Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:122/18.1BELSB
Secção:CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO
Data do Acordão:11/08/2018
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:PRÉ-CONTRATUAL
EFEITO DO RECURSO
QUESTÃO NOVA
AMPLIAÇÃO
PREÇO ANORMALMENTE BAIXO
DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:i) O recurso de decisão proferida em acção de contencioso pré-contratual, tem efeito suspensivo (art. 143.º, nº 1, do CPTA).

ii) O tribunal pode alterar o efeito-regra dos recursos, nos termos do disposto dos n.ºs 3 e 4, (apenas) desde que “a atribuição de efeito meramente devolutivo ao recurso é recusada quando os danos que dela resultariam se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua não atribuição, sem que a lesão possa ser evitada ou atenuada pela adoção de providências adequadas a evitar ou minorar esses danos” (n.º 5).

iii) Vindo formulado no recurso interposto pedido condenatório, consubstanciado numa indemnização por danos alegadamente sofridos, sem ter sido tal matéria antes invocada ou debatida, essa arguição constitui questão nova, a qual, enquanto tal, está vedada a este tribunal de recurso conhecer.

iv) Os recursos são meios para obter o reexame das questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do tribunal de que se recorre.

v) Mesmo a entender-se que a indemnização agora peticionada configura uma ampliação do pedido inicial, também este se mostra nesta sede inadmissível, face ao estatuído nos artigos 63.º do CPTA e 265.º do CPC. O autor, mesmo sendo a ampliação o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo, só pode ampliá-lo (ou reduzi-lo) até ao encerramento da discussão em 1.ª instância.

vi) De acordo com o disposto no artigo 47.º do CCP, o preço base é o preço máximo que a entidade adjudicante se dispõe a pagar pela execução de todas as prestações que constituem o seu objecto, incluindo as eventuais renovações.

vii) E nos termos do artigo 97.º do CCP, no preço contratual, ou seja, no preço a pagar pela entidade adjudicante, em resultado da proposta adjudicada, pela execução de todas as prestações que constituem o objecto do contrato, deverá estar incluído o preço a pagar na sequência de qualquer prorrogação contratualmente prevista, expressa ou tácita, do respectivo prazo.

viii) O conceito de preço anormalmente baixo não se relaciona com cada um dos elementos componentes do preço.

ix) O dever legal de fundamentação deve responder às necessidades de esclarecimento do destinatário, informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do respectivo acto permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito que determinaram a sua prática.

x) No caso em apreço é inequívoco que esse dever de fundamentação se encontra cumprido, constando da motivação da decisão final, como provado, a identificação das propostas apresentadas, a explicitação clara da análise que é efectuada das mesmas e a sua avaliação, considerando os critérios e fórmula de avaliação previamente definidos nas peças do procedimento.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

............................................................................, S.A. (Recorrente), interpôs recurso jurisdicional da sentença de 3.07.2018 do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que julgou improcedente a acção de contencioso pré-contratual intentada por aquela contra o ........................................., I.P. (Recorrido), sendo contra-interessadas ..................................., S.A. e .........................................................................., S.A., onde havia peticionado que: (i) Se declare como não válida, por ilegal, a proposta apresentada pela ............, aqui contra-interessada, por clara violação do disposto no CCP; (ii) Se anule a decisão de adjudicação da proposta à ............; (iii) se Adjudique à Autora ............ por fundamentada e isenta de ilegalidades, o serviço objecto do procedimento concursal anunciado com o nº 6284/2017, "Aquisição de serviços de comunicações e locação de equipamentos para o Ministério do Trabalho Solidariedade e Segurança Social".

As alegações de recurso que apresentou culminam com as seguintes conclusões:

A. O Tribunal a quo efectuou erros na aplicação do Direito aos factos;

B. Tendo realizado errada subsunção dos mesmos;

C. Defendendo, inversamente ao plasmado legalmente e pelo Tribunal de Contas, que o preço base é dos 4 anos de Contrato, quando o programa expressamente prevê que o preço base se reporte a 3 anos;

D. Interpretou erradamente a questão dos preços unitários, quando refere que aqueles se reportam anualmente, quando existe expresso acréscimo durante a vigência do contrato;

E. O Tribunal considerou irrelevante a violação do CE, quando aquele expressamente prevê a apresentação de valores com 4 (quatro) casas decimais, permitindo a alteração das peças do procedimento, o que é ilegal!

F. E não apreciou a ilegalidade do Relatório Final, escudando-se na percepção do Homem Médio ser suficiente para a legalidade do aludido relatório...

G. Sendo que a Recorrida Contrainteressada ............ tem de ser excluída por violação do disposto nos termos da alínea e) do nº 2 do artigo 72°,

H. Aplicável por força da alínea o) do nº 2 do artigo 146°, ambos do CCP, por apresentar um preço total anormalmente baixo para a vigência do contrato, cujos esclarecimentos justificativos não tenham sido apresentados;

I. Por violação do art.º 300° do CCP, pois não tendo as peças de Procedimento referido expressamente a possibilidade de revisão de preços, nos termos expressos pelo legislador no supra referido artigo, aqueles não podiam ser revistos, como foram;

J. Pelo que a proposta da Recorrida Contrainteressada ............ tem de ser excluída nos termos e para os efeitos da alínea f) do nº 2 do artigo 70°, aplicável por força da alínea o) do nº 2 do artigo 146°, ambos do CCP;

K. E por violação dos Princípios Gerais da Contratação Pública, nos termos legais supra mencionados

Pelo que, nestes termos e nos melhores de Direito, que V. Exas., Venerandos Desembargadores, Doutamente suprirão, deve o presente Recurso ser julgado procedente e, consequentemente,

(i) Declarar-se como não válidas, por ilegal, a proposta apresentada pela ............:

(ii) Declarar-se como única proposta válida a da ............, que cumpre os requisitos legais e regulamentares;

(iii) Anulando-se a decisão de adjudicação da proposta à ............;

(iv) Substituindo-se pela adjudicação à Autora, .............

(v) Revogando-se a Sentença recorrida do Tribunal a quo;

(vi) Ser a Ré condenada a pagar à Autora uma indemnização pelos danos sofridos com a admissão e adjudicação da proposta da ............ e da correspondente não adjudicação da proposta da ............ - no montante que a Autora se encontra a apurar, correspondente aos valores que esta deixou de obter, pela não adjudicação, atendendo ao período contratual em causa.

O Recorrido, ........................................., S.A., apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção da sentença recorrida e suscitando a questão de não conhecimento dos pedidos de indemnização e de declaração da validade da proposta da Recorrente, por serem questões novas não submetidas à apreciação do Tribunal a quo.

A CONTRA-INTERESSADA ..................................., S.A., apresentou contra-alegações, que culminam com as seguintes conclusões:

a) A sentença recorrida não enferma de nulidade por omissão de pronúncia no que concerne à alegada ilegalidade da fundamentação do relatório final, na medida em que a petição inicial não foi devidamente instruída ou é sequer elucidativa quanto às normas legais que aquele relatório teria infringido e, em todo o caso, sempre a sentença se teria pronunciado sobre as questões pertinentes em sede de apreciação dos vícios imputados à proposta apresentada pela .............

b) A Recorrente não observou o ónus que sobre si impendia de, nos termos do princípio do dispositivo, fundar a sua pretensão de direito, não estando reunidas as condições para que o tribunal se pudesse pronunciar sobre os vícios de que padeceria o relatório final, desde logo por este observar integralmente a lei e as peças do procedimento e não se descortinar qualquer normal legal ou regulamentar que pudesse ter sido violada.

c) Os argumentos invocados pela Recorrente quanto à alegada invalidade do relatório final retomam as alegações quanto à suposta ilegalidade da proposta da ............, pelo que, tendo aqueles sido devidamente analisados e preteridos pelo tribunal a quo a propósito da análise daquela proposta, sempre teria sido assegurada essa pronúncia e, sem conceder, suprida qualquer eventual irregularidade da sentença.

d) Sem conceder, o tribunal a quo analisou as questões em contenda quanto ao relatório final e, na sentença recorrida, referiu expressamente que o relatório final está fundamentado de facto e de direito, pelo que sempre ficaria prejudicada a arguição de uma nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

e) A jurisprudência é unânime quanto aos critérios de aferição do cumprimento do dever de fundamentação de um ato, sustentando uma avaliação casuística da sua suficiência e adequação em função do tipo concreto de cada ato e das circunstâncias concretas em que é praticado, mediante a adoção de um critério prático que consiste na indagação sobre se um destinatário normal, face ao itinerário cognoscitivo e valorativo constante do ato, fica em condições de saber o motivo que levou a decidir num sentido e não noutro.

f) A sentença recorrida não merece qualquer censura quanto aos critérios em que assentou o juízo proferido sobre o relatório final, que cumpriu plenamente o dever de fundamentação, estando nele patente a transparência e objetividade da análise e avaliação das propostas apresentadas, em especial, no que respeita aos elementos de caráter objetivo em contenda: preço da proposta e forma de apresentação dos preços unitários ou especificados.

Sem prejuízo,

g) O preço base global do procedimento, tal como definido nas peças do procedimento e em consonância com as disposições legais aplicáveis, abrange o período de vigência inicial e sucessiva do contrato, incluindo, neste caso, o período de duração inicial do contrato, de três anos, e o período de eventual renovação por um ano adicional.

h) O preço base global foi concretamente definido pela Entidade Adjudicante como preço máximo que esta se dispôs a pagar pela execução de todas as prestações que constituem o objeto do contrato, incluindo eventuais renovações, assumindo-se, ainda, como preço de referência para o apuramento dos limites da anormalidade do preço proposto.

i) O preço anormalmente baixo estabelecido pela Entidade Adjudicante assenta num preço base global que pressupõe a consideração do período de vigência inicial e sucessiva do contrato, contemplando os três anos de vigência inicial e a possível renovação do contrato.

j) A proposta de preço apresentada pela ............ não constitui uma proposta de preço anormalmente baixo, compreendendo no preço global proposto o preço indicado para o período de vigência inicial do contrato e para o período da sua eventual renovação, como decorria e era exigido pelas peças do procedimento.

k) Nenhum erro de subsunção dos factos ao direito ou erro de aplicação de direito poderá ser atribuído à decisão recorrida, que fez a única e correta interpretação possível das disposições legais e regulamentares em causa, atendendo ao circunstancialismo concreto deste concurso.

l) A renovação por um ano está expressamente prevista nas peças do procedimento, como a possibilidade de prolongar a vigência do contrato através da reconstituição do seu complexo originário, por um período de vigência sucessiva, mantendo-se as prestações objeto do contrato tal como o mesmo foi, inicialmente, celebrado.

m) O preço global da proposta da ............, em coerência com o determinado nas peças do procedimento, considerou o período de vigência inicial de três anos e a renovação do contrato por um ano adicional, desta forma acautelando as exigências da Entidade Adjudicante e precavendo a totalidade de custos em que esta poderá incorrer durante todo o período de duração do contrato.

n) A decisão de adjudicação da proposta apresentada pela ............ não enferma de qualquer ilegalidade nem outro poderia ter sido o sentido da decisão a adotar, considerando a factualidade assente e o adequado enquadramento legal da situação em apreço, pelo que deverá manter-se o teor da sentença recorrida e ser julgado o recurso totalmente improcedente.

o) As peças do procedimento proíbem o aumento de preços unitários e globais dos serviços objeto do contrato a celebrar, durante a vigência inicial ou sucessiva do contrato, ou seja, proíbem o acréscimo de preços não previsto, que seja efetuado no decurso da execução do contrato, quer no período de vigência inicial de três anos, quer na hipótese de renovação por um ano adicional.

p) As peças do procedimento não proíbem a possibilidade dos concorrentes preverem e considerarem preços distintos na sua proposta, por referência aos diferentes anos de vigência do contrato.

q) A proposta da ............ não prevê alterações supervenientes de preços durante a execução do contrato, apresentando, ao invés, preços distintos consoante o período em questão, preços definidos à partida e não suscetíveis de revisão, pelo que a mesma é conforme às disposições legais e regulamentares aplicáveis.

r) O regime legal da revisão de preços não é aplicável por tal não estar previsto nas peças do procedimento nem resultar dos termos da proposta apresentada pela .............

s) A exigência de quatro casas decimais é específica para os preços por minuto das comunicações de voz, o que não é o caso do “número único de atendimento”, associado a uma mensalidade e não a um preço por minuto.

t) A apresentação de um preço com duas casas decimais para o número único de atendimento não viola os esclarecimentos prestados pelo júri nem qualquer regra procedimental, sendo improcedente a argumentação aduzida pela Recorrente no sentido da irregularidade da proposta da .............

u) O pedido formulado a final pela Recorrente, apresentando dois novos pedidos – declaração como única proposta válida a da ............ e a condenação da entidade demandada no pagamento de uma indemnização pelos danos sofridos com a admissão e adjudicação da proposta da ............ e da correspondente não adjudicação da proposta da ............ –, consubstancia uma ampliação do pedido que, requerida após o encerramento da discussão em 1.ª instância, é legalmente inadmissível, conforme resulta do artigo 63.º do CPTA e do disposto no artigo 265.º do Código de Processo Civil.

v) Sem embargo, os novos pedidos apresentados pela Recorrente sempre deverão ser julgados totalmente improcedentes, por ineptos e inoperantes, desprovidos de fundamento de facto e de direito e desacompanhados de qualquer suporte.

Termina requerendo a fixação do efeito devolutivo ao presente recurso.



Neste Tribunal Central Administrativo, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, notificada nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 146.º do CPTA, pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.


Com dispensa dos vistos legais, atento o carácter urgente, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Administrativo para decisão.


I. 1. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em saber:

- Se a decisão recorrida errou ao julgar, inversamente ao plasmado legalmente e pelo Tribunal de Contas, que o preço base é dos 4 anos de Contrato;

- Se a decisão recorrida interpretou erradamente a questão dos preços unitários, quando refere que aqueles se reportam anualmente;

- Se a decisão recorrida errou ao concluir pela legalidade do Relatório Final;

- Se a decisão recorrida errou ao não ter concluído pela exclusão da Recorrida Contra-interessada ............; e se

- Deve ser a Ré condenada a pagar à Autora uma indemnização pelos danos sofridos com a admissão e adjudicação da proposta da ............ e da correspondente não adjudicação da proposta da ............ - no montante que a Autora se encontra a apurar, correspondente aos valores que esta deixou de obter, pela não adjudicação, atendendo ao período contratual em causa.



II. Fundamentação

II.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a qual se reproduz ipsis verbis:

A) Foi publicado em Diário da República, Anúncio de Procedimento, n.° 6284/2017, promovido pelo ......................................... para "Aquisição de serviços de comunicações e locação de equipamentos para o Ministério do Trabalho Solidariedade e Segurança Social", cfr. docs. 1, junto com a p.i., cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

B) No âmbito do presente procedimento, foram apresentas propostas pelos Concorrentes já identificados, a Autora ............, e as Contra-interessadas ............ e ............, cfr. p.a. apenso aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

C) Do Caderno de Encargos consta, designadamente, o seguinte, cfr. doc. 3, junto com a p.i., cujo teor se dá por integralmente reproduzido:

(…)

D) Do programa do concurso consta, designadamente, o seguinte, cfr. doc. 2, junto com a p.i., cujo teor se dá por integralmente reproduzido:

(…)

(…)

E) O Júri, em sede de Relatório Preliminar excluiu a proposta da Contra- interessada ............ e classificou a proposta da A. em 2º lugar e a da Contra- interessada ............ em 1º lugar, cfr. doc. 4, junto com a p.i., cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

F) A Autora apresentou pronúncia em sede de Audiência Prévia, por considerar que não foi respeitado o Caderno de Encargos, cfr. p.a., apenso aos autos cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

G) Em 17/1/2018 foi proferida Decisão de Adjudicar o procedimento à Contra- interessada ............, cfr. doc. 5, junto com a p.i., cujo teor se dá por integralmente reproduzido e onde consta, designadamente o seguinte:


"texto integral no original; imagem"

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Factos não provados

Inexistem.

Motivação da matéria de facto

Quanto aos factos provados, o tribunal assentou a sua convicção nos documentos juntos aos autos e ao processo administrativo, não impugnados, conforme referido em cada alínea do probatório.



II.2. De direito

II.2.1. Preliminares: i) do efeito do recurso

A ................................, SA., requereu, ao abrigo do disposto no art. 143.º, nº 3, do CPTA, a fixação do efeito meramente devolutivo ao recurso.

Para tanto alegou que: “[o] procedimento contestado tem por objeto a aquisição de serviços de comunicação de voz, dados, Internet e locação de equipamento, condições necessárias para o regular funcionamento dos serviços das múltiplas entidades beneficiárias desta aquisição, que se estendem por todo o território nacional e integram o Ministério referido.

A implementação destes serviços, possibilitando a instalação e utilização de uma ampla rede de comunicações, consistente e completa, permitirá a otimização de recursos e ganhos de eficiência e gestão decorrentes da atualização dos serviços de comunicação existentes, mediante a aquisição de novos serviços e locação de equipamento, imprescindíveis ao quotidiano destas entidades, ao seu funcionamento normal e regular e à execução de projetos futuros dependentes da implementação desta rede.

A manutenção do efeito suspensivo do recurso que, por defeito, se aplica ao caso geraria, assim, um grave prejuízo para o interesse público claramente desproporcional em relação aos interesses egoístas da Recorrente; por outras palavras, porventura de forma mais elucidativa, a não atribuição de efeito devolutivo ao recurso permitirá a sedimentação dos prejuízos que se verificam a cada dia em que perdura este litígio e o efeito suspensivo que ao mesmo está associado.

Afigura-se, assim, premente a concessão de efeito meramente devolutivo a este recurso, permitindo a celebração do contrato adjudicado e a o início da execução das respetivas prestações, atenta a manifesta superioridade dos interesses públicos em presença e a tutela urgente que os mesmos exigem, resultando evidente que os danos que resultam da não atribuição do efeito devolutivo são manifestamente superiores ao que poderiam resultar da sua atribuição.

Nestes termos, deverá reconhecer-se a prevalência do interesse público na execução da sentença recorrida em face do único interesse, de natureza patrimonial e individual, da Recorrente na suspensão dessa decisão, com graves e indiscutíveis prejuízos para o primeiro, de molde a atribuir-se efeito meramente devolutivo ao presente recurso, o que, desde já, se requer nos termos do disposto no artigo 143.º, n.º 3, do CPTA.

O ..........................................., IP., pronunciou-se sobre o requerido, pugnando pela manutenção do efeito suspensivo previsto no art. 143.º, n.º 1 , do CPTA.

O Recorrente, para tanto notificado, pronunciou-se no sentido de ser mantido o efeito suspensivo.

No despacho que admitiu o recurso o tribunal a quo fixou o efeito suspensivo ao recurso.

Apreciando, dispõe o art. 143.º do CPTA, a propósito dos efeitos dos recursos:

1 - Salvo disposto em lei especial, os recursos ordinários têm efeito suspensivo da decisão recorrida.

2 - Para além de outros a que a lei reconheça tal efeito, são meramente devolutivos os recursos interpostos de:

a) Intimações para proteção de direitos, liberdades e garantias;

b) Decisões respeitantes a processos cautelares e respetivos incidentes;

c) Decisões proferidas por antecipação do juízo sobre a causa principal no âmbito de processos cautelares, nos termos do artigo 121.º

3 - Quando a suspensão dos efeitos da sentença seja passível de originar situações de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação para a parte vencedora ou para os interesses, públicos ou privados, por ela prosseguidos, o recorrente, no requerimento de interposição de recurso, pode requerer que ao recurso seja atribuído efeito meramente devolutivo.

4 - Quando a atribuição de efeito meramente devolutivo ao recurso possa ser causadora de danos, o tribunal pode determinar a adoção de providências adequadas a evitar ou minorar esses danos e impor a prestação, pelo interessado, de garantia destinada a responder pelos mesmos.

5 - A atribuição de efeito meramente devolutivo ao recurso é recusada quando os danos que dela resultariam se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua não atribuição, sem que a lesão possa ser evitada ou atenuada pela adoção de providências adequadas a evitar ou minorar esses danos.

Como se vê, a regra é a do presente recurso ter efeito suspensivo da decisão recorrida, uma vez que não se verifica qualquer das situações previstas no nº 2, prevalecendo, portanto, a estatuição prevista no nº 1: efeito suspensivo.

No entanto, a pedido da parte, o tribunal pode alterar o efeito-regra, de acordo com o previsto naqueles nºs 3, 4 e 5 supra transcritos. Como ensinam Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, o que se pretende é que “o tribunal afaste o efeito suspensivo do recurso e lhe atribua um efeito meramente devolutivo, de modo a que, se a pretensão for deferida, a sentença passe a ser exequível e deva ser imediatamente cumprida pela parte vencida, não obstante a pendência do recurso” (cfr. Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 4.ª ed., 2017, p. 1102). E também com este argumento não se vê razão/fundamento para afastar a legitimidade do Recorrido para requerer a alteração do efeito do recurso, tanto mais que será a parte vencida, o Recorrente, que terá interesse, em regra, em que seja mantido o efeito suspensivo do recurso.

Isto estabelecido, vejamos então se é de alterar o efeito-regra estabelecido no art. 143.º, nº 1, do CPTA. Para tanto haverá que efectuar a ponderação de interesses de acordo com o previsto nos n.ºs 3, 4 e 5 daquele artigo.

Ora, no caso presente, o ........................................., IP, vem argumentar que o levantamento do efeito suspensivo envolveria, em caso de procedência da acção, duas mudanças de operador em curto intervalo de tempo ou, em alternativa, o pagamento de uma avultada indemnização. Sendo que, na sequência do que alega, as mudanças sucessivas de operador criam problemas assinaláveis no eficaz desempenho da rede, envolvendo ainda a substituição de um número elevado de equipamentos. Pelo que, entende ser conveniente aguardar pela decisão do recurso.

Tanto basta, do nosso ponto de vista, para fazer accionar a previsão contida no nº 5 daquele art. 143.º, que trava a execução provisória da sentença quando se conclua que dela decorreria para o interesse público em causa, prejuízos ainda mais gravosos do que aqueles que poderiam resultar da não atribuição do efeito devolutivo.

Termos em que se mantém o efeito suspensivo que vem fixado e é o legalmente previsto.



II.2.1. Preliminares: ii) do pedido indemnizatório

No recurso interposto a Recorrente vem formular o seguinte pedido:

(vi) Ser a Ré condenada a pagar à Autora uma indemnização pelos danos sofridos com a admissão e adjudicação da proposta da ............ e da correspondente não adjudicação da proposta da ............ - no montante que a Autora se encontra a apurar, correspondente aos valores que esta deixou de obter, pela não adjudicação, atendendo ao período contratual em causa.

Ora, tal pedido condenatório, consubstanciado numa indemnização por danos alegadamente sofridos, constitui questão nova, a qual, enquanto tal, está vedada a este tribunal de recurso conhecer. Compulsada a causa de pedir constante da p.i., tal arguição constitui questão nova, nunca antes invocada ou debatida, e como tal insusceptível de ser conhecida por este Tribunal superior. Significa isto que depois de proferida a decisão em primeira instância não pode ser apreciada, designadamente em sede de recurso jurisdicional, qualquer questão nova.

Como se concluiu, entre muitos outros, no ac. do STA de 27.04.2016, proc. n.º 288/15: “Os recursos são meios para obter o reexame das questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do tribunal de que se recorre”.

E mesmo a entender-se que a agora peticionado configura uma ampliação do pedido, também este se mostra nesta sede inadmissível, face ao estatuído no art. 63.º do CPTA e 265.º do CPC. O autor, mesmo sendo a ampliação o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo, só pode ampliá-lo (ou reduzi-lo) até ao encerramento da discussão em 1.ª instância.

Dito isto, delimitando assim o objecto válido do recurso, apreciemos então se a sentença errou ao concluir pela validade do acto impugnado.



II.2.1. Do mérito do recurso

A sentença recorrida julgou improcedente o pedido impugnatório, com base na seguinte fundamentação:

“(…)

Começa a A. por alegar que a proposta da ............ não apresentou justificação do preço anormalmente baixo.

Ora vejamos.

Tal como resulta da matéria de facto provada, a C.I. ............ apresentou um preço global da proposta de € 3.596.334,00 (três milhões, quinhentos e noventa e seis mil, trezentos e trinta e quatro euros) para 4 anos de contrato, valor que não inclui IVA.

De acordo com o artigo 9º, als. b) e c) do Programa do Concurso, devem as propostas indicar o preço global da proposta em euros, em algarismos e por extenso, não incluindo o Iva, com referência a 4 anos de vigência do contrato, e os preços unitários e globais dos serviços e da locação dos bens identificados no Anexo I do Caderno de Encargos, segundo o modelo constante do Anexo II, não incluindo o IVA, os quais não poderão sofrer acréscimos durante a vigência, inicial ou sucessiva, do contrato.

Por seu lado, estabelece o artigo 12º, do Programa do Concurso, que considera-se o preço anormalmente baixo, o preço apresentado na proposta que seja igual ou inferior a 2.970.111,00€ (dois milhões, novecentos e setenta mil, cento e onze euros).

Especificando-se no Caderno de Encargos o seguinte:

(i) o preço base correspondente aos 3 anos de vigência do contrato;

(ii) o preço base da renovação constante do artigo 17.º, n.º 2; e

(iii) o preço base global considerando a renovação constante do artigo 17.º, n.º 2, que é de 5.940.221€ (cinco milhões, novecentos e quarenta mil, duzentos e vinte e um euros), a que acresce o IVA à taxa legal em vigor, cfr. Artigo 11º, n.ºs 3, 4 e 5.

Mais referindo no artigo 17º, n.ºs 1 e 2, quanto à vigência do contrato, que o contrato produz efeitos na data do visto ou de declaração de conformidade e vigora por 3 anos e que o contrato poderá ser renovado mediante aviso prévio do Contraente Público, com o limite de uma renovação, pelo período de 1 ano.

Estabelece o artigo 47º, nº 1, do CCP, que:

“1 - O preço base, que deve ser definido pela entidade adjudicante no caderno de encargos, é o montante máximo que esta entidade se dispõe a pagar pela execução de todas as prestações que constituem o objeto do contrato, incluindo eventuais renovações do contrato.”

Finalmente, o artigo 97º, nº 2, do CCP, refere o seguinte:

“2 - Está incluído no preço contratual, nomeadamente, o preço a pagar pela execução das prestações objeto do contrato na sequência de qualquer prorrogação contratualmente prevista, expressa ou tácita, do respetivo prazo.”

Da conjugação das normas supra citadas decorre que foi a entidade adjudicante que definiu para os três anos de vigência inicial do contrato e para o quarto ano adicional os preços base atendíveis, prevendo, o preço base global, considerando o conjunto dos quatro anos de eventual vigência do contrato.

Como resulta, aliás, do Programa do Concurso que define o que se entende por preço global da proposta, delimitando-o por referência aos quatro anos de vigência do contrato, sendo de concluir que o preço anormalmente baixo a atender terá por referência o preço base global determinado pela Entidade Adjudicante para os quatro anos. Sendo que, também, o Caderno de Encargos expressamente esclarece que o preço base global considera aquele período de quatro anos assim incluindo o ano adicional de vigência eventual do contrato.

A jurisprudência tem considerado que o “conceito de preço anormalmente baixo não se relaciona com cada um dos elementos componentes do preço proposto, de per si, mas com o preço proposto globalmente considerado”, vide ac. TCAS de 11/23/2011, processo nº 07972/11.

Não é aqui de aplicar a jurisprudência do Tribunal de Contas, citada pela A., porquanto a situação aí relatada é substancialmente diferente da que nos ocupa, na medida em que estava em causa apenas a determinação do preço contratual atendendo à possibilidade de prorrogação prevista no caderno de encargos que não tinha sido previamente contabilizada, ou seja, não estava incluída no preço base que constava desse mesmo caderno de encargos.

Ora, tendo a C.I. ............ apresentado um preço global de € 3.596.334,00 e considerando que a entidade adjudicante fixou como preço anormalmente baixo um preço global da proposta igual ou inferior a € 2.970.111,00, inexiste qualquer irregularidade desta proposta, pelo que não tinha que ser apresentada qualquer justificação pela apresentação de um preço anormalmente baixo.

Mais alega a A. que a proposta da ............ apresenta um preço abaixo do custo necessário à execução da prestação em causa, colocando em causa os princípios da transparência, igualdade e concorrência, sendo uma proposta não séria.

O princípio da concorrência aplicado à contratação pública determina predominantemente a proibição de práticas procedimentais susceptíveis de impedir, limitar ou restringir a concorrência.

É pois em face do que antecede que são excluídas da contratação pública as propostas que apresentem preços anormalmente baixos, por forma a impedir, falsear ou restringir a concorrência.

Em qualquer caso, dentro dos limites legalmente estabelecidos, mostra-se legítimo que o concorrente a um procedimento de contratação pública, possa definir livremente o preço da sua proposta e, designadamente, reduzir ou eliminar a sua margem de lucro, sendo que não existe normativo algum que proíba a prestação de serviços com prejuízo, desde que o preço global proposto se não mostre anormalmente baixo.

Acresce que a apreciação da seriedade da proposta encontra-se no âmbito do poder discricionário da entidade adjudicante, apenas sendo sindicável judicialmente se fosse invocado um erro manifesto de apreciação por parte do júri, o que não foi o caso.

Pelo exposto, improcede o alegado vício.

Invoca a A. que a proposta da ............ viola o artigo 9º, nº 1, al. c) do Programa do Concurso, bem como o artigo 300º, do CCP.

Diz o artigo 9º, nº 1, al. c) do Programa do Concurso, que os preços unitários e globais dos serviços e dos bens identificados no Anexo I do Caderno de Encargos não podem sofrer acréscimos durante a vigência, inicial ou sucessiva, do contrato.

Da matéria de facto provada resulta que a C.I. ............ apresenta preços diferentes consoante o ano contratual em causa.

Todavia, isso não significa que a proposta da ............ viole aquele artigo.

Com efeito, aquela previsão do Programa do Concurso refere-se à fase de execução do contrato, ou seja, proíbe o aumento dos preços inicialmente apresentados na proposta adjudicada, não proibindo que as propostas apresentem preços diferenciados por ano.

Também não há aqui qualquer violação do artigo 300º, do CCP, porquanto como se disse supra não há, in casu, uma revisão de preços mas uma indicação ab initio dos preços a praticar em cada ano.

Assim, não há violação das disposições referidas pela A..

Mais alega a A. que a proposta da ............ viola o Regulamento do Concurso, em concreto a rectificação a este operada pela Acta nº 1 dos esclarecimentos prestados pelo Júri, que determinou a apresentação de preços no Anexo II a quatro casas decimais, na medida em que o preço por esta apresentado para o “número único de atendimento” contem duas casas decimais.

Efectivamente o preço apresentado pela ............ para o número único de atendimento tem apenas duas casas decimais.

O esclarecimento do júri visou complementar a norma do programa do concurso, dizendo que “devem ser consideradas quatro casas decimais”. Ou seja, não há, em rigor, uma violação da norma do concurso, nem o júri determinou que têm que ser quatro casas decimais. Não obstante, como bem diz a C.I. ............, “a exigência das quatro casas decimais é específica para os preços por minuto das comunicações de voz, como resulta dos termos concretos em que a questão foi colocada em sede de pedido de esclarecimentos” (sublinhado nosso).

Ora, encontrando-se o preço do “número único de atendimento” associado a uma mensalidade e não a um preço por minuto, a apresentação de duas casas decimais para este elemento não viola o programa do concurso, nem o esclarecimento, pelo que improcede o alegado vício.

Finalmente, alega a A. a ilegalidade da fundamentação do relatório final, sem, contudo, invocar qual a norma infringida, pelo que não pode o tribunal apreciar este vício.

Todavia, sempre se dirá que o relatório final está fundamentado de facto e de direito, sendo perceptível ao “homem médio” o iter percorrido para chegar à decisão.

Uma vez que não é procedente o pedido anulatório, não há que conhecer o pedido condenatório”.

O decidido é de manter, pode já adiantar-se.

Uma vez que a pronúncia do Ministério Público nesta sede dá resposta integral às questões objecto do recurso, nos termos supra delimitado, transcrever-se-á a mesma na sua parte relevante. Assim:

Na sua Alegação e, designadamente nas Conclusões apresentadas a recorrente defende que o tribunal cometeu erros de aplicação do direito aos factos, assumindo que o preço do contrato se reporta a quatro anos sendo que do programa resulta, expressamente que se reporta apenas a três anos; o tribunal a quo errou ao considerar irrelevante a violação do Caderno de Encargos, ao não apreciar a ilegalidade do Relatório Final e também ao não excluir a contra-interessada por violação do artº 72º nº 2 e) do CCP.

Defende a recorrente que a contra-interessada também devia ter sido excluída por apresentar um preço anormalmente baixo, não tendo apresentado os esclarecimentos necessários e ainda por violação do artº 300º do CCP, uma vez que as peças apresentadas não prevêem a revisão de preços e finalmente devia ter sido excluída, por violação dos princípios gerais da contratação pública.

Os pontos que a recorrente traz para reapreciação do tribunal são os da existência do preço anormalmente baixo, o da violação de Lei e do Regulamento Concursal e o da não apreciação pelo Tribunal a quo da ilegalidade do Relatório Final

Salvo o respeito devido, afigura-se-nos que à recorrente não assiste razão; efectivamente, tal como resulta da matéria de facto provada, a C.I. ............ apresentou um preço global da proposta de € 3.596.334,00 (três milhões, quinhentos e noventa e seis mil, trezentos e trinta e quatro euros) para 4 anos de contrato, valor que não inclui IVA.

De acordo com o artº 12º do Programa do Concurso, considera-se preço anormalmente baixo, o preço apresentado na proposta que seja igual ou inferior a 2.970.111,00€ (dois milhões, novecentos e setenta mil, cento e onze euros), contendo o caderno de encargos algumas especificações (o preço base correspondente aos 3 anos de vigência do contrato, o preço base da renovação constante do artigo 17.º, n.º 2; e o preço base global considerando a renovação constante do artigo 17º, nº 2, que é de 5.940.221€ (cinco milhões, novecentos e quarenta mil, duzentos e vinte e um euros), a que acresce o IVA à taxa legal em vigor.).

Como considerou o tribunal a quo, com invocação da jurisprudência existente, considerando inaplicável a jurisprudência do Tribunal de Contas e com invocação do artº 97º, nº 2 do CCP (“2 - Está incluído no preço contratual, nomeadamente, o preço a pagar pela execução das prestações objeto do contrato na sequência de qualquer prorrogação contratualmente prevista, expressa ou tácita, do respetivo prazo.”), tendo a C.I. ............ apresentado um preço global de € 3.596.334,00 e considerando que a entidade adjudicante fixou como preço anormalmente baixo um preço global da proposta igual ou inferior a € 2.970.111,00, inexiste qualquer irregularidade desta proposta, pelo que não tinha que ser apresentada qualquer justificação pela apresentação de um preço anormalmente baixo.

No respeitante à questão da revisão de preços, como considerou o tribunal a quo de acordo com o artº 9º, nº 1, al. c) do Programa do Concurso, os preços unitários e globais dos serviços e dos bens identificados no Anexo I do Caderno de Encargos não podem sofrer acréscimos durante a vigência, inicial ou sucessiva, do contrato; ora da matéria de facto provada resulta que a C.I. ............ apresenta preços diferentes consoante o ano contratual em causa, mas tal não significa que a proposta da ............ viole aquele artº 9º, pois a previsão do Programa do Concurso refere-se à fase de execução do contrato, ou seja, proíbe o aumento dos preços inicialmente apresentados na proposta adjudicada, não proibindo que as propostas apresentem preços diferenciados por ano, não havendo qualquer violação do artigo 300º do CCP, porquanto não há, in casu, uma revisão de preços, mas antes uma indicação ab initio dos preços a praticar em cada ano. Assim, considerou o tribunal a quo, correctamente, que não há violação das disposições mencionadas pela A., recorrente.

Também não tem razão a A. ao defender que a proposta da ............ viola o Regulamento do Concurso, em concreto a rectificação a este operada pela Acta nº 1 dos esclarecimentos prestados pelo Júri; o preço apresentado pela ............ para o número único de atendimento tem apenas duas casas decimais, mas o esclarecimento do júri visou complementar a norma do programa do concurso, dizendo que “devem ser consideradas quatro casas decimais”, não havendo, em rigor violação da norma do concurso, pois o júri não determinou que têm que ser quatro casas decimais. Sendo tal “… exigência das quatro casas decimais … específica para os preços por minuto das comunicações de voz, como resulta dos termos concretos em que a questão foi colocada em sede de pedido de esclarecimentos”.

Finalmente quanto à invocada ilegalidade da fundamentação do Relatório Final, julgou correctamente o tribunal a quo, uma vez que o relatório final está fundamentado de facto e de direito, sendo perceptível ao “homem médio” o iter percorrido para chegar à decisão.

Consideramos, em consequência, que o tribunal a quo analisou correctamente os factos que foram demonstrados e interpretou e aplicou bem as normas vigentes.

(…)”.

Com efeito, tal como oportunamente avançado pelo ora Recorrido ........................................., IP., por um lado, o preço da proposta tem como referência os 4 anos de vigência total do contrato, nos termos da al. a) do nº 1 do artigo 9.º do Programa do Concurso e, por isso, é este o valor que se subsume na previsão do art. 12.º do mesmo Programa. E, por outro lado, a análise pretendida pela Recorrente relativamente a cada preço unitário não colhe, uma vez que a ponderação sobre o preço anormalmente baixo é eminentemente global, não se confinando a um aspecto particular (cfr., i.a., o ac. do STA de 3.12.2015, proc. n.º 657/15). O preço global da proposta é de EUR 3.596.334,00 para 4 anos de contrato (valor que não inclui IVA), sendo este discriminado no Anexo II da proposta da ............ – Declaração de Preço –, tabela B, quanto aos valores globais relativos aos três primeiros anos e ao eventual quarto ano de vigência do contrato, de acordo com as exigências constantes das peças do procedimento e a configuração própria deste.

De acordo com o disposto no artigo 47.º do CCP, o preço base é o preço máximo que a entidade adjudicante se dispõe a pagar pela execução de todas as prestações que constituem o seu objecto. Como elucida PEDRO COSTA GONÇALVES quanto à matéria, “um dos parâmetros base é o preço base, em regra definido obrigatoriamente pela entidade adjudicante no caderno de encargos, que indica o montante máximo que esta entidade se dispõe a pagar pela execução de todas as prestações que constituem o objeto do contrato, incluindo eventuais renovações do contrato (…)” (cfr. Direito dos Contratos Públicos, 2.ª ed. - Vol. 1, 2018, p. 561). Por sua vez, nos termos do artigo 97.º do CCP, no preço contratual, ou seja, no preço a pagar pela entidade adjudicante, em resultado da proposta adjudicada, pela execução de todas as prestações que constituem o objecto do contrato, deverá estar incluído o preço a pagar na sequência de qualquer prorrogação contratualmente prevista, expressa ou tácita, do respectivo prazo.

Ou seja, correspondendo o preço global proposto pelo concorrente adjudicatário ao preço contratual em relação ao qual a entidade adjudicante se compromete a contratar, este deverá incluir eventuais prorrogações ou renovações que estejam previstas no Caderno de Encargos como parte do respectivo clausulado. O preço contratual é o preço máximo a pagar por todas as prestações objecto do contrato, aqui se incluindo as duas possíveis renovações do contrato (cfr. ac. deste TCAS de 28.06.2012, processo n.º 8646/12). E como já se decidiu neste TCAS a este propósito, “o conceito de preço anormalmente baixo não se relaciona com cada um dos elementos componentes do preço” (cfr. ac. de 23.11.2011, proc. nº 7972/11)

Assim sendo, não se detecta a invalidade que a este respeito vem apontada pela Recorrente. Aliás, neste ponto terá que subscrever-se a posição da Contra-interessada quando na contestação apresentada afirmou: “[a]demais, note-se que o limite do preço anormalmente baixo que consta do Programa do Concurso – € 2.970.111,00 –, representa, precisamente, 50% do preço base global – € 5.940.221,00 –, tendo a Entidade Adjudicante optado por concretamente o indicar, de forma clara, sem equívocos.// Pelo que apenas um preço global da proposta igual ou inferior a € 2.970.111,00 poderia ser qualificado como um preço anormalmente baixo, o que não acontece com a proposta apresentada pela ............ que, como se viu, propõe como preço global um montante que ascende a € 3.596.334,00”.

Por outro lado ainda, e tendo presente a critica formulada pela Recorrente relativamente à análise da fundamentação do relatório final feita na sentença recorrida, apresenta-se como evidente que aquele relatório cumpriu cabalmente o dever de fundamentação, apresentando-se como claro e objectivo na análise que efectua das propostas apresentadas e sua avaliação, considerando os critérios e fórmula de avaliação previamente definidos nas peças do procedimento. Donde, ser inequívoco que o relatório final está fundamentado de facto e de direito – basta lê-lo -, sendo perceptível ao “homem médio” o iter percorrido para chegar à decisão final tomada. A fundamentação do acto administrativo é suficiente se, no contexto em que foi praticado e atentas as razões de facto e de direito nele expressamente enunciadas, forem capazes ou aptas e bastantes para permitir que um destinatário normal apreenda o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão. É contextual quando se integra no próprio acto e dela é contemporânea. A mesma é, por sua vez, clara quando tais razões permitem compreender sem incertezas ou perplexidades qual foi o referido iter cog............citivo-valorativo da decisão, sendo congruente quando a decisão surge como a conclusão lógica e necessária de tais razões. Como se concluía no acórdão do STA de 11.02.2010, proc. nº 541/09: “[a] fundamentação é um conceito relativo e por isso variável, sendo que o que é realmente importante é que através dela o destinatário do acto fique a conhecer das razões que o motivaram, de molde a se poder decidir pela sua impugnação ou aceitação”. E tal é o que ocorre na presente situação.

Termos em que improcede o recurso.



III. Conclusões

Sumariando:

i) O recurso de decisão proferida em acção de contencioso pré-contratual, tem efeito suspensivo (art. 143.º, nº 1, do CPTA).

ii) O tribunal pode alterar o efeito-regra dos recursos, nos termos do disposto dos n.ºs 3 e 4, (apenas) desde que “a atribuição de efeito meramente devolutivo ao recurso é recusada quando os danos que dela resultariam se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua não atribuição, sem que a lesão possa ser evitada ou atenuada pela adoção de providências adequadas a evitar ou minorar esses danos” (n.º 5).

iii) Vindo formulado no recurso interposto pedido condenatório, consubstanciado numa indemnização por danos alegadamente sofridos, sem ter sido tal matéria antes invocada ou debatida, essa arguição constitui questão nova, a qual, enquanto tal, está vedada a este tribunal de recurso conhecer.

iv) Os recursos são meios para obter o reexame das questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do tribunal de que se recorre.

v) Mesmo a entender-se que a indemnização agora peticionada configura uma ampliação do pedido inicial, também este se mostra nesta sede inadmissível, face ao estatuído nos artigos 63.º do CPTA e 265.º do CPC. O autor, mesmo sendo a ampliação o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo, só pode ampliá-lo (ou reduzi-lo) até ao encerramento da discussão em 1.ª instância.

vi) De acordo com o disposto no artigo 47.º do CCP, o preço base é o preço máximo que a entidade adjudicante se dispõe a pagar pela execução de todas as prestações que constituem o seu objecto, incluindo as eventuais renovações.

vii) E nos termos do artigo 97.º do CCP, no preço contratual, ou seja, no preço a pagar pela entidade adjudicante, em resultado da proposta adjudicada, pela execução de todas as prestações que constituem o objecto do contrato, deverá estar incluído o preço a pagar na sequência de qualquer prorrogação contratualmente prevista, expressa ou tácita, do respectivo prazo.

viii) O conceito de preço anormalmente baixo não se relaciona com cada um dos elementos componentes do preço.

ix) O dever legal de fundamentação deve responder às necessidades de esclarecimento do destinatário, informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do respectivo acto permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito que determinaram a sua prática.

x) No caso em apreço é inequívoco que esse dever de fundamentação se encontra cumprido, constando da motivação da decisão final, como provado, a identificação das propostas apresentadas, a explicitação clara da análise que é efectuada das mesmas e a sua avaliação, considerando os critérios e fórmula de avaliação previamente definidos nas peças do procedimento.



IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

- Manter o efeito suspensivo fixado ao recurso;

- Não conhecer, por inadmissível, do pedido indemnizatório formulado pela Recorrente;

- Negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 8 de Novembro de 2018



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Pedro Marchão Marques


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José Gomes Correia


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Maria Cristina Gallego dos Santos