Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03044/09
Secção:CT
Data do Acordão:03/09/2017
Relator:ANA PINHOL
Descritores:TAXA
VINHOS REGIONAIS
PARECER NÃO VINCULATIVO
Sumário:I. Os pareceres são obrigatórios ou facultativos, conforme a lei imponha, ou não, a necessidade de eles serem emitidos, e são vinculativos, ou não vinculativos, quando a lei imponha, ou não, a necessidade de as suas conclusões serem seguidas pelo órgão decisor competente.
II. O parecer do Conselho Consultivo do Instituto da Vinha e do Vinho, exigido no artigo 1º da Portaria n.º 382/93, de 2 de Abril, é de natureza obrigatória e não vinculativa.
III. No caso dos autos, não logra aplicação o artigo 99º, n.º3 do CPA [diz o preceito: «Quando um parecer obrigatório e não vinculativo não for emitido dentro dos prazos previstos no número anterior, pode o procedimento prosseguir e vir a ser decidido sem o parecer, salvo disposição legal expressa em contrário.»], pela singela razão da entidade consultada não estar constituída à data em que o procedimento culminou com decisão final, corporizada esta na Deliberação do Conselho Directivo de 22 de Junho de 1993, que fixou o montante da taxa aplicável aos vinhos regionais.
IV. A não constituição do Conselho Consultivo do Instituto da Vinho e da Vinha consubstancia um vício gerador de anulabilidade da Deliberação do Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho, enquanto acto final do procedimento.
V. Anulada a Deliberação do Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho é de declarar a nulidade dos actos subsequentes da liquidação da taxa específica sobre os vinhos regionais (cfr. artigo 133º, n.º2, al.i) do CPA).
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I.RELATÓRIO
S..., S.A., não se conformando com a sentença do TRIBUNAL TRIBUTÁRIO DE LISBOA, de 19 de Dezembro de 2007, que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra as liquidações de taxas específica sobre vinhos regionais efectuadas pelo INSTITUTO DA VINHA E DO VINHO, referente a 1994, dela veio interpor recurso para o Supremo Tribunal Administrativo.

Culminou as respectivas alegações com a formulação das seguintes conclusões:

1.ª
A deliberação do Conselho Directivo do IVV que fixou a taxa sobre os vinhos regionais determinou ainda que a nova taxa se aplicasse cumulativamente com as anteriormente existentes, as decorrentes dos Decretos-Lei 26317 e 40037, respectivamente de 30/1/1936 e 18/1/1955.

2.ª
Tal viola a Portaria 382/93, de 3/4, a qual, ao permitir que a taxação específica do vinho regional pudesse ir até aos valores máximos que estabeleceu, teve necessariamente em vista uma relação de exclusão entre a nova taxa e as anteriormente existentes.


3.ª
Quando não, estaria a permitir que se catapultasse a taxação do vinho regional para a mesma faixa, ou até superior, à de alguns VQPRD, vinhos estes que a própria Portaria, no segundo parágrafo do seu Preâmbulo, faz notar constituírem um escalão superior.
4.ª
E, sendo que as tarefas de certificação que impendem sobre o vinho regional em quase nada acrescem às que impendem sobre o vinho "comum", estaria a permitir que, a esse pequeno acréscimo, pudesse corresponder um tributo só por si superior ao pago pelas tarefas comuns.
5.ª
A taxa específica sobre os vinhos regionais, se criada na devida forma, constituiria a correcta contrapartida do IVV pelos serviços prestados ao vinho regional.
6.ª
Qualquer imposição adicional, mormente a das taxas primitivas, porque deixa de ser a contrapartida de serviços prestados, perde a natureza de taxa, para passar a revestir a de imposto.
7.ª
Sendo inconstitucional a sua imposição, por ofensa do princípio da legalidade tributária (art.°s 106°, n°3 e 168°, n°1, al. i) da Constituição, na redacção então vigente).
8.ª
É assim nulo o acto do Conselho Directivo do IVV que manda aplicar a taxa sobre os vinhos regionais em cúmulo com as decorrentes dos Decretos-Lei 26317 e 40037.
9.ª
O acto do Conselho Directivo do IVV de fixação da taxa é um acto concreto de execução da Portaria 382/93, a qual por seu turno visava já regulamentar a aplicação do Decreto-Lei 560/73, de 26/10.

10.ª
Este Decreto-Lei impunha, no seu art.°2°, que a taxa fosse fixada por portaria do Secretário de Estado do Comércio (depois, Ministro da Agricultura).

11.ª
A Portaria 382/93, ao demitir-se de fixar a taxa, deferindo a tarefa ao Conselho Directivo do IVV, é ilegal, por violação do referido art.°2° do Decreto-Lei 560/73.

12.ª
Bem como, por idêntica violação, é ilegal o acto de fixação da taxa por este Conselho Directivo.
13.ª
Tal acto emana de órgão absolutamente incompetente, porque integrado em pessoa colectiva distinta daquela donde deveria emanar a concreta fixação da taxa (art.°s 133.°, n°2, al. b) e 2.°, als. a) e b) do Código do Procedimento Administrativo).

14.ª
E carece em absoluto de forma legal (art.°133°, n°2, al. f) do Código do Procedimento Administrativo), pois que teria que revestir a forma de portaria e, não, a de simples deliberação do Conselho Directivo.

15.ª
A deliberação que fixa o valor da taxa não o fundamenta, remetendo para a Informação 6/93, de 17/6, da Direcção de Serviços de Administração do IVV.

16.ª
Esta Informação, em sede de fundamentação, reporta-se apenas ao problema da cumulação da taxa dos vinhos regionais com as taxas anteriores, sendo que, no que toca ao valor da taxa sobre os vinhos regionais, se limita a propô-lo, sem o fundamentar.

17.ª
O acto da fixação da taxa carece assim absolutamente de fundamentação (art.°s 124° e 125° do Código do Procedimento Administrativo).

18.ª
A notificação da nova taxa haveria de ser feita aos interessados através da publicação obrigatória em Diário da República da portaria que a fixasse.

19.ª
Tal não aconteceu, bem como inexistiu qualquer divulgação da nova taxa aos interessados, sendo que a recorrente só a conheceu quando da respectiva liquidação, em Janeiro de 94.

20.ª
Por todo esse período, atenta a falta de notificação por qualquer meio legalmente adequado, é ineficaz a fixação da taxa, sendo consequentemente ilegal a sua liquidação.

21.ª
A Portaria 382/93, ao deferir ao Conselho Directivo do IVV competência para fixação da taxa, mandava no seu n°1 que previamente fosse ouvido o Conselho Consultivo, órgão do IVV representativo do sector interprofissional.

22.ª
Ao ser tomada a deliberação sem ser ouvido o Conselho Consultivo, ocorreu vício de procedimento, por preterição de formalidade essencial, gerador da invalidade do acto.



23.ª
Nisto conveio o Digno Representante do Ministério Público, no seu parecer de fls. 645 (verso).
24.ª
A própria deliberação de fixação da taxa autolimitou-se expressamente, condicionando a validade do acto a ulterior ratificação pelo Conselho Consultivo.
25.ª
Ao não ter sido lograda essa ratificação, inverificou-se a condição de validade do acto que a própria deliberação se impusera.

Termos em quer deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida e julgando inteiramente procedente a impugnação.»


Não constam, nos autos, contra-alegações.

**
Por decisão do Juiz Conselheiro Relator, de 10.02.2009, o Supremo Tribunal Administrativo julgou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecer do presente recurso, declarando competente para esse efeito este Tribunal Central Administrativo, ao qual o processo foi remetido, a pedido da recorrente “Sograpre Vinhos, S.A.”.

**
Recebidos os autos neste tribunal, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer a fls. 839/841, embora concordando com a ilegalidade denunciada pela recorrente quanto ao vício de preterição de formalidade no procedimento, veio suscitar a questão prévia da idoneidade meio processual de impugnação judicial para conhecer o objecto da lide, considerando adequado o recurso contencioso de anulação.
Ouvidas as partes quanto à referida questão prévia, apenas a recorrente veio responder, nos termos constantes a fls.853 dos autos.

**
Corridos os vistos e nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir.
**
II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Com este pano de fundo as questões que nos compete apreciar à luz das conclusões recursórias são as seguintes:
(i) se o meio processual apropriado à pretensão da recorrente é o processo de Impugnação judicial ou o processo de recurso contencioso de anulação; [questão prévia suscitada pelo Ilustre Magistrado do Ministério Público];
(ii) aferir da natureza jurídica do tributo cobrado sob a denominação “taxa específica sobre vinhos regionais”;
(iii) se o tributo liquidado pelo Instituto da Vinha e do Vinho emana de órgão absolutamente incompetente, porque integrado em pessoa colectiva distinta daquela donde deveria emanar a concreta fixação da taxa;
(iv) se a sentença sob recurso incorre em erro de julgamento por considerar que não foram preteridas formalidades essenciais no procedimento que culminou na Deliberação do Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho de 22 de Junho de 1993;
(v) se a sentença sob recurso incorre em erro de julgamento por considerar que a Deliberação do Conselho Directivo identificada em (ii) não carece de falta de fundamentação;

**
III. FUNDAMENTAÇÃO
A.DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:
«1. A impugnante foi objecto da liquidação, pelo Instituto da Vinha e do Vinho, em 94/01/27, das taxas sobre vinhos regionais da Portaria 382/93, nos montantes de 25.414.023$00 e 3.885.750$00, respectivamente referentes aos meses de Junho a Novembro de 1993 e a Dezembro de 1993 - doc. fls. 525 e 526.
2. O Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho, por deliberação de 22 de Junho de 1993, decidiu que a taxa prevista na Portaria 382/93 seria de 3$00 - doc. fls. 527.
3. À data da deliberação o Instituto da Vinha e do Vinho não possuía Conselho Consultivo - doc. fls. 529 e 530.

Em sede de fundamentação da decisão de facto, exarou-se na Sentença recorrida:
«A convicção do Tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos, em especial os mencionados.»


E, a título de factos não provados lê-se na sentença recorrida:
«Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.»


Alteração oficiosa, por ampliação, da decisão sobre a matéria de facto
Por se entender relevante à decisão de mérito a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada, adita-se, ao probatório a coberto do estatuído no artigo 662º, nº1, do CPC ex vi artigo 281º do CPPT a seguinte factualidade:
4. A Deliberação do Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho a que alude o ponto 2 do probatório tem o seguinte teor:
«Aos vinte e dois dias do mês de Junho de mil novecentos e noventa e três, na Rua Mouzinho da Silveira, número cinco, nesta cidade de Lisboa, reuniu o Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho, constituída pelos Senhores (….) tendo resolvido:
VALOR DO SELO PARA OS VINHOS DE MESA REGIONAIS
Analisada a Informação números seis barra noventa e três, de dezassete de junho, da Direcção de Serviços de Administração, concordar que o valor dos selos dos vinhos regionais, previsto no número um da Portaria número trezentos e oitenta e dois barra noventa e dois, de três de Maio, seja de Escudos: três escudos, acrescido do valor das taxas a que se referem os Decretos- Leis números vinte e seis mil trezentos e dezassete e quarenta mil e trinta e sete, actualizada pelo Decreto – Lei número trezentos e vinte e um traço A barra oitenta e seis, cujo total é de Escudos: cinco escudos e cinquenta centavos. Estes vinhos estão, também sujeitos à taxa de vinte centavos, criada pelo Decreto – Leo número quarenta e sere mil quatrocentos e setenta, de trinta de Dezembro de mil novecentos e sessenta e seis.
A fixação desta taxa será. Posteriormente sujeita a ratificação pelo Conselho Consultivo.». (Doc. fls. 527)
**

B. DO DIREITO

Considerada a factualidade dada por assente pelo tribunal a quo e ora aditada neste tribunal de recurso, importa entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional.

Ø Da questão da (im)propriedade do presente meio processual

O âmbito deste recurso respeita primordialmente à questão prévia da idoneidade do meio processual, suscitada pelo Ministério Público, para passarmos depois, em caso de improcedência, ao conhecimento do mérito do recurso.

Vejamos, então.

O Ministério Público no douto parecer emitido, secundando alegação da recorrente quanto às ilegalidades apontadas na petição inicial, veio suscitar a questão prévia da idoneidade do meio processual, dizendo o seguinte: « Em face das características do acto, o processo de impugnação não é o meio idóneo com vista a declaração de ilegalidade de normas e, assim sendo, deve rejeitar-se a presente impugnação por manifestamente ilegal nos termos do parágrafo 4º do art. 57º do RSTA cuja convolação e, aplicação do principio “pro actione” contido no art. 98º da LGT deverá salvar a tutela jurisdicional efectiva.».

A recorrente respondeu pronunciando-se no essencial nos seguintes termos: «4. É verdade que não fora intenção pedir a titulo principal, a declaração de ilegalidade da deliberação do IVV.5. Contentar-nos-íamos com a apreciação, a titulo incidental, dessa ilegalidade, por forma a que, reconhecida ela, tal determinasse a ilegalidade das cobranças que sucessivamente foram feitas à Sogrape e por esta pagas sob protesto. 6. Acreditamos na viabilidade desta opção. Boa ou má, V. Exas superiormente decidirão. 7. Mas ainda que a rejeitassem, essa rejeição teria de ser parcial, Sempre deveria aproveitar-se a impugnação na parte respeitante às facturas já cobradas ao tempo da petição inicial e que a acompanham. 8. Na parte restante, a convolação a que bem alude o MP, em aplicação do princípio “ pro actione”, poderá salvar a tutela jurisdicional efectiva.».

Vejamos, se existem razões para proceder a questão prévia da impropriedade do meio processual levantada pelo Ministério Público.

É, sabido que o erro na forma de processo, contemplado no artigo 199º do Código de Processo Civil (CPC) -na redacção em vigor à data-, consiste em ter o autor usado de uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão (cfr. RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, I, 3.ª Edição, 261.)

Decorre das disposições conjugadas dos artigos 199º, 202º e 206º, nº 2 do CPC que o erro na forma de processo constitui numa nulidade de conhecimento oficioso que deve ser apreciada até ao despacho saneador, ou até a decisão final.

É entendimento da jurisprudência de modo que julgamos pacífico, vd. entre tantos outros, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18.06.2014, proferido no processo n.º 01549/13, de 18.06.2014, que: «[é] pelo pedido que se afere a adequação do meio processual utilizado ao fim por ele visado: se o pedido formulado pelo autor não se ajusta à finalidade abstractamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre o erro na forma do processo (Se o pedido formulado pelo autor não se ajusta à finalidade abstractamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre o erro na forma do processo (cf. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, volume II, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, págs. 288/289. No mesmo sentido, RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, volume I, 3.ª edição, 1999, pág. 262, e ANTUNES VARELA, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 100.º, pág. 378).).» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

E, como se deixou dito, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02.12.2008, proferido no processo n.º 08A2353, (partindo da noção de pedido plasmada nos artigos 274º, nº 2, al. c) e 498º, nº 3, ambos do CPC) o pedido: «[r]epresenta o círculo fechado dentro do qual o Tribunal se tem de mover para definir a solução do conflito de interesses que é chamado a dirimir».

Efectivamente, o objecto da sentença coincide com o objecto do processo, não podendo o juiz ficar aquém nem ir além do que lhe foi pedido - não pode decidir-se por um maius, nem por um aliud. (Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, CPC Anotado, Vol. 2º, 2ª ed., 682).

Todavia, não obstante a regra contida no artigo 615º, n.º1, al.e) do CPC, pode o juiz interpretando a petição inicial em bloco determinar a verdadeira pretensão do autor.

Postas estas considerações gerais e regressando ao nosso caso, importa agora, delinear o campo de aplicação dos meios processuais em causa nestes autos.

A delimitação geral dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial do recurso contencioso de anulação [actualmente acção administrativa por força do disposto no artigo 191.º do CPTA] resulta do artigo 118º do Código do Processo Tributário (CPT) [então em vigor e, por isso, aplicável ao caso por força do princípio tempus regit actum)] segundo o qual:

«2 - O processo judicial tributário compreende, designadamente:

a) Impugnação dos actos tributários, incluindo o indeferimento total ou parcial das reclamações graciosas;

(…)

3 - O recurso contencioso dos actos administrativos relativos a questões fiscais da administrações fiscal, bem como do Governo Central, dos governos regionais e dos seus membros, mesmo quando praticados por delegação, é regulado pelas leis do processo nos tribunais administrativos.».

Como se vê, a utilização do processo de impugnação judicial ou do recurso contencioso depende do conteúdo do acto impugnado: se este comporta a apreciação da legalidade de um acto de liquidação será aplicável o processo de impugnação judicial e se não comporta uma apreciação desse tipo é aplicável o recurso contencioso/acção administrativa especial. (neste sentido, vd. entre outros: Acórdão do STA de 25.06.2009, proferido no processo n.º 0194/09, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Na petição inicial dirigida ao Tribunal Administrativo do Círculo do Porto em 04.04.1998 (Por decisão proferida em 26.09.1996, aquele Tribunal julgou-se incompetente em razão da matéria para conhecer o recurso contencioso e competente para esse efeito o Tribunal Tributário de 2ª Instância) a recorrente no intróito disse que: «vem interpor recurso contencioso de anulação dos seguintes actos do Conselho Directivo do Instituto do Vinho e da Vinha (…) a) aplicação, nos termos da Portaria n.º 382/93, de 3/4 de uma taxa específica sobre os vinhos regionais Beiras e Trás-os-Montes; b) aplicação, em cúmulo com essa taxa, das taxas decorrentes dos Decretos-Lei 26317 e 40037, respectivamente de30/1/1996 e 18/1/1955.» e finalizou do seguinte modo: «(…) deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser decretada a nulidade dos, ou se assim não for entendido, serem anulados os seguintes actos: a) aplicação, nos termos da Portaria n.º 382/93, de 3/4 de uma taxa específica sobre os vinhos regionais Beiras e Trás-os-Montes; b) aplicação das taxas decorrentes dos Decretos-Lei 26317 e 40037 em cúmulo com uma taxa específica sobre os vinhos regionais.».

Como se vê da transcrição supra, a recorrente pretende ver sindicados dois actos imputados ao Conselho Directivo do Instituto do Vinho e da Vinha, os quais se consubstanciam:

a) na aplicação, nos termos da Portaria n.º 382/93, de 3 de Abril, de uma taxa especifica sobre os vinhos regionais Beiras e Trás-os-Montes”;

b) na aplicação, em cúmulo com essa taxa, das taxas decorrentes dos Decretos – Lei n.ºs 26317 e 40037, respectivamente de 30 de Janeiro de 1936 de 18 de Janeiro de 1995, retratadas nas facturas n.ºs ..., ... nos montantes de 25.414.023$00 e 3.885.750$00, respectivamente referentes aos meses de Junho a Novembro de 1993 e a Dezembro de 1993, relativas à taxa especifica sobre vinhos regionais.

Assim, a questão da legalidade do acto de liquidação daquelas taxas passa, indubitavelmente, pela análise da Deliberação do Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho que fixou o quantum das mesmas.

Ou seja, e dito de outro modo, estamos perante a liquidação da taxa específica sobre os vinhos regionais retratadas nas facturas indicadas nos autos, que por seu turno se mostram suportadas na Deliberação do Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho datada de 22 de Junho 1993, que fixou a taxa para os vinhos regionais em 3$00 e decidiu que lhe acrescesse o valor das taxas decorrentes dos Decretos Lei n.ºs 26317 e 40037.

Entendimento este já veiculado, no Acórdão deste Tribunal Central Administrativo proferido nestes autos (fls.478/487) em 23 de Setembro de 1997 que assim concluiu: « A deliberação de 22 de Junho de 1993 do Conselho Directivo do Instituto da Vinha, posta em crise pela recorrente, fixou, como atrás se viu, o valor de taxa devida pela prestação de serviços específicos a esse Instituto. Aplica-se a um universo indeterminado de pessoas não imediatamente identificadas num identificáveis todas aqueles que recorram a esses serviços. Aplica-se um número indeterminado de vezes: sempre que alguém recorra a tais serviços. Não pode, pois, dizer-se que a deliberação se esgota com a sua aplicação. À primeira aplicação segue-se ou pode seguir-se outra e outra, indefinidamente, a um e outros destinatários. E, relativamente a qualquer delas, há que quantificar o montante da taxa em concreto devida, nem que essa tarefa se salde numa mera operação aritmética. Dai que deva concluir-se que a apontada deliberação por geral e abstracta, não é um acto administrativo, mas, antes um regulamento, uma norma. Desde modo, depois de fixado o montante da taxa, pela referida deliberação, e de a recorrente requisitar os serviços sobre que ela incide (ainda que isto tenha ocorrido anteriormente), foi calculado o montante de a taxa por ela devida e posto á cobrança, mediante a emissão das facturas de 27 de Janeiro de 1994. Estas facturas consubstanciam, nesta perspectiva, um acto de liquidação de uma receita tributaria no sentido corrente na doutrina e na jurisprudência, E, a ser assim, não pode afirmar-se que a deliberação produz efeitos sem necessidade de um acto de intermediação que a aplique à concreta destinatária que é a recorrente(sublinhado da nossa autoria)

Repare-se, ainda que, da leitura da petição inicial resulta que a recorrente após elencar as ilegalidades que entende padecer a Deliberação de do Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho de 22 de Junho de 1993, as faz reflectir nas facturas n.ºs ... e ..., na medida em que o montante apurado resulta da aplicação da taxa determinada naquele acto colegial.

Poderá dizer-se que, desse modo, que os pedidos formulados pela recorrente devem ser interpretados no sentido de ver anuladas os actos de liquidação consubstanciados nas facturas n.ºs ..., ..., referentes aos meses de Junho a Novembro de 1993 e a Dezembro de 1993, cujas quantias foram cobradas ao abrigo da Deliberação de 22 de Junho de 1993, do Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho.

Em face disso, conclui-se que não é correcto o entendimento adoptado no parecer emitido pelo Ministério Público sobre a inadequação da presente impugnação judicial a apreciar a pretensão da recorrente.

Ø DO MÉRITO DO RECURSO

Na ordem de apreciação dos vícios invocados logra prioridade a inconstitucionalidade da lei em que se baseou o acto recorrido pois se trata de matéria de conhecimento oficioso, embora a intervenção do tribunal se tenha de circunscrever à fiscalização concreta da constitucionalidade pois a fiscalização abstracta incumbe em exclusivo ao Tribunal Constitucional (cfr. 281º da Constituição da República Portuguesa).

Da alegada inconstitucionalidade material da norma constante do artigo 1º da Portaria n.º 382/93, de 2 de Abril por violação do princípio da legalidade tributária.

Na petição inicial alegou a recorrente que a aplicação da taxa específica sobre os vinhos regionais em acumulação com as taxas decorrentes dos Decretos - Lei n.ºs 26317 e 40037 é inconstitucional por se tratar verdadeiramente de um imposto.

Quanto a este ponto, em particular, sentença recorrida sustenta que: «[A]s taxas previstas para os vinhos comuns, nos decretos-lei 26317 e 40037, vinhos de mesa, constituem contrapartida de serviços distintos dos que se encontram previstos na portaria 382/93. Uma coisa são os serviços para os vinhos em geral, como sejam a garantia da sua conformidade com questões de saúde pública, graus alcoólicos, etc., outra coisa são os serviços de certificação de uma determinada proveniência ou qualidade das uvas que compõem o vinho, certificação essa de que a impugnante beneficiou ao vender os seus produtos sob essa designação.

Logo, estamos perante serviços distintos, estamos perante taxas e não perante impostos, pelo que não se verifica a invocada inconstitucionalidade das taxas aplicadas.».

É contra este julgamento que a recorrente se insurge, alegando em síntese que «[c]onstituindo a taxa específica sobre os vinhos regionais a contrapartida adequada dos serviços prestados pelo IVV, a imposição de outras taxas já não seria a contrapartida do serviço prestado, passando a revestir a natureza de verdadeiro imposto.».

Como é bom de ver, no caso a concreta questão colocada pela recorrente prende-se com a natureza do tributo liquidado sobre os vinhos regionais.

Dela cumpre, pois, conhecer.

É inquestionável que o princípio da legalidade fiscal impõe que seja a lei, ou decreto-lei emitido ao abrigo de autorização legislativa, a criar os impostos e também a definir os seus elementos essenciais (artigo 167º, n.º 1, alínea o), da Constituição da República Portuguesa - texto à data dos factos -).

Como se afirma no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 127/2004 de 2 de Abril:

«O princípio da legalidade tributária, que a Constituição de 1976 vem afirmando em todas as suas versões, consta hoje do seu art.º 103º, n.º 2.

Segundo este, «os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes». O princípio tem duas dimensões jurídicas, ambas enfeudadas à sua matriz histórica de não tributação sem a autorização do Parlamento, enquanto representante do povo (princípio da auto-tributação): uma traduzida na regra constitucional de reserva de lei da Assembleia da República ou de decreto-lei do Governo emitido a coberto de autorização do Parlamento a que tem de obedecer a criação dos impostos, constante actualmente do art.º 165º, n.º 1, alínea i), da CRP; outra, consubstanciada na exigência de conformação, por parte da lei, dos elementos modeladores do tipo tributário, abrangendo, assim, a incidência objectiva e subjectiva, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes.

É esta segunda dimensão que densifica os fundamentos axiológicos da nossa Constituição Fiscal e que se materializa nos princípios da universalidade, da igualdade tributária e da capacidade contributiva.

Ora, a prossecução de um tal desiderato ético-político demanda que a função de definição dos elementos de cuja operacionalidade jurídica emerge a obrigação tributária esteja reservada à lei.

Assim, não oferece dúvida que os elementos do tipo tributário têm de ser definidos por lei aprovada pela Assembleia da República ou por decreto-lei emitido pelo Governo ao abrigo de autorização legislativa que incida sobre esse elemento.». (disponível em texto integral em: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20140127.html)

Nesta perspectiva que aqui, se acolhe na íntegra, podemos então dizer que, do princípio da legalidade tributária, enquanto um dos elementos essenciais do Estado de Direito constitucional, emana, desde logo, a regra da reserva de lei formal para a criação e definição dos elementos essenciais dos impostos.

A solução da questão em apreço depende, pois, da distinção dos conceitos de imposto e de taxa, distinção que assenta, essencialmente, no carácter unilateral ou bilateral e sinalagmático do tributo.

Cumpre, por isso, perguntar se no caso, estamos perante uma taxa ou perante um imposto.

É, o que seguidamente veremos.

Quanto à distinção entre imposto e taxa socorrendo-nos, do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 07.11.2012, proferido no processo n.º 0564/12, que passaremos a transcrever, o que ficou plasmado, para o que aqui, nos importa: «Dando por adquiridas as inúmeras reflexões doutrinárias e jurisprudenciais produzidas sobre a matéria atinente à distinção entre imposto e taxa [ou seja, que ambos constituem receitas públicas coactivamente impostas, mas enquanto o imposto «... é uma prestação pecuniária, coactiva e unilateral, sem carácter de sanção, exigida pelo Estado com vista à realização de fins públicos» (Cfr. Teixeira Ribeiro, Lições de Finanças Públicas, Coimbra, 1977, 262.) a taxa tem «carácter sinalagmático, não unilateral, o qual por seu turno deriva funcionalmente da natureza do facto constitutivo das obrigações em que se traduzem e que consiste ou na prestação de uma actividade pública ou na utilização de bens do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à actividade dos particulares», (Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, Vol. I, Lisboa, 1981, pag. 42) pressupondo, pois, uma contraprestação por parte do ente público que a exige, a verificar-se na respectiva génese, e que deve concretizar-se naquela prestação de serviço público, naquele acesso à utilização de bens do domínio público ou na remoção do obstáculo jurídico à actividade do particular (Cfr. Casalta Nabais, Contratos Fiscais, Coimbra 1994, 236.)], ressalta na definição legal e doutrinal da taxa a individualização de um aspecto estrutural da mesma (a sinalagmaticidade ou bilateralidade) e, em consequência, os respectivos pressupostos da sua cobrança. Relação sinalagmática essa que, como se sublinha no acórdão do Tribunal Constitucional n° 365/03, de 14/7/2003, «há-de ter um carácter substancial ou material, e não meramente formal; isso não implica, porém, que se exija uma equivalência económica rigorosa entre ambos, não sendo incompatível com a natureza sinalagmática da taxa o facto de o seu montante ser superior (e porventura até consideravelmente superior) ao custo do serviço prestado». (disponível em texto integral em:

http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/baaf7fdb4116ac7680257abc004fc60e?OpenDocument).

A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem afirmado igualmente que o critério fundamental de diferenciação entre os conceitos de imposto e de taxa consiste na unilateralidade ou bilateralidade dos tributos em causa: a taxa possui um carácter bilateral ou sinalagmático, envolvendo uma correspectividade entre a prestação pecuniária a propor e a prestação de um serviço pelo Estado ou outras entidades públicas, o que não se verifica no imposto, em que a prestação devida apenas é unilateral, tendo como um dos seus critérios básicos a capacidade contributiva. (neste sentido vd. entre outros, os Acórdãos nºs 115/2002 – D.R., II Série, de 28 de Maio de 2002; 1108/96 – D.R., II Série, de 20 de Dezembro de 1996; e 336/2002 – D.R., II Série, de 14 de Outubro de 2002).

Para se compreender cabalmente o sentido e alcance do tributo questionado, importa convocar o Regulamento (CEE) no 822/87 do Conselho, de 16 de Março de 1987 (foi completado e executado pelos seguintes regulamentos: (CEE) n.º 346/79(7), (CEE) n.º 351/79(8), (CEE) n.º 460/79(9), (CEE) n.º 465/80(10), (CEE) n.º 457/80(11), (CEE) n.º 458/80(12), (CEE) n.º 1873/84(13), (CEE) n.º 895/85(14), (CEE) n.º 823/87(15), (CEE) n.º 1442/88(16), (CEE) n.º 3877/88(17), (CEE) n.º 4252/88(18), (CEE) n.º 2046/89(19), (CEE) n.º 2048/89(20), (CEE) n.º 2389/89(21), (CEE) n.º 2390/89(22), (CEE) n.º 2391/89(23), (CEE) n.º 2392/89(24), (CEE) n.º 3677/89(25), (CEE) n.º 3895/91(26), (CEE) n.º 2332/92(27), e (CEE) n.º 2333/92(28), na medida em procedeu à definição da Organização Comum de Marcados Vitivinícolas e dele se extrai que existem como categorias de vinhos os vinhos de mesa e os vinhos de mesa de qualidade produzidos em regiões determinadas (V.Q.P.R.D.). Para que um vinho de mesa possa ter a menção regional ou um vinho seja considerado (V.Q.P.R.D.) é necessário a sua cerificação.

Atentemos, agora, na Portaria n.º 382/93, de 2 de Abril.

Ali se disse, no respectivo preâmbulo: «A produção e comercialização de vinhos de mesa regionais, regulamentada pelo Decreto-Lei 309/91, de 17 de Agosto, pelo interesse que acolheu junto do sector vitivinícola, levou já à criação de diversas regiões produtoras e ao estabelecimento das respectivas denominações de «Vinho Regional».

Nestas circunstâncias e uma vez que os vinhos de mesa regionais constituem, numa hierarquia de qualidade, produtos situados entre os «vinhos de qualidade produzidos em regiões determinadas» e os vinhos de mesa sem direito a qualquer indicação de proveniência, deverá o Instituto da Vinha e do Vinho (IVV) acautelar, desde já, o rigoroso controlo da sua produção e comercialização, por forma a preservar as potencialidades comerciais desta gama de produtos, pela sua acreditação junto dos consumidores.

O sistema de controlo que se exige para os vinhos regionais justifica, porém, a aplicação de uma taxa, cujo valor importa definir e que constitui contrapartida de serviços prestados pela entidade certificadora. No entanto, sendo previsível e desejável que o IVV, sem abdicar da sua competência de fiscalização do cumprimento dos preceitos legais aplicáveis ao sector vitivinícola, transfira para o âmbito interprofissional, mediante protocolo, as funções de controlo da produção, certificação e comercialização dos vinhos de mesa regionais e tendo em conta as necessidades da promoção dos vinhos regionais a controlar pelas comissões vitivinícolas regionais, deverá admitir-se, nestes casos, uma maior flexibilidade na fixação daquele valor.». (negrito da nossa autoria).

Ora, como se explica no preâmbulo do diploma, o tributo em causa, constitui contrapartida dos serviços prestados na garantia da qualidade e proveniência dos vinhos regionais mediante a respectiva certificação.

Desde modo, exigindo a qualificação de um tributo como taxa a contraprestação individualizável, no caso, face ao que ficou dito, o tributo em causa inscreve-se claramente ao conceito de taxa constituindo, portanto, a contrapartida do acto de certificação.

A alegação da recorrente é, pois, improcedente.

Da (in)competência do Instituto da Vinha e do Vinho para fixar a taxa específica sobre os vinhos regionais.

Na sentença proferida na 1ª Instância foi justificada a competência do Instituto da Vinha e do Vinho do seguinte modo (transcrevendo): «[A] portaria 382/93 procedeu à fixação da taxa em causa até 3$00.Não foi por conseguinte o Conselho Directivo do IVV que fixou o limite abstractamente aplicável. Aquela portaria apenas atribuiu efectivamente ao IVV a possibilidade de aplicar uma redução à taxa já fixada e prevista na mesma portaria.».

A recorrente considera que esta pronúncia decorre de um erro de julgamento, alegando, em síntese, que a Portaria n.º 382/93, é ilegal, por violar o artigo 2º do Decreto – Lei n.º 560/73, de 10 de Outubro, uma vez que se demitindo-se da sua função de definir a taxa, a defere para entidade não governamental.

Vejamos.

Deve começar por dizer-se que « [a] incompetência traduz-se na prática de acto por órgão que, para efeito, não dispõe de poder legal e pode ser absoluta ou relativa.

A incompetência absoluta consubstancia-se na prática por um órgão de uma pessoa colectiva pública de um acto incluído nas atribuições de outra pessoa colectiva pública ou de um ministério, no caso da pessoa colectiva Estado. Se é um órgão que pratica um acto administrativo da competência de outro órgão da mesma pessoa colectiva estamos perante a hipótese de incompetência relativa. (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (Pleno) de 15.11.2012, proferido no processo n.º 0450/09, disponível em texto integral em www.dsgi.pt).

No presente caso, o artigo 2º do Decreto - Lei n.º 560/73, de 10 de Outubro conferiu expressamente ao Secretário de Estado do Comércio, a competência para fixar os «(…) [p]reços dos selos de garantia para os vinhos típicos regionais (com denominação de origem) e para os vinhos com indicação de proveniência regulamentada, bem como para os produtos vínicos de quaisquer regiões para cuja selagem seja necessária verificação por parte do organismo vitivinícola competente portanto este, sobre esta matéria tem uma competência própria.

A Portaria n.º 382/93, de 2 de Abril assinada pelo Ministro da Agricultura (antes, Secretário de Estado do Comércio) veio a estabelece o seu artigo 1º que: « [P]ara os vinhos de mesa regionais, o valor do selo ou do certificado de garantia é fixado pelo Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), ouvido o seu conselho consultivo, até ao máximo de 3$00 por cada litro, ou fracção, de vinho acondicionado em recipientes com capacidade igual ou superior a 0,5 l, sendo de metade daquele valor para os recipientes com capacidade inferior a 0,5 l.».

Objectivamente, a citada Portaria como resulta da leitura do preceito transcrito definiu com densidade suficiente a fixação do valor do selo ou do certificado, ao estabelecer o valor máximo até (3$00 por cada litro, ou fracção), estabelecendo, ainda que esse montante fosse susceptível de variar em função da capacidade do recipiente «vinho acondicionado em recipientes com capacidade igual ou superior a 0,5 l, sendo de metade daquele valor para os recipientes com capacidade inferior a 0,5 l) (negrito da nossa autoria).

Tal solução é justificada, no preâmbulo daquele diploma, da seguinte forma: «[O] sistema de controlo que se exige para os vinhos regionais justifica, porém, a aplicação de uma taxa, cujo valor importa definir e que constitui contrapartida de serviços prestados pela entidade certificadora. No entanto, sendo previsível e desejável que o IVV, sem abdicar da sua competência de fiscalização do cumprimento dos preceitos legais aplicáveis ao sector vitivinícola, transfira para o âmbito interprofissional, mediante protocolo, as funções de controlo da produção, certificação e comercialização dos vinhos de mesa regionais e tendo em conta as necessidades da promoção dos vinhos regionais a controlar pelas a comissões vitivinícolas regionais, deverá admitir-se, nestes casos, uma maior flexibilidade na fixação daquele valor.»

Do que vem escrito, resulta pois, que não obstante o legislador reconheça as particularidades do serviço a prestar, não deixou de quantificar o valor da taxa específica sobre os vinhos regionais, embora admitindo a possibilidade que esse valor (3$00) fosse objecto de redução por parte do I.V.V..

Conclui-se, pois que existe título normativo legitimador do exercício da competência administrativa do I.V.V. em alterar o valor da taxa em causa, dentro do limite (quantitativo) fixado na Portaria n.º 382/93, de 2 de Abril.

Por outras palavras, a fonte normativa dos efeitos declarados pelo acto administrativo praticado pelo I.V.V. existe retratada na referida Portaria, que por sua vez, está legitimada no Decreto – Lei n.º 560/73, de 10 de Outubro.

Desde modo, a sentença recorrida ao dar como não verificado o vício de incompetência, por não haver qualquer fundamento para a sua invocação, não merece reparo.

Do vício de forma no procedimento

Na petição inicial alegou, ainda, a recorrente o vício de forma no procedimento, por entender que a Deliberação do Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho foi tomada sem prévia audiência do Conselho Consultivo, ao contrário do que a Portaria n.º 382/93, de 2 de Abril impunha.

O Mmº Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, enfrentando a questão pronunciou-se nos seguintes termos: «A Portaria 382/93 exigia que fosse ouvido o Conselho Consultivo do IVV, o qual não havia entrado em funções ao tempo da deliberação.

Não era possível, assim, que o Conselho Consultivo emitisse o parecer cuja emissão se encontrava prevista na Portaria 382/93.

O C.P.A. nos seu art. 99º n.º3 estabelece que quando o parecer não vinculativo (como sucede na situação em apreço, por força do art.98º.2 do CPA e do teor da Portaria), não seja emitido no prazo de 30 dias, o procedimento pode prosseguir e vir a ser emitido sem parecer, salvo disposição legal em contrário. A decisão proferida poderia pois ser tomada como foi, sem o procedimento ficasse dependente de uma formalidade impossível de cumprir, por o Conselho Consultivo, a quem incumbia a emissão daquele parecer, não existir.»

A recorrente não se conforma com o assim decidido por entender, em síntese, que o recorrido ao não submeter a fixação da taxa a parecer prévio do Conselho Consultivo, violou o n.º1 da Portaria n.º 382/93, de 2 de Abril, daí ocorrendo o vício de procedimento por preterição de formalidade essencial gerador da invalidade do acto.

Antecipadamente, adiantamos que assiste razão à recorrente.

Vejamos de perto as razões porque assim entendemos.

O Instituto da Vinha e do Vinho foi criado pelo Decreto-Lei n.º 304/86, de 22 de Setembro, e sofreu a primeira alteração orgânica através Decreto-Lei n.°102/93, de 2 de Abril.

Tal como resulta do preâmbulo daquele diploma « [f]ace à complexidade da organização comum do mercado do vinho e dos respectivos controlos e às exigências de uma política de qualidade para a vitivinicultura nacional, são reforçadas as competências do IVV no domínio do controlo e fiscalização da produção e comercialização do vinho e produtos vínicos.».

Diz-se, no artigo 1º daquele diploma que o Instituto da Vinha e do Vinho é um instituto público, de natureza empresarial, dotado de personalidade jurídica, com autonomia administrativa e financeira e património próprio.

Os artigos 11º, 14º e 17º do mesmo diploma, têm a seguinte redacção:



Artigo 11.°
Enumeração dos órgãos
São órgãos do IVV:
a) O conselho directivo;
b) O conselho consultivo;
c) A comissão de fiscalização.
Na economia da questão colocada, interessa-nos naturalmente e ainda os seguintes artigos;

Artigo 14º
Competências do Conselho Directivo
Compete ao conselho directivo:
a) Dirigir a actividade do IVV com vista à realização das suas atribuições;
b) Elaborar, submeter à aprovação do Ministro da Agricultura e fazer cumprir os regulamentos internos do IVV;
c) Exercer a gestão do pessoal do IVV;
d) Celebrar os contratos necessários à prossecução das atribuições do IVV;
e) Gerir o património do IVV, podendo adquirir, ceder, dar de comodato, alienar ou onerar bens móveis e imóveis e aceitar donativos, heranças ou legados, nos termos da lei geral;
f) Arrecadar as receitas e autorizar a realização de despesas;
g) Elaborar e submeter à apreciação do Ministro da Agricultura os planos de actividades e o orçamento, o relatório e a conta de gerência do IVV;
h) Submeter à aprovação do Ministro da Agricultura a participação do IVV no capital de empresas e gerir tais participações;
i) Representar o IVV em juízo e fora dele, activa e passivamente, podendo transigir, confessar ou desistir em quaisquer litígios, bem como celebrar convenções e arbitragem;
j) Constituir mandatários, conferindo-lhes o poder de substabelecer sempre que necessário e designar representantes do IVV junto de outras entidades;
l) Praticar os demais actos referentes às atribuições do IVV que não sejam da competência de outros órgãos.»

Artigo 17º
Competências do conselho consultivo
«O conselho consultivo tem por função apreciar e dar parecer sobre as matérias que lhe sejam submetidas pelo conselho directivo, nomeadamente no que respeita:
a) Aos planos de actividade do IVV;
b) À situação do mercado do vinho e sua gestão;
c) Às propostas de legislação nacionais e comunitárias;
d) A quaisquer outros assuntos que lhe sejam submetidos pelo presidente ou cuja competência venha a ser-lhe atribuída por lei

Como já dissemos atrás, ao abrigo do disposto no artigo 2.º do Decreto – Lei n.º 560/73, de 26 de Outubro, foi publicada a Portaria n.º 382/93, de 2 de Abril, que veio a estabelecer os valores máximos do selo ou do certificado de garantia, a cobrar pelas entidades certificadoras dos vinhos de mesa regionais, nos seguintes termos:

«1.º Para os vinhos de mesa regionais, o valor do selo ou do certificado de garantia é fixado pelo Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), ouvido o seu conselho consultivo, até ao máximo de 3$00 por cada litro, ou fracção, de vinho acondicionado em recipientes com capacidade igual ou superior a 0,5 l, sendo de metade daquele valor para os recipientes com capacidade inferior a 0,5 l.

2.º Para os vinhos de mesa regionais relativamente aos quais o IVV tenha transferido, mediante protocolo, as suas competências de controlo da produção, certificação e circulação do produto para uma organização interprofissional, o valor máximo a que se refere o número anterior é de 5$00 e fixado por decisão do respectivo conselho geral.». (sublinhado nosso).

Observa-se, na verdade, que a Portaria n.º 382/93, de 2 de Abril, prevê o parecer do Conselho Consultivo do Instituto da Vinha e do Vinho no procedimento tendente à fixação do valor do selo ou do certificado de garantia para os vinhos de mesa regionais «[a]té ao máximo de 3$00 por cada litro, ou fracção, de vinho acondicionado em recipientes com capacidade igual ou superior a 0,5 l, sendo de metade daquele valor para os recipientes com capacidade inferior a 0,5 l.».

Segundo, o PROFESSOR FREITAS DO AMARAL, os pareceres são «atos opinativos elaborados por peritos especializados em certos ramos do saber, ou por órgãos colegiais de natureza consultiva» (Curso de Direito Administrativo, volume II, 2011, 2.ª edição, com a colaboração de PEDRO MACHETE e LINO TORGAL, Almedina, p. 304.).

De harmonia com o artigo 98º do Código do Procedimento Administrativo (CPA) [na redacção pelo DL 442/91, de 15 de Novembro por força do princípio tempus regit actum, acolhido no artigo 12.º do Código Civil, constitui a regra geral de aplicação das leis no tempo e significa que as normas jurídicas têm efeito apenas para o futuro, valendo no direito público e no privado] os pareceres são obrigatórios ou facultativos, conforme a lei imponha ou não a necessidade de eles serem emitidos, e vinculativos ou não vinculativos, conforme a lei imponha ou não a necessidade de as suas conclusões serem seguidas pelo órgão decisório competente.

À luz da distinção legal vertida, não se nos oferece dúvidas, que o parecer referido no artigo 1º da Portaria n.º 382/93, de 2 de Abril é um parecer obrigatório na medida em que existe uma obrigatoriedade da sua solicitação no decurso do procedimento de fixação do valor do selo ou do certificado de garantia para os vinhos de mesa e não vinculativo.

É, aliás esta também a posição do recorrido ao afirmar: «[D]e facto a Portaria 382/93 prevê a audição do Conselho Consultivo, para a fixação das taxas de certificação, requisito que o I.V.V. nunca pôs em causa, conforme expressam a deliberação que fixa a taxa e sua fundamentação.» (fls. 399 dos autos).

E, assim sendo, podemos sem controvérsia afirmar, que encontramo-nos diante um parecer obrigatório mas não vinculativo aparentemente sem caracter de formalidade essencial, dado que a hipotética falta da sua emissão não impediria que o procedimento prosseguisse e obtivesse a decisão final, nos termos do citado artigo 99º, n.º3 do CPA.

Na verdade, a razão de ser da dispensabilidade dos pareceres obrigatórios que não se mostrem emitidos num certo prazo, o que normalmente sucederá em função da inoperacionalidade e não da mera inércia do órgão consultivo, radica na necessidade de protecção dos administrados e da prossecução do interesse público sem delongas, e nunca na subestimação da valia intrínseca de tais pareceres, que de outro modo, não seriam legalmente obrigatórios.

E, tratando-se de parecer não vinculativo, se o órgão decisor com ele não concordar tem de fundamentar as razões da sua discordância, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 124º do CPA.

Na sentença recorrida entendeu-se (bem ou mal, adiante veremos), que tratando-se de parecer obrigatório mas não vinculativo a « [d]ecisão proferida poderia pois ser tomada como foi, sem o procedimento ficasse dependente de uma formalidade impossível de cumprir, por o Conselho Consultivo, a quem incumbia a emissão daquele parecer, não existir.».

A questão em apreço, reconduz-se, consequentemente em apurar qual o efeito jurídico, que assume no caso concreto a falta de parecer obrigatório não vinculativo para a decisão final, in casu, na Deliberação do Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho.

Para tal efeito, importa trazer à colação o artigo 99º, n.º3 do CPA que sob a epígrafe «Forma e prazo dos pareceres» preceitua o seguinte: «Quando um parecer obrigatório e não vinculativo não for emitido dentro dos prazos previstos no número anterior, pode o procedimento prosseguir e vir a ser decidido sem o parecer, salvo disposição legal expressa em contrário.

Trata-se de disposição inovadora no Direito Administrativo Português (em concordância com o princípio da decisão - artigo 9º do CPA-) destinada a explicitar os requisitos e a tramitação dos pareceres. (neste sentido: Diogo Freitas do Amaral, João Caupers, João Martins Claro, João Raposo, Maria da Glória Dias Garcia, Pedro Siza Vieira e Vasco Pereira da Silva Código do Procedimento Administrativo, Anotado, 4ª Edição, 2003, Almedina, em anotação ao artigo 99º do CPA, pág. 187).

Como se lê no sumário do acórdão deste Tribunal Central Administrativo (Secção de Contencioso Administrativo) de 07.11.2001, proferido no processo nº 2103/99: «I - A falta de emissão de um parecer obrigatório e não vinculativo no prazo de 30 dias, não impede a prossecução do procedimento e a prolação da decisão final. II - Todavia, isto não significa que tal parecer se degrade em formalidade não essencial do procedimento. III - Na verdade, a razão de ser da dispensabilidade dos pareceres obrigatórios que não se mostrem emitidos naquele prazo, radica apenas na necessidade de protecção dos administrados e da prossecução do interesse público sem delongas, e nunca na substimação da valia intrínseca de tais pareceres.».

Acontece, porém, que no caso sub judice mostra-se inaplicável o comando do artigo 99º, nº3 do CPA, na medida em que este pressupõe que o pedido de parecer tenha sido efectuado, o que na situação em apreço não se verificou.

É que, conforme já o afirmamos, resulta da matéria assente, que o pedido de parecer não chegou a ser emitido, nem o poderia ter sido feito, pela singela razão da entidade consultada, o Conselho Consultivo do Instituto da Vinha e do Vinho não estar constituído à data em que o procedimento culminou com decisão final, leia-se - Deliberação do Conselho Directivo.

Como escrevem JOSÉ MANUEL BOTELHO, AMÉRICO PIRES ESTEVES, JOSÉ CÂNDIDO DE PINHO que «[t]orna-se necessário que as entidades consultadas tenham existência legal e que, caso de trate de órgão colegiais, o parecer emitido surja na sequência de efectiva observância das regras procedimentos próprias do órgão.» (Código do Procedimento Administrativo, Almedina, 2000, em notação ao artigo 99º, pág. 370).

Portanto, como bem refere a recorrente, cuja posição foi sufragada pelo Ministério Público, estamos perante a inobservância de duas formalidades essenciais, a saber, a não sob a emissão a parecer obrigatório e bem assim a omissão da constituição do órgão emissor do respectivo parecer (as associações que integram o conselho consultivo do IVV, a que aludem as alíneas a) e b) do artigo 16º, n.º1 do Estatuto do Instituto da Vinha e do Vinho -Decreto-Lei n.º 304/86, de 22 de Setembro, e na redacção dada pelo Decreto-Lei n.°102/93, de 2 de Abril- são designadas por despacho do Ministro da Agricultura sob proposta do Presidente do IVV) que redundará na invalidade da Deliberação do Conselho Directivo do I.V.V..

Precisando o efeito jurídico da falta de emissão do parecer, MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO AMORIM explicitam: «Se porém, o parecer não tiver sequer sido emitido, a sua falta já origina invalidade, por vício do procedimento» (Código do Procedimento Administrativo, Vol I, Almedina, 1993, em nota ao n.º3 do artigo 99, pág. 519).

De resto, é esta também a posição da Divisão Jurídica e de Contencioso do recorrido, como ilustra a passagem extraída do parece junto a fls. 355 a 358:«(…) parece-nos que a deliberação do Conselho Directivo do I.V.V. foi tomada com preterição de uma formalidade legalmente prevista parecer do Conselho Consultivo), o que se consubstancia num vicio de forma(…)».

E, mais, disso mesmo, se deu conta, o próprio Conselho Directivo ao lavrar na dita deliberação que «A fixação desta taxa será, posteriormente, sujeita a ratificação do Conselho Consultivo.», o que não veio a ocorrer.

De qualquer modo, a ratificação-sanação constitui um acto secundário que actua sob um acto primário visando suprir a incompetência do seu autor ou outros “vícios não atinentes ao conteúdo do acto, ou seja, as invalidades formais e procedimentais quando estas sejam superáveis (nesse momento post acto)”, sanando o vício ou vícios decorrentes de tais ilegalidades ( Mário Esteves de Oliveira e Outros, CPA Comentado, vol. II, pág. 174 ).

Todavia, se por um lado o Conselho Consultivo não é um órgão decisor, não é menos verdade que, integrando a emissão de parecer a fase procedimental que se situa a montante do acto primário (ratificado), a sanação da falta do parecer pressupõe que se volte à fase à fase procedimental o que só poderá acontecer revogando o acto ratificado - acto final de encerramento do procedimento (cfr. artigo 106º do CPA) (seguimos a doutrina expendida no acórdão do STA de 26.05.2010, proferido no processo n.º 0238/09, que é transponível para o presente caso - disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Do que vimos de dizer, resulta, que estamos em presença de duas formalidades essenciais (os pareceres enquanto actos jurídicos que têm subjacente um juízo valorativo de uma dada realidade, são habitualmente incluídos pela doutrina no domínio das diligências procedimentos de feição instrutória e consultivaneste sentido Pedro Gonçalves, “Apontamentos sobre a função e a natureza dos pareceres vinculantes”, in Cadernos de Justiça Administrativa, n° 0 (novembro/dezembro) pág.3), cujas omissões inquinam a Deliberação do Conselho Directivo de 22 de Junho de 1993 de ilegalidade por vício de forma por preterição de formalidades anteriores à prática do acto, determinando a sua anulabilidade (cfr. artigo 135º do CPA).

De resto, entendemos nós que não é possível afirmar que se verifique alguma das situações de derrogação do princípio da formalidade (princípio geral do aproveitamento do acto administrativo), desde logo, por nos confrontarmos com uma “barreira” intransponível traduzida na omissão da constituição de um órgão que o legislador entendeu fazer parte do procedimento relativo á fixação da taxa dos vinhos regionais. Em todo o caso, não se apresenta manifesto que mesmo sem ter ocorrido a preterição das formalidades identificadas, o quantum da taxa em causa não poderia ser diferente. Com efeito, como dissemos atrás a Portaria n.º 382/93, de 2 de Abril limitou-se a definir o montante máximo da taxa competindo ao I.V.V. fixar o seu montante dentro deste parâmetro ouvido o seu conselho consultivo que integra precisamente, além de outras entidades, os representantes dos produtores e das adegas cooperativas e do comércio de vinhos.

Desde modo, é de declarar a nulidade (cfr. artigo 133º, n.º2, al.i) do CPA) dos actos subsequentes de liquidação na parte que se mostra fixada a taxa específica sobre os vinhos regionais.

E, sendo assim, a sentença não se pode manter, motivo por que, a final, a revogaremos e julgaremos a impugnação judicial procedente, o que tudo determina que fique prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas pela recorrente.

IV.CONCLUSÕES

I. Os pareceres são obrigatórios ou facultativos, conforme a lei imponha, ou não, a necessidade de eles serem emitidos, e são vinculativos, ou não vinculativos, quando a lei imponha, ou não, a necessidade de as suas conclusões serem seguidas pelo órgão decisor competente.

II. O parecer do Conselho Consultivo do Instituto da Vinha e do Vinho, exigido no artigo 1º da Portaria n.º 382/93, de 2 de Abril, é de natureza obrigatória e não vinculativa.

III. No caso dos autos, não logra aplicação o artigo 99º, n.º3 do CPA [diz o preceito: «Quando um parecer obrigatório e não vinculativo não for emitido dentro dos prazos previstos no número anterior, pode o procedimento prosseguir e vir a ser decidido sem o parecer, salvo disposição legal expressa em contrário.»], pela singela razão da entidade consultada não estar constituída à data em que o procedimento culminou com decisão final, corporizada esta na Deliberação do Conselho Directivo de 22 de Junho de 1993, que fixou o montante da taxa aplicável aos vinhos regionais.

IV. A não constituição do Conselho Consultivo do Instituto da Vinho e da Vinha consubstancia um vício gerador de anulabilidade da Deliberação do Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho, enquanto acto final do procedimento.

V. Anulada a Deliberação do Conselho Directivo do Instituto da Vinha e do Vinho é de declarar a nulidade dos actos subsequentes da liquidação da taxa específica sobre os vinhos regionais (cfr. artigo 133º, n.º2, al.i) do CPA).

V.DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar procedente a presente impugnação judicial.

Sem custas por delas, estar isenta a parte que pelo seu pagamento seria responsável.

Registe e notifique.


Lisboa, 9 de Março de 2017.









[Ana Pinhol]


[Jorge Cortês]


[Cristina Flora]