Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:264/07.9BECTB
Secção:CT
Data do Acordão:11/28/2019
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IRS.
EXTEMPORANEIDADE DO PEDIDO DE REVISÃO OFICIOSA DO ACTO TRIBUTÁRIO.
ERRO IMPUTÁVEL AOS SERVIÇOS.
Sumário:i) Não é de considerar imputável aos serviços o erro das liquidações, por falta de consideração dos custos inerentes à formação da matéria colectável, quando o contribuinte não procurou suprir as omissões da contabilidade no decurso do procedimento inspectivo, apesar de notificado para o efeito.
ii) Não pode ser considerado imputável aos serviços o erro relativo a aspectos que a AT não conheceu, nem podia conhecer, por falta de colaboração do contribuinte.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão
I. Relatório
A Fazenda Pública interpõe o presente recurso jurisdicional contra sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Castelo Branco, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por J...... contra os actos de liquidação de IRS dos anos de 1997, 1998 e 2000.
A recorrente apresentou suas alegações e formulou as seguintes conclusões seguintes:

«CONCLUSÕES
a) Foram violados pela douta sentença o artigo 125/1 do CPPT e o artigo 668/1 alínea d) do CPC [actual artigo 615/1 alínea d) do CPC ("é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ...), o artigo 78/1 da LGT e o artigo 660/1 e 2 do CPC (actual artigo 608/1 e 2 do CPC), em virtude de não ter atendido à fundamentação da Fazenda e de não a ter conhecido em primeiro lugar na invocação duma excepção peremptória preclusiva do prazo de interposição da presente impugnação. Preclusão do prazo para interposição da impugnação. Violação pela douta sentença do artigo 78/1 e 3 da LGT, do artigo 74/1 da LGT e dos artigos 342/1 e 344/1 e 2 do Código Civil.
b) Subjaz à presente impugnação um pedido de revisão oficiosa nos termos do artigo 78° da LGT, pelo impugnante, das liquidações de IRS/1998 e 2000, no sentido de abrir ou fazer nascer um prazo para posterior impugnação judicial, o que se verifica.
c) Ora, em virtude do pedido de revisão oficiosa subjacente à presente impugnação ter sido efectuado já para além dos prazos de reclamação, recurso hierárquico e impugnação previstos nos artigos 70°, 66° e 102° do CPPT, ou seja, no prazo de revisão oficiosa atribuído à administração fiscal para revogar o acto tributário, este apenas poderia ter como fundamento o erro imputável aos serviços, material ou de direito, e não já ser interposto "com fundamento em qualquer ilegalidade" (artigo 78/1 da LGT). Assim o prevê desde logo o Acórdão do STA n° 080/07, de 27/06/2007, ao afirmar que "a expressão «erro imputável aos serviços» refere-se a «erro» e não a «vício», o que inculca que quer relevar os erros sobre os pressupostos de facto ou de direito que levaram a Administração a uma ilegal definição da relação jurídica tributária do contribuinte, não considerando os vícios formais ou procedimentais que, ferindo, embora, de ilegalidade o acto, não implicam, necessariamente, uma errónea definição daquela relação. Os vícios de violação do direito de audição prévia e de falta de fundamentação, na medida em que integram os invocados vícios formais ou procedimentais, não são abrangidos pelo «erro imputável aos serviços»".

d) Depois, é de evidenciar, nos termos do artigo 78/3 da LGT que "a revisão dos actos tributários nos termos do nº 1, independentemente de se tratar de erro material ou de direito, implica o respectivo reconhecimento devidamente fundamentado nos termos do nº 1 do artigo anterior", ou seja, para além de reduzir a abrangência das situações que podem ser objecto de pedido de revisão oficiosa, o "erro imputável aos serviços" incorre o requerente do pedido de revisão no ónus de provar que há "erro imputável aos serviços", sendo certo que, a haver erro, se este não for imputável aos serviços, "a administração fiscal não está sujeita ao dever de revisão oficiosa do acto tributário: ao contribuinte resta apenas a via da reclamação graciosa ou a impugnação judicial" (Código de Processo Tributário comentado por A. Barros Lima Guerreiro e J. Silvério Dias Mateus, 2ª edição página 124), previstas, para o presente caso, nos artigos nos artigos 70°, 66° e 102° do CPPT. "Esgotados os prazos, o acto consolida-se na ordem jurídica e não pode ser revisto". Ora, o que se verifica na situação em apreço é que as correcções levadas a cabo ao IRS dos anos de 1998 e 2000- cfr. relatórios de inspecção juntos aos autos - estão devidamente fundamentadas de facto e também de direito ao longo dos relatórios de inspecção, sendo com a minúcia dos factos dados a conhecer pela administração fiscal e demonstrados que são levadas a efeito as liquidações adicionais de IRS em causa.
e) Revela-se ainda esclarecedor no sentido da inexistência de erro imputável aos serviços o não exercício do direito de audição pelo contribuinte ora impugnante - não tendo exercido, apesar de notificado para tal, em nenhum dos procedimentos inspectivos o direito de audição -, precisamente porque (sendo certo que o direito de audição não exercido não lhe coarcta qualquer direito) qualquer erro que eventualmente pudesse ter sido cometido pela administração tributária ao longo do iter cogniscitivo (recolha e análise dos factos, subsunção destes ao direito) seria sempre devido ou imputável, nem que fosse indirectamente, ao impugnante em virtude da sua não participação ou falta de colaboração com vista à descoberta da verdade material. Isto porque o princípio do inquisitório, embora atribua à administração fiscal o poder e o dever de procurar a verdade material, está balizado pela lei (não pode ser almejado a qualquer preço) e pela própria falta de colaboração do contribuinte ora impugnante, direito que lhe assiste (embora com consequências negativas como a presente).

f) Note-se também que não compareceram as testemunhas arroladas pelo impugnante na sua petição inicial, no dia marcado para a sua inquirição. Facto também relevante porque, decorrendo a presente impugnação do indeferimento dum pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRS dos anos de 1998 e 2000 nos termos do artigo 78/1 da LGT, nos termos do qual "a revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou pode ser efectuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade ou por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços" (sublinhado nosso), quer em sede de pedido de revisão oficiosa, quer no âmbito da presente impugnação, há apenas matéria argumentativa sem qualquer tipo de prova adicional efectuada, não logrando, assim, o impugnante provar­ sendo seu o ónus de provar o erro imputável aos serviços -, desde logo porque não faz ou junta qualquer tipo de prova, que tipo de erro deve ser assacado ou imputado à administração fiscal que viesse inviabilizar as liquidações adicionais efectuadas.
g) Assim, para além da violação, pela douta sentença, do artigo 125/1 do CPPT e do artigo 668/1 alínea d) do CPC [actual artigo 615/1 alínea d) do CPC ("é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar...), do artigo 78/1 da LGT e do artigo 660/1 e 2 do CPC (actual artigo 608/1 e 2 do CPC), em virtude de não ter atendido à fundamentação da fazenda e de não a ter conhecido em primeiro lugar na invocação duma excepção peremptória preclusiva do prazo de interposição da presente impugnação, violou também a douta sentença o artigo 78/1 e 3 da LGT e o artigo 74/1 da LGT e os artigos 342/1 e 344/1 e 2 do CC em virtude do impugnante não ter feito qualquer tipo de prova no sentido de provar o erro imputável aos serviços, sendo seu o ónus de provar o erro imputável aos serviços.
h) Não logrando o impugnante provar nas correcções/liquidações de IRS em causa erro imputável aos serviços, tal faz precludir o prazo de interposição de revisão oficiosa prevista no artigo 78° da LGT, conduzindo à absolvição da fazenda pública da instância e do pedido.
i) Violação pela douta sentença do artigo 78/1 e 3 da LGT, do artigo 74/1 da LGT e dos artigos 342/1 e 344/1 e 2 do Código Civil.

j) Ainda no que concerne às liquidações de IRS/1998 e 2000 ora em causa, no seguimento do já referido nos autos, quanto aos fundamentos invocados de vício de violação de lei; falta de fundamentação; que a administração fiscal devia ter recorrido à avaliação indirecta uma vez que não foram considerados custos nas liquidações adicionais efectuadas, é de referir:
k) No respeitante aos dois primeiros fundamentos de impugnação -vício de violação de lei e falta de fundamentação - não concretiza o impugnante uma única vez sequer qual o facto ou vício em causa, qual o momento do iter procedimental que violou a lei fiscal e, encontrando­ se as liquidações fundamentadas de facto e de direito, não concretiza qual o facto ou momento do procedimento de inspecção que carece de fundamentação ou de razoabilidade ou de lógica. Pelo que naturalmente deverão improceder os fundamentos invocados.

l) Quanto ao fundamento da necessidade de recurso à avaliação indirecta uma vez que não foram considerados custos nas liquidações adicionais efectuadas, é de evidenciar que estamos perante uma impugnação que surge na sequência dum pedido de revisão oficiosa da liquidação nos termos do artigo 78/1 da LGT, reduzindo a abrangência das situações que podem ser objecto de impugnação em virtude da necessidade do impugnante provar que há a "erro imputável aos serviços". Ora, o que se verifica é que o impugnante não entregou as declarações de rendimentos respeitantes aos exercícios de 1998 e 2000; notificado, no âmbito dos procedimentos de inspecção, para apresentar as referidas declarações de rendimentos, a escrita e documentos subjacentes, nada apresentou. Só através da circularização de clientes, isto é, através do pedido de colaboração a clientes do impugnante foi possível fazer as correcções meramente aritméticas ora em causa, valores que o impugnante não colocou em causa quando confrontado com eles, pelo contrário, confirmando-os. Não exerceu o direito de audição nos termos do artigo 60° da LGT, não reclamou e não impugnou. No âmbito da presente impugnação na sequência de pedido de revisão oficiosa não junta qualquer prova. Ou seja, não há qualquer erro que se possa imputar aos serviços nas correcções efectuadas, decorrendo estas precisamente do total incumprimento do dever de colaboração do impugnante, da recolha de elementos junto de clientes e da confirmação desses elementos por parte do impugnante. Na fundamentação das correcções e no iter procedimental não há, pois, nenhum erro que se possa imputar à administração fiscal e, acima de tudo, a haver, sempre decorreriam da actuação do impugnante.

m) No que se refere aos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida, eles constam dos autos e da douta sentença, tendo sido juntos quer pela impugnante/recorrida, quer pela fazenda, sendo de evidenciar o pedido de revisão oficiosa interposto pelo impugnante.»

Termina-se pedindo que seja «dado provimento ao recurso e em consequência ser revogada a decisão recorrida.»

O Recorrido, não apresentou contra-alegações.

*
Foram os autos a vista da Magistrada do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
*
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
*
II. Fundamentação
2.1. Matéria de facto
A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
«Fundamentação
1De facto
Com interesse para a decisão da causa, mostram-se provados os seguintes factos:
a) Entre 25/11/1999 e 29/09/2000 decorreu acção de inspecção de âmbito circunscrito de IVA e IRS e de incidência temporal circunscrito ao exercício de 1997 à contabilidade do aqui impugnante (cfr. relatório a fls. 72 e ss. do PAT);
b) O sujeito passivo apresentou declaração de início de actividade em 25/03/1995, onde indicou o exercício a título principal da actividade de “Transporte Internacional e Nacional” (cfr. relatório a fls. 72 e ss. do PAT);
c) Da acção de inspecção concluiu-se serem de aplicar ao impugnante correcções à matéria tributável de IRS, com recurso a métodos indirectos, no valor de 29.786.000$00 (cfr. Quadro de conclusões a fls. 70 e ss. do PAT);
d) O impugnante não entregou declaração de IRS relativa ao exercício de 1997 (cfr. relatório a fls. 72 e ss. do PAT);
e) Lê-se do relatório de inspecção, além do mais, o seguinte (cfr. relatório a fls. 72 e ss. do PAT):
“IV – Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos
Por não ter apresentado a escrita e estando já excedidos os prazos que lhe foram concedidos para a sua apresentação (…) estes Serviços de Fiscalização propõem a V. Exa., para efeitos de IRS, por métodos indirectos, os valores de serviços prestados, excluídos do IVA, indicados em III deste relatório.
V – Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos.

Cálculo dos Valores

Para efeitos de IRS:
Não tendo o sujeito passivo declarado quaisquer valores, pois não apresentou a declaração mod. 2 de IRS 1997 e nem tão pouco a escrita – embora notificado para o efeito – estes serviços de Fiscalização propõem a V. Exa. a aceitação (…) dos valores líquidos constantes das facturas atrás relacionadas.
Além da notificação que lhe foi feita para a apresentação de todos os elementos de escrita, o sujeito passivo foi ainda alertado, durante o período de fiscalização para apresentar os custos inerentes à actividade exercida e compatíveis com os serviços prestados facturados.
Como não os apresentou, estes serviços propõem a aceitação da importância de 20.000.000$00 (gasóleo, pneus, óleos e outros gastos de viagem) como custos razoáveis de produção dos serviços facturados.
f) A 19/02/2001 foi proferido despacho de concordância com o relatório a que se referem as alíneas anteriores (cfr. despacho de fls. 69 dos autos);
g) Entre 03/04/2001 e 07/06/2001 foi levada a cabo acção inspectiva ao ora impugnante, em sede de IVA e IRS, relativa aos exercícios de 1998, 1999 (cfr. relatório de fls. 58 do PAT);
h) Lê-se do relatório a que se refere a alínea anterior, além do mais o seguinte, no ponto 3- IRS- Análise aos proveitos: // (…) // Desta forma, os valores a corrigir em sede de IRS, por serviços omitidos, em anexo II, são resumidamente os seguintes: [30.398.919$00].

Não tendo o sujeito passivo declarado quaisquer valores, pois não apresentou declarações de rendimento Mod. 2 e nem tão pouco escrita (…) irão ser corrigidos para determinação do resultado tributável, os valores líquidos constantes das facturas relacionadas, em anexo II.
i) No anexo II ao relatório, encontra-se um quadro descritivo das facturas emitidas pelo sujeito passivo, onde se encontram entre outras uma coluna relativa a “transporte isento”, outra relativa a “transporte sujeito” e uma outra coluna denominada “Matrícula do veículo”. (cfr. anexo II, a fls. 65 e 66 do PAT);
j) Entre 23/06/2003 e 04/08/2003 decorreu acção inspectiva contra o ora impugnante, de âmbito parcial de IVA e IRS, relativa aos exercícios de 1999 e 2000 (cfr. relatório de inspecção de fls. 24 e ss. do PAT);
k) Lê-se do relatório de inspecção, além do mais, o seguinte (cfr. relatório de inspecção de fls. 24 e ss. do PAT): // “(…) Nas diligências efectuadas não foi possível estabelecer qualquer contacto pessoal com o sujeito passivo. // (…) No dia 24 de Junho procedeu-se ao envio de uma notificação em nome do sujeito passivo, na qual se solicitava a apresentação dos seguintes elementos: fotocópia das declarações de rendimentos respeitantes aos exercícios de 1999 e 2000, e dos documentos justificativos das despesas e proveitos relacionados com a actividade exercida.
aviso de recepção foi assinado (…)
(…) o sujeito passivo não apresentou os elementos solicitados. // (…)
Deste modo a análise efectuada, tem apenas como base os elementos conhecidos e constantes do processo individual.
Capítulo III – Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas. // (…)

2- Exercício 2000
Nas diversas fichas de fiscalização constam fotocópias de facturas emitidas pelo sujeito passivo no decorrer do ano 2000. // (…)
No que respeita a custos incorridos para a obtenção de tais proveitos apenas são de considerar, conforme dispõe o artigo 23.º do CIRC, os que comprovadamente forem indispensáveis à obtenção para a realização dos proveitos.
Por motivos imputáveis ao sujeito passivo não foi possível a comprovação de qualquer valor respeitante a custos do exercício, motivo pelo qual se propõe lucro tributável do exercício de 2000, o valor de €36.574,33, igual ao valor das prestações de serviços. // (…)
No exercício de 2000 o impugnante emitiu facturas, onde descreve, entre outros, a prestação dos seguintes serviços:
“Transporte efect. p/ n/ camião (…) desde V. instalações com destino a Dinamarca” (factura 608)
“Transporte efect. p/ n/ camião (…) desde (…) com destino a Itália” (factura 610);
“Transporte efect. p/ n/ camião (…) desde Carvalhos com destino a Itália” (factura 611);
“Transporte efect. p/ n/ camião (…) desde Vila das Aves (…)com destino a Marselha”; “Transporte (…) desde Bolonha (…) com destino ao Porto” (factura 626);
“Transporte efectuado p/ n/ camião (…) desde Vila das Aves (…) com destino a Marselha” (factura 639);
“Transporte efect. p/ n/ camião (…) desde Grijó com destino a Itália” (factura 643);

“Transporte efectuado pelo nosso camião (…) desde Mirandela (…) com destino a Lyon - França” (factura 656);
“Transporte efectuado pelo nosso camião (…) desde Portugal para França e Itália (2485 Kms (…))” (factura 658);
m) A 06/08/2003 foi proferido despacho de concordância com as conclusões do relatório a que se referem as alíneas anteriores (cfr. despacho de fls. 22 do PAT);
n) A 03/05/2001 foi emitida a liquidação de IRS do ano fiscal de 1997, relativa ao aqui impugnante, com o n.º5……. (cfr. documento de fls. 84 do PAT);
o) A 22/09/2001 foi emitida a liquidação de IRS do ano fiscal de 1998, relativa ao aqui impugnante, com o n.º 5……. (cfr. documento de fls. 83 do PAT);
p) A 19/09/2003 foi emitida a liquidação de IRS do ano fiscal de 2000, relativa ao aqui impugnante, com o n.º 5……. (cfr. documento de fls. 81 do PAT);»

X
Rectifica-se a alínea g), a qual passa a ter a redacção seguinte:
«Entre 03/04/2001 e 07/06/2001 foi levada a cabo acção inspectiva ao ora impugnante, em sede de IVA e IRS, relativa aos exercícios de 1998, 1999 e 2000 (cfr. relatório de fls. 58 do PAT)»;
X
Dá-se como provado a seguinte factualidade, ao abrigo do artigo 662.º do CPC, com relevo para a decisão da causa:
q) Em 30.05.2006, o recorrido dirigiu ao Director Distrital de Finanças da Guarda pedido de revisão das liquidações de IRS de 1997, 1998, 1999 e 2000 – fls. 2/8, do p.a.
r) No Serviço de Finanças de Pinhel foram instauradas contra o recorrido execuções fiscais com vista à cobrança das dívidas emergentes dos actos tributários em apreço – fls. 13/24, do p.a.
s) As execuções fiscais referidas na alínea anterior foram garantidas por penhora dos artigos urbanos …. E…., da freguesia de Pinzío, o que determinou a sua suspensão – fls. 131/132.
t) Por meio de ofício notificado em 19.04.2007, o recorrido foi notificado do despacho de indeferimento do pedido de revisão das liquidações referido em q) – fls. 93/94, do p.a.
u) A presente impugnação judicial foi instaurada em 08.05.2007 – fls. 2.
v) Do relatório inspectivo referido em g) e h), supra, relativo aos exercícios 1998/1999/2000, consta, designadamente, o seguinte:
«3 - IRS - Análise aos Proveitos - 1998 / 1999 /2000
3.1 - Proveitos não contabilizados
Tendo sido efectuadas diligências pela Direcção de Finanças da Guarda, através do ofício n.° 1 251, Proc. 212 de 2001-02-09, foi o sujeito passivo notificado em carta registada com aviso de recepção, para no prazo de 15 dias proceder à entrega na Repartição de Finanças da área fiscal e fazer prova da apresentação na D. F. da Guarda Divisão de Inspecção Tributária, das declarações de rendimentos mod. 2 de IRS de 1998 e 1999, o que não se verificou, conforme averiguações a que se procedeu e conforme se verificou da consulta efectuada ao sistema informático.
Desta forma, dado que o sujeito passivo não cumpriu com o solicitado no ofício acima identificado, procedeu a Direcção de Finanças da Guarda à emissão da ordem de serviço já identificada, a qual originou a inspecção aos exercícios de 1998 / 1999 / 2000.
Em face do descrito, foi contactado o sujeito passivo, tendo sido solicitado ao mesmo, todos os elementos de escrita e elementos auxiliares dos já referidos exercícios.
Deste facto, resulta que o sujeito passivo informou que não possuía qualquer elemento de escrita dos exercícios em causa.
Tendo em conta o informado pelo sujeito passivo, foi o mesmo notificado pessoalmente para a apresentação da escrita, conforme anexo I.
Decorrido o prazo da referida notificação, o sujeito passivo não apresentou qualquer elemento de escrita ou a contabilidade regularmente organizada dos exercícios de 1998/1999/2000.
Após o descrito, foi confrontado o sujeito passivo com as facturas emitidas à empresa “M……. – T……, Lda., Rua do C…., …. - 3o Dt°, NIPC: 5…..”, relativas a serviços prestados, o qual confirmou a prestação desses mesmos serviços à referida empresa.
De acordo com os elementos solicitados pela Direcção de Finanças da Guarda no ofício n.° 8 ……Proc. 203 de 2000-10-19, à empresa “M......, Lda., NIPC: 5……”, e por esta enviados, foi efectuada a relação de facturas emitidas em 1998 e 1999, relativas a serviços prestados efectuados pelo sujeito passivo J......, NIF: 1……., em anexo II.
De referir, que da análise efectuada aos extractos da conta corrente enviada pela M......, Lda., NIPC: 5……, foi ainda possível verificar o pagamento de inúmeras facturas relativas a serviços prestados.
Desta forma, os valores a corrigir em sede de IRS, por serviços prestados omitidos, em anexo II, são resumidamente os seguintes:
“(texto integral no original; imagem)”


Não tendo o sujeito passivo declarado quaisquer valores, pois não apresentou as declarações de rendimentos Mod. 2 e nem tão pouco a escrita, embora notificado para o efeito, irão ser corrigidos para determinação do resultado tributável, os valores líquidos constantes das facturas relacionadas, em anexo II.
Em face do descrito, vai ser preenchido para correcção desta irregularidade, as respectivas declarações oficiosas, onde vão ser acrescidos os valores de 30398 919$00 para o exercício de 1998 e de 500 000$00 para o exercício de 1999.
De referir, que em relação ao exercício de 2000, não foi efectuada qualquer correcção, uma vez que não foi possível determinar valores de eventuais serviços prestados a eventuais clientes, por falta de elementos concretos».
x) Na acção inspectiva referia em g), o contribuinte foi notificado para exercer a audição prévia, sem que tenha apresentado alegações – fls. 63 do p.a.
y) Na acção inspectiva referida em j), o contribuinte foi notificado para exercer a audição prévia, sem que tenha apresentado alegações – fls. 28 do p.a.
X
2.2. Do Direito
2.2.1. Nos presentes autos é sindicada a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Castelo Branco, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial apresentada por J......, contra os actos de liquidação de IRS dos anos de 1997, 1998 e 2000. A sentença determinou o seguinte: «anulo as liquidações de IRS dos exercícios de 1998 e 2000, mantendo a liquidação impugnação em relação ao exercício de 1997».
2.2.2. A presente intenção recursória assenta, em síntese, nos vícios da sentença seguintes:
a) Nulidade, por omissão de pronúncia, dado que a sentença não se pronunciou sobre a “excepção peremptória preclusiva do prazo possibilitador de interposição da presente impugnação”.
b) Erro de julgamento, por preterição do prazo preclusivo do pedido de revisão oficiosa do acto tributário e consequente caducidade do direito de acção.
c) Erro de julgamento, porquanto as liquidações de IRS de 1998 e 2000 não padecem dos vícios de falta de fundamentação e de violação de lei.
2.2.3. No que respeita à nulidade por omissão de pronúncia sobre a excepção peremptória preclusiva do prazo possibilitador de interposição da presente impugnação, a recorrente argumenta que «[s]ubjaz à presente impugnação um pedido de revisão oficiosa nos termos do artigo 78° da LGT, pelo impugnante, das liquidações de IRS/1998 e 2000, no sentido de abrir ou fazer nascer um prazo para posterior impugnação judicial, o que se verifica; Ora, em virtude do pedido de revisão oficiosa subjacente à presente impugnação ter sido efectuado já para além dos prazos de reclamação, recurso hierárquico e impugnação previstos nos artigos 70°, 66° e 102° do CPPT, ou seja, no prazo de revisão oficiosa atribuído à administração fiscal para revogar o acto tributário, este apenas poderia ter como fundamento o erro imputável aos serviços, material ou de direito, e não já ser interposto "com fundamento em qualquer ilegalidade" (artigo 78/1 da LGT)».
Vejamos.
A omissão de pronúncia sobre questões de que devesse tomar conhecimento é fundamento da nulidade da sentença (artigo 615.º/1/d), CPC). «O conceito de questões abrange tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem»(1). «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras» (artigo 608.º/2, do CPC).
Compulsados os autos, verifica-se que a excepção preclusiva em referência do caso decidido associado ao decurso do prazo de dedução do pedido de revisão foi invocada pela recorrente, em sede de alegações pré-sentenciais.
Uma vez que a caducidade do direito de acção constitui excepção peremptória de conhecimento oficioso (artigo 333.º do CC)(2), o tribunal recorrido podia e devia ter conhecido da mesma na sentença, pelo que ao ter omitido a referida apreciação incorreu no vício de omissão de pronúncia sobre questão de que cumpre conhecer (artigo 615.º/1/d), do CPC). A sentença deve ser anulada com este fundamento.
Termos em que se julga procedente a presente imputação.
Havendo elementos nos autos e uma vez observado o contraditório prévio (fls. 217/219), cumpre aferir do bem fundado do fundamento de caducidade da acção em referência.
2.2.4. No que respeita às liquidações de 1998 e 2000, a recorrente invoca a excepção preclusiva em referência do caso decidido associado ao decurso do prazo de dedução do pedido de revisão.
Estatui o artigo 78.º, n.º 1, da LGT, que «[a] revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou pode ser efectuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços».
A argumentação da recorrente é a seguinte:
i) Estão em causa as liquidações de 1998 e 2000, cuja data de emissão é respectivamente, de 22.09.2001 e 19.09.2003 (alíneas o) e p)).
ii) O prazo de dedução do pedido de revisão oficiosa da liquidação de quatro anos a contar da liquidação não foi observado, dado que não foi demonstrado erro imputável aos serviços (artigo 78.º/1/, 2ª parte).
iii) No caso, o recorrido não logrou demonstrar que existe erro imputável aos serviços na elaboração das liquidações; ao invés, as mesmas mostram-se fundamentadas, quer do ponto de vista formal, quer do ponto de vista material.
Sobre a matéria em exame constitui jurisprudência assente a seguinte.
i) «O «erro imputável aos serviços» constante do art. 78.°, n.° 1, in fine, da LGT compreende o erro de direito cometido pelos mesmos que não apenas o simples lapso, erro material ou de facto»(3).
ii) «Deve considerar-se como erro imputável aos serviços o vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto, quando os factos foram apurados pela AT que, com base neles, procedeu à correcção do lucro tributável declarado e à liquidação adicional do imposto»(4).
iii) «O “erro imputável aos serviços” constante do art.º 78º, nº 1 da LGT compreende não só o lapso, o erro material ou o erro de facto, como também o erro de direito, e essa imputabilidade é independente da demonstração da culpa dos funcionários envolvidos na liquidação afectada pelo erro»(5).
Por seu turno, do probatório resultam os elementos seguintes:
i) Em 22/09/2001 foi emitida a liquidação de IRS do ano fiscal de 1998(6).
ii) Em19/09/2003 foi emitida a liquidação de IRS do ano fiscal de 2000(7).
iii) Em 30.05.2006, o recorrido dirigiu ao Director Distrital de Finanças da Guarda pedido de revisão das liquidações de IRS em causa(8).
Uma vez que o pagamento do imposto em apreço se mostra garantido, com inerente suspensão da execução fiscal(9), impõe-se indagar se foi (ou não) comprovada nos autos a ocorrência de erro imputável aos serviços que logre reabrir o prazo de dedução do pedido de revisão oficiosa da liquidação (quatro anos a contar da liquidação, artigo 78.º/1, 2.ª parte, da LGT), e o consequentemente, o prazo de instauração da impugnação judicial.
Dos elementos coligidos nos autos verifica-se que o recorrido não logrou demonstrar a ocorrência de erro imputável aos serviços, como base para a elaboração das liquidações adicionais em causa.
Ao invés, do probatório resultam os elementos seguintes:
i) O contribuinte não apresentou declarações de rendimentos nos exercícios em causa(10).
ii) Uma vez detectada pelos serviços de inspecção a existência de facturação emitida pelo contribuinte, junto de terceiros/clientes, foi solicitada a apresentação da contabilidade do mesmo, o que não foi observado(11).
iii) Foi-lhe solicitado a entrega de elementos que justificassem os custos/gastos, o que não fez(12).
iv) Notificado dos projectos de relatórios inspectivos, o contribuinte não exerceu o direito de audição(13).
Perante o quadro factual descrito, verifica-se que o contribuinte não observou os deveres de colaboração, de declaração e de registo que sobre si recaem (artigos 59.º/4 e 75.º da LGT). Também não procurou obviar a tal incumprimento no âmbito dos procedimentos inspectivos. Nesta medida, a existir erro nas liquidações em apreço, o mesmo não pode ser imputável aos serviços, dado que não pode servir de fundamento de tal erro aquilo que a AT não conheceu, nem podia conhecer, por falta de colaboração do contribuinte(14). Como sucede no caso em exame.
Não se oferece tempestivo o pedido de revisão oficiosa da liquidação em referência, dado que o pressuposto determinante do erro imputável aos serviços não se comprova nos autos (artigo 78.º/1, 2.ª parte, da LGT).
A falta de tempestividade do pedido de revisão em apreço implica a falta de tempestividade da acção impugnatória em exame, dado que a mesma constitui contestação das liquidações com base nos argumentos desatendidos no procedimento de revisão oficiosa.
Motivo porque se impõe julgar procedente a excepção peremptória da caducidade da acção, absolvendo a recorrente, Fazenda Pública, do pedido.
Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso.

III. Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, anular a sentença recorrida e, em substituição, julgar procedente a excepção de caducidade da acção, absolvendo a Fazenda Pública do pedido.

Custas pela recorrido, com dispensa da taxa de justiça em 2.ª instância, dado não ter oferecido contra-alegações.
Registe.
Notifique.


D.n.
Lisboa, 28/11/2019

Jorge Cortês - Relator

1.º Adjunto

2.º Adjunto


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(1)Jorge Lopes Sousa, CPPT Anotado, 6.º Ed., vol. II, p. 363.
(2)Neste sentido, V. Jorge Lopes Sousa, CPPT Anotado, 6.º Ed., vol. II, pp. 155/156. V. neste sentido, Acórdão do STA, de 30.10.2019, P. 01086/14.6BELRS 01449/17
(3)Acórdão do STA, de 11.05.2005, P. 0319/05
(4).04.05.2016, P. 0407/15
(5).08.03.2017, P. 01019/14
(6).Alínea o).
(7).Alínea p).
(8).Alínea q).
(9).Alíneas r) e s).
(10).Alínea v).
(11).Alineas k), l) e v).
(12).Alínea e), ponto V.
(13).Alineas x), e y).
(14).Neste sentido, V. Pedro Marques, A revisão do acto tributário, Cadernos IDEFF, n.º 19, 2015, p. 235.