Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1339/10.2BELRA
Secção:CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO
Data do Acordão:11/15/2018
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA (VÍCIO DE “PETITIONEM BREVIS”).
ARTº.615, Nº.1, AL.D), DO C.P.CIVIL. ARTº.125, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO.
NULIDADE DA SENTENÇA DEVIDO A FALTA DE ESPECIFICAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DE FACTO E DE DIREITO.
ARTº.615, Nº.1, AL.B), DO C.P.CIVIL. ARTº.125, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO.
NULIDADES PROCESSUAIS SECUNDÁRIAS.
CONHECIMENTO IMEDIATO DO PEDIDO PREVISTO NO ARTº.113, Nº.1, DO C.P.P.T., É OBRIGATÓRIO.
FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO ADMINISTRATIVO/TRIBUTÁRIO. REQUISITOS.
A FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO ADMINISTRATIVO/TRIBUTÁRIO É QUESTÃO DIFERENTE DA NOTIFICAÇÃO DA FUNDAMENTAÇÃO.
ARTº.100, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO. PRINCÍPIO “IN DUBIO CONTRA FISCUM”.
Sumário:1. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes (cfr.artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil).
2. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma.
3. Nos termos do preceituado no artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil, é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.607, nº.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação.
4. No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário.
5. Abordando as nulidades processuais, dir-se-á que as mesmas consubstanciam os desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder, embora não de modo expresso, uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais (cfr.artº.195, do C.P.Civil), sendo o regime de arguição o previsto no artº.199, do C.P.Civil. No caso dos autos, tratando-se de irregularidade anterior à decisão final, a sua arguição deve ser efectuada junto do próprio Tribunal recorrido, em consonância com o preceituado no citado artº.199, do C.P.Civil. Mais, as irregularidades não qualificadas como nulidades principais ou de conhecimento oficioso (cfr.artº.98, do C.P.P.T.) ficam sanadas com o decurso do prazo em que podem ser arguidas, o que significa que tudo se passa como se elas não tivessem sido praticadas. Por último, se o interessado, além de pretender arguir a nulidade processual, quiser também interpor recurso da decisão que foi proferida, deverá cumulativamente apresentar requerimentos de arguição da nulidade e de interposição de recurso, não podendo fazer a arguição da nulidade neste último.
6. O conhecimento imediato previsto no artº.113, nº.1, do C.P.P.T., é obrigatório, tanto no caso de estar em causa apenas resolução de questões de direito, como no caso de estar em causa também, ou exclusivamente, questões de facto, como se infere da redacção imperativa adoptada no mesmo preceito (“...conhecerá...”). No caso de estar em causa a resolução de questões de facto, o conhecimento imediato não deixa de ser obrigatório, mas a questão de saber se o processo fornece os elementos necessários envolve alguma subjectividade, a mesma que está ínsita na possibilidade de o juiz realizar ou ordenar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade, conforme estatui o artº.13, nº.1, do C.P.P.T. De qualquer modo, só no caso de o juiz entender ser de realizar ou ordenar diligências de prova poderá deixar de conhecer imediatamente do pedido.
7. Tem sido entendimento constante da jurisprudência e da doutrina que determinado acto (no caso acto administrativo-tributário) se encontra devidamente fundamentado sempre que é possível, através do mesmo, descobrir qual o percurso cognitivo utilizado pelo seu autor para chegar à decisão final.
8. Se a fundamentação não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto considera-se não fundamentado (cfr.artº. 125, nº.2, do C.P.Administrativo). Haverá obscuridade quando as afirmações feitas pelo autor da decisão não deixarem perceber quais as razões porque decidiu da forma que decidiu. Por outras palavras, os fundamentos do acto devem ser claros, por forma a colher-se com perfeição o sentido das razões que determinaram a prática do acto, assim não sendo de consentir a utilização de expressões dúbias, vagas e genéricas. Ocorrerá contradição da fundamentação quando as razões invocadas para decidir, justificarem não a decisão proferida, mas uma decisão de sentido oposto (contradição entre fundamentos e decisão), e quando forem invocados fundamentos que estejam em oposição com outros. Por outras palavras, os fundamentos da decisão devem ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida. Por último, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. Em conclusão, a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final.
9. Deve fazer-se a destrinça entre a fundamentação do acto administrativo/tributário e, questão diferente, a notificação da fundamentação, realidades diversas, apenas a primeira constituindo vício de forma determinante da eventual anulabilidade do acto tributário. A mera falta de notificação da fundamentação de um acto de liquidação não gera a invalidade deste, antes dando direito ao sujeito passivo de requerer a notificação da fundamentação ou a passagem de certidão que a contenha (cfr.artº.37, do C.P.P.Tributário).
10. O artº.100, nº.1, do C.P.P.Tributário, constitui uma afloração do princípio “in dubio contra fiscum”, vigente no momento da decisão sobre facto incerto na aplicação da lei e com alcance análogo ao do princípio “in dubio pro reo” no que respeita à apreciação da prova em processo penal. Tal princípio leva a que o interesse substancial da justiça domine o actual processo tributário em detrimento do mero interesse formal ou financeiro do Estado. Este princípio consubstancia uma aplicação no processo de impugnação judicial da regra geral sobre o ónus da prova no procedimento tributário enunciada no artº.74, nº.1, da L.G.T., em que se estabelece que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque. Cânone este também aplicável ao processo judicial tributário. Saber se, perante a prova produzida, há dúvidas sobre a existência ou quantificação de um facto tributário é uma questão essencialmente de facto. Assim, se o Tribunal decidiu dar como provada a existência ou inexistência de um facto tributário não haverá lugar à aplicação desta norma. Só em situações em que não houver a certeza se existe ou não o facto deverá fazer-se aplicação desta regra sobre o ónus da prova, decidindo a questão contra quem tem tal ónus.
11. No caso "sub judice", de acordo com a matéria de facto provada, o recorrente não conseguiu fazer prova que gere dúvida, de qualquer espécie, sobre a defendida ilegalidade dos actos de liquidação objecto dos presentes autos. Como a dúvida sobre a existência do facto tributário tem que resultar de prova produzida, ou seja, é uma questão que só se coloca após a produção de prova, não se pode aplicar, na decisão do presente processo, o mencionado princípio “in dubio contra fiscum”.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
"M…… - IMPORTAÇÃO, COMÉRCIO E EXPORTAÇÃO, L.DA.", com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal, visando sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.124 a 131-verso do presente processo, através da qual julgou totalmente improcedente a impugnação intentada pela sociedade recorrente, tendo por objecto actos de liquidação adicional de I.M.T. e Imposto de Selo, no montante total de € 5.525,37.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.151 a 162-verso dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Conforme resulta de fls., a aqui impugnante, nos termos do disposto nos artigos 102º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, impugnou As Liquidações referentes ao imposto Municipal sobre transmissões Onerosas de Imóveis, no montante de 4.919,85 €, ao Imposto de Selo, no montante de 605,52 €, aos Juros de mora no montante de 49,20 €, às custas, no montante de 60,66 €, aos Juros de mora notificados no montante de 12,12 €, Custas, notificadas no montante de 17,07 €, alegando o que acima se transcreveu;
2-A Fazenda Pública veio apresentar contestação, conforme o que consta a fls.;
3-A impugnante apresentou as alegações;
4-Por sentença de fls. o Meritíssimo Juiz decidiu o acima transcrito;
5-Não se compreende como é possível decidir-se deste modo, dado todas as informações, documentos e posições das partes no processo que deu causa à impugnação;
6-O Meritíssimo Juiz tendo dado como provado os factos sustentados por via da prova documental apresentada, não dispunha dos elementos necessários para a correcta fundamentação de uma decisão nesses termos, porquanto não só desconsiderou a produção de prova testemunhal – diligências probatórias oportunamente requeridas pela ora recorrente – indispensáveis à descoberta da verdade material e à boa decisão da causa, como ignorou o dever de investigação que sob o mesmo impendia por força do princípio do inquisitório;
7-Em face da inexistência nos autos, por força de tal situação, de elementos de prova bastantes com base nos quais possa ser correctamente apreciada a questão da legalidade do valor patrimonial tributário apurado para o imóvel em questão em sede de segunda avaliação, impõe-se a conclusão de que a sentença recorrida padece de um défice instrutório, cumulado com uma insuficiência factual, cujas consequências deverão ser as previstas no artigo 712º, nº 4, do CPC (aplicável ex vi al. e) do artigo 2º do CPPT;
8-Violou o princípio do contraditório, coarctando o seu direito de acesso ao direito, previstos no artigo 3º do Código Civil (aplicável ex vi artigo 45º do CPPT) e artigo 20.º n.º 1 da CRP;
9-O Meritíssimo Juiz violou um princípio básico do direito processual, o do contraditório, não permitindo que ao processo sejam trazidos elementos de forma a decidir-se a causa de acordo com as várias soluções plausíveis ao Direito;
10-Estamos perante uma nulidade processual que é susceptível de afectar os direitos adjectivos e/ou substantivos da recorrente e que importa declarar com as legais consequências, o que desde já e aqui se requer;
11-A avaliação do imóvel teve por base uma realidade diversa da que se verificava ao tempo da transmissão, pelo que deve ser anuladas as liquidações adicionais de IMT;
12-Para efeitos de IMT deve tomar-se em consideração o valor patrimonial tributário do imóvel no estado em que se encontrava na data do ato ou facto translativo, e não na data em que foi realizada a avaliação;
13-O momento relevante para efeitos da constituição e determinação da obrigação da obrigação tributária em sede de IMT é o momento da transmissão;
14-A avaliação não se reporta à realidade dos imóveis aquando do momento de aquisição, momento em que se constitui a obrigação tributária de IMI, mas a uma realidade diferente;
15-A Administração Tributária tomou em consideração uma avaliação realizada sobre uma realidade diferente e liquidou adicionalmente IMT como se os imóveis transmitidos se encontrassem em 26/07/2006 no mesmo estado em que se encontravam a 22/12/2009;
16-A Administração Tributária atendeu para efeitos de liquidação adicional de IMT (imposto cuja função é tributar a riqueza mobilizada pelo adquirente) ao valor patrimonial tributário fixado numa avaliação realizada muito depois da transmissão do prédio adquirido e numa altura em que este já tinha sofrido alterações e melhoramentos;
17-A liquidação adicional de IMT é sindicada com base na ilegalidade por se ter alicerçado num valor tributário fixado em avaliação que se deteve sobre uma realidade diferente daquela que existia à data da transmissão, momento em que se constitui a obrigação tributária de IMT;
18-A recorrente não aceitou os valores das avaliações feitas ao imóvel, tendo impugnado as mesmas;
19-O que está em causa é saber se, para efeitos de liquidação de IMT se pode, atender, como se atendeu, ao valor patrimonial fixado em avaliação efetuada na sequência da apresentação de declaração modelo 1 de IMI e que não considerou o estado em que o imóvel se encontrava à data da sua transmissão onerosa;
20-Sobre esta questão o Meritíssimo Juiz não se pronunciou, pelo que a sentença padece da nulidade de omissão de pronúncia;
21-Nulidade esta que desde já e aqui se requer, com todas as consequências legais daí resultantes;
22-Conforme alegou a recorrente na sua petição inicial, após a aquisição do imóvel, esta procedeu a diversos melhoramentos, nomeadamente: alcatroou o logradouro, puxou a água da rede pública, aumentou a rede eléctrica, vedou com um muro de vedação toda a propriedade, construiu mais barracões pré-fabricados, conseguiu legalizar as instalações junto do Ministério da Economia, o que não estavam anteriormente;
23-O encarregado da avaliação aquando da visita tenha verificado aumento de construção e de alteração do imóvel, e tenha ordenado à recorrente que apresentasse um novo IMI;
24-A liquidação adicional de IMT atendeu a um valor diverso ao que o imóvel detinha à data da transação do mesmo, ou seja, em 2006;
25-Não tendo o Meritíssimo Juiz se pronunciado sobre esta questão, cometeu uma nulidade;
26-Nulidade esta que desde já e aqui se requer a sua apreciação;
27-A liquidação adicional de IMT está ferida de ilegalidade, tendo em conta que atendeu a uma realidade diversa da que existia à data em que ocorreu a transmissão do imóvel;
28-A Autoridade Tributária e o Meritíssimo Juiz não tiveram em conta a realidade do prédio à data em que ocorreu a transmissão do mesmo, e não tiveram em conta o que dispõem as normas legais acima transcritas;
29-Não existem dúvidas que existe erro de interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis ao caso em concreto, por parte dos serviços fiscais e do Meritíssimo Juiz sobre esta questão;
30-Daí ser necessário revogar a sentença de que ora se recorre, o que desde já e aqui se requer;
31-As liquidações impugnadas, bem como os despachos que lhe deram causa, não estão fundamentados tanto de facto e de direito como exige a Lei;
32-O Meritíssimo Juiz ao omitir as formalidades prescritas na lei e, que acima se mencionaram, violou os princípios, do inquisitório, previsto no artigo 58º da LGT, e do contraditório, previsto no artigo 3º do CPC;
33-Dúvidas não existem de que estamos perante uma ilegalidade insanável, violando-se nesta parte o disposto nas alíneas a), c) e d) do artigo 120º do Código do Processo Tributário, e artigo 77º da LGT;
34-Na prova já constante dos autos, verifica-se a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, conforme acima se alegou e já provou;
35-Deveria o Meritíssimo Juiz ordenado a realização da prova testemunhal a fim de averiguar se foram realizados os melhoramentos enunciados pela recorrente, bem como se o valor do imóvel à data da transmissão do mesmo, em 2006, era o mesmo que foi atribuído pela avaliação do mesmo em 2009;
36-Na sentença recorrida não se procedeu a uma correcta interpretação dos elementos constantes dos autos, da prova produzida em sede de audiência de julgamento, bem como se efectuou uma incorrecta interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis ao caso em concreto;
37-Lendo, atentamente, a decisão recorrida, na parte de que se recorre, verifica-se que não se indica nela um único facto concreto susceptível de revelar, informar, e fundamentar, a real e efectiva situação, do verdadeiro motivo da elaboração da sentença final;
38-O (Tribunal) com a decisão recorrida, não assegurou a defesa dos direitos da Alegante, em não fundamentar exaustivamente a sua decisão, e nem se quer aplicar a as normas legais aplicáveis ao caso em concreto;
39-Deixando o Meritíssimo Juiz de se pronunciar sobre algumas questões que são essenciais à boa decisão da causa, nomeadamente as acima expostas;
40-A sentença violou os seguintes artigos:
a) Artigos 100º; 124º e 125, do CPA;
b) Alínea a), 16º; 17º; alíneas a), c) e d) do 120º e 121º, do CPT;
c) Artigos 13º, 20º, 80º, 81º, 99º, 100º, 103º, 104º, 161º, nº 2, 202º, 204º, 205º, 266º; e nº 3, 268º, da CRP;
d) Artigo 37º, 99º, al. c) do CPPT;
e) Artigos 3º, 158º, 201º 668º, nº 1, al.c) e d) do CPC;
41-Termos em que se requer a V. Exas. a REVOGAÇÃO da sentença recorrida, por ser de LEI, DIREITO e JUSTIÇA.
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de se negar provimento ao presente recurso (cfr.fls.185 e 186 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.125 a 127-verso dos autos):
1-Em 26 de Julho de 2006, a sociedade impugnante, "M…. - Importação, Comércio e Exportação, L.da.", com o n.i.p.c. 502 …., apresentou declaração de modelo oficial para efeitos de liquidação de IMT (modelo 1) por “aquisição do direito de propriedade plena sobre imóveis” do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de C….., concelho de Leiria, sob artigo ….. (atual artigo 4….), indicando como valor de aquisição € 150.000,00 e como titular do bem transmitido M……. (cfr. documentos juntos a fls.4, 5 e 9 do processo administrativo apenso);
2-No dia 13 de Setembro de 2006, a impugnante apresentou Modelo 1 do IMI sobre o prédio urbano inscrito na matriz predial de C…. sob artigo …. (cfr.facto admitido por acordo das partes);
3-Na sequência da apresentação da declaração Modelo 1 do IMI referenciada no ponto antecedente, foi efetuada avaliação ao prédio urbano inscrito na matriz predial de C…. sob artigo …., de que resultou um valor patrimonial tributário (VPT) de € 545.610,00 (cfr.documento junto a fls.45 dos presentes autos);
4-O VPT referido no ponto anterior foi notificado a M….. (transmitente do prédio em causa), por ofício n.º 2…./3.ª Secção, datado de 07 de Agosto de 2009 (cfr. documento junto a fls.45 dos presentes autos);
5- Por ofício n.º …., datado de 22 de Dezembro de 2009, a impugnante foi notificada das liquidações de IMT, no valor de € 25.714,65, e de IS, no montante de € 3.164,88, apuradas em resultado da fixação do VPT referido em 3 (cfr.documento junto a fls.47 dos presentes autos);
6-M…… requereu junto do 2º. Serviço de Finanças de Leiria a segunda avaliação do prédio inscrito na matriz predial urbana de C…. sob artigo … (cfr. documento junto a fls.47 dos presentes autos);
7-Em 18 de Janeiro de 2010, depois da comissão de avaliação ter visto o local e analisado o processo, a mesma não procedeu à avaliação do prédio por se ter verificado que “não foi efetuada a primeira avaliação aquando da 1.ª transmissão nos termos da vigência do IMI com base no Modelo 1 apresentado em 2006.09.13” (cfr.documento junto a fls.48 dos presentes autos);
8-Nesta sequência, foi realizada a primeira avaliação, tendo sido fixado ao prédio em questão o VPT de € 240.750,00, comunicada a M…… por ofício n.º ….., datado de 02 de Fevereiro de 2010 (cfr.documento junto a fls.49 dos presentes autos);
9-No dia 03 de Março de 2010, M…….. requereu junto do 2º. Serviço de Finanças de Leiria a segunda avaliação do identificado prédio urbano (cfr.documento junto a fls.50 dos presentes autos);
10-Foi realizada pela comissão de avaliação a segunda avaliação ao referido prédio urbano inscrito na matriz predial de C…. sob artigo ….., descrita na ficha de avaliação n.º 307….., tendo o VPT sido fixado em € 225.690,00, decorrente da aplicação dos seguintes coeficientes:
- Vc (valor base dos prédios edificados): 603,00;
- A (área bruta de construção mais área excedente à área de implantação): 875,4800;
- Ca (coeficiente de afetação): 0,60;
- Cl (coeficiente de localização): 1,00;
- Cq (coeficiente de conforto): 0,950;
- Cv (coeficiente de vetustez): 0,75 (cfr.documentos juntos a fls.51 e 52 dos presentes autos);
11-O termo de avaliação teve o voto de vencido do representante da impugnante, por não concordar com o valor da avaliação (cfr.facto admitido por acordo das partes);
12-A impugnante foi notificada do VPT atribuído ao prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de C…. sob o artigo …. em 2.ª avaliação, por ofício n.º 66……, datado de 27 de abril de 2010, no qual foi discriminada a fórmula de cálculo do VPT “Vt = Vc x A x CA x Cl x Cq x Cv” (isto é, € 225.690,00 = 603,00 x 875,4800 x 0,60 x 1,00 x 0,95 x 0,75) e explicitadas as siglas da equação (cfr.documento junto a fls.51 dos presentes autos);
13-Em resultado da segunda avaliação do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de C…. sob o artigo …., foi emitida, em 17 de Maio de 2010, liquidação adicional de IMT n.º …., incidente sobre a transmissão do referido imóvel declarada no Modelo 1 do IMT (referido em 1.), na qual se apurou imposto a pagar no montante de € 4.919,85, com data limite de pagamento em 30 de Junho de 2010, da mesma tendo sido notificada a sociedade impugnante (cfr.documento junto a fls.41 dos presentes autos; factualidade admitida pela impugnante nos artºs.1 e 2 do articulado inicial);
14-Na sequência da segunda avaliação do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia de C…. sob o artigo …., foi emitida, em 18 de Maio de 2010, liquidação adicional de IS n.º …., incidente sobre a transmissão do referido imóvel declarada no Modelo 1 do IMT (referido em 1.), na qual se apurou imposto a pagar no montante de € 605,52, com data limite de pagamento em 28 de Junho de 2010, da mesma tendo sido notificada a sociedade impugnante (cfr.documento junto a fls.42 dos presentes autos; factualidade admitida pela impugnante no artº.3 do articulado inicial);
15-A presente impugnação judicial foi apresentada junto do 2º. Serviço de Finanças de Leiria em 12 de Agosto de 2010 (cfr.data de entrada aposta a fls.3 dos presentes autos).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “... Inexistem factos não provados, com interesse para a solução da causa, atenta a causa de pedir...”.
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A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto, efetuou-se com base nos documentos e informações oficiais constantes dos autos e do processo administrativo apenso, referidos em cada um dos pontos do elenco da factualidade dada como provada, que não foram impugnados e que, pela sua natureza e qualidade, mereceram a credibilidade do tribunal, em conjugação com a livre apreciação da prova.
De salientar que a matéria apurada constante dos pontos 2. e 11. foi admitida por acordo das partes, conforme consignado naqueles concretos prontos, na exata medida em que foram reconhecidos pela impugnante e pela Fazenda Pública.
A demais matéria não foi aqui considerada por ser conclusiva, de direito ou não relevar para a decisão da causa…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar totalmente improcedente a impugnação pela sociedade recorrente intentada, em virtude do decaimento de todos os fundamentos da mesma, mais mantendo os actos tributários objecto do processo (cfr.nºs.13 e 14 do probatório).
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O apelante aduz, em primeiro lugar e em síntese, que está em causa saber se, para efeitos de liquidação de I.M.T., se pode atender ao valor patrimonial fixado em avaliação efectuada na sequência da apresentação de declaração modelo 1 de I.M.I., a qual não considerou o estado em que o imóvel se encontrava à data da sua transmissão onerosa. Que o Tribunal “a quo” não se pronunciou sobre tal questão, pelo que a sentença recorrida padece de nulidade de omissão de pronúncia (cfr.conclusões 19 a 21, 25 e 26 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar uma nulidade por omissão de pronúncia da decisão recorrida.
Deslindemos se procede a nulidade da sentença suscitada pelo recorrente.
A sentença é uma decisão judicial proferida pelos Tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, no caso posto à sua apreciação, dirimem um conflito de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativo-tributárias. Tem por obrigação conhecer do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto. Esta peça processual pode padecer de vícios de duas ordens, os quais obstam à eficácia ou validade da dicção do direito:
1-Por um lado, pode ter errado no julgamento dos factos e do direito e então a consequência é a sua revogação;
2-Por outro, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e, então, torna-se passível de nulidade, nos termos do artº.615, do C.P.Civil.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/5/2011, proc.4629/11).
Mais se dirá que a sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7119/13; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.122 e seg.).
Trata-se, em qualquer caso, nesta nulidade, de falta de pronúncia sobre questões e não de falta de realização de diligências instrutórias ou de falta de avaliação de provas que poderiam ter sido apreciadas. A falta de realização de diligências constituirá uma nulidade processual e não uma nulidade de sentença. A falta de avaliação de provas produzidas, tal como a sua errada avaliação, constituirá um erro de julgamento da matéria de facto. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e referir se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P. Tributário).
Ainda, a nulidade de omissão de pronúncia impõe ao juiz o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Se o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado e o declara expressamente, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia.
Por último, embora o Tribunal tenha também dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr.artº.608, nº.2, do C.P.Civil), a omissão de tal dever não constituirá nulidade da sentença, mas sim um erro de julgamento. Com efeito, nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso deve significar que o Tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa. Se esta posição for errada, haverá um erro de julgamento. Se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o Tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão. Aliás, nem seria razoável que se impusesse ao Tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias de conhecimento oficioso (cfr.artºs.577 e 578, do C.P.Civil), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no artº.133, nº.2, do C.P.Administrativo (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/5/2003, rec.1757/02; ac.T.C.A.Sul-2.ªSecção, 25/8/2008, proc.2569/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc.3171/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7119/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.365).
Revertendo ao caso dos autos, do exame da decisão do Tribunal “a quo”, principalmente do seu enquadramento jurídico (cfr.fls.127-verso a 131 dos autos), deve concluir-se que foram analisadas e decididas as causas de pedir (questões) estruturadas pelo recorrente na p.i. do presente processo (cfr.articulado junto a fls.27 a 38 dos autos). Especificamente quanto à questão da avaliação do imóvel em causa ter sido efectuada na sequência da apresentação de declaração modelo 1 de I.M.I., mais não tendo levado em consideração o estado em que o imóvel se encontrava à data da sua transmissão onerosa, conforme refere, de forma certeira, o Tribunal “a quo” no despacho de sustentação exarado a fls.180 do processo físico, o resultado da avaliação do imóvel foi objecto de impugnação judicial autónoma, a qual foi julgada totalmente improcedente, mais sendo confirmada por acórdão deste Tribunal exarado no processo nº.6029/12, datado do pretérito dia 22/01/2015 e já transitado, assim nada mais havendo a dilucidar quanto à mesma avaliação (cfr.nº.10 do probatório).
A própria sentença recorrida faz menção ao citado acórdão na sua fundamentação de direito, a fls.128-verso do processo físico.
Em suma, não se vê que a sentença recorrida tenha omitido pronúncia e, nestes termos, devendo improceder este fundamento do recurso.
O recorrente defende, também, que a decisão recorrida não indica um único facto susceptível de revelar, informar e fundamentar a sua elaboração, mais não indicando as normas legais aplicáveis ao caso em concreto (cfr.conclusões 37 e 38 do recurso) com base em tal alegação pretendendo, segundo percebemos, consubstanciar um vício de nulidade da sentença recorrida, devido a falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil, é nula a sentença, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.607, nº.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.139 a 141; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.687 a 689; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36).
No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, norma onde estão consagrados todos os vícios (e não quaisquer outros) susceptíveis de ferir de nulidade a sentença proferida (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.357 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.871/10; ac.S.T.A-2ª.Secção, 13/10/2010, rec.218/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/5/2013, proc.6406/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13).
Voltando ao caso concreto, no que se refere à fundamentação de facto e de direito da decisão recorrida, conforme exarado acima ela existe, sendo que o vício que consubstancia esta nulidade consiste na falta de fundamentação absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente.
Concluindo, a decisão do Tribunal “a quo” não padece da nulidade acabada de examinar, assim se julgando improcedente também este esteio do recurso.
Aduz, igualmente e em sinopse, o recorrente que o Tribunal "a quo" não dispunha dos elementos necessários para a correcta fundamentação da decisão que tomou, porquanto não só desconsiderou a produção de prova testemunhal - diligências probatórias oportunamente requeridas pelo ora recorrente - indispensáveis à descoberta da verdade material e à boa decisão da causa, como ignorou o dever de investigação que sob a mesma impendia por força do princípio do inquisitório. Que em face da inexistência nos autos, por força de tal situação, de elementos de prova bastantes com base nos quais possa ser correctamente apreciada a questão da legalidade do valor patrimonial tributário apurado para o imóvel em questão em sede de segunda avaliação, impõe-se a conclusão de que a sentença recorrida padece de um défice instrutório, cumulado com uma insuficiência factual, cujas consequências deverão ser as previstas no artº.712, nº.4, do C.P.C. Que também violou o princípio do contraditório, coarctando o direito de acesso ao direito, previsto no artº.3, do C.Civil, e no artº.20, nº.1, da C.R.P. Que estamos perante uma nulidade processual que é susceptível de afectar os direitos adjectivos e/ou substantivos do recorrente e que importa declarar com as legais consequências (cfr.conclusões 6 a 10, 32 e 35 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, segundo percebemos, a existência de uma nulidade processual no âmbito dos presentes autos.
Examinemos se o processo padece de tal vício.
Abordando as nulidades processuais, dir-se-á que as mesmas consubstanciam os desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder, embora não de modo expresso, uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais (cfr.artº.195, do C.P.Civil; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/5/2013, proc.6393/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 13/2/2014, proc.7308/14; Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág.176; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.79).
As nulidades de processo que não sejam de conhecimento oficioso têm que ser arguidas, em princípio, perante o Tribunal que as cometeu (cfr.artºs.196 e 199, do C.P.Civil). São as nulidades secundárias, com o regime de arguição previsto no artº.199, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6.
Neste caso, tratando-se de irregularidade anterior à decisão final, a sua arguição deve ser efectuada junto do próprio Tribunal recorrido, em consonância com o preceituado no citado artº.199, do C.P.Civil. Mais, as irregularidades não qualificadas como nulidades principais ou de conhecimento oficioso (cfr.artº.98, do C.P.P.T.) ficam sanadas com o decurso do prazo em que podem ser relevadas, o que significa que tudo se passa como se elas não tivessem sido praticadas. Por último, se o interessado, além de pretender arguir a nulidade processual, quiser também interpor recurso da decisão que foi proferida, deverá cumulativamente apresentar requerimentos de arguição da nulidade e de interposição de recurso, não podendo fazer a arguição das ditas nulidades neste último (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/5/2013, proc. 6018/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.6971/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 13/2/2014, proc.7308/14; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.86 e seg.).
Por outro lado, deve recordar-se que a norma do artº.113, nº.1, do C.P.P.T., impõe o conhecimento imediato do pedido com cariz obrigatório, tanto no caso de estar em causa apenas a resolução de questões de direito, como no caso de estar em causa também, ou exclusivamente, questões de facto, como se infere da redacção imperativa adoptada no nº.1, deste artº.113 (“...conhecerá...”). Estando em causa a resolução de questões de facto, o conhecimento imediato não deixa de ser obrigatório, mas a questão de saber se o processo fornece os elementos necessários envolve alguma subjectividade, a mesma que está ínsita na possibilidade de o juiz realizar ou ordenar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade, conforme estatui o artº.13, nº.1, do C.P.P.T. De qualquer modo, só no caso de o juiz entender ser de realizar ou ordenar diligências de prova poderá deixar de conhecer imediatamente do pedido (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/5/2013, proc.6393/13; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 14/5/2013, proc.6018/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc. 6971/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 13/2/2014, proc.7308/14; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.249 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, e apesar de tudo o acabado de mencionar, analisados os fundamentos da impugnação que originou o presente processo, tem este Tribunal de concordar com a constatação efectuada em 1ª. Instância de que, levando em consideração que a matéria é integrada por factos a provar por documentos, pelo que nenhuma produção de prova testemunhal é necessária (cfr.despacho exarado a fls.80 e 81 dos presentes autos).
Mais se deve vincar que as partes foram notificadas do aludido despacho exarado a fls.80 e 81 dos presentes autos não tendo reagido ao mesmo (cfr.fls.82 e 83 do processo).
Atento o referido, não se verifica qualquer nulidade processual secundária no âmbito do presente processo, assim não padecendo a decisão recorrida de qualquer vício de violação de lei.
Por último, sempre se dirá que não vislumbra este Tribunal que tenham sido violados no âmbito do presente processo o princípio do contraditório (cfr.artº.3, nº.3, do C.P.Civil) e o direito de acesso ao direito previsto no artº.20, da C.R.P., tal como que padeça a decisão recorrida de qualquer défice instrutório, o qual implique a aplicação do disposto no actual artº.662, do C.P.Civil (aplicável "ex vi" do artº.2, al.e), do C.P.P.T.).
Sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente também este esteio do recurso.
Aduz, também e em síntese, o recorrente que as liquidações impugnadas, bem como os despachos que lhe deram causa, não estão fundamentados de facto e de direito como exige a lei (cfr.conclusão 31 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida, tudo em virtude da falta de fundamentação das liquidações que constituem objecto do presente processo.
Vejamos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
A fundamentação dos actos tributários ou “praticados em matéria tributária” que “afectem os direitos ou interesses legalmente protegidos dos contribuintes” estava consagrada nos artºs.19, al.b), 21, 81 e 82, do C.P.Tributário (cfr.actualmente o artº.77, da L.G.Tributária).
Tal necessidade de fundamentação decorria já, quer do artº.1, nº.1, al.a) e c), do dec.lei 256-A/77, de 17 de Junho, quer do próprio artº.268, nº.3, da C. R. Portuguesa, na redacção introduzida pela Lei Constitucional nº.1/89 (cfr.Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1993, pág.936 e seg.; Vieira de Andrade, O Dever de Fundamentação Expressa dos Actos Administrativos, 1990, pág.53 e seg.).
A fundamentação é um conceito relativo que pode variar em função do tipo legal de acto administrativo que estamos a examinar.
Tem sido entendimento constante da jurisprudência e da doutrina que determinado acto (no caso acto administrativo-tributário) se encontra devidamente fundamentado sempre que é possível, através do mesmo, descobrir qual o percurso cognitivo utilizado pelo seu autor para chegar à decisão final (cfr.ac.S.T.J.26/4/95, C.J.-S.T.J., 1995, II, pág.57 e seg.; A. Varela e outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª. edição, 1985, pág.687 e seg.; Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1984, V, pág.139 e seg.). Quer dizer. Utilizando a linguagem de diversos acórdãos do S.T.A. (cfr.por todos, ac.S.T.A-1ª.Secção, 6/2/90, A.D., nº.351, pág.339 e seg.) o acto administrativo só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto acto (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto. Mais se dirá que a fundamentação pode ser expressa ou consistir em mera declaração de concordância de anterior parecer, informação ou proposta, o qual, neste caso, constitui parte integrante do respectivo acto (é a chamada fundamentação “per relationem” - cfr.artº.125, do C.P.Administrativo).
Se a fundamentação não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto considera-se não fundamentado (cfr.artº. 125, nº.2, do C.P.Administrativo, então em vigor). Haverá obscuridade quando as afirmações feitas pelo autor da decisão não deixarem perceber quais as razões porque decidiu da forma que decidiu. Por outras palavras, os fundamentos do acto devem ser claros, por forma a colher-se com perfeição o sentido das razões que determinaram a prática do acto, assim não sendo de consentir a utilização de expressões dúbias, vagas e genéricas. Ocorrerá contradição da fundamentação quando as razões invocadas para decidir, justificarem não a decisão proferida, mas uma decisão de sentido oposto (contradição entre fundamentos e decisão), e quando forem invocados fundamentos que estejam em oposição com outros. Por outras palavras, os fundamentos da decisão devem ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida. Por último, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. Em conclusão, a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final (cfr.Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol.I, Almedina, 1991, pág.477 e seg.; Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol.II, Almedina, 2001, pág.352 e seg.; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária Anotada e comentada, 4ª. Edição, 2012, pág.675 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/12/2008, proc.2606/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/11/2009, proc.3510/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/3/2011, proc.4489/11).
Ainda, deve fazer-se a destrinça entre a fundamentação do acto administrativo /tributário e, questão diferente, a notificação da fundamentação, realidades diversas, apenas a primeira constituindo vício de forma determinante da eventual anulabilidade do acto tributário (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 9/9/99, rec.23773; ac.S.T.A-2ª.Secção, 4/2/2009, rec.889/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/1/2012, proc.4966/11).
No caso “sub judice”, os actos tributários objecto do presente processo encontram-se devidamente fundamentados, tendo sido levado ao conhecimento do impugnante/ recorrente as razões da sua estruturação (cfr.nºs.12 a 14 da matéria de facto provada).
Por outro lado, se acaso não se considerava devidamente esclarecido da fundamentação dos actos tributários objecto do presente processo, deveria o recorrente ter feito uso do dispositivo constante do artº.37, nº.1, do C.P.P.Tributário.
Por último, recorde-se que a alegada falta de fundamentação da avaliação do imóvel, a qual originou a emissão das liquidações impugnadas, foi objecto de impugnação judicial autónoma, a qual foi julgada totalmente improcedente, mais sendo confirmada por acórdão deste Tribunal já transitado, assim nada mais havendo a dilucidar quanto à mesma avaliação, tudo conforme aludido supra.
Face ao exposto, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente também este fundamento do recurso, assim se confirmando a decisão do Tribunal "a quo" neste segmento.
Defende o apelante, ainda e em sinopse, que a avaliação do imóvel teve por base uma realidade diversa da que se verificava ao tempo da transmissão, pelo que devem ser anuladas as liquidações adicionais impugnadas (cfr.conclusões 11 a 18, 22 a 24 e 27 a 30 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, se bem percebemos, mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão objecto do presente recurso sofre de tal pecha.
Mais uma vez, se deve lembrar que as eventuais ilegalidades da avaliação do imóvel, a qual originou a emissão das liquidações impugnadas, foram objecto de impugnação judicial autónoma, a qual foi julgada totalmente improcedente, sendo confirmada por acórdão deste Tribunal já transitado, assim nada mais havendo a dilucidar quanto à mesma avaliação, tudo conforme aludido supra.
Apesar disso, sempre se dirá que no citado acórdão exarado no processo nº.6029/12, datado do pretérito dia 22/01/2015 e já transitado, consta o seguinte excerto:
“Ora, conforme se retira da factualidade provada os actos de avaliação levados a efeito foram reportados precisamente à data de 13/9/2006, sendo esse o motivo por que se deu sem efeito a primeira avaliação do imóvel urbano em causa, visto não se ter levado em consideração a declaração modelo 1 apresentada na citada data (cfr.nº.5 do probatório). Mais se constata que a posterior 1ª. e 2ª. avaliações levadas a efeito em 19/01/2010 e 21/4/2010 (cfr.nºs.6 e 8 da factualidade provada) se reportaram precisamente à data de 13/9/2006, data esta que consta expressamente dos elementos documentais da 1ª. avaliação (cfr.documento junto a fls.26 do procedimento de 2ª. avaliação apenso), sendo que o termo da 2ª. avaliação se reporta à data da 1ª. avaliação (cfr.documento junto a fls.36 do procedimento de 2ª. avaliação apenso).
E não poderia ser outra a data a que se reporta a avaliação do imóvel urbano em causa, visto que, independentemente do tempo que demore o procedimento de avaliação dos imóveis, certo é que o seu resultado, enquanto definidor do valor patrimonial dos imóveis, terá efeitos reportados ao facto gerador da obrigação de avaliação, no caso a entrega da declaração modelo 1 em 13/9/2006 (cfr.artº.37, nº.4, do C.I.M.I.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/11/2014, proc.8013/14).
Concluindo, não têm razão os recorrentes no que se refere ao vector da data a que se reporta a avaliação do imóvel em causa nos autos.”
Face ao exposto, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente também este fundamento do recurso.
Alega, ainda, o recorrente que da prova já constante dos autos se verifica a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário (cfr.conclusão 34 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo, supõe-se, consubstanciar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
Se bem percebemos, os apelantes defendem a violação do princípio "in dubio contra fiscum" consagrado no actual artº.100, nº.1, do C.P.P.T. (cfr.anterior artº.121, nº.1, do C.P.Tributário).
O preceito referido constitui uma afloração do princípio “in dubio contra fiscum”, vigente no momento da decisão sobre facto incerto na aplicação da lei e com alcance análogo ao do princípio “in dubio pro reo” no que respeita à apreciação da prova em processo penal. Tal princípio leva a que o interesse substancial da justiça domine o actual processo tributário em detrimento do mero interesse formal ou financeiro do Estado (cfr.Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Almedina, 1972, pág.158; Soares Martínez, Direito Fiscal, 8ª. edição, 1996, pág.133 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.267; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 29/11/95, rec.19247, Apêndice ao D.R., 14/11/97, pág.2800 e seg.; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 13/12/95, B.M.J. 452, pág.315 e seg.).
Este princípio consubstancia uma aplicação no processo de impugnação judicial do cânone geral sobre o ónus da prova no procedimento tributário enunciada no artº.74, nº.1, da L.G.T., em que se estabelece que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque. Cânone este também aplicável ao processo judicial tributário.
Saber se, perante a prova produzida, há dúvidas sobre a existência ou quantificação de um facto tributário é uma questão essencialmente de facto. Assim, se o Tribunal decidiu dar como provada a existência ou inexistência de um facto tributário não haverá lugar à aplicação desta norma. Só em situações em que não houver a certeza se existe ou não o facto deverá fazer-se aplicação desta regra sobre o ónus da prova, decidindo a questão contra quem tem tal ónus (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 14/1/2004, rec.1480/03; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/3/2012, proc.1103/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/3/2014, proc.7188/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2014, proc.7546/14; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.134).
No caso concreto, de acordo com a matéria de facto provada, o impugnante/recorrente não conseguiu fazer prova que gere dúvida, de qualquer espécie, sobre a defendida ilegalidade dos actos de liquidação objecto dos presentes autos (cfr.nºs.13 e 14 da matéria de facto provada). Como a dúvida sobre a existência do facto tributário tem que resultar de prova produzida, ou seja, é uma questão que só se coloca após a produção de prova, não se pode aplicar, na decisão do presente processo, o mencionado princípio “in dubio contra fiscum”.
Sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente também este esteio do recurso.
Por último, o recorrente chama à colação a alegada violação de um extenso rol de preceitos legais e constitucionais, alguns deles nem sequer estando já em vigor (cfr.a sentença violou os seguintes artigos:
a) Artigos 100º; 124º e 125, do CPA;
b) Alínea a), 16º; 17º; alíneas a), c) e d) do 120º e 121º, do CPT;
c) Artigos 13º, 20º, 80º, 81º, 99º, 100º, 103º, 104º, 161º, nº 2, 202º, 204º, 205º, 266º; e nº 3, 268º, da CRP;
d) Artigo 37º, 99º, al. c) do CPPT;
e) Artigos 3º, 158º, 201º 668º, nº 1, al.c) e d) do CPC;
Quanto a esta pretensa violação de preceitos legais e constitucionais, o recorrente não concretiza, minimamente, essas violações, sendo que já se afirmou que a decisão recorrida não padece de qualquer nulidade, não se vislumbrando em que termos foram colocados em crise os preceitos citados, a não ser com referência ao facto de a decisão recorrida ter sido desfavorável ao apelante. Este Tribunal também não vislumbra tais alegadas violações, assim estando o presente esteio do recurso condenado ao insucesso.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente também o presente esteio do recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 15 de Novembro de 2018



(Joaquim Condesso - Relator)


(Ana Pinhol - 1º. Adjunto)



(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)