regime geral de acesso à informação administrativa constante da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto, na sua atual redação (LADA), estes procedimentos encontram-se cobertos por segredo comercial, não tendo a V............, S.A., atendendo ao disposto no n.º 6 do respetivo artigo 6.º, apresentado uma autorização escrita das empresas em causa ou demonstrado, fundamentadamente, ser titular de um interesse direto, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido preponderante;

c) Nesse sentido, note-se que a apresentação de uma comunicação prévia de início de atividade, a data prevista que é indicada para o efeito e os elementos transmitidos quanto à descrição sucinta das ofertas, incluindo eventuais esclarecimentos e documentos solicitados, permitem revelar, no seu conjunto, a estratégia e o plano comercial e técnico da empresa e, como tal, constituem informação secreta e com valor comercial, que apenas foi transmitida à ANACOM em cumprimento de uma obrigação legal, para os fins que a lei prevê e na certeza de que a mesma beneficia das restrições de acesso previstas na LADA – ou seja, constitui informação de natureza sensível, por permitir revelar segredos de negócio legalmente tutelados;

d) Neste contexto, não pode o exercício do direito de acesso à informação administrativa constituir um meio através do qual um terceiro, sem autorização ou interesse demonstrado, aproveitando-se do cumprimento, por parte da empresa a que respeita a informação protegida, de uma obrigação legalmente prevista – no caso, o dever de comunicar previamente à ANACOM o início da sua atividade –, obter, por essa via, acesso a essa informação e, assim, distorcer as regras do mercado, tomando conhecimento da intenção de início de atividade, da data prevista que foi indicada pela empresa para o efeito e das características das ofertas; e

e) Esta restrição geral, acrescente-se, deve prolongar-se até ao termo do caráter secreto da informação em causa, o qual, sem prejuízo de outras circunstâncias que o possam eventualmente eliminar, coincidirá com a divulgação da inscrição da empresa no registo, através do sítio da ANACOM na Internet, sem prejuízo de, mesmo a partir desse momento, ser necessário efetuar a devida ponderação da aplicação de restrições de acesso a cada um dos documentos que os integrem; e

2) No que respeita a diligências de fiscalização nesta matéria e para além da informação a que a V............, S.A. já teve acesso, foi decisão do Presidente do Conselho de Administração da ANACOM, de 22.04.2020 [NDR: Ao abrigo do disposto no artigo 5.º, no n.º 6 e na alínea a) do n.º 7 do artigo 6.º e no artigo 15.º da LADA, e nos termos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 26.º e no n.º 3 do artigo 29.º, ambos dos Estatutos da ANACOM, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 39/2015, de 16 de março], ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 7 do artigo 6.º da LADA, interditar o acesso a quaisquer documentos entretanto produzidos neste âmbito, na medida em que a sua divulgação permitiria revelar o plano e a estratégia de fiscalização adotados por esta Autoridade e, por isso, prejudicar a sua eficácia.

Esta interdição apenas se manterá pelo tempo estritamente necessário à salvaguarda da invocada eficácia.

Mais informamos que, atendendo ao disposto no n.º 7 do artigo 6.º da LADA, não é possível, neste momento, assegurar uma comunicação parcial:

a) Quer em relação a eventuais procedimentos de inscrição em curso, na medida em que a sua própria existência se encontra coberta pelo segredo comercial, o que obvia à comunicação de todos os documentos que os integram;

b) Quer em relação às referidas diligências de fiscalização, pelo mesmo fundamento que determinou a interdição de acesso.

Mais salientamos que o facto de a V............, S.A. ter apresentado as comunicações recebidas a 07.04.2016 e a 07.01.2020 não altera as informações acima transmitidas:

a) Por um lado, na medida em que da simples apresentação de uma denúncia não resulta a aquisição da qualidade de interessado, nem tão pouco a demonstração de qualquer interesse legítimo; e

b) Por outro lado, por não afetar a fundamentação acima sustentada quer para o segredo comercial de eventuais procedimentos de inscrição em curso, quer para a interdição de acesso às referidas diligências de fiscalização.

Em cumprimento do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 15.º da LADA, informamos ainda que, no que respeita ao regime geral de acesso à informação administrativa, pode a V............, S.A. queixar-se à Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, nos termos previstos no artigo 16.º do mesmo diploma, ou requerer uma intimação judicial.

Por último, solicitamos que nos confirmem se mantêm o vosso pedido de realização de reunião apresentado na comunicação recebida a 07.01.2020, salientando-se que, sem prejuízo da nossa inteira disponibilidade para o efeito, nunca poderemos, nesse âmbito, transmitir qualquer informação que, conforme acima se fundamenta, se mantenha sujeita a uma restrição ou interdição de acesso.” (cf. copia da mensagem electrónica junta a fls. 84-88 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

A prova dos factos fixados supra assenta no teor dos documentos juntos aos autos, conforme referido a respeito de cada facto.

Nada mais foi provado com interesse para a decisão da causa.”.

DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, não impugnada, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional e da questão suscitada pela Recorrida, segundo a sua ordem lógica de conhecimento.

Da questão invocada pela Recorrida:

1. Nulidade processual, traduzida na apresentação de uma resposta que não é processualmente admissível, importando o seu desentranhamento e restituição à Recorrente e a sua condenação em multa, pelo incidente anómalo

Na sequência da apresentação das contra-alegações ao recurso jurisdicional interposto, veio a Recorrente pronunciar-se sobre a matéria nela alegada, relativa à invocação de questões novas, o que motivou a apresentação de um articulado de pronúncia pela Recorrida, invocando a inadmissibilidade legal da pronúncia apresentada pela Recorrente, importando a incorrência de uma nulidade processual, pedindo a rejeição e desentranhamento da pronúncia apresentada pela Recorrente e a sua respetiva condenação em multa.

Tal posição assumida pela Recorrida motivou ainda a apresentação de um segundo articulado de resposta por parte da ora Recorrente.

Vejamos.

A matéria invocada pela Recorrida nas contra-alegações a respeito de ser invocado como fundamento do recurso uma questão nova, insere-se no direito processual que lhe assiste de contra-alegar o recurso jurisdicional interposto na sentença recorrida, nos termos e com os fundamentos que lhe aprouver.

A lei processual civil, assim como a lei processual administrativa, não prevêem o direito de apresentação de um articulado de resposta às contra-alegações de recurso.

No entanto, atenta a concreta e específica matéria, estando em causa a alegação nas contra-alegações de uma alegada causa para o não conhecimento pelo Tribunal ad quem de um dos fundamentos do recurso, sendo configurado o objeto da sentença recorrida e do fundamento do recurso em termos que não são lineares, nem o fundamento do recurso se poder extrair dos exatos termos conhecidos na sentença recorrida, é de configurar como legítimo o exercício do direito de pronúncia da ora Recorrente.

A Recorrida não deixou de suscitar nas contra-alegações do recurso matéria que pode ser configurada como impeditiva do conhecimento do objeto do recurso, visto ter invocado que o fundamento do recurso acerca da aplicação do disposto no artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA ao pedido de prestação de informações, constituir uma questão nova, como tal, subtraída do conhecimento do tribunal de recurso.

Nesse sentido, ao abrigo dos poderes de gestão processual e de adequação formal, previstos nos artigos 7.º-A do CPTA e 547.º do CPC, será de admitir tal exercício de pronúncia por parte da Recorrente.

O que acarreta que não assista razão à Recorrida ao invocar a prática de um ato processual inadmissível por parte da Recorrente e a consequente nulidade processual.

Nestes termos, será de indeferir o requerido pela Recorrida quanto à inadmissibilidade da apresentação da pronúncia da Recorrente e o seu consequente desentranhamento, com a cominação no pagamento de multa.

Dos fundamentos do recurso:

2. Erro de julgamento de direito, quanto à aplicação do regime do CPA e da LADA ao processo de contraordenação

Vem a Recorrente interpor recurso da sentença recorrida, que a intimou a prestar as informações requeridas pela Recorrida, no prazo de 10 dias, relativas ao requerimento por aquela apresentado em 07/01/2020 e aos demais requerimentos que aí se enunciam, identificando os atos e diligências por si praticados nesse seguimento e, especificamente, quais as medidas concretas, se algumas, por si adotadas relativamente aos operadores aí assinalados, designadamente, no âmbito dos seus poderes de fiscalização e sancionatório.

Sustenta que o pedido de acesso ao procedimento de contraordenação não se rege pelo CPA, nem pela LADA, mas antes pelo regime que regule o processo contraordenacional e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Penal.

Por isso, o pedido de acesso a processos de tal natureza não se enquadra no direito de informação não procedimental, por não visar o acesso a documento administrativo, mas a documentos ou informações que não são administrativos, sendo inaplicáveis, quer as normas do CPA, quer o regime da LADA.

Vejamos.

Como decorre do teor da sentença recorrida, o Tribunal a quo não negou tal entendimento sufragado pela ora Recorrente, antes o afirma e defende.

De entre o mais aduzido na sentença recorrida, afirma-se na sua fundamentação:

É certo que os tribunais superiores vêm entendendo, de forma mais ou menos pacificada, que os tribunais administrativos são materialmente incompetentes “para conhecer do pedido de intimação de uma autoridade administrativa a satisfazer o pedido de informações formulado por um arguido no âmbito de um processo contra- ordenacional, por o direito à informação que se pretende ver tutelado se encontrar regulado e assegurado, nomeadamente pelos artº 86º e 89º do Cód. Processo Penal, na redacção introduzida pela Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto, aplicável subsidiariamente ao processo de contra-ordenação, por força do artº 41º nº 1 do DL 433/82, de 27/10” (neste sentido, vide, assim, o aresto prolatado pelo Supremo Tribunal Administrativo, em 01.10.2008, no âmbito do processo n.º 0584/08, a que a Requerida alude na resposta apresentada nos presentes autos de intimação para prestação de informações).”.

Por isso, não existe qualquer oposição entre o alegado pela Recorrente e o decidido a este respeito, por nos termos legais definidos e decididos na jurisprudência administrativa, os processos contraordenacionais estarem subtraídos da aplicação das normas do CPA e da LADA, no respeitante à tutela do direito à informação administrativa.

O que se verifica é antes uma total divergência da ora Recorrente em relação à configuração dada ao presente litígio pelo Tribunal a quo.

Decidiu-se na sentença recorrida: “(…) não está aqui em causa um qualquer processo contra-ordenacional que vise a Requerente, não se afigurando, por isso, o entendimento acabado de assinalar aplicável tout court à situação sub judice; por outro, e atendendo ao concreto pedido que é formulado pela Requerente, consistente na “emissão de informação com a identificação dos atos e diligências praticados na sequência do requerimento da ora Requerente, de 07.01.2020, e dos demais requerimentos identificados no n.º 7 do presente requerimento, bem como sobre as decisões que tenham sido adotadas no seguimento daquele requerimento de 07.01.2020 e dos demais requerimentos identificados no n.º 7 do presente requerimento” ou, mais concretamente, na emissão de “informação sobre o que foi feito pela ANACOM com o Requerimento da ora Requerente, de 07.01.2020, nomeadamente que medidas concretas foram adotadas pela ANACOM relativamente aos Operadores identificados nesse Requerimento e que medidas foram adotadas quanto a esses Operadores no âmbito do poder de fiscalização e sancionatório dessa Autoridade” (cf. factos 2. e 4. firmados supra), daí não é possível extrair, como aparenta ser aventado pela Requerida, que a parte se arrogue à disponibilização de “elementos constantes do processo de contra-ordenação” (cuja existência é, de resto, absolutamente incerta), mas apenas a uma informação que, no limite, passará pela indicação de que houve lugar à instauração de processo contra-ordenacional e, eventualmente, o seu desfecho.”.

Este julgamento encontra-se correto, devendo considerar-se ser manifesta a falta de razão que assiste à Recorrente quanto ao fundamento do recurso.

É sabido que a configuração do litígio depende do que haja sido alegado e peticionado pelo autor/requerente, ou seja, em função da causa de pedir e do pedido, sendo nesses termos que é aferida a natureza da relação jurídica substantiva litigiosa, determinante para a delimitação das regras de direito aplicáveis.

Analisando a estruturação da alegação da ora Recorrida no requerimento de intimação, dele decorre constituir a pretensão requerida a intimação da ora Recorrente a prestar as informações solicitadas no requerimento da Requerente, ora Recorrida, datado de 19/03/2020, nomeadamente, os concretos atos e diligências praticados na sequência do requerimento da ora Requerente, de 07/01/2020, e as decisões que tenham sido adotadas no

seguimento desse requerimento.

As informações requeridas não respeitam ao teor ou conteúdo de qualquer processo contraordenacional, antes traduzindo o exercício do direito à informação não procedimental da ora Recorrida, na sequência dos requerimentos anteriormente apresentados perante uma entidade administrativa, como se constitui a ora Recorrente.

Defender ou alegar coisa diferente, traduz-se numa alegação nos limites da boa fé processual, por se traduzir numa alegação cuja falta de fundamento a ora Recorrente não pode ignorar, segundo o disposto na alínea a), do n.º 2 do artigo 542.º do CPC.

Perante os requerimentos antes apresentados, a ora Recorrida quer ser informada das diligências que foram adotadas pela ora Recorrente, a qual as deve prestar, informando quais os atos ou procedimentos desencadeados ou, no caso de nada ter feito, prestando a respetiva informação negativa.

Por conseguinte, falece em absoluto a alegação recursiva da Recorrente quanto ao fundamento do recurso, o qual é, em consequência, de julgar não provado, por o pedido de informação respeitante à presente intimação não incidir sobre processo contraordenacional.

3. Erro de julgamento de direito, por a informação não poder ser prestada, por versar sobre a atividade fiscalizadora da Recorrente, nos termos do artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA

No demais, vem a Recorrente alegar que, ainda que por absurdo se considerassem aplicáveis as normas do CPA e da LADA, não se aplicando as normas do RGCO, as informações requeridas não poderiam ser prestadas, por versarem sobre a atividade fiscalizadora da Recorrente.

Alega que a sentença não ponderou a necessidade de garantir as condições de eficácia da investigação e de preservação de possíveis meios de prova, a que se refere o artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA, em que se fundou também a recusa da Recorrente, não podendo revelar-se o conteúdo das ações de fiscalização, realizadas ou programadas e as suas metodologias.

Além de, segundo a Recorrente, além dos interesses da investigação, também os interesses da proteção dos arguidos são fundamentos bastantes para recusar o acesso à informação ou para não consentir na divulgação da informação.

Vejamos.

Compulsando o julgamento da matéria de facto, o qual não se encontra impugnado no presente recurso, decorre que apenas após a apresentação do requerimento inicial, em 22/04/2020, de instauração dos presentes autos de intimação judicial para a prestação de informações, depois de não ter existido a prestação das informações solicitadas, veio a Entidade Requerida, ora Recorrente, remeter uma mensagem de correio eletrónico à ora Recorrida, invocando, de entre o demais, a restrição no direito de acesso às informações requeridas com base na norma do artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA, nos termos em que constam do ponto 6 da matéria de facto assente.

Por conseguinte, a alegação do presente fundamento do recurso foi expressamente invocada na fase administrativa pela Entidade Requerida perante a Requerente, embora já depois de a presente instância ter sido constituída.

No entanto, decorre que tal questão não foi expressamente objeto de análise por parte da sentença recorrida.

Porém, analisando o articulado de resposta da Entidade Requerida, por ser ela quem deveria alegar a questão em causa, considerando estar em causa a invocação de uma causa para a restrição do direito de acesso, o que resulta é que, para além do que resulta do teor do artigo 34.º da resposta, referente à alegação do que a ora Recorrida já fora informada por remissão para o teor do documento que consta do ponto 6 do julgamento da matéria de facto, a Entidade Requerida não invoca expressamente tal matéria em juízo.

Na resposta apresentada, a Entidade Requerida, ora Recorrente, limitou-se a alegar no seu artigo 34.º o teor do documento que consta do ponto 6 do julgamento da matéria de facto, mas sem proceder a qualquer alegação autónoma, ou seja, sem invocar considerar aplicável a restrição ao direito de acesso que consta do artigo 6.º, n.º 7, a), da LADA.

O que significa que na resposta apresentada, a Entidade Requerida se limitou a reiterar o teor do documento que ora se dá como provado no ponto 6 da matéria de facto assente, sem mais.

Tal justifica que não tenha existido uma pronúncia expressa sobre tal questão na sentença sob recurso, por a mesma não ter sido colocada.

Esta também a razão porque a ora Recorrida vem alegar nas contra-alegações de recurso que tal fundamento do recurso constitui uma questão nova, que não foi anteriormente alegada nos articulados, nem decidida na sentença recorrida.

Sem prejuízo, ao contrário do defendido pela Recorrida, não está este tribunal de recurso impedido de conhecer de tal questão, não apenas porque foi expressamente invocada como fundamento do presente recurso, integrando o objeto do recurso, como, sobretudo, por se traduzir no conhecimento oficioso da questão de direito, nos termos do disposto no artigo 5.º, n.º 3 do CPC, aplicável subsidiariamente à presente instância administrativa, por força do artigo 1.º do CPTA.

O juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, importando, por isso, que na presente instância se conheça da questão da aplicação do disposto do artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA ao litígio em presença.

Neste sentido, é de recusar que o fundamento do recurso constitua uma questão nova, como tal subtraída do conhecimento deste tribunal de recurso.

Aqui chegados, importa o enquadramento normativo do direito de acesso à informação administrativa, assim como as suas restrições.

O direito à informação enquanto direito fundamental, com consagração constitucional nos n.ºs 1 e 2, do artigo 268.º da Constituição, garante o direito e a garantia dos administrados de serem informados pela Administração, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos processos em que sejam diretamente interessados, bem como o de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas, o que constitui a vertente procedimental do direito à informação, além de no seu n.º 2 se consagrar o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas, correspondendo à vertente não procedimental do direito à informação.

O direito à informação, procedimental e não procedimental, encontra-se concretizado no Código do Procedimento Administrativo (CPA), comportando três direitos distintos: o direito à prestação de informações (artigo 82.º), o direito à consulta de processo e o direito à passagem de certidões (artigo 83.º).

O direito à informação não procedimental abrange o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos.

Por isso, nos termos do n.º 2 do artigo 268.º da Constituição, os cidadãos têm o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, só podendo haver restrições a esse direito de acesso quando, fundamentadamente, tal se mostrar obstaculizado pela aplicação da lei em matérias relativas, designadamente, à segurança interna e externa, à intimidade das pessoas e aos segredos comerciais e industriais.

Sobre o disposto em tal preceito constitucional, remete-se para o Acórdão do TCAS n.º 4841/09, de 17/09/2009, que reproduz a doutrina, “(…) A utilização neste nº 2 do advérbio “também” denota a consciência de um nexo conjuntivo entre os direitos à informação procedimental e ao acesso aos arquivos e registos administrativos: são, na verdade, duas diferentes concretizações de um mesmo princípio geral de publicidade ou transparência da administração. Mas se ambos se conjugam em torno do propósito de banir o “segredo administrativo”, algo os diferencia: ao passo que o primeiro direito se concebe no quadro subjetivo e cronológico de um procedimento administrativo concreto, o segundo existirá independentemente de estar em curso qualquer procedimento administrativo.”.

Estes dois planos do direito à informação, procedimental e não procedimental, foram respeitados aquando da sua incorporação no CPA, na regulação do direito de acesso à informação contida em processos e procedimentos em curso, assim como o direito à informação que assiste a todos os cidadãos, de acordo com o sistema de arquivo aberto ou open file, isto é, independentemente de serem ou estarem interessados no procedimento administrativo em causa.

O artigo 17.º, juntamente com o artigo 85.º, ambos do CPA, consagram o princípio da Administração aberta, facultando a qualquer pessoa o acesso aos arquivos e registos administrativos, mesmo que não se encontre em curso qualquer procedimento que lhes diga diretamente respeito, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas.

Segundo o citado artigo 17.º do CPA:

1. Todas as pessoas têm o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, mesmo quando nenhum procedimento que lhes diga diretamente respeito esteja em curso, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal, ao sigilo fiscal e à privacidade das pessoas.

2. O acesso aos arquivos e registos administrativos é regulado por lei.”.

Essa lei é a Lei nº 26/2016, de 22/08, que aprova o regime de acesso à informação administrativa e ambiental e a reutilização dos documentos administrativos, transpondo a Diretiva 2003/4/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de janeiro, e a Diretiva 2003/98/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de novembro.

Em face do recorte que é conferido pela Constituição, assim como resultante do CPA, a que acresce a configuração que lhe é dada pelo CPTA, ao prever um meio processual próprio para tutelar o direito à informação, que segue termos sob o processo de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, previsto e regulado no artigo 104.º e segs. do CPTA, é seguro que o direito à informação se apresenta e é perspetivado na ordem jurídica como um verdadeiro direito subjetivo, constitucional e legalmente garantido (nºs. 1 e 2 do artigo 268.º da Constituição, artigos 82.º a 85º do CPA e Lei de Acesso aos Documentos Administrativos, aprovada pela Lei n.º 26/2016, de 22/08), podendo ser feito valer em juízo, quer como meio processual autónomo, quer com uma função instrumental, destinado a obter elementos à utilização de outro meio administrativo ou processual.

Além disso, não obstante a Constituição e a LADA, no seu artigo 5.º, consagrarem o direito de acesso, nos termos do qual, “sem necessidade de enunciar qualquer interesse, têm direito de acesso aos documentos administrativos, o qual compreende os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a sua existência e conteúdo”, esse direito sofre as restrições previstas no artigo 6.º da LADA.

Resulta do citado artigo 5.º da LADA, que ao contrário do que sucede no domínio da informação procedimental, prevista nos artigos 82º a 85º do CPA, não é necessária a verificação de qualquer requisito subjetivo de titularidade e legitimidade, por o direito de acesso pertencer a todos os cidadãos, independentemente de serem interessados num procedimento administrativo, não havendo necessidade de enunciar qualquer interesse.

Assim, não existem dúvidas quanto à titularidade de um direito de acesso à informação não procedimental da Requerente, à luz da Constituição, do CPA e da LADA.

No entanto, não sendo tal direito absoluto e incondicionado, o artigo 6.º da LADA, consagra restrições ao direito de acesso.

Porém, como decidido no Acórdão do TCAS, de 07/11/2019, no Processo n.º 729/19.0BELSB, cabia à Administração, ora Recorrente, concretizar no plano do facto e no plano do direito a existência de qualquer obstáculo ou restrição ao direito de acesso à informação, o que no presente caso apenas logra acontecer no plano do direito.

Revertendo o exposto para o presente caso, importa considerar que a Entidade Requerida não invocou na sua resposta o que quer que seja sobre a aplicação da restrição do direito ao acesso à informação prevista no disposto do artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA ao litígio em presença, exigindo que se considere o que decorre do teor da comunicação enviada à Requerente, ora Recorrida, nos termos dados como provados no citado ponto 6 do julgamento da matéria de facto.

Nos termos desse documento, constante do ponto 6 da fundamentação de facto da sentença recorrida, entende a Entidade Requerida, ora Recorrente, o que se ora se transcreve:

2) No que respeita a diligências de fiscalização nesta matéria e para além da informação a que a V............, S.A. já teve acesso, foi decisão do Presidente do Conselho de Administração da ANACOM, de 22.04.2020 [NDR: Ao abrigo do disposto no artigo 5.º, no n.º 6 e na alínea a) do n.º 7 do artigo 6.º e no artigo 15.º da LADA, e nos termos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 26.º e no n.º 3 do artigo 29.º, ambos dos Estatutos da ANACOM, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 39/2015, de 16 de março], ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 7 do artigo 6.º da LADA, interditar o acesso a quaisquer documentos entretanto produzidos neste âmbito, na medida em que a sua divulgação permitiria revelar o plano e a estratégia de fiscalização adotados por esta Autoridade e, por isso, prejudicar a sua eficácia.

Esta interdição apenas se manterá pelo tempo estritamente necessário à salvaguarda da invocada eficácia.

Mais informamos que, atendendo ao disposto no n.º 7 do artigo 6.º da LADA, não é possível, neste momento, assegurar uma comunicação parcial:

a) Quer em relação a eventuais procedimentos de inscrição em curso, na medida em que a sua própria existência se encontra coberta pelo segredo comercial, o que obvia à comunicação de todos os documentos que os integram;

b) Quer em relação às referidas diligências de fiscalização, pelo mesmo fundamento que determinou a interdição de acesso.”.

O que significa que a própria Entidade Requerida, ora Recorrente, não integrou toda a matéria objeto do pedido de prestação de informações no disposto no artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA, apenas tendo integrado no citado fundamento da restrição do direito ao acesso à informação a específica matéria das informações referentes às diligências de fiscalização.

A Entidade Requerida excluiu expressamente dessa restrição prevista no artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA, as informações respeitantes a medidas concretas adotadas em eventuais procedimentos de inscrição no registo das empresas que ofereçam redes e serviços de comunicações eletrónicas em curso.

Tal é o que resulta com clareza do confronto do teor dos pontos 1 e 2 da citada comunicação da Entidade Requerida, referindo-se exclusivamente o ponto 2 à matéria das informações referentes às diligências de fiscalização.

O que permite, de imediato, afirmar que em relação à matéria a que se refere o ponto 1 da comunicação remetida à Requerente, respeitante aos eventuais procedimentos de inscrição no registo das empresas, segundo a própria Entidade Requerida, não se coloca a questão da aplicação da restrição do direito de acesso, prevista no artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA.

Tal acarreta que se imponha à Entidade Requerida prestar as informações relativas à matéria a que respeita o ponto 1 da comunicação enviada à Requerente, pois como defendido pela Entidade Requerida, não estando submetida à restrição do direito de acesso à informação prevista no artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA, também não se mostra impugnada a sentença recorrida na parte em decide não vigorar a restrição do direito de acesso à informação, prevista no artigo 6.º, n.º 6 da LADA, referente aos alegados segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna de uma empresa.

Remetendo para a fundamentação de direito da sentença recorrida:

Contra este entendimento não se argua, como chega a ser referido pela Requerida, que estaria aqui em causa informação sujeita a segredo comercial: conforme se fez já menção, dos termos em que o pedido de informação sub judice foi formulado, resulta que a Requerente se arroga única e exclusivamente a informação atinente à vida interna da Requerida, concretamente, no que tange à “identificação dos atos e diligências praticados na sequência do requerimento da ora Requerente, de 07.01.2020, e dos demais requerimentos identificados no n.º 7 do presente requerimento, bem como sobre as decisões que tenham sido adotadas no seguimento daquele requerimento de 07.01.2020 e dos demais requerimentos identificados no n.º 7 do presente requerimento” ou, mais concretamente, ao “que foi feito pela ANACOM com o Requerimento da ora Requerente, de 07.01.2020, nomeadamente que medidas concretas foram adotadas pela ANACOM relativamente aos Operadores identificados nesse Requerimento e que medidas foram adotadas quanto a esses Operadores no âmbito do poder de fiscalização e sancionatório dessa Autoridade”, a qual, por natureza, não pode encerrar qualquer segredo relativo aos operadores em questão.”.

A decisão quanto a esta questão, relativa à aplicação da restrição de acesso à informação prevista no artigo 6.º, n.º 6 da LADA, tendo sido expressamente conhecida na sentença sob recurso, não se mostra impugnada no presente recurso, quer nos termos da alegação recursiva da Recorrente, quer segundo o teor das conclusões alegadas, pelo que, tem de se manter.

O que acarreta que se imponha à ora Recorrente prestar as informações requeridas a respeito dos eventuais procedimentos de inscrição em curso, por os mesmos não respeitarem a matéria de fiscalização e sancionatória.

Acresce que, perante a supra expendida delimitação do objeto do pedido de prestação de informações da Requerente, nos termos efetuados na comunicação da Entidade Requerida, se deva atender ao que estabelece a citada norma do artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA em matéria de restrições do direito de acesso, por a mesma ser colocada como fundamento do presente recurso.

Estabelece tal disposição legal:

7 - Sem prejuízo das demais restrições legalmente previstas, os documentos administrativos ficam sujeitos a interdição de acesso ou a acesso sob autorização, durante o tempo estritamente necessário à salvaguarda de outros interesses juridicamente relevantes, mediante decisão do órgão ou entidade competente, sempre que contenham informações cujo conhecimento seja suscetível de:

a) Afetar a eficácia da fiscalização ou supervisão, incluindo os planos, metodologias e estratégias de supervisão ou de fiscalização;”.

Também neste caso não assiste razão à Recorrente, pelas seguintes razões.

A matéria sobre que incide o pedido de informação não procedimental não respeita a qualquer processo de contraordenação, o qual, de resto, se desconhece se foi ou não instaurado.

Nem é de associar, de imediato, a atividade de fiscalização à instauração de um processo de contraordenação, tendo aquela atividade um conteúdo ou expressão muito mais ampla, podendo traduzir-se em múltiplas atuações administrativas.

Nesse sentido, pode a Entidade Requerida pautar a sua atuação fiscalizadora pela adoção de atos que vão muito para além da instauração do processo de contraordenação.

Motivo porque também por esta razão se entende que não se encontra suficientemente caracterizada de facto a atuação de fiscalização da Entidade Requerida, seja na fase administrativa, seja nos termos em que veio a juízo, de modo a pode subsumir a sua eventual atuação ao disposto na norma invocada do artigo 6.º, n.º 7, a), da LADA.

Recai sobre a Entidade Requerida o ónus de esclarecer a sua atuação de facto, o que não foi feito, seja na fase administrativa, seja no âmbito da presente instância judicial.

Além de que a Entidade Requerida apenas veio invocar tal disposição legal depois de a presente intimação ter sido instaurada em juízo, não se socorrendo dessa alegação para antes justificar a sua recusa na prestação das informações requeridas.

Impunha-se que a Entidade Requerida, ora Recorrente, tivesse concretizado de facto, a sua atuação, como consequência dos vários requerimentos apresentados pela Requerente, ora Recorrida, tendo-se limitando a informar o exercício das iniciativas adotadas no exercício das suas legais competências, sem as mesmas respeitarem específica ou diretamente à matéria invocada e requerida pela Requerente, como se comprova pelo teor do documento que consta do ponto 3 do julgamento da matéria de facto.

A matéria sobre que incide o pedido de informações apresentado pela Requerente não respeita direta ou forçosamente sobre matéria contraordenacional, nem se mostra suficientemente caracterizada a situação no âmbito dos poderes de fiscalização da Entidade Requerida, de forma a subsumir o caso em juízo à restrição do direito de acesso previsto no artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA.

Acresce que não está exclusivamente em causa a prestação de informação relativa ao exercício dos poderes de fiscalização da Entidade Requerida, de resto, não invocada pela Entidade Requerida para recusar o acesso à informação antes da presente intimação ser instaurada.

Pelo que, nestes termos e sob a fundamentação antecede, será de negar provimento ao fundamento do recurso, por não provado.

4. Incompetência material do tribunal, por ser da competência do tribunal da concorrência, regulação e supervisão conhecer das medidas em processo de contraordenação

No demais, vem ainda a Recorrente invocar a incompetência material do tribunal, por ser da competência do tribunal da concorrência, regulação e supervisão conhecer das medidas em processo de contraordenação.

Invoca que as decisões que decretem ou indefiram a sujeição a segredo ou impeçam o acesso ao processo com fundamento no segredo, são suscetíveis de recurso de impugnação para o tribunal referido no artigo 55, n.º 1 e 3 do RGCO, cabendo ao tribunal da concorrência, regulação e supervisão conhecer das medidas em processo de contraordenação, segundo o artigo 112.º, nº 1 da Lei n.º 62/2013, de 26/08, conhecer das questões relativas a demais medidas em processo de contraordenação.

Além de entender que segundo o artigo 104.º do CPTA o presente meio processual apenas se adequa aos pedidos formulados no exercício do direito à informação administrativa, sendo os tribunais administrativos incompetentes para conhecer do pedido de intimação de uma autoridade administrativa no âmbito de um processo contraordenacional.

Mais uma vez sem qualquer razão.

Tal como antes se decidiu, a presente instância de intimação para prestação de informações, instaurada nos termos do disposto no artigo 104.º e segs. no CPTA não incide sobre qualquer processo de contraordenação, como aliás, decorre do teor do requerimento de intimação apresentado pela Requerente e, antes disso, do teor dos vários requerimentos apresentados pela Requerente junto da autoridade requerida, sendo nestes termos que é balizada a pretensão da interessada, ora Recorrida.

Não se coloca nos presentes autos qualquer litígio relativo ao acesso de informação respeitante a qualquer processo de contraordenação, pelo que, é desprovida de razão a alegação da Recorrente.

Além de que, como decidido na sentença recorrida, podendo a Requerente “lançar mão da prerrogativa de consulta dos autos e obtenção de certidões prevista no artigo 90.º do CPP, aplicável ex vi artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27.10, à mesma terá necessariamente que assistir a possibilidade de requerer informações acerca da existência de tais processos, a qual, por isso, integra ainda o escopo da informação administrativa, nos termos e para os efeitos dos artigos 82.º e seguintes do CPA e artigos 104.º e seguintes do CPTA, mais se mostrando tal informação ainda subsumível à noção de “litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais” que, como é sabido, circunscreve o âmbito da presente jurisdição.”.

Nestes termos, será de negar provimento ao fundamento do recurso, sendo o mesmo julgado não provado.

5. Ilegitimidade passiva, por falta de indicação dos Contrainteressados

Por último, alega a Recorrente o erro de julgamento da sentença no tocante à decisão proferida a respeito da ilegitimidade passiva, por falta de indicação dos Contrainteressados.

Alega que o Tribunal a quo decidiu que a informação a prestar respeita à vida interna da Requerida e às suas condutas e não às de terceiros, não existindo contrainteressados, mas defende que ninguém que seja objeto de uma investigação vê com indiferença a divulgação desse facto e menos ainda, a divulgação dos resultados da mesma.

Vejamos.

Mais uma vez importa recentrar aquele que é o objeto da presente intimação, o que se mostra consecutivamente olvidado pela ora Recorrente.

A presente intimação visa obter a prestação de informações da Entidade Requerida, enquanto entidade administrativa, a respeito da atuação por si desenvolvida em reação ao solicitado pela Requerente nos vários requerimentos apresentados, em matéria diretamente respeitante ao exercício das suas legais competências de entidade reguladora em matéria de comunicações eletrónicas.

Está em causa um pedido de prestação de informações respeitante à atuação de uma entidade administrativa, não sendo requerida a prestação de qualquer informação respeitante à vida interna ou negócio de qualquer outra entidade.

Considerando a matéria que está em causa, relativa ao exercício do direito à informação não procedimental, não se reconhece a qualidade de contrainteressada a qualquer outra entidade.

De resto, limita-se a Recorrente a defender que os operadores de telecomunicações referidos pela Requerente nos seus requerimentos devem ser considerados contrainteressados, sem lograr proceder à explanação das respetivas razões de facto, sendo insuficiente a alegação de que a prestação da informação à Requerente sobre se tais operadores estão a ser investigados as pode prejudicar.

A alegação da Recorrida é, por isso, insuficiente para a caracterização de uma situação que permita identificar a existência de terceiros a quem a prestação da informação requerida possa causar danos graves e dificilmente reversíveis nos seus bens ou interesses patrimoniais.

Por isso, não se configura a existência de quaisquer contrainteressados no âmbito do presente processo de intimação para a passagem de certidões.

Pelo que, improcedem, por não provadas, as conclusões que se mostram formuladas quanto a tal fundamento do recurso, sendo de manter o decidido na sentença recorrida.


*

Pelo exposto, será de julgar improcedente, por não provado, o presente recurso, por não provados os seus respetivos fundamentos e, em consequência, em manter a sentença recorrida, que julgando procedente o pedido, intima a Entidade Requerida, ora Recorrente, a prestar a informação requerida em 10 dias.

*

Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. Não prevendo a lei a possibilidade de apresentação de um articulado de resposta às contra-alegações de recurso, nelas sendo invocado uma causa impeditiva do conhecimento do fundamento do recurso, como se configura ser a alegação da Recorrida de um dos fundamentos do recurso constituir uma questão nova que está subtraída do conhecimento do Tribunal ad quem, é de admitir tal pronúncia da Recorrente ao abrigo dos poderes de gestão processual e de adequação formal, previstos nos artigos 7.º-A do CPTA e 547.º do CPC.

II. Revelando o teor do requerimento de acesso à informação não procedimental, da Administração aberta ou do open file apresentado, que a informação pretendida se apresenta configurada no âmbito do exercício do direito à informação administrativa, por a Requerente ter vindo solicitar informação que está na disponibilidade da Entidade Requerida, encontra-se concretizado o direito de acesso à informação.

III. O acesso à informação relativa ao pedido de informações sobre a atuação da Entidade Requerida em matéria da Lei das Comunicações Eletrónicas, nos exatos termos requeridos pela Requerente, não respeita a processo contraordenacional, pelo que, além de serem aplicáveis as normas da Constituição, do CPA, da LADA e do CPTA, respeitantes ao exercício do direito fundamental à informação, não está subtraída a competência jurisdicional dos tribunais administrativos.

IV. Não tendo a Entidade Requerida, na resposta apresentada em juízo, invocado considerar aplicável a restrição ao direito de acesso que consta do artigo 6.º, n.º 7, a), da LADA, limitando-se a mencionar o teor do documento de resposta enviada à Requerente onde se mostra invocada essa matéria, mas sendo esse documento posterior à instauração da presente intimação, não existiu o conhecimento na sentença recorrida quanto a tal matéria.

V. A invocação como fundamento do presente recurso da aplicação ao pedido de prestação de informações apresentado pela Requerente do disposto no artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA, não constitui uma questão nova que esteja subtraída do conhecimento do Tribunal ad quem, não só por integrar o objeto do recurso, mas sobretudo, por estar em causa o conhecimento oficioso do direito pelo juiz, nos termos do artigo 5.º, n.º 3 do CPC, segundo o qual o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.

VI. Cabe à Entidade Requerida, concretizar no plano do facto e no plano do direito a existência de qualquer obstáculo ou restrição ao direito de acesso à informação, o que no presente caso apenas logra acontecer no plano do direito.

VII. Não se verificando o enquadramento do pedido de prestação de informações requerido, nem no artigo 6.º, n.º 6 da LADA, por tal questão ter sido negada na sentença recorrida e não ter sido objeto do presente recurso, nem no artigo 6.º, n.º 7, a) da LADA, por não estar em causa o acesso a informação de qualquer processo contraordenacional, sendo mais vasta a competência da Entidade Requerida em matéria de fiscalização e não proceder a Entidade Requerida à concretização factual da sua atuação, não se verificam tais fundamentos para a restrição do acesso à informação requerida.

VIII. Não se configura a existência de contrainteressados, por estar apenas em causa a prestação de informações referentes à atuação da Entidade Requerida, não se vislumbrando a afetação dos direitos dos terceiros, operadores de telecomunicações.


*

Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em:

1. admitir a pronúncia apresentada pela Recorrente em resposta às contra-alegações do recurso, indeferindo o requerimento da Recorrida, e

2. negar provimento ao recurso, por não provados os seus respetivos fundamentos, mantendo a decisão proferida, de intimação da Entidade Demandada, ora Recorrente, a prestar as informações requeridas em dez dias, nos termos da fundamentação antecedente.

Custas pela Recorrente.

Registe e Notifique.


(Ana Celeste Carvalho - Relatora)


(Pedro Marchão)


(Alda Nunes)