Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04234/10
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:07/10/2015
Relator:CREMILDE MIRANDA
Descritores:SISA; AQUISIÇÃO DE PRÉDIO PARA REVENDA; CADUCIDADE DA ISENÇÃO.
Sumário:I. Nos termos dos arts. 11º n.º 3, e 16º n.º 1, do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto Sobre as Sucessões e Doações, a isenção de imposto de que beneficiam as aquisições de prédios para revenda caduca se aos mesmos não for dado aquele específico destino no prazo de três anos (DL n.º 91/89, de 27.03 );

II. Não pode, assim, beneficiar daquela isenção a parte dos prédios, adquiridos para revenda, cedida à Câmara Municipal em processo de loteamento.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

T…..- I………., S.A., inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação adicional de Imposto de Sisa, de que foi notificado pelo ofício nº14008, de 15.11.2001, do Serviço de Finanças de Oeiras -1, vem interpor recurso concluindo as suas alegações nos seguintes termos:


«1ª. A sentença recorrida enferma de erro de julgamento e viola por errada interpretação e aplicação os artigos 11°/3, 13°-A e 16°/1 do CIMSISSD, ao decidir que a recorrente perdeu a isenção de sisa ao não vender os metros quadrados de terreno que foi forçada a ceder para passeios, estradas e zonas verdes no âmbito da operação de loteamento urbano, apesar de ter revendido a totalidade dos lotes de terreno do prédio adquirido para revenda.

2ª. A aquisição de prédios para revenda, por quem exerça normal e habitualmente a actividade de comprador de prédios para revenda, beneficia da isenção de sisa constante do art.11º°/3 do CIMSISSD, desde que não se verifique nenhuma das condições previstas no art.16°/1 do mesmo diploma legal, ou seja desde que aos referidos prédios não seja dado destino diferente, que os mesmos não sejam revendidos dentro do prazo de três anos ou o forem novamente para revenda;

3ª. A ratio legis subjacente ao art.11º/3 do CIMSISSD reside na opção legislativa pela sujeição dos ganhos obtidos na actividade de revenda de prédios à disciplina do Código do IRS ou IRC, tributação que é, nesse caso, mais perfeita que a que resultaria da sisa, pois entra em linha de conta com os proveitos e custos respectivos, procurando atingir o lucro real, ao que acresce que os prédios adquiridos para revenda fazem parte do lucro permutável da empresa (mercadorias) e não do seu imobilizado (capital), o que aponta para a sua tributação como rendimento e não como transmissão de capital;

4ª. A aquisição de um prédio rústico com isenção nos termos do art.11°/3 do CIMSISSD, posterior loteamento e venda dos lotes resultantes não conduz à perda da referida isenção, por não configurar destino diferente da revenda, referida no art.16°/1 do CIMSISSD (cfr. Ofício- Circular D-2/91, de 17 de Junho de 1991, da Direcção Geral de Contribuições e Impostos).

5ª. Contrariamente ao pressuposto na decisão recorrida, o objecto da isenção é a realidade "prédio", como bem contabilizado no activo permutável do transmitente, e independentemente das alterações físicas ou jurídicas que venha a sofrer, pelo que, o que importa para efeitos da isenção constante dos art.s 11°/1 e 16°/1 do CIMSISSD é que esta realidade PRÉDIO seja revendida no prazo de três anos.

6ª. A caducidade da isenção só é justificável quando o prédio não seja revendido no prazo de três anos ou afecto a destino diferente da revenda por acto voluntário do adquirente, pelo que se a área de terreno do prédio for diminuída por razões involuntárias (v. g. expropriação), subtraídas da autonomia da vontade do proprietário, não haverá lugar ao pagamento de sisa.

7ª. A revenda do prédio loteado implica o registo da autorização de loteamento, surgindo tantas descrições prediais como os lotes constituídos, enquanto os m2 de terreno cedidos são integrados automaticamente no domínio público, não sendo objecto de registo predial e portanto inexistindo como prédios, pelo que no caso vertente o que importa apurar é se foram revendidos todos os lotes resultantes da operação de loteamento promovida sobre o prédio adquirido com isenção nos termos do art.11º/1 do CIMSISSD.

. A não subsunção ao conceito de revenda para efeitos dos artigos 11°/1 e 16.0/1 do CIMSISSD, das cedências de áreas de terreno que obrigatoriamente são feitas no âmbito de operações de loteamento incidentes sobre prédios adquiridos para revenda, ofende os princípios da coerência do sistema e da igualdade e da justiça fiscal, já que situações substancialmente iguais são objecto de diferentes regimes de tributação não existindo fundamento válido para tal diferenciação.

9ª. Os artigos 11.°/3, 13.°-A e 16°/1 do CIMSISSD, interpretados no sentido perfilhado na sentença recorrida, são materialmente inconstitucionais por violação do princípio da justiça e da igualdade (v. arts. 13.° e 104°/3 da Constituição da República Portuguesa).

10ª. A decisão recorrida enferma de erro de julgamento, pois ao contrário do pressuposto, não existe disposição legal que autorize que o apuramento da matéria colectável para efeitos de liquidação de imposto de sisa, possa ser feito através de uma operação aritmética de apuramento do peso percentual, no valor total de um prédio transmitido, dos metros quadrados da parte desse prédio destinados a passeios, estradas, jardins.

11ª. A avaliação de uma parcela de terreno em sede de sisa deve atender ao respectivo destino, não sendo lícito avaliar m2 de terreno destinados a infra-estruturas urbanísticas, v.g. espaços verdes ou redes viárias, pelos mesmos valores que são avaliados m2 de terreno para construção.

NESTES TERMOS, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, com as legais consequências».

Não foram apresentadas contra-alegações.


Neste Tribunal, a Digna Magistrada do Ministério Público pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.



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Questões a decidir:


- Se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento e viola, por errada interpretação e aplicação, os artigos 11°, nº 3, 13°-A e 16°, nº 1, do CIMSISSD;

- Se os artigos 11.°, nº 3, 13.°- A e 16°, nº 1, do CIMSISSD, interpretados no sentido perfilhado na sentença recorrida, são materialmente inconstitucionais por violação do princípio da justiça e da igualdade.


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Na sentença recorrida julgaram-se provados os seguintes factos:


«a) A ora Impugnante, T……… - I…………, SA, encontra-se colectada pela actividade de Compra e Venda de Bens Imobiliários, CAE 70120 - Cfr. documento a fls. 17 do PAT, apenso aos autos;

b) Por escritura notarial lavrada em 20/03/95 no Cartório Notarial de Oeiras, a ora Impugnante adquiriu a Vasco …………….., o prédio rústico denominado " S……………. e P…………….", com a área de 2644 m2, sito no E……….., freguesia e concelho de Oeiras, descrito na 1a Conservatória do Registo Predial de Oeiras sob o n°….. da referida freguesia, e na matriz rústica sob o artigo …, da Secção ……, com o valor tributável de 19.228$00, com destino a revenda, beneficiando, no acto, da isenção do imposto municipal de sisa, nos termos do n°3 do artigo 11° do Código do Imposto Municipal de Sisa -Cfr. documentos a fls. 39 a 42 do PAT apenso aos autos;

c) O prédio rústico referido em b), foi objecto de alvará de loteamento, através do qual foi autorizada a constituição de 3 lotes de terreno para construção urbana com área total de 1.230 m2 - Cfr, documentos a fls. 43 a 50 do PAT, apenso aos autos;

d) Os três lotes referidos na alínea anterior foram revendidos pela Impugnante -Cfr. documentos a fls. 26 a 38 do PAT, apenso aos autos;

e) À parcela do terreno referido em b), com a área sobrante de 1.414 m2, na qual se incluem, de acordo com o Alvará de Loteamento, 1189 m2 que foram cedidos ao Município de Oeiras, procedeu a Administração Fiscal (AF) à liquidação de sisa em virtude de terem deixado de se cumprir os requisitos legais previstos no n°3 do artigo 11° em conjugação com o artigo 16° do CIMSISSD - Cfr. documentos a fls. 54 a 58 do PAT apenso aos autos;

f) Por ofício datado de 22/10/2001 foi a Impugnante notificada para efectuar o pagamento de imposto municipal de sisa e juros compensatórios no valor total de Esc. 10.397.075$00, no prazo de 10 dias contados do termo do prazo de 8 dias fixado para o exercício do direito de audição - Cfr. documento a fls. 58, o qual se dá aqui por integralmente reproduzido;

g) Em 29/10/2001 a Impugnante deu entrada na Repartição de Finanças de Oeiras de requerimento no âmbito do direito de audição prévia - Cfr. documento a fls.64 do PAT apenso aos autos;

h) Por ofício datado de 15/11/2001 foi a Impugnante notificada do despacho que recaiu sobre o requerimento referido em g), que manteve o teor do projecto de decisão - Cfr. documento a fls. 70 do PAT apenso aos autos;

i) Em 13 de Fevereiro de 2002 deu entrada a presente Impugnação Judicial - Cfr. carimbo aposto no rosto da p.i. a fls. 2.».


Quanto ao julgamento da matéria de facto, exarou-se, ainda, na Sentença recorrida:


Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.
A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados resultou do exame dos documentos, não impugnados, e das informações oficiais constantes dos autos, conforme referido no probatório.


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Quanto à questão de saber se sentença recorrida enferma de erro de julgamento por violação dos artigos 11°, nº 3, 13°-A e 16°, nº 1, do CIMSISSD

O n° 3 do art. 11° do CIMSISD, em vigor à data dos factos, isentava do pagamento de imposto de Sisa as aquisições de prédios para revenda em determinadas condições, nos seguintes termos:

3 - As aquisições de prédios para revenda, nos termos do artigo 13°-A, desde que se verifique ter sido apresentada antes da aquisição a declaração prevista no artigo 105° do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou na alínea

a) do n° 1 do artigo 94° do Código do Imposto sobre o Rendimentos das Pessoas Colectivas (IRC), consoante o caso, relativa ao exercício da actividade de comprador de prédios para revenda.

Os termos do art. 13º-A do CIMSISD eram os seguintes:

A isenção prevista no n.º 3.º do artigo 11.º não prejudica a liquidação e pagamento da sisa, nos termos gerais, salvo se se reconhecer que o adquirente exerce normal e habitualmente a actividade de comprador de prédios para revenda.

1.º Para efeitos do disposto na parte final do corpo deste artigo, considera-se que o contribuinte exerce normal e habitualmente a actividade quando comprove o seu exercício do ano anterior mediante certidão passada pela repartição de finanças competente, devendo constar sempre daquela certidão se, no ano anterior, foi adquirido para revenda ou revendido algum prédio antes adquirido para esse fim.

2.º Quando o prédio tenha sido revendido sem ser novamente para revenda, no prazo de três anos, e haja sido paga a sisa, esta será anulada pela repartição de finanças, a requerimento do interessado, acompanhado de documento comprovativo da transacção.

O n° 1 do artigo 16° do mesmo Código dispunha:

As transmissões de que tratam os nºs 3º, 8º, 9º e 12º, alínea a), 26º, 30º e 31º do artigo 11º e n° 7 do artigo 12°, deixarão de beneficiar de isenção logo que se verifique, respectivamente:

1° Que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda; (...)

Resulta dos citados normativos que, à data dos factos, ficavam isentas do pagamento de SISA as aquisições de imóveis para revenda mas que a isenção caducava nos casos em que ao prédio adquirido para revenda fosse dado destino diferente.

Assim os interpretou a sentença recorrida e, com base no facto, assente, de que a liquidação de Sisa impugnada incidiu sobre a cedência à Câmara Municipal de parcela de terreno adquirido para revenda, com isenção de Sisa, decidiu que, tendo sido dada a referida parcela destino diferente da revenda, é de manter a liquidação impugnada.

Alega a Recorrente, em síntese, que a não subsunção ao conceito de revenda para efeitos dos artigos 11°, nº 1 e 16, nº 1, do CIMSISSD, das cedências de áreas de terreno que obrigatoriamente são feitas no âmbito de operações de loteamento incidentes sobre prédios adquiridos para revenda, ofende os princípios da coerência do sistema e da igualdade e da justiça fiscal, já que situações substancialmente iguais são objecto de diferentes regimes de tributação não existindo fundamento válido para tal diferenciação. Mas não se compreende como possa uma operação de cedência ser considerada revenda. Trata-se, efectivamente, como entendeu a sentença recorrida, de situação em que o destino da parcela em causa deixou de ser a revenda.

No sentido de que a cedência, gratuita, à Câmara Municipal, de parcela de terreno adquirido pra revenda preenche o requisito negativo de isenção de SISA, previsto no art. 16º, nº 1, do CIMSISSD (destino diferente da revenda), pronunciou-se o Supremo Tribunal Administrativo em todos os recursos interpostos de casos idênticos, como nos processos referidos no parecer do Ministério Público, a fls. 57 (acórdãos de 13-10-93, 06-10-99 e 04-10-2000, nos processos 015334, 023831 e 024998) e, ainda, entre outros, nos acórdãos de 20-05-96, 19-10-2003 e de 16-11-2011, nos processos 0894/03 e 0303/11.

Escreveu-se no Acórdão de 19-10-2003, processo 0894/03, acima citado: (…) quanto a esta questão, tem vindo a ser uniformemente afirmado pela jurisprudência do STA, que a eventual cedência gratuita à Câmara Municipal de parcelas daqueles prédios ou alguns deles, em processo de loteamento em que se incluam e de que dependa o respectivo alvará de licenciamento municipal, consubstancia destino diverso daquele que a lei elege para conferir a dita isenção (cfr., neste sentido, os acs. desta Secção do STA, de 13/10/93, rec. nº 15.334; de 6/10/99, rec. nº 23.831; de 4/10/2000, rec. nº 24.923; de 4/10/2000, rec. nº 24.998; de 8/3/2001, rec. nº 24.757; de 29/10/2003, rec. nº 0894/03; de 12/11/2009, rec. nº 0888/09; de 18/11/2009, rec. nº 0891/09). Isto porque, a expressão “ transaccionados “ contida na redacção original do referido art. 16º do CSisa tem de ser entendida como reportada, apenas, ao “acto de venda”, com exclusão de todo e qualquer outro acto que não revista aquela natureza.

Não se encontram motivos para divergir da jurisprudência assim firmada, pelo é de julgar improcedente a questão da violação, pela sentença recorrida, dos artigos 11°, nº 3, 13°-A e 16°, nº 1, do CIMSI

Quanto à alegada inconstitucionalidade material dos artigos 11.°, nº 3, 13.°- A e 16°, nº 1, do CIMSISSD, interpretados no sentido perfilhado na sentença recorrida

Alega a Recorrente que os artigos 11.°, nº 3, 13.°- A e 16°, nº 1, do CIMSISSD, interpretados no sentido perfilhado pela sentença recorrida são materialmente inconstitucionais por violação dos princípios da justiça e da igualdade, mas não concretiza tal violação, que este Tribunal não vislumbra, pelo que, igualmente, é de julgar improcedente esta questão.

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Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao Recurso, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

10 de Julho de 2015


Cremilde Abreu Miranda

Joaquim Condesso

Catarina Almeida e Sousa