Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05335/12
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:11/20/2012
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL.
IRC.
ASSOCIAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS.
TRIBUTAÇÃO AUTÓNOMA.
DESPESAS CONFIDENCIAIS.
CUSTOS FISCAIS.
Sumário:1.Uma associação sem fins lucrativos mas que exerce um actividade isenta de imposto e outra a tal sujeita, encontra-se sujeita a IRC e encontra-se sujeita a dispor de contabilidade regularmente organizada que abranja todas as suas actividades;

2. A tributação autónoma relativa a despesas confidenciais, então previstas no art.º 4.º do Dec-Lei n.º 192/90, apenas tem lugar quando não são especificados ou identificados os respectivos beneficiários, desconhecendo-se a natureza, origem e finalidade de tais encargos assumidos;

3. Se a AT, na respectiva liquidação adicional, nem sequer invocou a existência destes pressupostos, tal liquidação é ilegal;

4. Não pode considerar-se um custo fiscal duma entidade sem fins lucrativos, as despesas de aquisição de bens de consumo e outros, cujos destinatários se não conhecem, de molde que não seja possível subsumir se tais aquisições se destinaram a alcançar o seu objecto social de acção social.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. A Exma Representante da Fazenda Pública (RFP), dizendo-se inconformada com a sentença proferida pelo M. Juiz Administrativo e Fiscal de Leiria, na parte que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por Associação ………………………………….., veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


A) Vem impugnada a liquidação de IRC do ano de 2000, resultante da desconsideração como custos dos valores registados na "conta 6484 - custos com pessoal - outros custos com o pessoal" e da respectiva tributação autónoma, nos termos conjugados dos artigos 23°/1 e 41°/1-alínea h), ambos do CIRC e do art. 4.º/2 do Decreto-Lei n.º 192/90, de 9 de Junho.
B) Em sede de IRC, a impugnante goza de isenção nos rendimentos provenientes das suas actividades culturais, recreativas e desportivas {art. 11° do respectivo código), desenvolvendo, contudo, outras actividades sujeitas a tributação e auferindo rendimentos provenientes de publicidade e da exploração de um bar a funcionar num complexo desportivo.
C) Em sede de acção inspectiva realizada foi detectada na "conta 6484 - custos com o pessoal - outros custos com o pessoal” a contabilização de diversos documentos (facturas e talões de compra, sem identificação do adquirente ou com identificação de terceiros), que titulavam a aquisição de diversos bens de consumo com finalidades e em quantidades que se revelavam incompatíveis com as actividades desenvolvidas pela inspeccionada, sendo corrigido o IRC do ano de 2000 em conformidade, por se considerar que as despesas apresentadas não eram adequadas para a titulação do tipo de custos onde se encontravam relevadas (conta 6484), para além de que os documentos em causa não cumpriam o requisito da necessária indispensabilidade entre os custos e a obtenção dos "proveitos" acolhido no art.º 23º do CIRC (designadamente, a aquisição de artigos de decoração, brinquedos, produtos de cosmética e higiene, bebidas alcoólicas, lingerie, etc.).
D) Efectivamente, para os custos possam ser considerados impõe-se comprovar a sua efectiva existência e, igualmente, comprovar a sua indispensabilidade e o nexo causal com os ganhos obtidos.
E) Tendo a AF demonstrado a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação, passava a recair sobre a impugnante o ónus de demonstrar a verificação de erro sobre a respectiva existência, quantificação e indispensabilidade, o que não foi conseguido.
F) A impugnante não conseguiu carrear prova documental relativa aos meios de pagamento das importâncias contabilizadas, nem se pode considerar ter efectuado tal prova através do depoimento das testemunhas inquiridas, dado que estas detinham relações profissionais com a impugnante, situação que lhes ministra, ou é susceptível de ministrar, interesse e que compromete a total isenção dos depoimentos prestados.
G) Por outro lado, mesmo que se aceitasse que os montantes referidos nos documentos passados em nome da impugnante e contabilizados na "conta 6484 - custos com pessoal" se referiam a bens por si adquiridos e a despesas por incorridas, sempre restaria um vazio probatório quanto ao destino ou o fim específico de tais bens e despesas, no sentido de concluir que os mesmos foram indispensáveis para a realização dos ganhos ou para a manutenção da fonte produtora.
H) Sendo sobre a impugnante que recaia esse ónus probatório, falhada tal demonstração, a decisão sob recurso deveria ter desconsiderado como custos os valores contabilizados na conta 6484, uma vez que a lei fiscal prevê que a dedutibilidade do custo dependa da atinente comprovação e indispensabilidade (art. 23°/1 do CIRC) e que os encargos não devidamente documentados não sejam dedutíveis - art. 41°/1-alinea h) do CIRC.
I) Ao não decidir assim, por erro de julgamento, a douta sentença sob recurso não pode manter-se por deficiente avaliação da matéria de facto e desacertada aplicação do direito ­artigos 23° e 41°/1-h) do CIRC.

Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de Vossas Ex.as, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, com o que se fará como sempre JUSTIÇA.


A Exma Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser concedido provimento ao recurso, por a recorrida não ter logrado provar que tais custos desconsiderados pela AT se insiram na sua actividade normal de molde a serem custos fiscais.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se as despesas suportadas pela ora recorrida relativas à sua conta 6484 devem ser tributadas autonomamente, como despesas não documentadas ou confidenciais; E se as despesas da mesma conta não devem ser consideradas como custo fiscal do exercício do ano de 2000.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório o M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
1. A impugnante exerce a actividade de Acção Social sem alojamento, CAE 85324.
a. Encontra-se isento de IRC para os rendimentos das actividades Culturais, Recreativas e Desportivas;
b. Também desenvolve actividades sujeitas a tributação: transporte escolar, distribuição de refeições em escolas, tempos livres e apoio escolar, bem como os rendimentos provenientes de publicidade e da exploração de um bar nas piscinas do Belo Horizonte.
2. Foi submetida a fiscalização referente ao exercício de 2000 no âmbito da qual foi elaborado o relatório junto a fls. 82 e segs. cujo conteúdo se dá por reprodu­zido.
3. A fiscalização permitiu verificar que existem diversos documentos (facturas do C………………, talões de Supermercado, facturas de alimentação e facturas de aqui­sição de vestuário) que titulam a aquisição de bens de consumo (alimentação e outros produtos cuja quantidade e finalidade nada podem ter a haver com as actividades desenvolvidas pelo Sujeito Passivo, nomeadamente fraldas, cuecas, leite em pó para bebe, boiões de fruta para bebes, cosméticos), roupas e produtos de higiene íntima registados contabilisticamente nas contas 6483 e 6484.
4. Aos factos descritos acresce também as seguintes situações:
a. Algumas despesas encontram-se tituladas por talões (nos quais não se encontra identificado o adquirente)
b. Outras documentos identificam um adquirente que não o Académico de Leiria nomeadamente o Sr. Acácio …………………..
c. Existem ainda documentos de aquisição de roupas, tanto de bebe (PreNa­tal) como de adulto (Benetton, Haga, Jacinto Atoalhados, Modas Lena, Fetal, Sport Zone, etc.), roupa íntima (Noivas D. Dinis, Pérola do Lar Texteis);
d. Para além da roupa existem também outras compras em lojas como a Tribe, e produtos como barbies, pensos evax, cuecas c/renda, camarões, tudo em facturas do C…………., I……………. ou U…………….. (pp. 5 do relatório cujo conteúdo se dá por reproduzido).
5. As despesas consideradas «encargos não documentados», foram as seguintes:
Alimentação Funcionários (6483): 6.100.384$
Outros (6484): 29.074.416$.
6. De que resultou uma colecta por tributação autónoma no montante de 21.104.880$
7. A impugnante exerceu o direito de audição, nos termos que constam de fls. 90 e segs. cujo conteúdo se dá por reproduzido.
8. Em consequência do que foram retirados da tributação autónoma as despesas registadas na Conta 6483, no montante de 6.100.384$, e mantidas as restantes correcções.
9. A impugnante efectuava pagamentos a colaboradores mediante a apresentação dos documentos de compra dos produtos por estes adquiridos, nomeadamente peças de roupa, produtos de supermercado e outras, sendo que no caso dos toxi­codependentes em recuperação estes são acompanhados nas compras.
10. A impugnante desenvolve actividades no âmbito de Férias de Movimento para Jovens, campos de Férias, acampamentos e parcerias com o Instituto de Empre­go e Formação Profissional, além de outras entidades.

FACTOS NÃO PROVADOS.
Com interesse para a decisão da causa nada mais se provou.

MOTIVAÇÃO. A convicção do tribunal baseou-se nos seguintes meios de prova:

PROVA DOCUMENTAL.
Os meios de prova documental que serviram para a convicção do tribunal estão referidos no «probatório» com remissão para as fls. do processo onde se encontram.
PROVA TESTEMUNHAL.
Quanto a este meio de prova, relevaram os depoimentos das testemunhas arrola­das pela impugnante que confirmaram, no essencial, os factos alegados. O «mapa» de fls. 63 e 64 correspondente aos pagamentos efectuados pela impugnante no ano de 2000, o que foi confirmado por Luís ……………. e Acácio ………………………….; embora estas testemunhas tenham confirmado os pagamentos em causa, não se pode aceitar que as despesas com cosméticos, uísque, barbies, camarões e vinho integrem custos da impug­nante, tal como definido no Art.º 23 do CIRC, para mais tendo as características da isenção de que goza. Também os talões sem identificação do adquirente, ou as facturas ou documentos titulados em nome de outrem, que não a impugnante, não merecem inte­grar os custos da impugnante, pois embora a testemunha Acácio ………………….. tenha adiantado que só «por lapso as facturas não iam em nome do clube ou da impugnante». não foi feita prova suficiente de que os bens descriminados nesses talões ou facturas foram entregues à impugnante. Acresce que tendo em conta todas as aquisições, mani­festamente a impugnante excedeu-se em despesas que não se integram no âmbito do objecto social que ditou a sua isenção, razão por que a prova de que os talões sem indi­cação do adquirente, ou as facturas emitidas em nome de terceiro se destinavam à impugnante e à prossecução dos seus objectivos sociais deveria ter sido efectuada de forma mais convincente. E não foi.
As testemunhas da AF confirmaram o conteúdo do relatório.


4. Para julgar procedente a impugnação judicial e na parte em que o foi e sobre que versa o presente recurso, considerou o M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que as despesas incorridas constantes da citada conta n.º6484 (29.074.416$), não podem ser qualificadas como de despesas confidenciais, por lhes faltar o requisito da falta de fundamento do gasto e do seu destinatário, enquanto que as mesmas devem também ser qualificadas como de custos fiscais, mercê da prova efectuada, mas apenas quanto às constantes de fls 63 e 64 do autos, e nestas, com excepção das relativas a cosméticos, uísque, barbies, camarões e vinho, por estas não se revelarem indispensáveis para a prossecução da sua actividade.

Para a recorrente Fazenda Pública, de acordo com a matéria das conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto, é contra este entendimento do M. Juiz do Tribunal “a quo”, perfilhado na sentença recorrida que vem a esgrimir argumentos tendentes a este Tribunal proceder ao seu reexame em ordem a sobre ela ser emitido um juízo de censura conducente à sua revogação, pugnando que a ora recorrida não logrou provar os reais destinatários de tais bens adquiridos, nem mesmo pela prova testemunhal produzida, que de resto, por terem relações profissionais com a impugnante é susceptível de comprometer a isenção dos depoimentos prestados, sendo que sempre restaria a falha de prova de quem foram os reais beneficiários de tais bens de molde a concluir-se que as despesas incorridas com os mesmos eram indispensáveis para a realização dos ganhos ou para a manutenção da fonte produtora.

Vejamos então.
Desde logo convém frisar que a ora recorrida constitui uma associação de solidariedade social, exercendo uma actividade de acção social sem alojamento e também, concomitantemente, exercendo uma actividade sujeita a tributação, como seja o transporte escolar, a distribuição de refeições em escolas, a publicidade, etc., sendo que os custos contabilizados e desconsiderados como custos fiscais e tributados autonomamente, aqui em causa, se reportam à actividade isenta, quer por não se mostrarem devidamente documentados, quer por não se revelarem adequados aos fins prosseguidos pela mesma, tendo em conta a sua natureza e quantidade, sendo certo encontrarem-se os rendimentos directamente derivados do exercício de actividades culturais, recreativas e desportivas isentas de IRC, nas condições previstas no n.º2 do art.º 10.º do CIRC (redacção e numeração de então, em 2000), onde abrangia a obrigação de possuírem contabilidade organizada, abrangendo todas as suas actividades, pelo que nestes casos os custos fiscais elegíveis têm de ter em conta este especial objecto social da mesma, sendo-lhe aplicáveis as disposições relativas às pessoas colectivas previstas nos art.ºs 157.º e segs do Código Civil, tal como às sociedades, onde avulta, o princípio da especialidade, o qual limita a sua capacidade de exercício de direitos aos necessários ou convenientes à prossecução dos seus fins estatutários.

A noção do que sejam despesas de carácter confidencial ou não documentadas, face às normas então vigentes dos art.ºs 41.º, n.º1, alínea h) do CIRC e 4.º, n.º1, do Dec-Lei n.º 192/90, de 9 de Junho, na redacção então vigente em 2000, com a sua tributação então, em 60%, tem tido um sentido e alcance que a jurisprudência dos nossos tribunais superiores tem vindo a firmar, enquanto conceito positivamente não determinado, como no acórdão deste TCAS, proferido no recurso n.º 5284/12 (1), e que para aqui se aporta enquanto discurso fundamentador do presente, onde nele se escreveu:
(...)
Assim, em termos factuais, o que dos autos ressume, é que a ora recorrente vendeu tal prédio urbano por € 95.759,58, valor que fez contabilizar neste exercício de 2000, mas para a caixa da sociedade só entrou metade deste montante, pelo que a outra metade não se sabe a quem foi atribuído, sendo que o tratamento fiscal que a mesma lhe deu foi o de transferir apenas 50% desse valor para as contas bancárias da sociedade, desta forma tendo esta ficado “desfalcada” dos restantes 50%, muito embora tenha sido com a totalidade desse montante que foi apurado o lucro tributável do exercício, nos termos do art.º 17.º do CIRC, assim funcionando tal montante como uma despesa ou um encargo.

Nos termos das Notas explicativas ao POC, a conta Caixa inclui as disponibilidades imediatas e as aplicações de tesouraria de curto prazo, como os meios de pagamento, tais como notas de banco e moedas metálicas de curso legal, cheques e vales postais, nacionais ou estrangeiros, pelo que tendo feito transitar para esta conta caixa apenas 50% do valor em causa, o incremento patrimonial para a sociedade apenas se traduziu nesses 50%, que não pela sua totalidade.

Nos termos do disposto no art.º 41.º, n.º1, alínea h) do CIRC, na redacção e numeração de então, não constituem custos do exercício os encargos de não devidamente documentados e as despesas de carácter confidencial, sendo que estes ainda se encontravam sujeitos a tributação autónoma, nos termos do disposto no art.º 4.º do Dec-Lei n.º 192/90, de 9 de Junho, a taxas que vieram a variar ao longo dos anos, tendo ao longo dos anos da vigência do CIRC sido perfeitamente delimitada a materialidade fáctica subsumível a tal norma por via jurisprudencial, como no acórdão de 28-1-2009, do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, no recurso n.º 575/08, onde se qualificaram aqueles como sendo os que, não são especificados ou identificados, quanto à sua natureza, origem e finalidade, doutrina que também tem sido seguida por este TCAS, nas decisões proferidas sobre tal matéria (2), e que também por nós tem sido seguida, como iremos seguir no presente caso, já que nenhum argumento foi avançado ou se nos suscite, que nos levem a rejeitá-la.

Assim, face à matéria constante nos pontos 5., 7. e 19. (segunda entrada), bem como à não provada, já referida, relativa à não prova de que os 50% referidos tenham entrado na caixa social, em anos anteriores, como «Adiantamentos de Clientes», pelo que não se mostra provado tal requisito invocado pela ora recorrente e sobre que assentava a sua defesa contra tal liquidação, logo, a liquidação consequente, não pode padecer de erro sobre o preenchimento de tal pressuposto, que assim tem de continuar não anulada, como bem se decidiu na sentença recorrida.
(...)

No caso, como do relatório do exame à escrita flui, contido, na sua parte relevante, na matéria dos pontos 3. e 4. do probatório da sentença recorrida, concretamente do seu ponto I-2 e III, a fundamentação para tal liquidação estribou-se apenas em “A fiscalização permitiu verificar que existem diversos documentos (facturas do C……………, talões de Supermercado, facturas de alimentação e facturas de aqui­sição de vestuário) que titulam a aquisição de bens de consumo (alimentação e outros produtos cuja quantidade e finalidade nada podem ter a haver com as actividades desenvolvidas pelo Sujeito Passivo, nomeadamente fraldas, cuecas, leite em pó para bebe, boiões de fruta para bebes, cosméticos), roupas e produtos de higiene íntima registados contabilisticamente nas contas 6483 e 6484...”, no fundo, exprimindo a ideia contida no mesmo relatório, naquele ponto I-2, Descrição sumária das conclusões da acção de inspecção, de despesas não devidamente documentadas, o que há luz de tal jurisprudência corrente se afigura insuficiente para o efeito, já que, desde logo, enquanto fundamentação formal, deveria tal liquidação ser arrimada a que tais montantes se desconhecia qual a natureza, origem e finalidade, das respectivas utilizações, nada tendo vindo a invocar que estes requisitos ocorriam no caso, para desta forma puderem ser subsumíveis em tais despesas confidenciais e logo, sujeitas a tal tributação autónoma.

Por outro lado, como consta da matéria contida no ponto 4. do probatório da sentença recorrida, a existência de alguns desses requisitos encontra-se verificada pela própria Inspecção Tributária, como seja a natureza e origem de parte das aquisições que originaram tais custos, na generalidade bens de consumo corrente e as respectivas aquisições em supermercados, face aos seus descritivos que a fiscalização não colocou em causa, sempre aqueles requisitos de falta de conhecimento da origem e natureza, se não alcançam, embora sempre falte saber quem foram os seus beneficiários, ou seja, a quem os mesmos se destinaram, pelo que, nos termos supra, nos termos em que se entendeu que tal conceito deve ser preenchido, os respectivos pressupostos, na sua generalidade, não logram verificados, pelo que foi ilegal a referida tributação autónoma, bem tendo, por isso, sido anulada pela sentença recorrida, a qual assim, nesta parte, não é merecedora da censura que a recorrente lhe pretende assacar.


Mas o presente recurso abarca ainda a mesma verba da conta 6484, nesta outra vertente em que foi desconsiderada como um custo fiscal, na parte em que a impugnação ora foi julgada procedente, para além de tais despesas não serem aptas a figurarem como custos na rubrica onde constavam – outros custos com pessoal – carecerem de prova da sua indispensabilidade para a obtenção dos proveitos, à luz do art.º 23.º do CIRC, onde o M. Juiz do Tribunal “a quo”, considerou que foi feita a prova das pessoas beneficiárias de tais bens de consumo (pessoas carenciadas e outros apoios sociais), por referência às listas elaboradas pela ora recorrida, constantes de fls 63 e 64 dos autos.

A norma do art.º 23.º do CIRC (3), enquanto qualifica a noção de custos ou perdas, encontra-se especialmente direccionada para as sociedades comerciais e entes equiparados, todos eles visando a obtenção do lucro no exercício da sua actividade, pelo que não poderá ser aplicada no caso, sem as devidas adaptações para uma associação que não prossegue tais fins lucrativos, mas sim o de bem fazer, a ajuda a pessoas carenciadas, pelo que aqui a noção de custo fiscal elegível deve ser operado com a aquisição de bens aptos a este seu objecto social e a sua efectiva entrega ou destino à prossecução desta sua finalidade.

No caso, a parte em que a impugnação judicial foi julgada procedente, destes custos, embora o M. Juiz do Tribunal “a quo”, tenha fundamentado que a ora recorrida logrou provar quem foram as pessoas beneficiárias destas despesas, por referência às citadas listas de fls 63 e 64 dos autos, da autoria da ora recorrida, o certo é que do probatório da sentença recorrida não vimos tal matéria como provada, sendo certo que a constante do seu ponto n.º9, pelos seus dizeres, apenas se poderá interpretar como as despesas pagas pela ora recorrida, directamente, aos seus colaboradores por compras por estes efectuadas, em seu próprio nome, o que não é caso destas aqui em causa, as quais se reportam às despesas constantes de facturas passadas à ora recorrida, pelos vendedores dos bens, constantes de fls 147 e segs, emitidas pelo C……………, M…………., M……………., etc., cujos destinatários desses bens se ignoram quem tenham sido, bem podendo delas terem sido beneficiários, quer pessoas carenciadas, no desenvolvimento do seu escopo associativo, ou quaisquer outras, fora do mesmo, pelo que não se mostra assente que tais despesas ou custos suportados pela ora recorrida, tenham ocorrido dentro do fim para que esta foi criada para que assim se pudesse considerar um seu custo isento de IRC, faltando-lhe pois, a demonstração da relação de causalidade entre a assunção desses custos na realização do interesse da sua actividade de acção social, atento o seu objecto social, à semelhança aliás, do que acontece com as entidades que tem por objecto o lucro, o qual constitui o farol de guia para aferir dessa relação, no caso, substituído pelo seu fim de acção social para o mesmo efeito, tendo em vista apurar tal escopo legal.

E tal prova nem seria difícil de lograr alcançar pela ora recorrida, bastando-lhe ter junto os documentos das pessoas beneficiárias de tais bens de consumo, que certamente as mesmas outorgarão quando lhes são fornecidos os bens, ou ter junto a prova das pessoas que pela mesma são reconhecidas como carenciadas e a que presta apoio social, ou ainda, ter feito a prova testemunhal atinente, matéria que a mesma articulou nos art.ºs 21.º e segs da sua petição inicial de impugnação judicial, mas que não vimos como provada no probatório fixado na sentença recorrida e nem vimos dos autos vimos qualquer outra prova atinente, pelo que a sentença recorrida que em contrário decidiu não se pode manter, tendo de ser revogada, com a procedência do recurso nesta parte.


Procede assim, em parte, a matéria das conclusões das alegações do recurso sendo de lhe conceder parcial provimento e de revogar a sentença recorrida na parte correspondente.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em conceder parcial provimento ao recurso e em revogar a sentença recorrida na parte em que julgou procedente a impugnação quanto à liquidação que teve por base a desconsideração dos custos fiscais da conta 6484, mantendo-se a mesma no remanescente do decidido.


Custas pela recorrente na medida do decaimento, sendo na 1.ª instância por ambas as partes, igualmente na medida do decaimento.


Lisboa, 20 de Novembro de 2012
Eugénio Sequeira
Joaquim Condesso
Lucas Martins (vencido quanto às despesas tuteladas autonomamente, na consideração de que o não conhecimento dos beneficiários as caracteriza como despesas confidenciais)

(1) Que igualmente teve por Relator o do presente.
(2) Cfr. neste mesmo sentido os acórdãos deste TCAS de 25-3-2003, de 15-6-2005 e de 24-4-2007, recursos n.ºs 7236/02, 563/05 e 1611/07, respectivamente, tendo aqueles dois primeiros como relator o do presente.
(3) Quanto à noção de custo elegível, cfr. entre outros, o acórdão deste TCAS, recurso n.º 5.307/12, que igualmente teve por Relator o do presente.