Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:664/19.1BEALM-S1
Secção:CA
Data do Acordão:01/30/2020
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:MEDIDA PROVISÓRIA, ARTIGO 103-B DO CPTA,
ADMISSÃO PROVISÓRIA AO PROCEDIMENTO PRÉ- CONTRATUAL,
PERICULUM IN MORA.
Sumário:I. O regime das medidas provisórias, previsto e regulado no artigo 103.º-B do CPTA foi introduzido na revisão da lei processual administrativa pelo D.L. n.º 214.º-G/2015, de 02/10, tendo uma finalidade instrumental e de natureza cautelar, daí produzir efeitos provisórios em relação à decisão que vier a ser proferida no âmbito do processo de contencioso pré-contratual, da qual é seu incidente.

II. Interpretando o artigo 103.º-B, n.º 1 em conformidade com a Diretiva recursos, a qual não exige o periculum in mora como requisito autónomo da adoção de medidas provisórias, deve entender-se que as situações aí previstas relativas ao risco de constituição de uma situação de facto consumado ou de já não ser possível retomar o procedimento pré-contratual para determinar quem deveria ser o adjudicatário, constituem danos relevantes na esfera do requerente, que, por essa razão, não podem deixar de ser considerados no âmbito do juízo de ponderação, a realizar nos termos do disposto no seu n.º 3.

III. Não faria sentido prever o recurso à tutelar cautelar, de natureza provisória, destinada a acautelar o risco dos prejuízos decorrentes da delonga própria do processo principal e da prolação de uma decisão que decida o litígio, se esse próprio risco da produção de prejuízos associados ao decurso do tempo não existir.

IV. Trata-se, no fundo, de exigir a verificação de uma característica típica de todos os processos judiciais sob o cunho da urgência e da provisoriedade, isto é, que se verifique uma situação de risco de, no momento em que a sentença de mérito vier a ser proferida existir uma situação de facto consumado.

V. Atendendo a que procedimento pré-contratual em causa não é de execução instantânea, antes de execução continuada e prolongada no tempo, por o fornecimento dos 10 navios não se fazer de uma única vez, antes de forma faseada no tempo e ao longo de cerca de cinco anos e que os serviços de manutenção global integrada deverão ser executados por mais cerca de quinze anos, mesmo que se admita que o desfecho do processo principal não chegará a tempo de evitar a entrega dos primeiros navios, no pior dos cenários ainda restará parte da execução do contrato.

VI. Considerando: (i) a relevância económica do procedimento pré-contratual em causa; (ii) a enorme complexidade técnica do objeto contratual, vertida no caderno de encargos e no seu Anexo I, referente às especificações técnicas e (iii) a centralidade do interesse público subjacente à satisfação da necessidade pública do transporte fluvial de passageiros, não se concebe que a entidade adjudicante abdique da essencialidade do procedimento que ela própria escolheu, como consiste a fase de negociação da proposta e a análise da versão final da proposta, ainda que de apenas uma proposta se trate no presente caso.

VII. Não se pode associar inelutavelmente a prática do ato de adjudicação ou a proximidade temporal da sua prática à existência de um risco de no momento em que a sentença de mérito vier a ser proferida, se ter constituído uma situação de facto consumado.

VIII. Nem se pode associar o eventual início da execução do contrato à impossibilidade de retomar o procedimento pré-contratual.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – RELATÓRIO

A.........., SA e A.........., S..........., devidamente identificadas nos autos, inconformadas, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, datada de 14/10/2019, que no âmbito do incidente de adoção de medida provisória, previsto no artigo 103.º-B do CPTA, deduzido na ação de contencioso pré-contratual instaurada contra a T.......... – T.........., SA e a Contrainteressada A…….., julgou improcedente o incidente deduzido, recusando a adoção da medida provisória requerida, de readmissão provisória das Autoras até à prolação de sentença que decida a impugnação do ato de exclusão do Agrupamento candidato n.º 3 ao Procedimento de Negociação n.º 03…/2019-D…/TT, para o Fornecimento com Manutenção Global Integrada de Dez Navios para a T.......... , acompanhada, se assim for entendido, de uma prorrogação do prazo para a apresentação das propostas.


*

Formulam as aqui Recorrentes, nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“1. Considerando a duração normal das ações de contencioso pré-contratual, a morosidade acrescida que a ação principal enfrenta por força das dificuldades de citação da contrainteressada na Austrália e o calendário de entrega dos navios previsto na cláusula 17ª do Caderno de Encargos, é evidente, que ao contrário do que sustenta a sentença recorrida, há elementos mais do que suficientes nos autos para concluir que, efetivamente, é mais do que certo que o contrato será executado materialmente na pendência da ação e, inclusivamente, de forma irreversível, impossibilitando a retoma do procedimento e gerando uma situação de facto consumado;

2. O argumento contido na sentença recorrida de que não existe risco de ser celebrado de imediato o contrato porque faltam tramitar as fases subsequentes do procedimento pré-contratual de negociação é destituído de sentido, porquanto relevante é o risco da produção de consequências lesivas durante a pendência da ação, que nunca durará menos de um ano, além de que a inexistência de outras propostas permitirá reduzir ao mínimo o tempo necessário até à celebração do contrato;

3. Ao afirmar que nada obsta a que o procedimento seja retomado com o convite a dirigir às requerentes para a apresentar proposta, porque a execução de eventual de decisão de procedência assim o determina, independentemente de ter sido já negociada a proposta da contrainteressada, a sentença recorrida coloca-se num plano puramente teórico e abstrai-se da realidade;

4. Desde logo, seria juridicamente duvidosa a solução de permitir a apresentação de proposta pelas requerentes depois de apresentada e conhecida a proposta da contrainteressadas e seus atributos;

5. Por outro lado, considerando a duração expectável da pendência da ação principal até ao trânsito em julgado e os prazos de entrega dos navios fixados no caderno de encargos é mais do que provável que no momento em que a sentença viesse a ser executada já o contrato estaria materialmente executado em medida definitiva e irreversível, com o fabrico e entrega de parte significativa dos navios a fornecer, gerando-se uma situação de impossibilidade absoluta, que consubstancia causa legítima de inexecução da sentença, nos termos do artigo 163.º, n.º 1 do CPTA;

6. Ainda que assim não fosse, o próprio texto da Resolução do Conselho de Ministros n.º 11/2019 citada na sentença recorrida, que descreve uma situação de urgência na substituição da frota de navios da entidade demandada, permite antecipar a invocação de causa legítima de inexecução com fundamento em excecional prejuízo para o interesse público;

7. Ao contrário do que decidiu a sentença recorrida, face aos elementos disponíveis nos autos, a medida provisória requerida é necessária para evitar que o agrupamento composto pelas Autoras fique definitivamente afastado da possibilidade de obter a adjudicação do contrato, já que no caso de ela ser recusada gerar-se-á uma situação de facto consumado – a execução material do contrato – que impossibilita a retoma do procedimento para que no mesmo possa ser novamente selecionado o adjudicatário;

8. Está, pois, preenchido o requisito do periculum in mora;

9. Ao assim não decidir, a sentença recorrida interpretou erradamente as peças do procedimento e violou o artigo 103.º-B, n.ºs 1 e 3 do CPTA, devendo, como tal, ser revogada;

10. Em consequência do erro de julgamento cometido na apreciação do periculum in mora, a sentença recorrida não chegou a proceder à ponderação de danos prevista no n.º 3 do artigo 103.º-B do CPTA, impondo-se a este Venerando Tribunal Central Administrativo Sul, ao abrigo dos poderes que lhe são conferidos pelo disposto no n.º 2 do artigo 149.º do CPTA, que proceda à referida ponderação;

11. O decretamento da medida provisória requerida tem apenas por efeito permitir ao agrupamento constituído pelas requerentes apresentar a sua proposta, não implicando qualquer paralisação do procedimento;

12. Da sua adoção não resulta, pois, qualquer dano muito menos para o interesse público, o qual só sai beneficiado, na medida em que se a medida for decretada haverá concorrência efetiva nas fases de apresentação e de negociação das propostas. Caso contrário a contrainteressada não terá qualquer incentivo para ser competitiva nos atributos da proposta e na respetiva negociação, podendo, designadamente, “encostar” o seu preço ao preço base;

13. A boa interpretação e aplicação do artigo 103.º-B, n.º 3 do CPTA determina, em face da realidade dos autos, o decretamento da medida provisória requerida.”.

Pedem que se conceda provimento ao recurso e revogada a sentença recorrida, decretando-se a medida provisória requerida.


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A ora Recorrida, T.......... , SA, notificada, apresentou contra-alegações, em que concluiu do seguinte modo:

“I. A adoção das medidas provisórias previstas no art.º 103.º-B, n.ºs 1 e 3, do CPTA, reclama a aplicação conjugada de dois critérios: o do periculum in mora e o da ponderação de interesses. Assim, conforme o preceituado no citado artigo, tais medidas serão tomadas quando (1) se se verificar uma situação de facto consumado ou a impossibilidade da retoma do procedimento pré-contratual para determinar quem nele seria escolhido como adjudicatário; e (2) se os danos que resultarem da adoção da medida não forem superiores aos que podem resultar da sua não adoção, sem que a lesão possa ser evitada e atenuada com a adoção de outras medidas. De fora fica, pois, o critério do fumus boni iuris.

II. Se não estamos perante uma situação de facto consumado ou uma impossibilidade de retoma do procedimento para determinar quem nele seria escolhido como adjudicatário, todos os prejuízos decorrentes são irrelevantes no contexto da verificação do periculum in mora.

III. Sabemos que há calendários apertados, impostos pelos fundos europeus, mas como bem refere o juiz a quo: “Estando em causa um procedimento de negociação, que integra as fases previstas no artigo 194.º, do Código dos Contratos Públicos - a) apresentação das candidaturas e qualificação dos candidatos; b) apresentação e análise das versões iniciais das propostas; c) negociação das propostas; d) análise das versões finais das propostas e adjudicação -, tendo o ato impugnado sido praticado na 1ª fase - o ato impugnado qualificou o Candidato n.º 1, e excluiu as restantes candidaturas, entre as quais a candidatura apresentada pelo agrupamento constituído pelas Autoras (candidato n.º 3) -, não podemos sequer concluir que existe o risco de se iniciar, de imediato, a execução do contrato.”.

IV. Se, de facto, ainda nos encontramos na primeira fase do procedimento de negociação (apresentação das candidaturas e qualificação dos candidatos), há ainda mais 3 fases, que inelutavelmente demorarão. Acrescente-se que não fazendo parte do procedimento de qualificação qualquer requisito de disponibilidade de calendário, os prazos poderão sofrer alterações, estando as partes perante um facto incerto.

V. Assim, ao momento do julgamento da presente medida provisória, o julgador não poderia ter tomado outra medida diferente dado que pelo decurso do tempo é ainda possível de executar a sentença e retomar o procedimento para adjudicar novamente o contrato.

VI. É atendendo ao tempo de desenvolvimento dos projetos, construção e entrega dos navios que o procedimento deve desenrolar-se. Esse tempo de desenvolvimento dos projetos deve ainda contemplar, na perspetiva do julgador, os atrasos próprios do procedimento de negociação, que vão muito além do ano e meio até ao trânsito em julgado invocado. Estamos a falar de 5 anos – e perante estas evidências, refuta-se completamente o que os recorrentes alegam.

VII. Caso esteja verificado o periculum in mora, por erro de julgamento, o que não se admite, podemos adiantar e concluir que, qualquer readmissão, pela denominada qualificação provisória que o autor assim denomina, e conforme alegado no pedido, não é inócua, uma vez que:

a. Vai implicar o atraso irremediável do procedimento contratual com perda dos fundos europeus pelo incumprimento do calendário constante da Resolução do Conselho de Ministros nº 11/2019, de 18 de Janeiro;

b. Vai implicar a realização de atos inúteis, contrariando o artigo 60º, nº 2 do CPA;

c. Põe em causa o princípio geral da concorrência, que será integralmente cumprido, quer seja um ou vários concorrentes.”.

Pede que o recurso seja julgado totalmente improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.


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O Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art.º 146.º do CPTA, não emitiu parecer.

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O processo vai, sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento, por se tratar de um processo urgente.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir a questão colocada pelas Recorrentes, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nele não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

A questão suscitada resume-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento no tocante ao requisito do periculum in mora.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos:

“A. Em 10 de janeiro de 2019, o Conselho de Ministros aprovou a Resolução n.º 11/2019, publicada no Diário da República, 1.ª série, n.º 13, de 18 de janeiro de 2019, da qual se extrai o seguinte:

«A promoção de um transporte público de qualidade, com prioridade às pessoas e com vista a reduzir o uso do transporte individual, é um vetor essencial do programa do XXI Governo Constitucional que se articula com a estratégia nacional de descarbonização das cadeias de mobilidade, para cumprimento dos compromissos de redução da pegada de carbono e de combate ao aquecimento global decorrentes do acordo de Paris.

Em particular no contexto dos principais aglomerados urbanos, com destaque para as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, onde os movimentos pendulares casa-trabalho-casa e casa-escola-casa assumem particular intensidade, a oferta de um transporte coletivo de qualidade e adequado à procura é um eixo fundamental, importando portanto manter padrões de serviço de excelência, quer em termos de fiabilidade e frequências, quer em termos de conforto e qualidade do serviço.

Adicionalmente, é sobejamente reconhecido o desinvestimento a que as empresas públicas foram sujeitas e que conduziu à degradação significativa dos ativos de exploração, em particular das suas frotas, com impactos significativos na fiabilidade das mesmas e no cumprimento das frequências estabelecidas.

Considerando o caso particular da T.........., S.A., tem-se assistido a constrangimentos significativos na operação da empresa, refletidos nas várias supressões que em muito degradam o serviço e a sua imagem perante os utilizadores, que muitas vezes não têm outra alternativa para se deslocarem entre as margens norte e sul do rio Tejo ou, pelo menos, outras opções igualmente competitivas em termos de economia de tempo e dinheiro. Há diversos fatores estruturais que concorrem para intensificar os constrangimentos à operação desta empresa, entre os quais: i) a elevada idade média da frota que realiza as ligações Cacilhas-Cais do Sodré (38 anos), Seixal-Cais do Sodré e Montijo-Cais do Sodré (mais de 20 anos);

ii) o seu estado de degradação face ao desinvestimento na sua manutenção;

iii) a elevada intensidade de operação, com muitas atracações por dia que em muito desgastam as embarcações; iv) a heterogeneidade da frota que torna os processos de gestão e manutenção dos navios mais complexos e onerosos; v) e a necessidade de dar cumprimento aos períodos de docagem obrigatórios com vista a garantir as condições de navegabilidade e segurança dos navios.

Não obstante o esforço recente de recuperação do investimento na manutenção dos navios, tais ações não conferem qualquer solução estável e duradoura para a operação da empresa, pelo caráter estrutural dos constrangimentos sentidos.

É premente dar uma resposta, também ela estrutural, à presente situação, sendo entendimento do Governo que tal só pode passar pela renovação integral da frota de navios que opera as referidas ligações fluviais, bem como pelo estabelecimento de um contrato de manutenção que garanta fiabilidade e níveis de disponibilidade da frota da T.........., S. A., a longo prazo.

Esta solução estrutural passará, portanto, por um projeto de renovação integral da frota da T.........., S.A., que opera atualmente as ligações Cacilhas-Cais do Sodré, Seixal-Cais do Sodré e Montijo-Cais do Sodré, constituída por até 10 navios iguais, cujo investimento deve atingir um valor não superior a 57 milhões de euros, a realizar entre 2019 e 2024, atendendo ao tempo de desenvolvimento dos projetos, construção e entrega dos navios. Por forma a garantir desde logo o compromisso dos fornecedores e níveis de serviço, fiabilidade e consequentemente, de regularidade e qualidade do serviço, pretende -se ainda assegurar um contrato de manutenção para os navios até 2035.

Face a um projeto desta envergadura e à natureza plurianual dos compromissos a assumir, importa assim conferir autorização à T.........., S. A., para proceder à respetiva assunção de encargos.

Assim: Nos termos do n.º 2 do artigo 45.º da Lei n.º 91/2001, de 20 de agosto, na sua redação atual, da alínea e) do n.º 1 do artigo 17.º e do n.º 1 do artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de junho, na sua redação atual, do n.º 1 do artigo 109.º do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, na sua redação atual, da alínea a) do n.º 1 do artigo 6.º da Lei n.º 8/2012, de 21 de fevereiro, na sua redação atual, e do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21 de junho, na sua redação atual, o Conselho de Ministros resolve:

1 - Aprovar a proposta referente ao «Plano de Renovação da Frota da T........., S. A.», doravante Plano, que inclui a aquisição de até 10 novos navios, bem como a respetiva manutenção no período de 2020 a 2035, devendo a T.........., S. A., realizar todas as ações necessárias com vista à concretização dos investimentos inerentes a este plano.

2 - Autorizar a T.........., S.A., a assumir os encargos plurianuais e a realizar a despesa necessária à concretização do Plano referido no número anterior, até ao montante global de € 57 000 000 referentes à componente aquisição, e de até € 32 946 000 referentes à componente de manutenção, valores aos quais acresce IVA à taxa legal em vigor.

3 - Determinar que os encargos orçamentais decorrentes da execução do Plano não podem exceder, em cada ano económico, os seguintes valores, aos quais acresce IVA à taxa legal em vigor:

a) Encargos com a componente aquisição:

i) Em 2019: € 248 785;

ii) Em 2020: € 10 581 215;

iii) Em 2021: € 15 390 000;

iv) Em 2022: € 11 400 000;

v) Em 2023: € 11 400 000;

vi) Em 2024: € 7 980 000;

b) Encargos com a componente manutenção:

i) Em 2020: € 114 000;

ii) Em 2021: € 456 000;

iii) Em 2022: € 684 000;

iv) Em 2023: € 912 000;

v) Entre 2024 e 2025: € 1 140 000, em cada ano;

vi) Entre 2026 e 2030: € 2 280 000, em cada ano;

vii) Entre 2031 e 2035: € 3 420 000 em cada ano.

4 - Determinar que o investimento resultante da execução da componente aquisição do Plano é financiado exclusivamente pelo Fundo Ambiental, por fundos europeus no âmbito do Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (POSEUR) e por receitas decorrentes da alienação da frota da T.......... a substituir, nos seguintes termos:

a) Transferências orçamentais provenientes do Fundo Ambiental, reconhecendo-se, nos termos da lei, estar em causa uma intervenção de especial relevância, até ao montante global de € 40 130 000,00, repartidas da seguinte forma:

i) Em 2019: € 158 000,00;

ii) Em 2020: € 6 544 000,00;

iii) Em 2021: € 9 178 000,00;

iv) Em 2022: € 7 196 000,00;

v) Em 2023: € 9 174 000,00;

vi) Em 2024: € 7 880 000,00;

b) Verbas financiadas por fundos europeus no âmbito do POSEUR, no montante global mínimo de € 14 920 000,00, repartidas da seguinte forma:

i) Em 2019: € 90 785,00;

ii) Em 2020: € 3 837 215,00;

iii) Em 2021: € 5 512 000,00;

iv) Em 2022: € 3 604 000,00;

v) Em 2023: € 1 876 000,00;

c) Receita obtida com alienação de navios da T.........., S.A., a substituir, no montante global de € 1 950 000,00, repartida da seguinte forma:

i) Em 2020: € 200 000,00;

ii) Em 2021: € 700 000,00;

iii) Em 2022: € 600 000,00;

iv) Em 2023: € 350 000,00;

v) Em 2024: € 100 000,00.

5 - Determinar que, caso a receita prevista na alínea c) do número anterior seja superior ao montante global previsto, o excedente deve ser utilizado para reduzir a necessidade de financiamento por parte do Fundo Ambiental.

6 - Determinar que, caso a receita prevista na alínea c) do n.º 4 fique abaixo do montante global previsto, os montantes em falta devem ser suportados por transferências do Fundo Ambiental.

7- Sem prejuízo das fontes de financiamento definidas no n.º 4, incumbir o Conselho de Administração da T.........., S.A., de instruir os procedimentos necessários para obter financiamento adicional ao abrigo de programas operacionais de fundos europeus, a estabelecer no âmbito do Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027.

8 - Determinar que, caso seja possível obter financiamento adicional nos termos previstos no número anterior, deve o mesmo ser utilizado para reduzir as necessidades de financiamento a suprir por transferências do Fundo Ambiental.

9 - Determinar que os encargos financeiros resultantes da componente manutenção do Plano referido no n.º 1 são financiados através do orçamento da T.........., S.A.

10 - Estabelecer que os montantes fixados para cada ano económico nos n.os 3 e 4 acima identificados, são acrescidos do saldo apurado no ano anterior.

11 - Delegar no conselho de administração da T.........., S.A., com faculdade de subdelegação, as competências legalmente atribuídas pelo Código dos Contratos Públicos ao órgão competente para a decisão de contratar, designadamente a decisão de escolha do procedimento, a aprovação das peças do procedimento, a retificação das peças do procedimento, a decisão sobre erros e omissões identificados pelos interessados e a decisão de adjudicação, relativamente aos procedimentos de formação do contrato de aquisição para concretização do investimento referido no n.º 1.

12 - Determinar que a presente resolução produz efeitos à data da sua aprovação.» (cf. documento de fls. 245, junto com a resposta apresentada pela Entidade Demandada no âmbito do incidente de adoção de medidas provisórias).

B. Por anúncios publicados no Diário da República, 2ª série, n.º 33, de 15 de fevereiro de 2019, e no Jornal Oficial da União Europeia, de 19 de fevereiro de 2019, a T.......... –T……., S.A. publicitou o Procedimento de Negociação n.º 03…/2019-D…/TT, que tem por objeto o “Fornecimento com Manutenção Global Integrada de 10 Navios para a T.......... ”, sendo o preço base de 89 946 000.00EUR, e o prazo de execução do contrato de 16 anos (documento n.º 2, com a Petição Inicial, a fls. 51-53).

C. Apresentaram-se ao referido Procedimento de Negociação n.º 03…/2019-D…/TT cinco candidatos, entre os quais o agrupamento constituído pelas ora Autoras - Candidatura n.º 3 -, e a ora contrainteressada “A……” - Candidatura n.º 1 (documento n.º 4, junto com a Petição Inicial, a fls. 73, e seguintes).

D. Em 11 de junho de 2019, o Júri elaborou o “Relatório Preliminar de Qualificação”, comunicado aos candidatos em sede de audiência prévia, no qual propôs que “seja admitida à fase de apresentação de propostas a A……” e excluídas as restantes candidaturas apresentadas (documento n.º 4, junto com a Petição Inicial, a fls. 73, e seguintes).

E. Em 05 de julho de 2019, o Júri elaborou o relatório final da fase da apresentação das candidaturas e qualificação dos candidatos (“Relatório Final de Qualificação”), no qual manteve as propostas formuladas no “Relatório Preliminar de Qualificação” (documento n.º 6, junto com a Petição Inicial, a fls. 134, e seguintes).

F. Por deliberação de 11 de julho de 2019, o Conselho de Administração da T.........., S.A., colhendo o “Relatório Final de Qualificação”, de 05.07.2019, deliberou “Qualificar o Candidato n.º 1 – A…… ” e excluir as restantes candidaturas apresentadas (cf. documento n.º 1, junto com a Petição Inicial, a fls. 49-50).”.

DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, importa agora entrar na análise da questão colocada para decisão.

Do erro de julgamento no tocante ao requisito do periculum in mora

Nos presentes autos mostra-se impugnada a decisão proferida no incidente de adoção de medida provisória, requerida pelas Autoras da ação de contencioso pré-contratual, ora Recorrentes, que julgou improcedente a medida requerida de readmissão provisória até à prolação de sentença que decida a impugnação do ato de exclusão do Agrupamento candidato n.º 3 ao Procedimento de Negociação n.º 03…/2019-D…/TT, para o Fornecimento com Manutenção Global Integrada de Dez Navios para a T.........., acompanhada, se assim for entendido, de uma prorrogação do prazo para a apresentação das propostas.

Baseiam as Recorrentes o presente recurso no erro de julgamento em relação ao requisito do periculum in mora, entendendo que se verificam os pressupostos para que a medida provisória seja decretada.

Alegam que considerando a demora própria da ação de contencioso pré-contratual, acrescida da demora da citação da Contrainteressada na Austrália e o calendário de entrega dos navios, é evidente que há elementos para entender que é mais do que certo que o contrato será executado materialmente na pendência da ação, impossibilitando a retoma do procedimento e gerando uma situação de facto consumado.

A ação nunca demorará menos de um ano e a inexistência de outras propostas permitirá reduzir ao mínimo o tempo necessário à celebração do contrato, pelo que, quando a ação estiver decidida, é mais do que provável que o contrato se encontre materialmente executado, com a entrega de parte significativa dos navios a fornecer, gerando uma situação de impossibilidade absoluta, que consubstancia causa legítima de inexecução de sentença, nos termos do artigo 163.º, n.º 1 do CPTA.

Defendem as Recorrentes que, ao contrário do decidido na sentença sob recurso, a medida provisória requerida é necessária para evitar que o Agrupamento composto pelas Autoras fique definitivamente afastado da possibilidade de obter a adjudicação, gerando uma situação de facto consumado, que impossibilita a retoma do procedimento.

Vejamos.

Compulsando o julgamento de facto da sentença recorrida dela decorre que a Entidade Demandada, ora Recorrida, por anúncios publicados em 15/02/2019 no Jornal Oficial da União Europeia, procedeu à abertura de procedimento pré-contratual de negociação, tendo por objeto o Fornecimento com Manutenção Global Integrada de 10 Navios para a T.........., com o preço base de € 89.946.000,00 e prazo de execução do contrato de 16 anos.

As Autoras, ora Recorrentes, apresentaram-se ao referido procedimento como candidatas agrupadas (Agrupamento n.º 3).

Por deliberação da Entidade Demandada, datada de 11/07/2019, a candidata n.º 1, ora Contrainteressada, foi qualificada e foram excluídas as restantes quatro candidatas, nos termos do Relatório final da fase de apresentação das candidaturas e qualificação, que manteve as propostas constantes do relatório preliminar.

Em reação a essa decisão de exclusão do procedimento, as interessadas vieram requerer a medida provisória de admissão provisória, a título de qualificação provisória até à prolação de sentença que decida a ação de contencioso pré-contratual, a qual foi recusada pela sentença sob recurso, sob a invocação de que não se verifica o requisito do periculum in mora.

O regime das medidas provisórias, previsto e regulado no artigo 103.º-B do CPTA foi introduzido na revisão da lei processual administrativa pelo D.L. n.º 214.º-G/2015, de 02/10, tendo uma finalidade instrumental e de natureza cautelar, daí produzir efeitos provisórios em relação à decisão que vier a ser proferida no âmbito do processo de contencioso pré-contratual, da qual é seu incidente.

Desde o seu início que não se tem afigurado linear a interpretação dos requisitos de decretamento das medidas provisórias, questionando-se a autonomia do requisito do periculum in mora, previsto no artigo 103.º-B, n.º 1, em relação ao critério de ponderação de interesses, consagrado no seu n.º 3, designadamente, em razão da circunstância de a Diretiva recursos não prever autonomamente tal requisito do periculum in mora, limitando a decisão de adoção de medidas provisórias ao critério de ponderação de interesses (vide, Ana Celeste Carvalho, “Aspectos Processuais da ação de contencioso pré-contratual e dos seus incidentes, à luz do CPTA e do CCP revistos”, Revista de Direito Administrativo, n.º 1, janeiro-abril 2018, pp. 47).

Por isso, “Considerando a interpretação conjugada do disposto no artigo 103.º-B, é defensável afirmar que a não demonstração do periculum in mora, previsto no seu n.º 1 inviabiliza a concessão da medida provisória requerida. (…) o n.º 1 do artigo 103.º-B carece de ser interpretado em conformidade com a Diretiva recursos, a qual não exige o periculum in mora como requisito autónomo da adoção de medidas provisórias, devendo entender-se que o legislador assumiu que as situações aí previstas, relativas ao risco de constituição de uma situação de facto consumado ou de já não ser possível retomar o procedimento pré-contratual para determinar quem deveria ser o adjudicatário, constituem danos relevantes na esfera do Requerente, que, por essa razão, não podem deixar de ser considerados no âmbito do juízo de ponderação, a realizar nos termos do disposto no n.º 3.”, idem.

Tendo a revisão de 2019 do CPTA alterado a redação do seu artigo 103.º-B, não foi de molde a alterar ou, por algum modo, clarificar os critérios de adoção das medidas provisórias, não obstante essa nova redação não ser a aplicável ao presente caso.

Conforme decidido na sentença sob recurso e nos termos anteriormente assumidos, o requisito do periculum in mora previsto no artigo 103.º, n.º 1 do CPTA, tem de ser interpretado conjugadamente com o critério da ponderação de interesses, consagrado no artigo 103.º, n.º 3 do CPTA.

Compreende-se porquê.

Não faria sentido prever o recurso à tutelar cautelar, de natureza provisória, destinada a acautelar o risco dos prejuízos decorrentes da delonga própria do processo principal e da prolação de uma decisão que decida o litígio, se não existir esse risco da produção de prejuízos associados ao decurso do tempo.

Trata-se, no fundo, de exigir a verificação de uma característica típica de todos os processos judiciais sob o cunho da urgência e da provisoriedade, isto é, que se verifique uma situação de risco de, no momento em que a sentença de mérito vier a ser proferida existir uma situação de facto consumado ou de já não ser possível retomar o procedimento pré-contratual para determinar quem nele seria escolhido como adjudicatário.

Por isso, se exige a alegação e demonstração de factos de onde se possa fundar a convicção de que sem a adoção da medida provisória requerida não será mais possível executar no plano do facto, a realidade jurídica que vier a ser definida na sentença de mérito da ação principal.

De modo que se for possível formular um juízo de possibilidade de retomar o procedimento pré-contratual ou de não existir o risco de constituição de uma situação de facto consumado, não existem fundamentos que determinem a adoção da medida provisória.

No demais, analisando o requisito do periculum in mora à luz do critério de ponderação de interesses previsto no artigo 103.º, n.º 3 do CPTA, ainda que se verifiquem as situações previstas no artigo 103.º, n.º 1 do CPTA, não se adotará a medida provisória se os danos que resultariam da sua concessão se mostrarem superiores aos que podem resultar da sua não adoção, sem que tal lesão possa ser evitada ou atenuada pela adoção de outras medidas.

Revertendo o expendido para o caso dos autos, conforme se mostra sintetizado pelas Recorrentes na sua alegação de recurso, a sentença baseou-se em três fundamentos para negar a adoção da medida provisória requerida:

1.º O contrato submetido a concurso tem uma duração de 16 anos, pelo que não se perspetiva que seja executado integral ou parcialmente na pendência da ação;

2.º Estando em causa um procedimento de negociação, no qual faltam ainda percorrer as fases de i) apresentação e análise das versões iniciais das propostas; ii) de negociação das propostas e iii) de análise das versões finais das propostas e adjudicação, não se pode concluir que exista sequer um risco de se iniciar, de imediato, a execução do contrato;

3.º O prosseguimento do procedimento com a negociação da proposta da Contrainteressada, não obsta a que o procedimento seja retomado na fase seguinte à da apresentação das candidaturas e qualificação dos candidatos.

Ao contrário do que defendem as Recorrentes no presente recurso, tais fundamentos mostram-se corretos, porque alicerçados nas concretas circunstâncias de facto apuradas.

Atendendo aos factos que se dão como provados, o procedimento pré-contratual em causa nos autos não é de execução instantânea, antes de execução continuada e prolongada no tempo.

O objeto do procedimento é misto, abrangendo quer o fornecimento de bens, quer a prestação de serviços de manutenção global integrada de 10 navios, sendo ambas as prestações contratuais de duração prolongada no tempo.

Não está em causa o fornecimento único ou por uma única vez dos 10 navios, antes de forma faseada no tempo e ao longo de cerca de cinco anos.

Segundo o ponto 17 do Caderno de Encargos do procedimento, os navios deverão ser construídos e entregues segundo uma calendarização fixada, entre 31 de julho de 2021 e 30 de junho de 2024, a que acrescem os serviços de manutenção global integrada até 31 de dezembro de 2035 (vide a definição de “Fornecimento”, prevista no ponto 2 da citada peça do procedimento).

Mesmo que se admita que o desfecho do processo principal não chegará a tempo de evitar a entrega do primeiro ou dos três primeiros navios, a ocorrer até 31 de julho de 2021 e até 30 de novembro de 2021, respetivamente, ou mesmo dos restantes três navios, com prazo de entrega até 30 de junho de 2022, no pior dos cenários – daqui a dois anos e meio –, ainda restarão mais quatro navios, correspondente a 40% do objeto do procedimento e, por isso, a quase metade do objeto dos navios a entregar.

A que acresce todo o período, até 31 de dezembro de 2035, para a manutenção global integrada dos navios.

O objeto do contrato é elucidativo quanto a estar em causa um contrato de prestações continuadas ou de execução prolongada no tempo, o que inviabiliza o entendimento assumido pelas Recorrente quanto à verificação do risco de constituição de uma situação de facto consumado, por execução material de grande parte do objeto contratual.

De resto, a assumir-se como válido o entendimento constante da alegação e respetivas conclusões do presente recurso teria de se concluir que em qualquer procedimento contratual se teria de dar sempre por verificado o requisito do periculum in mora, por existir o risco de constituição de uma situação de facto consumado, decorrente da probabilidade de o procedimento chegar ao seu termo quando a sentença de mérito vier a ser produzida.

Não se pode associar inelutavelmente a prática do ato de adjudicação ou a proximidade temporal da sua prática à existência de um risco de no momento em que a sentença de mérito vier a ser proferida, se ter constituído uma situação de facto consumado.

Nem se pode associar o eventual início da execução do contrato à impossibilidade de retomar o procedimento pré-contratual.

Naturalmente que não estando o procedimento suspenso e continuando a sua tramitação, vão sendo praticados atos e formalidades com vista ao seu desenvolvimento e o seu termo, até à prática do ato de adjudicação, o que é natural em qualquer procedimento de contratação pública.

Acresce que, mesmo seguindo a tese das Recorrentes, este risco seria bem menor no caso a que respeitam os presentes autos por não ter sido sequer praticado o ato de adjudicação e o procedimento pré-contratual se encontrar ainda pendente.

O objeto do contrato em causa dita, consequentemente, a improcedência do fundamento do recurso, quanto o de existir um risco de constituição de uma situação de facto consumado, por execução relevante na pendência dos autos, mesmo perante o cenário alegado, mas real, de ser moroso o tempo de construção de um navio.

Por outro lado, tem de se contar com a própria delonga de um procedimento pré-contratual como aquele que está em causa nos presentes autos, nos termos em que foram considerados no segundo fundamento invocado na sentença recorrida.

Está em causa um procedimento pré-contratual de negociação, cujas exigências colocadas, quer pela natureza do procedimento administrativo em si mesmo considerado, quer pela dimensão económica do contrato a celebrar, acompanhando a relevância dos bens a fornecer, que abrange o fornecimento de navios destinados ao serviço público de transporte fluvial de passageiros entre as duas margens do Rio Tejo na Área Metropolitana de Lisboa e ainda os serviços de manutenção integrada, não se ultima em curto espaço de tempo.

Segundo o artigo 194.º do CCP, o procedimento de negociação contempla quatro fases:

a) Apresentação das candidaturas e qualificação dos candidatos;

b) Apresentação e análise das versões iniciais das propostas;

c) Negociação das propostas;

d) Análise das versões finais das propostas e adjudicação.”.

Trata-se de um procedimento evolutivo, cujos atributos das propostas vão sendo melhorados no decurso do procedimento, pelo que, um procedimento em si mesmo complexo e moroso.

Tal, de resto, mostra-se confirmado pelo teor das contra-alegações ao recurso apresentadas pela Recorrida, na qual se informa que já decorreram mais de cinco meses sobre o prazo interno previsto para o termo da primeira fase do procedimento.

Além de que o ato impugnado, de qualificação do candidato n.º 1 e de exclusão dos restantes candidatos insere-se e foi praticado na primeira fase do procedimento de negociação, sem que exista uma previsão fidedigna de quando o próprio procedimento pré-contratual estará concluído.

Tendo o procedimento pré-contratual o seu início em 15 de fevereiro de 2019, em novembro de 2019 apenas se encontra realizada a primeira fase do procedimento, ao contrário do que seria de esperar.

Pelo que, a própria delonga do procedimento pré-contratual não é favorável ao entendimento de existir um risco de no momento em que a sentença vier a ser proferida existir uma situação de facto consumado ou de já não ser possível retomar o procedimento.

E ainda que se possa invocar, como o fazem as Recorrentes, que a circunstância de apenas uma candidata ter sido qualificada tenderá a reduzir o tempo necessário com as restantes fases do procedimento, não se sufraga o entendimento invocado de que nada há a negociar, nem a avaliar.

Considerando, por um lado, a relevância económica do procedimento pré-contratual em causa, por outro lado, a enorme complexidade técnica do objeto contratual, vertida não apenas no teor do caderno de encargos, como sobretudo, no seu Anexo I, referente às especificações técnicas dos navios para tráfego local de passageiros, para além da centralidade do interesse público subjacente à satisfação da necessidade pública do transporte fluvial de passageiros, não se concebe que a entidade adjudicante abdique da essencialidade do procedimento que ela própria escolheu, como consiste a fase de negociação da proposta e a análise da versão final da proposta, ainda que de apenas uma proposta se trate no presente caso.

A circunstância de apenas uma candidata ter sido qualificada não permite concluir que a entidade pública contratante abdicará da fase de negociação da proposta ou de tentar melhorar os atributos da proposta inicial, como parece decorrer da alegação das Recorrentes.

A tal se opõe não apenas o princípio da legalidade, como a defesa da prossecução do interesse público.

Por conseguinte, considerando o concreto procedimento pré-contratual que ora está em causa, não é possível formular um juízo sobre a existência do risco de no momento em que a sentença vier a ser proferida se ter constituído uma situação de facto consumado ou de já não ser possível retomar o procedimento pré-contratual.

Por último, como entendido na decisão recorrida, o prosseguimento do procedimento com a negociação da proposta da Contrainteressada, não obsta a que o procedimento seja retomado na fase seguinte à da apresentação das candidaturas e qualificação dos candidatos.

Nestes termos, não assistem razão às ora Recorrentes quanto à censura que dirigem contra a decisão recorrida, a qual não incorre no erro de julgamento em relação ao requisito do periculum in mora, o qual, tal como decidido e com base nas razões ora aduzidas, não se verifica no presente caso.

Assim, não se verificando as situações previstas no artigo 103.º-B, n.º 1 do CPTA, não é possível adotar a medida provisória requerida, faltando o pressuposto previsto na primeira parte do artigo 103.º-B, n.º 3 do citado Código para que se apreciem os danos que resultariam da sua adoção, em relação aos que podem resultar da sua recusa.

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Pelo que, em face de todo o exposto, será de negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pelas Recorrentes, por não provado e em manter a decisão recorrida, que não decretou a medida provisória de readmissão das Autoras, como candidatas, sob o Agrupamento n.º 3, ao procedimento pré-contratual.

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Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. O regime das medidas provisórias, previsto e regulado no artigo 103.º-B do CPTA foi introduzido na revisão da lei processual administrativa pelo D.L. n.º 214.º-G/2015, de 02/10, tendo uma finalidade instrumental e de natureza cautelar, daí produzir efeitos provisórios em relação à decisão que vier a ser proferida no âmbito do processo de contencioso pré-contratual, da qual é seu incidente.

II. Interpretando o artigo 103.º-B, n.º 1 em conformidade com a Diretiva recursos, a qual não exige o periculum in mora como requisito autónomo da adoção de medidas provisórias, deve entender-se que as situações aí previstas relativas ao risco de constituição de uma situação de facto consumado ou de já não ser possível retomar o procedimento pré-contratual para determinar quem deveria ser o adjudicatário, constituem danos relevantes na esfera do requerente, que, por essa razão, não podem deixar de ser considerados no âmbito do juízo de ponderação, a realizar nos termos do disposto no seu n.º 3.

III. Não faria sentido prever o recurso à tutelar cautelar, de natureza provisória, destinada a acautelar o risco dos prejuízos decorrentes da delonga própria do processo principal e da prolação de uma decisão que decida o litígio, se esse próprio risco da produção de prejuízos associados ao decurso do tempo não existir.

IV. Trata-se, no fundo, de exigir a verificação de uma característica típica de todos os processos judiciais sob o cunho da urgência e da provisoriedade, isto é, que se verifique uma situação de risco de, no momento em que a sentença de mérito vier a ser proferida existir uma situação de facto consumado.

V. Atendendo a que procedimento pré-contratual em causa não é de execução instantânea, antes de execução continuada e prolongada no tempo, por o fornecimento dos 10 navios não se fazer de uma única vez, antes de forma faseada no tempo e ao longo de cerca de cinco anos e que os serviços de manutenção global integrada deverão ser executados por mais cerca de quinze anos, mesmo que se admita que o desfecho do processo principal não chegará a tempo de evitar a entrega dos primeiros navios, no pior dos cenários ainda restará parte da execução do contrato.

VI. Considerando: (i) a relevância económica do procedimento pré-contratual em causa; (ii) a enorme complexidade técnica do objeto contratual, vertida no caderno de encargos e no seu Anexo I, referente às especificações técnicas e (iii) a centralidade do interesse público subjacente à satisfação da necessidade pública do transporte fluvial de passageiros, não se concebe que a entidade adjudicante abdique da essencialidade do procedimento que ela própria escolheu, como consiste a fase de negociação da proposta e a análise da versão final da proposta, ainda que de apenas uma proposta se trate no presente caso.

VII. Não se pode associar inelutavelmente a prática do ato de adjudicação ou a proximidade temporal da sua prática à existência de um risco de no momento em que a sentença de mérito vier a ser proferida, se ter constituído uma situação de facto consumado.

VIII. Nem se pode associar o eventual início da execução do contrato à impossibilidade de retomar o procedimento pré-contratual.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e, em consequência, em manter a decisão recorrida, não decretando a medida provisória requerida.

Custas pelas Recorrentes.

Registe e Notifique.


(Ana Celeste Carvalho - Relatora)


(Pedro Marques)


(Alda Nunes)