Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1975/10.7BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:09/30/2020
Relator:LUÍSA SOARES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO;
REVERSÃO;
CULPA;
ÓNUS DA PROVA.
Sumário:I- No âmbito do art.º 24.º, n.º 1, al. a), da LGT, cabe à administração tributária provar o comportamento culposo do revertido.

II. A falta do preenchimento dos pressupostos da reversão previstos nos artigos 24º da LGT e 8º do RGIT, determina a ilegitimidade do revertido, tendo como consequência a extinção da execução fiscal quanto ao revertido.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I – RELATÓRIO

A Fazenda Pública, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a oposição à execução deduzida por R.........., contra a decisão de reversão proferida no processo de execução fiscal nº .......... e apensos, instaurado originariamente contra a sociedade “G………., Lda.”, por dívidas de IRS dos anos de 2002, 2003 e 2004, IRC do ano de 2004 e coimas no valor total de € 25.092,34.

A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos:

“1. Dos autos resulta que a oponente era gerente de facto e de direito da sociedade devedora originária.

2. Nos presentes autos, a oponente limitou-se a alegar que não era gerente facto da sociedade devedora originária, não ilidindo a presunção de culpa que sobre ela recaía.

3. A oponente não apresentou provas cabais de que não foi por culpa sua que o património da sociedade devedora originária se delapidou.

4. Por sua vez, a Administração Fiscal em face das diligências por si efetuadas, constatou que a oponente, no desempenho das suas funções de gerente da sociedade devedora originária, e em face de manifestas dificuldades e risco de solvência das dívidas da sociedade em tempo devido, não diligenciou no sentido da proteção dos credores, particulares e oficiais.

5. Mais, igualmente das diligências respeitantes ao apuramento da existência de património da devedora originária, resultou comprovada a inexistência de bens patrimoniais, ou outros, passíveis de serem penhorados.

6. Em suma, sendo a ora oponente revertida em virtude de a sociedade devedora originária não ter quaisquer bens penhoráveis, e porque gerente de direito e de facto, com provas inequívocas da sua gerência, a culpa que lhe é imputada, encontra total razão de ser, falecendo in totum todos os argumentos aduzidos pelo meritíssimo juiz a quo.

Termos em que, e nos mais de Direito aplicáveis, deve o presente Recurso proceder, sendo revogada a douta sentença, com o julgamento totalmente improcedente nos presentes autos de oposição.
Porém, com melhor entendimento, V. Exas., decidindo, farão a costumada justiça”.
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A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II – DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635°, n.° 4 e artigo 639°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, a questão controvertida consiste em aferir se a sentença enferma de erro de julgamento de facto e de direito ao considerar a Oponente parte ilegítima na execução em virtude de a Administração Tributária não ter demonstrado a culpa da revertida na insuficiência do património da devedora originária para o pagamento das dívidas exequendas, nos termos da alínea a) do nº 1 do art. 24º da LGT.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

1) O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“Com interesse para a decisão a proferir, o Tribunal considera provados os seguintes factos:

A) Pelo averbamento da inscrição ap. .........., foi registada na 1.ª Conservatória de Registo Comercial de Loures a designação da ora Oponente e de R.......... como gerentes da sociedade por quotas denominada “G……., Lda”, obrigando-se aquela sociedade “com a intervenção de qualquer um dos gerentes” (cfr. certidão junta a fls. 221 a 224 do processo de execução apenso aos autos);

B) Em 22.04.2004, a Oponente assinou, na qualidade de gerente da sociedade identificada em A) supra, o recibo n.º 20040041, emitido por aquela sociedade, relativo à sociedade I………, Lda (cfr. documento junto a fls. 110 dos autos);

C) Em 03.03.2005, a Oponente assinou, no campo destinado ao preenchimento pelo destinatário, um aviso de recepção dirigido à sociedade identificada em A) supra (cfr. documento junto a fls. 112 dos autos);

D) Nos anos de 2004 e 2005, a sociedade identificada em A) supra efectuou pagamentos à ora Oponente, no valor de 8.560,00 EUR e 12.758,20 EUR, respectivamente, enquanto membro de órgão estatutário (cfr. documento junto a fls. 117 a 122 dos autos e depoimento da testemunha F..........);

E) A técnica oficial de contas da sociedade identificada em A) supra tratava das questões relacionadas com as contas/contabilidade daquela sociedade tanto com o gerente R.......... como com a ora Oponente (cfr. depoimento da testemunha F..........);

F) Foram instaurados contra a sociedade identificada em A), pelo Serviço de Finanças de Loures 1, os processos de execução fiscal infra identificados, entretanto apensos:
1. Processo n.º ............., instaurado em 18.06.2005, por dívida de IRS (retenção na fonte) do ano de 2004, no valor de 1.941,27 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 20.08.2004;
2. Processo n.º ............., instaurado em 19.06.2005, por dívida de IRS (retenção na fonte) do ano de 2004, no valor de 1.144,06 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 20.09.2004;
3. Processo n.º ............., instaurado em 20.06.2005, por dívida de IRS (retenção na fonte) do ano de 2004, no valor de 1.429,14 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 20.10.2004;
4. Processo n.º ............., instaurado em 24.06.2005, por dívida de IRS (retenção na fonte) do ano de 2004, no valor de 1.298,68 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 20.11.2004;
5. Processo n.º ............., instaurado em 25.06.2005, por dívida de IRS (retenção na fonte) do ano de 2004, no valor de 1.209,63 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 20.12.2004;
6. Processo n.º ............., instaurado em 04.08.2005, por dívida de IRS (retenção na fonte) do ano de 2004, no valor de 1.986,43 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 20.01.2005;
7. Processo n.º ............., instaurado em 11.08.2005, por dívida de IRS (retenção na fonte) do ano de 2002, no valor de 2.141,96 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 20.02.2005;
8. Processo n.º ............., instaurado em 28.10.2005, por dívida de coima do ano de 2005 no valor de 6.142,34 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 28.07.2005;
9. Processo n.º ............., instaurado em 28.10.2005, por dívida de coima do ano de 2005 no valor de 2.892,44 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 31.08.2005;
10. Processo n.º ............., instaurado em 03.11.2005, por dívida de IRC do ano de 2004, no valor de 4.330,65 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 15.09.2005;
11. Processo n.º ............., instaurado em 18.11.2006, por dívida de IRS/juros compensatórios e juros de mora dos anos de 2002 e 2003, no valor de 575,77 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 15.02.2006 e 10.07.2007 (cfr. fls. 249 do processo de execução apenso);

G) Pelo averbamento da inscrição ap. 19/20070219, foi registada na 1.ª Conservatória de Registo Comercial de Loures a cessação de funções da Oponente como gerente da sociedade identificada em A) supra, por renúncia à gerência, com data de renúncia de 10.09.2004, com efeitos a partir de 30.09.2004 (cfr. certidão junta a fls. 221 a 224 do processo de execução apenso);

H) Em 27.08.2008, no âmbito dos processos de execução identificados em F), foi elaborado auto de diligências por funcionário do Serviço de Finanças de Loures 1, com o seguinte teor:
“(…)
Aos vinte e sete dias do mês de Agosto do ano 2008, na Rua ……..n° 100 Flamenga ……. Frielas onde eu R............. servindo de escrivão e na companhia do oficial de diligência I............., e em cumprimento do mandado de penhora que antecede verificámos não poder cumpri-lo em virtude da executada, G............. Lda., com o Nif/NIPC…….., já aqui não ter a sua sede, informação prestada pelo vizinho do lado, e, não ter alterado a morada da mesma. Após consulta ao sistema informático verificamos não ter mais bens penhoráveis além dos já penhorados pelo que é nossa opinião que encontram-se reunidas as condições estabelecidas no n° 2 do Art° 153° do Código de Procedimento e do Processo Tributário, para o chamamento à execução dos responsáveis subsidiários, por via de reversão, nos termos do n° 1 do Art° 23° da Lei Geral Tributária
(…)” (cfr. fls. 220 do processo de execução apenso);

I) No seguimento do auto de diligências mencionado na alínea anterior, em 22.10.2008, foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de Loures 1, no qual determinou a notificação da ora Oponente para efeitos de exercício do direito de audição prévia à reversão dos processos de execução identificados em F) supra (cfr. documento de fls. 228-229 do processo de execução apenso);

J) Notificada para o efeito, a Oponente não exerceu o direito de audição prévia à reversão (cfr. documentos de fls. 230 a 232 e 244-245 do processo de execução apenso);

K) Em 07.09.2009, foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Loures 1 despacho de reversão contra a ora Oponente dos processos de execução identificados em E) supra, constando do mesmo o seguinte:
“(…)

«imagem no original»


(…)” (cfr. documento de fls. 276 do processo de execução apenso);

L) No seguimento da citação da oponente para a execução, por reversão, a mesma apresentou, em 19.05.2010, a presente oposição (cfr. fls. 6 dos autos).

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FACTOS NÃO PROVADOS: não existem factos a dar como não provados com interesse para a decisão.
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Assenta a convicção do tribunal no exame dos documentos constantes dos presentes autos e do processo de execução apenso, não impugnados, bem como no depoimento da testemunha F.........., tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
Quanto aos factos dados como provados nas alíneas D) e E), foi valorado o depoimento da testemunha aí identificada, a qual, enquanto técnica oficial de contas/contabilista certificada da sociedade devedora originária, tem um conhecimento privilegiado e directo dos referidos factos.
Com efeito, com clareza e segurança, a testemunha declarou expressamente que foram efectuados pagamentos à Oponente, a qual era paga enquanto membro de órgão estatutário, referindo que se fez constar em acta a decisão que determinou que os pagamentos fossem efectuados aos gerentes enquanto tais.
Quanto ao facto dado como provado na alínea E), afirmou a técnica oficial de contas/contabilista certificada que tratava das questões relativas à contabilidade e contas da sociedade com ambos os gerentes, Oponente incluída, tendo ambos assinado as contas.”.

IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

A Recorrida deduziu junto do Tribunal Tributário de Lisboa, oposição à execução fiscal contra a decisão de reversão proferida no processo de execução fiscal nº .......... e apensos, instaurado originariamente contra a sociedade “G…….., Lda.”, por dívidas de IRS dos anos de 2002, 2003 e 2004, IRC do ano de 2004 e coimas no valor total de € 25.092,34.

O Tribunal a quo considerou a Oponente, ora Recorrida, como parte ilegítima das execuções fiscais, vertendo na sentença recorrida a seguinte fundamentação:
In casu, constam dos autos elementos demonstrativos da gerência de facto da sociedade devedora originária pela Oponente, designadamente pela assinatura de documentos, como sejam recibos, invocando a sua qualidade de gerente da sociedade devedora originária [cfr. alínea B) da factualidade assente]. Sendo igualmente demonstrativo do exercício da função de gerência da sociedade devedora originária o facto de, pelo menos nos anos de 2004 e 2005, a Oponente ter sido remunerada por aquela sociedade enquanto membro de órgão estatutário, ou seja, como gerente de facto da sociedade. Tendo a técnica oficial de contas/contabilista certificada da sociedade afirmado, no seu depoimento, que ficou a constar em acta da sociedade a decisão que determinou que os pagamentos fossem efectuados aos gerentes nesta mesma qualidade [cfr. alínea D) da factualidade assente].
Para a mesma conclusão contribui o facto dado como provado em E) do probatório, de que se retira que as questões relacionadas com as contas/contabilidade daquela sociedade eram tratadas, junto da técnica oficial de contas da sociedade, tanto pelo gerente R.......... como pela ora Oponente, tendo ambos assinado as contas da sociedade.
Não restam dúvidas, assim, que foram recolhidos elementos que atestam a gerência de facto pela aqui Oponente, demonstrativos que ela praticou actos que vinculam a sociedade executada e, portanto, consubstanciadores de uma gerência efectiva nos períodos a que respeitam as dívidas em execução.”.

Acrescentando-se ainda que:

Impõe-se agora conhecer da eventual culpa da Oponente pela falta de pagamento da dívida em execução.
Como resulta da matéria de facto assente [cfr. alínea K) do probatório], a reversão operada contra a Oponente teve como fundamento legal a alínea a) do n.° 1 do artigo 24.° da LGT. Isto mesmo resulta dos fundamentos da reversão, tal como constam do despacho de reversão, bem como do ofício de citação.
Salienta-se, desde já, que, constando do artigo 8.° do RGIT a definição dos pressupostos da reversão das coimas, dado que a fundamentação da reversão assentou somente no artigo 24.°, n.° 1, alínea a), da LGT, tal constitui, desde logo, um erro quanto aos pressupostos de direito da reversão de coimas”

E concluído que: “A Administração Tributária não provou, nem sequer alegou, que a actuação do revertido, enquanto gerente da devedora originária, concretizada em actos positivos ou em omissões, não foi prudente nem adequada às circunstâncias concretas, e que a mesma tem/teve uma relação causal com a insuficiência patrimonial da devedora originária ou que aquela não tenha tomado providências com vista à satisfação das dívidas.
Ora, não havendo, como acima já se mencionou, uma presunção legal de culpa, cabe à Administração Tributária o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária que invoca (artigo 342.°, n.° 1, do CC), pelo que a dúvida sobre tal ponto sempre teria de ser valorada contra aquela.
Assim sendo, tendo a reversão sido operada com base na alínea a) do n.° 1 do artigo 24.° da LGT (e sendo aplicável, quanto à reversão das coimas, o disposto no artigo 8.° do RGIT), e não estando, in casu, demonstrado pela Administração Tributária o referido pressuposto da responsabilidade subsidiária, da culpa do revertido na insuficiência do património da devedora originária, impõe-se concluir pela ilegitimidade da Oponente para a reversão da dívida em execução e, consequentemente, julgar procedente a presente oposição.”.

A Fazenda Pública apresentou recurso jurisdicional discordando do decidido e alegando em síntese que “…A oponente não apresentou provas cabais de que não foi por culpa sua que o património da sociedade devedora originária se delapidou e que a Administração Fiscal em face das diligências por si efetuadas, constatou que a oponente, no desempenho das suas funções de gerente da sociedade devedora originária, e em face de manifestas dificuldades e risco de solvência das dívidas da sociedade em tempo devido, não diligenciou no sentido da proteção dos credores, particulares e oficiais.(…) Em suma, sendo a ora oponente revertida em virtude de a sociedade devedora originária não ter quaisquer bens penhoráveis, e porque gerente de direito e de facto, com provas inequívocas da sua gerência, a culpa que lhe é imputada, encontra total razão de ser …”

Vejamos então.

No caso em apreço estamos perante dívida revertida de IRS dos anos de 2002, 2003 e 2004, IRC do ano de 2004 e coimas de 2005 no valor total de € 25.092,34, tendo a reversão da execução fiscal sido efectuada com base na alínea a) do nº 1 do art. 24º da LGT (cfr. alíneas F e K do probatório).

Para a apreciação da legitimidade dos executados por reversão quanto às dívidas tributárias importa ter presente o regime da responsabilidade das dívidas tributárias vertido no art. 24º da Lei Geral Tributária (LGT).

Dispõe o n.° l do art.°24.° da LGT:

Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.”

Da disposição legal acima transcrita resultam duas situações distintas:

- Na alínea a) do nº 1 refere-se à responsabilidade dos gerentes ou administradores em funções quer no momento de ocorrência do facto tributário, quer após este momento, mas antes do término do prazo de pagamento da dívida tributária, sendo esta responsabilidade pela diminuição do património social, de molde a torná-lo insuficiente para responder pelas dívidas em causa. A culpa exigida aos gerentes ou administradores, nesta situação, é uma culpa efetiva — culpa por o património da sociedade se ter tornado insuficiente. Não há qualquer presunção de culpa, pelo que de acordo com o disposto no art.º 74.º, n.º 1, da LGT, cabe à administração tributária alegar e provar a culpa dos gerentes ou administradores.

- Na alínea b) do n.º 1, refere-se à responsabilidade dos gerentes ou administradores em funções no período no qual ocorre o fim do prazo de pagamento ou entrega do montante correspondente à dívida tributária. Nesta alínea presume-se que a falta de pagamento da obrigação tributária é imputável ao gestor, cabendo a este o ónus da prova de que não lhes foi imputável a falta de pagamento.

Nos termos do citado artigo, para o que ora releva, atenta a alínea que suportou a reversão (alínea a) do nº 1 do art. 24º da LGT), os gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração nas sociedades, são subsidiariamente responsáveis em relação estas e solidariamente entre si pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.

Como se referiu anteriormente, o regime da responsabilidade tributária tem subjacente o exercício efetivo de funções por parte do gestor. In casu, o Tribunal a quo decidiu no sentido de a Recorrida exerceu as funções de gerente quer de direito, quer de facto.

Entendeu igualmente o Tribunal a quo que a administração tributária não demonstrou, ao contrário do que era seu ónus, que a Recorrida atuou com culpa.

Assim, no caso concreto, o exercício efectivo das funções de gerente e a culpa pela falta de pagamento são dois pressupostos que condicionam indelevelmente a confirmação da validade do despacho de reversão.

Porém, ao contrário do que defende a Recorrente, apesar de provada a gerência de facto e de direito pela Recorrida, não ficou provado que não foi por sua culpa que os tributos não foram pagos dentro do prazo legal em que o deviam ter sido, sendo que o ónus da prova recaía sobre a administração tributária, não tendo sido feita essa prova.

Importa agora analisar a responsabilidade subsidiária da dívida de coimas fiscais do ano de 2005.

Dispõe o art.º 8.º do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei n.º15/2001, de 5 de Junho, no segmento pertinente para os autos:

«1 - Os administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração em pessoas colectivas, sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras entidades fiscalmente equiparadas são subsidiariamente responsáveis:

a) Pelas multas ou coimas aplicadas a infracções por factos praticados no período do exercício do seu cargo ou por factos anteriores quando tiver sido por culpa sua que o património da sociedade ou pessoa colectiva se tornou insuficiente para o seu pagamento;

b) Pelas multas ou coimas devidas por factos anteriores quando a decisão definitiva que as aplicar for notificada durante o período do exercício do seu cargo e lhes seja imputável a falta de pagamento».

Como resulta da letra do preceito acima transcrito, a Administração Tributária não tem a seu favor qualquer presunção legal de culpa do revertido, de que se possa prevalecer.

Isto significa que na reversão das dívidas exequendas subjacentes a coimas fiscais, cabe à Fazenda Pública o ónus da prova no que diz respeito aos pressupostos constitutivos da culpa do revertido na insuficiência do património social ou na falta de pagamento da coima.

Como no Acórdão do STA de 27/09/2017 no proc. 0377/17 se refere “O artigo 8º do RGIT não consagra uma presunção de culpa e, por isso, recai sobre o autor do despacho de reversão o ónus de alegar a culpa do gerente pela insuficiência do património social e, sempre que essa alegação seja contestada em sede de oposição, recai sobre a Fazenda Pública o ónus de a provar, em conformidade com o disposto no artigo 74º nº 1 da LGT, sob pena de ilegitimidade do oponente para a execução.”.

Ora, nada consta do despacho de reversão quanto à dívida de coimas, designadamente o disposto no art. 8º do RGIT e no que concerne à culpa da Recorrida na situação de insuficiência patrimonial ou de falta de pagamento das coimas, pelo que, quanto a estas dívidas provenientes de coimas fiscais, ocorre igualmente a ilegitimidade da Recorrida para a execução.

Em suma, porque à luz da factualidade provada se verifica que nada ficou demonstrado quanto à eventual culpa da Recorrida pela falta de património social para pagamento das dívidas provenientes dos tributos e das coimas, e porque competia à Administração Tributária o ónus da prova dos pressupostos para essa responsabilização subsidiária, há que valorar essa falta de prova contra si.

A falta do preenchimento dos pressupostos da reversão previstos nos artigos 24º da LGT e 8º do RGIT, determina a ilegitimidade do revertido, tendo como consequência a extinção da execução fiscal quanto ao revertido.

Ao decidir no sentido da procedência da oposição por não estarem preenchidos os pressupostos da responsabilidade subsidiária, a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica.

V - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo da Recorrente, em ambas as instâncias

Lisboa, 30 de Setembro de 2020

Luisa Soares

Cristina Flora

Tânia Meireles da Cunha