Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:717/10.1BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:02/25/2021
Relator:ANTÓNIO ZIEGLER
Descritores:IRS.
BENEFICIO FISCAL: ARTº 56º DO E.B.F.
RENDIMENTOS DE PROPRIEDADE ARTÍSTICA E RESULTANTES DA VENDA DO OBRAS DE ARTE E DE DIVULGAÇÃO
Sumário:
I) O beneficio fiscal ínsito no artº 56º, do E.B.F., compreende os direitos de autor sobre a obra, assim como o direito de propriedade sobre as coisas materiais que servem de suporte à sua fixação, nos termos do disposto no artº 10º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos.

II) No caso, como o presente, de obras de arte plástica, a sua venda pressupõe que se trate do obra original, assim como a sua exposição e divulgação pedagógica, constituem manifestações de tais direitos nas duas vertentes supra referidas.

III) A apresentação de facturas que comprovem a sua natureza de obra de arte é suficiente para os ditos efeitos do beneficio fiscal.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECCÂO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

1 - RELATÓRIO

A Exma. Representante da Fazenda Pública, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por J….. e D….., da liquidação adicional de IRS de 2005, na importância total de 4 084,48.

Para o efeito apresenta as seguintes conclusões:

1. Visa o presente recurso reagir contra a decisão proferida nos presentes autos que julga procedente a impugnação deduzida por J….. (e Outros) da liquidação de IRS referente ao ano de 2005, no montante de € 4.084,48.

2. A douta sentença afirma ser a Impugnante um nome conhecido no âmbito da arte plástica pelo grande público, pelo que, considerando que a propriedade intelectual sobre a criação não se confunde com a obra, têm de ser qualificadas as peças transmitidas, e que geraram o rendimento em causa nos presentes autos, como obras de arte originais produzidas pela autora, tratando-se de rendimentos provenientes da alienação de obras de arte de exemplar único, entendimento do qual clara e respeitosamente discorda a Fazenda Pública.

3. Sucede que a douta sentença conclui serem qualificadas as peças transmitidas pela impugnante como obras de arte originais produzidas pela autora, estando em causa rendimentos provenientes da alienação de obras de arte de exemplar único, sem que proceda à enumeração das premissas de facto que permitam alcançar tal juízo, pois as supostas premissas são já conclusões em si próprias.

4. Se, por um lado, o facto notório de J….. ser um nome conhecido do grande público não permite qualificar todo o trabalho por si desenvolvido como obra de arte de exemplar único, por outro lado, não se percepciona como, por via desse singelo facto, conclui a douta sentença terem de ser consideradas as “peças transmitidas e que geraram o rendimento aqui em causa” nos autos como obras de arte originais produzidas pela autora.

5. Pois que, dos factos assentes resulta apenas e tão só a enumeração das facturas n.°s 26, 30, 31, 32, 34, 39, 40, 41 e 43 (pontos c., g., h., i., o., p., q. e s. da alínea E) do probatório), dos quais resulta somente a referência a “Escultura «Coração Independente» (ponto c. da alínea E) dos factos provados), a prestações da peça «Ópio» (pontos g., h., L, o., p. e q. da alínea E) dos factos provados) e «Venda da peça Carrossel» (ponto s. da alínea E) dos factos provados), daí não resultando, sem mais, que estejamos perante obras de arte de exemplar único, facto contrariado pelas próprias facturas, das quais não consta qualquer referência à alienação de peças de “exemplar único”.

6. E à mesma conclusão se chega no referente ao contrato de compra e venda da peça Ópio, porquanto do mesmo consta que estejamos perante obra de arte de exemplar único, como prescreve o n.° 1 do artigo 56.° do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

7. E quanto à peça Coração Independente, vejamos que no referente à factura correspondente constante do ponto c. da alínea E) do probatório já referida, não consta também menção ao facto de se tratar de exemplar único, mais se devendo atentar a que a cláusula 7.a do contrato de compra e venda de tal peça, junto aos autos com a p.i. como documento n.° 11 (e não contante do probatório) permitida a reprodução da obra, decaindo assim o seu estatuto de alegado exemplar único.

8. Mais, de tal contrato resulta que o objecto do mesmo se restringe à execução e aquisição da peça (cláusula 5.a do contrato), excluindo-se a montagem, pelo que, o facto constante do ponto j. da alínea E) do probatório, referente a factura emitida por ocasião da prestação de serviço de montagem da peça «Coração Independente», nunca se poderia incluir no conceito de obra de arte de exemplar único, não sendo, por isso, os rendimentos qualificáveis como rendimentos de propriedade intelectual à luz do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

9. Por outro lado, e com referência à peça “Ópio” considerou a douta sentença como provado que as facturas n.° 27, 28 e 29 constantes dos pontos d., e., e f. da alínea E) dos factos provados, referentes à primeira, segunda e terceira prestações da peça Ópio, emitidas a favor de E….., S.A., foram anuladas e emitidas então as facturas n.° 30, 31 e 32 constantes dos pontos g., h. e i. da alínea E) dos factos provados, referentes também à primeira, segunda e terceira prestações da peça Ópio, emitidas desta vez a favor de Q….., S.A., mas não demonstra em que factos alicerçou tal conclusão, pois das facturas apresentadas com a p.i. tal facto não resulta, e a alegação subsequente de que as mesmas terão sido anuladas mostra-se insuficiente, considerando que os documentos apresentados com o fim de provar a anulação se limitam a cópias, não resulta das mesmas que tenham sido anuladas, e considerando ainda que tal não menção não se enquadra no comportamento habitual da impugnante no referente ao tratamento dado às facturas anuladas, pois da factura n.° 35 consta expressamente a sua anulação (vide facto contante no ponto I. da alínea E).

10. E, quanto à prova testemunhal, a que a douta sentença não se refere nos factos provados, neste particular aspecto, adiantou a segunda testemunha não ter conhecimento efectivo da explicação a dar às duas supostas transmissões da mesma peça a entidades diversas, mas acrescentou que tal facto se poderia ter devido ao facto de “os coelhos terem roído a estrutura da peça”, no local onde a mesma se encontrava montada, explicação esta pouco inteligível mas esclarecedora quanto à possibilidade de a peça poder ter sido alienada mais que uma vez.

11. Ainda, quanto à peça denominada “Carrossel” e indicada no ponto s. da alínea E) dos factos provados, constata-se não figurar da respectiva factura n.° 43 menção de se tratar de exemplar único, nem existir contrato de compra e venda da peça junto aos autos de que resulte tal alusão.

12. Por sua vez, os factos constantes dos pontos a., b., k., m., n. e r. da alínea E) do probatório referem-se a factos não subsumíveis no conceito de transmissão, do qual faz depender a douta sentença a qualificação dos rendimentos percebidos a título de rendimentos provenientes da alienação de obras de arte de exemplar único; os pontos a. e b. da alínea E) referem-se a uma exposição, cujos contornos e conteúdo se desconhecem, e não são enunciados na douta sentença, nem tão pouco demonstrados pela impugnante; o ponto K. da alínea E) do probatório refere-se a montagem da peça “Valquíria” no âmbito de exposição cujas circunstâncias de tempo, modo, lugar e conteúdo se desconhecem, e não são enunciadas na douta sentença, nem referidas pela impugnante; já o ponto n. da alínea E) dos factos provados se refere a operação que não se reporta a transmissão de qualquer peça; e o ponto r. da alínea E) do probatório não se refere também à alienação de qualquer peça, pelo que, dificilmente enquadrável na qualificação de alienação de obras de arte de exemplar único levada a cabo pela douta sentença.

13. Por fim, o ponto m. da alínea E) do probatório refere-se a “produção e execução de uma peça de cerâmica produzida a 200 exemplares pela F…..”, daí não decorrendo a unicidade do exemplar produzido, dificuldade que se adensa atento o facto de ter sido a peça de cerâmica produzida em número que ascende a 200 exemplares(l), e importaria, assim, determinar quantas peças de cerâmica transformou ou tratou a impugnante, e em que termos tal afirmada pela douta sentença transformação ou tratamento aconteceu, mas a douta sentença não aborda o tema, aceitando como verdade insofismável que uma qualquer alegada transformação concede à peça de cerâmica produzida em 200 exemplares o estatuto de obra de arte de exemplar único.

14. E, desta forma verificamos que qualquer dos factos pretendidos reconduzir pelo Tribunal a quo ao conceito de obras de arte de exemplar único se mostra deficientemente qualificado, pois que, ou não está em causa a alienação de qualquer peça, ou está em causa a alienação de peça cujos contornos de execução, por desconhecidos, não permitem a sua consideração como obra de arte, ou estamos perante alegada obra de arte cuja reprodução é permitida, ou estamos perante obra de arte sem estatuto de exemplar único.

15. Com efeito, não basta à impugnante alegar tratar-se de rendimentos decorrentes da alienação de obra de arte de exemplar único, cabe-lhe fazer a prova de tais factos, contextualizando a percepção de tais rendimentos quanto às circunstâncias de tempo, modo, lugar, com individualização concreta e precisa de cada uma das peças em causa nos autos, bem como procedendo ao necessário nexo de causalidade entre cada uma das peças e o rendimento percebido.

16. E à douta sentença não bastará a enunciação das facturas relacionadas com os rendimentos alegadamente provenientes de propriedade artística da impugnante, sem que proceda a cuidada escalpelização da origem de cada um dos rendimentos em relação com cada uma das peças, de modo a assegurar que o rendimento efectivamente provém da alienação de obra de arte de exemplar único.

17. Mais atentemos a que, aludindo a douta sentença ao depoimento das testemunhas ouvidas como tendo confirmado os factos, não se percepciona a quais factos provados dizem respeito tais depoimentos, porquanto os factos do probatório resultam provados conforme documentos constantes dos autos, prescindindo, pois, de prova testemunhal, sendo que, nesses termos a prova testemunhal de factos já de si provados documentalmente se mostra despicienda, não alterando a consideração de que não resulta da douta sentença, nem dos autos, a demonstração inconclusiva de estarmos perante peças de obras de arte de exemplar único.

18. Consideremos, ademais, que a impugnante se encontrava à data inscrita como artesã e não como artista plástica, daí se recolhendo um indício válido de que os rendimentos que percepcionava se processariam no seio da actividade declarada, e que era “Fabrico de artigos de joalharia”, o que determinava uma imposição acrescida à impugnante no sentido de trazer aos autos factos que demonstrem um efectivo exercício da actividade noutros moldes, com prova inequívoca de que aquelas peças alegadamente executadas e consideradas pela impugnante como obras de arte exemplar único se enquadram na categoria de obras de arte de exemplar único.

19. Concluímos, nestes termos, não se mostrarem os factos dos presentes autos subsumíveis na realidade a que aponta a previsão da norma do n.° 1 do artigo 56.° do Estatuto dos Benefícios Fiscais, por não estarem em causa rendimentos comprovadamente provenientes de propriedade artística, não tendo a impugnante cumprido com o ónus da prova que emerge do disposto no n.° I do artigo 74.° da Lei Geral Tributária, não lhes sendo portanto aplicável o pretendido benefício fiscal.

20. Não obstante, cabe-nos, ainda, referir que a impugnante se refere a rendimentos que ascendem ao montante de € 45.900,00, conforme documento 10 junto com a p.i., verificando-se que a douta sentença não considerou como enquadráveis em rendimentos provenientes da alienação de obra de arte de exemplar único as operações correspondentes às facturas n.°s 37 (venda da peça Santola) e 38 (montagem da peça “a noiva” na bienal de Veneza), pelo que nunca a impugnação deduzida poderia ser julgada totalmente procedente.

21. Atento o exposto, e ao previsto no n.° 1 do artigo 56.° do Estatuto dos Benefícios Fiscais, bem como ao disposto nos artigos 1° e 2.° do Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos, bem como ao n.° 1 do artigo 74.° da Lei Geral Tributária, não se incluem os rendimentos percebidos pela impugnante, e em causa nos presentes autos, na categoria de rendimentos de propriedade literária, artística e científica para efeitos de aplicação do benefício fiscal decorrente da norma citada.

22. Nestes termos, a douta sentença padece de erro de julgamento de facto, tendo procedido a errónea apreciação dos factos, violando assim o disposto no n.° 1 do artigo 74.° da Lei Geral Tributária e n.° 1 do artigo 56.° do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

23. Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., concedendo-se provimento ao recurso, deve ser revogada a douta sentença recorrida, com as devidas consequências legais.

Sendo que V. Exas. Decidindo farão a Costumada Justiça.”.

Por sua vez os recorridos apresentaram contra-alegações , tendo formulado as seguintes conclusões:

40. Em face de tudo o exposto, a conclusão a extrair da letra das facturas e do teor do contratos parece ser precisamente a contrária à extraída pela AT, ou seja, a leitura dos descritivos das faturas e dos contratos, evidencia tratarem-se de peças únicas, originais.

41. Acresce ainda o facto que a lei não prevê a obrigatoriedade de mencionar a expressão «exemplar único» na fatura ou no documento equivalente, para auferir do benefício consagrado no artigo 58° do EBF.

42. Além do mais a menção «exemplar único» também não é utilizada nos usos do comércio de obras de arte porque, por definição de conceito, uma obra de arte é uma peça de exemplar único.

43. Assim sendo, repetimos, não se vislumbra o motivo, se é que existe algum, que levou a AT, perante os documentos acima descritos, a concluir que existem várias obras de arte iguais àquelas que a impugnante, ora recorrida, alienou.

44. Dito por outras palavras, a análise dos documentos não reflete um único que indício que alvitre justificar a conclusão da AT.

45. Os depoimentos de ambas as testemunhas foram peremptórios em afirmar que todas as obras de arte, em análise no caso sub judice, são peças de exemplar único.

46. Assim sendo, com o devido respeito, que é muito, a AT qualificou erroneamente os factos tributários e, em consequência, o ato tributário de liquidação que ora se impugna deve ser anulado, com fundamento no artigo 99° alínea a) do CPPT.

47. Sem nada conceder, admitindo, por mera hipótese, que os documentos não permitem concluir claramente que estamos em presença de obras de exemplar único, o certo é que não há nada que indicie tratarem-se de várias obras iguais pelo que, quando muito, poderá de existir alguma dúvida sobre se estamos perante obras de exemplar único ou perante obras «em série», (iguais umas às outras).

48. Ora, nos termos do n° 1 do artigo 100° do CPPT, «sempre que da prova produzida resulte afundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o acto impugnado ser anulado.»

49. No caso concreto em apreço, na opinião da ora recorrida, os documentos evidenciam tratar-se de peças de exemplar único. Contudo, mesmo admitido a hipótese de existir fundada dúvida sobre se o teor dos documentos permite concluir se estamos perante peças de exemplar único, ainda assim, nesse caso haverá que anular o acto tributário de liquidação, na parte que ora se impugna, por força do n° 1 do artigo 100° do CPPT, porque, em caso de dúvida, o acto deverá ser anulado.

50. Por último, mas não menos relevante, acrescente-se que, nos termos do artigo 75° n° 1 da LGT, «presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos».

51. A impugnante apresentou a declaração de autoliquidação de IRS cumprido, nos termos previstos na lei, as obrigações declarativas a que está sujeita.

52. A impugnante considerou na sua declaração de autoliquidação que o rendimento auferido é proveniente da alienação de obras de exemplar único, razão pela qual aproveitou o benefício fiscal previsto no artigo 58° do EBF, aplicável aos rendimentos provenientes da alienação do corpus mechanicum de obras de exemplar único.

53. As declarações fiscais apresentadas não revelam omissões ou erros, suscetíveis de impedirem o conhecimento da matéria coletável do sujeito passivo ora impugnante.

54. Não se verifica nenhum dos requisitos previstos no n°2 do artigo 75° da LGT, pelo que vigora a presunção de veracidade das declarações da A.

55. A Autoridade Tributária, quer no relatório de ação inspetiva quer em sede de contestação, quer em sede do presente recurso, não aditou qualquer facto ou documento com vista a ilidir a presunção de veracidade das declarações da impugnante.

56. «Assim, nestes casos, se a Administração Tributária não demonstrar a falta de correspondência entre o teor de tais declarações e a realidade, o seu conteúdo terá de se considerar como verdadeiro» (cfr. comentário ao artigo 75°, in LGT anotada e comentada por Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, 4a Edição, 2012).

57. Por tudo o exposto, nada mais será necessário acrescentar, em matéria de direito, para concluir que o ato tributário de liquidação, na parte que ora se impugna, é anulável com fundamento no artigo 99° alínea a) e, subsidiariamente, sem nada conceder, no artigo 100° n°l do CPPT.”

*

A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta neste Tribunal é de parecer que o recurso não merece provimento pelas razões aduzidas na sentença recorrida.

*

Com dispensa dos vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.


2 - DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações apresentadas pela Recorrente (artigos 635.° n.°4 e 639.° n.° 1, do CPC),são estas, em síntese, as questões que importa conhecer: (i) se a sentença incorreu em erro de julgamento tendo feito deficiente apreciação e valoração da prova e deficiente selecção da matéria de facto relevante para a decisão; (iii) se a sentença incorreu em erro de julgamento quanto ao critério de repartição do ónus de prova e na interpretação e aplicação dos preceitos contidos nos artigos 74.° da LGT e no disposto no nº1, do artº 56º, do EBF.

3 - DA MATÉRIA DE FACTO

Em 1ª instância deixou-se consignado em sede factual: 

A) A impugnante J….. iniciou a atividade profissional em 1995.10.01, dedicando-se ao fabrico de artigos de joalharia e outros, a que correspondia o CAE 032122 (cf. fls. 16 do processo em papel);

B) Em 2002.12.20, candidatou-se ao prémio ….. (cf. fls. 17 - Id.);

C) Em 2003.02.05, foi-lhe atribuído o Prémio ….., destinado a galardoar a carreira de um jovem artista plástico (cf. fls. 18 e 19 - Id.);

D) Em 2007.05.21, os Impugnantes preencheram e entregaram via internet declaração de substituição Modelo 3 de IRS do exercício de 2005, constante de fls. 23 a 29 do processo em papel e que aqui se dá como integralmente reproduzida, acompanhada dos Anexos B - Categoria B (Regime Simplificado) e H - Benefícios Fiscais e deduções; desta transcreve-se:

a. (...);

b. Modelo 3 - Anexo B;

c. (….);

d. Rendimentos Profissionais, comerciais e industriais

i. (…);

ii. Propriedade intelectual (L404): € 33 669,99;

iii. (…);

e. Modelo 3 - Anexo H;

i. (Q5) - Rendimentos da propriedade intelectual isentos parcialmente - artigo 56° do EBF:

ii. (…)

iii. (L501) - Montante do Rendimento: € 33 669,99;

iv. (…);

E) Em 2005, a impugnante J….. emitiu as seguintes faturas (cf. fls. 30 a 40 do processo em papel):

a. Fatura n° 24, emitida em 2005.01.11, a favor de ….. (...), Paris, no montante de € 15 925,00, com a menção Isento de IVA - artigo 6/5.d) - Exposição de «J…..»;

b. Fatura n° 25, emitida em 2005.01.11, a favor de ….. (...), Paris, no montante de € 2 164,98, com a menção Isento de IVA - artigo 6/5.d) - Despesas com a montagem da Exposição de «J…..»;

c. Fatura n° 26, emitida em 2005.02.28, a favor de E….., SA, (...) Lisboa, no montante global de € 8 400,00, com as menções IVA - artigo 35°.f) - IVA 5%: € 400,00, retenção IRS 10%: 800,00 - Escultura «Coração Independente» - restantes 50%;

d. Fatura n° 27, emitida em 2005.07.31, a favor de E….., SA, (...) Lisboa, no montante global de € 1312,50, comas menções IVA 5%: € 62,50, retenção IRS 10%: € 125,00 - 1a prestação da peça «Ópio» - Julho;

e. Fatura n° 28, emitida em 2005.08.31, a favor de E….., SA, (...) Lisboa, no montante global de € 1312,50, comas menções IVA 5%: € 62,50, retenção IRS 10%: € 125,00 - 2a prestação da peça «Ópio» - Agosto;

f. Fatura n° 29, emitida em 2005.09.06, a favor de E….., SA, (...) Lisboa, no montante global de € 1312,50, com as menções IVA 5%: € 62,50, retenção IRS 10%: € 125,00 - 3a prestação da peça «Ópio» - Setembro;

g. Fatura n° 30, emitida em 2005.07.31, a favor de Q….., SA, (...) Coimbra, no montante global de € 1312,50, com as menções IVA 5%: € 62,50, retenção IRS 10%: € 125,00 - 1a prestação da peça «Ópio») - Julho;

h. Fatura n° 31, emitida em 2005.08.31, a favor de Q….., SA, (...) Coimbra, no montante global de € 1312,50, com as menções IVA 5%: € 62,50, retenção IRS 10%: € 125,00 - 2a prestação da peça «Ópio) - Agosto;

i. Fatura n° 32, emitida em 2005.09.06, a favor de Q….., SA, (...) Coimbra, no montante global de € 1312,50, com as menções IVA 5%: € 62,50, retenção IRS 10%: € 125,00 - 3a prestação da peça «Ópio) - Setembro;

j. Fatura n° 33, emitida em 2005.10.24, a favor de V….., Lda., (...) Lisboa, no montante global de € 2 420,00, com as menções IVA 21%: € 420,00, retenção IRS 20%: € 400,00 - Montagem da peça «Coração Independente» para a exposição (…);

k. Fatura n° 34, emitida em 2005.10.24, a favor de F….. (...) Lisboa, no montante global de € 6050,00, com as menções IVA 21%: € 115,50, retenção IRS 20%: € 110,00 - Montagem da peça «Valquíria 4» 2004, para a exposição (...);

l. Fatura n° 35 - Anulada;

m. Fatura n° 36, emitida em 2005.11.24, a favor de Câmara Municipal de Lisboa (...), no montante global de € 7 875,00, com as menções IVA 5%: € 375,00, retenção IRS 20%: € 1 575,00 - Produção e execução de uma peça em cerâmica produzida a 2000 exemplares pela F…..;

n. Fatura n° 38, emitida em 2005.11.05, a favor de Fundo de Fomento Cultural (...), no montante de € 5 000,00, com as menções Isento artigo 9/22;

o. Fatura n° 39, emitida em 2005.11.28, a favor de Q….., SA (...), no montante global de € 1 312,50, com as menções IVA artigo 35/5.f) do CIVA, IVA 5%: € 62,50, retenção IRS 10%: € 125,00 - 4a prestação da Peça «Ópio» - Outubro;

p. Fatura n° 40, emitida em 2005.11.30, a favor de Q….., SA (...), no montante global de € 1 312,50, com as menções IVA artigo 35/5.f) do CIVA, IVA 5%: € 62,50, retenção IRS 10%: € 125,00 - 5a prestação da Peça «Ópio» - Novembro;

q. Fatura n° 41, emitida em 2005.12.02, a favor de Q….., SA (...), no montante global de € 1 312,50, com as menções IVA artigo 35/5.f) do CIVA, IVA 5%: € 62,50, retenção IRS 10%: € 125,00 - 6a prestação da Peça «Ópio» - Dezembro;

r. Fatura n° 42, emitida em 2005.12.05, a favor de C….. (...) Lisboa, no montante global de € 121,00, com as menções IVA artigo 35/5.f) do CIVA, IVA 21%: € 21,00, o IRS 20%: € 20,00 - Conferência sobre arte contemporânea;

s. Fatura n° 43, emitida em 2005.12.19, a favor de Caixa geral de depósitos (...), no montante global de € 26 250,00, com as menções IVA 5%: € 1 250,00, IRS 10%: € 2 500,00 - Venda da peça Carrossel (...);

F) Os originais das faturas identificadas na alínea anterior sob as letras d) e) e f), com os n° 27, 28 e 29, emitidas a favor de E….., SA, foram devolvidas à Impugnante (cf. fls. 164 a 172 do processo em papel);

G) Em 2005.06.20, a Impugnante e a sociedade Q….., SA, com sede na Rua António Augusto Gonçalves, em Coimbra, outorgaram o contrato de compra e venda constante de fls. 159 a 162 do processo em papel, e que aqui se dá como integralmente reproduzido, que tem por objeto a aquisição, a título definitivo, por parte da Q….., SA, da obra de arte de que é dona a Impugnante, com o título Ópio, mediante a contrapartida de € 20 000,00;

H) O exercício de 2005, foi inspecionado e o rendimento líquido alterado para mais € 46 565,99 (cf. fls. 42 - Id.);

I) Do relatório elaborado em 2009.11.30, pela Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, constante de fls. 122 a 138 do PA e que aqui se dá por integralmente reproduzido, transcreve-se:

a. (...);

b. III - Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas:

c. (...);

d. Em face do conteúdo das declarações, foi verificada, nomeadamente, a existência de:

i. Rendimentos inscritos no anexo H da declaração modelo 3 de IRS, como sendo rendimentos isentos parcialmente (artigo 58° do EBF), sem que os suportes documentais tal confirmem;

ii. Operações inscritas nas declarações periódicas de IVA como sendo sujeitas à taxa reduzida de IVA, apesar de as operações efetuadas não constarem da lista I (bens e serviços sujeitos à taxa reduzida de IVA);

e. Não tendo sido obtidos quaisquer elementos esclarecedores, afigura-se que deverão ser sujeitos a tributação os rendimentos declarados, conforme a seguir descrito:

f. III. 1 - Correções em sede de IRS

i. A situação descrita, traduziu-se em omissões praticadas na declaração modelo 3 - anexo B, com reflexo no apuramento do rendimento coletável:

ii. Ano 2005

1. (…);

2. Liquidação a efetuar no âmbito da ação inspetiva:

3. Rendimento coletável:

4. Total dos rendimentos: € 71 639,98 x 65% = € 46 565,99;

5. Correção ao rendimento coletável: € 17 676,10;

g. (…);

J) Em 2009.12.12, foi emitida a liquidação de IRS n° ….., do ano de 2005, constante de fls. 14 do processo em papel e que aqui se dá como integralmente reproduzida, com valor a pagar de € 4 084,48;

K) Com data de compensação de 2009.12.16, foi emitida a demonstração de acerto de contas documento n° ….., com saldo a pagar de € 6 284,42 e data limite de pagamento de 2010.01.27;

L) Em 2010.04.26, no Serviço de Finanças de Oeiras-3, deu entrada a presente impugnação (cf. carimbo aposto a fls. 4 do processo em papel).

b) Factos não provados

Os factos constantes das precedentes alíneas consubstanciam os elementos do caso que, em face do alegado nos autos, se mostram provado com relevância necessária e suficiente à decisão final a proferir, à luz das possíveis soluções de direito.

IV - Motivação da decisão de facto

A decisão da matéria de facto, consoante ao que acima ficou exposto, efetuou-se com base nos documentos e informações constantes do processo e no depoimento das testemunhas ouvidas que os confirmaram, que tinham conhecimento direto dos factos a que depuseram, de forma serena, tranquila e pormenorizada, nomeadamente identificando e descrevendo as peças transmitidas e que geraram o rendimento em causa, onde se encontram expostas e onde podem ser vistas.

*

Fundamentação de Direito da 1ª Instância

“….Nos termos do artigo 56/1 do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) com a redação dada pela Lei n° 55-B/2004, de 30 de Dezembro, os rendimentos provenientes da propriedade literária, artística e científica, considerando-se também como tal os rendimentos provenientes da alienação de obras de arte de exemplar único e os rendimentos provenientes das obras de divulgação pedagógica e científica, quando auferidos por autores residentes em território português, desde que sejam o titular originário, são considerados no englobamento para efeitos de IRS apenas por 50 % do seu valor, líquido de outros benefícios. Sendo que a importância a excluir não pode exceder € 30 000,00 (artigo 56/3 - Id.)

Consideram-se obras as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, por qualquer modo exteriorizadas (artigo 1° do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos).

São obras originais as criações intelectuais do domínio literário, científico e artístico, quaisquer que sejam o género, a forma de expressão, o mérito, o modo de comunicação e o objetivo, compreendem nomeadamente: (...) obras de desenho, tapeçaria, pintura, escultura, cerâmica, azulejo, gravura, litografia e arquitetura (artigo 2° do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos).

J….. é hoje um nome percebido pelo grande público como o de uma artista plástica.

Admitindo-se, contudo, que no ano de 2005, era conhecida de um setor mais restrito de pessoas.

Ora e tal como alega a Impugnante, a propriedade intelectual sobre a criação, como direito sobre bens imateriais que é, não se confunde com o que recai sobre o seu corpus mechanicum: a obra.

Assim, as peças transmitidas e que geraram o rendimento aqui em causa, têm de ser qualificadas como obras de arte originais produzidas pela autora. Trata-se, pois, de rendimentos provenientes da alienação de obras de arte de exemplar único.

E, nessa medida, subsumíveis ao conceito de objetos de arte para beneficiarem do regime estabelecido para os rendimentos provenientes da alienação de obras de arte de exemplar único.

Mesmo e no que se refere às peças em cerâmica produzidas pela F….., foram depois transformadas ou tratadas pela Autora e cabem, pois, também elas e cada uma delas, no conceito de obra de arte e como tal têm de ser consideradas como abrangidas pelo conceito de obra única.

Tem, pois, que ser dada razão à Impugnante, com as legais consequências, restituição do imposto indevidamente pago e condenação da Fazenda Pública no pagamento de juros indemnizatórios a favor da Contribuinte, contados desde a data de pagamento indevido até efetivo reembolso (artigos 43° e 100° da Lei Geral Tributária)….

…Dispositivo

Por tudo o que ficou exposto e nos termos das disposições legais citadas, julgo procedente a presente impugnação parcial deduzida por J….. e D….., com as legais consequências: reconstituição da situação tributária dos Contribuintes. ”.

*

Cumpre então conhecer das questões suscitadas pelo recorrente:

Quanto à deficiente apreciação e valoração da prova, e da correspectiva selecção da matéria de facto relevante para a decisão, baseia-se a mesma na alegada consideração de que os documentos levados ao probatório e do depoimento testemunhal, não resultaria que as obras materiais de escultura objecto de venda poderiam beneficiar da referida redução de tributação a que alude o nº 1, do artº 56º do EBF, por tais facturas “ de per si”, não seriam susceptiveis de demonstrar que se trataria de uma alienação de obras de arte de exemplar único a que se refere o preceito, sendo que a prova testemunhal não era adequada a tal desiderato, sendo que se teria de considerar os respectivos contratos não levados ao probatório.

Se quanto à prova testemunhal se verifica que o Tribunal a quo motivou a matéria de facto com base em prova testemunhal que corroborou a prova documental, porém não a elencou e individualizou na factualidade, questão que ora importa apreciar.

Ainda que seja correta a asserção da Recorrente, a verdade é que se retira que a mesma não tem o alcance que é almejado pela mesma, porquanto, ainda que não seja a melhor técnica jurídica, a verdade é que se infere que os factos elencados foram suportados por prova documental, coadjuvada com a testemunhal, não relevando, de per se, a falta de menção específica atenta a motivação da matéria de facto.

Quanto à consideração dos contratos que titulam esses negócios jurídicos, é facto que foram juntas aos autos cópias de dois contratos de compra e venda de tais obras de arte- cfr documento de fls 100 e segs. Não obstante,

Como bem se observa na sentença ora controvertida, os fundamentos da correcção dos elementos declarados pelos recorridos , não se reportam à desconsideração de tais peças enquanto “provenientes da venda do respectivo suporte material de obras de arte”, antes tendo considerado que tal rendimento se inseria , ou no âmbito da autorização da utilização da obra por terceiro, ou no âmbito da transmissão do próprio conteúdo patrimonial dos direitos de autor ( cfr nesse sentido o Relatório da I.T., a fls 130 e segs, do P.A.), pelo que se entendeu que se impunha determinados suportes documentais ( num caso de autorização , noutro de escritura pública), pelo que considerou-se como sujeito a tributação tais rendimentos. Ora,

Como bem refere o Ilte Jurista e Prof. Catedrático da F.D.L. José Oliveira Ascensão , in “ Direito Civil- Dtº de Autor e Dtºs Conexos”, Coimbra Editora , 1992, pags 61 e segs, a propósito da obra literária ou artística a que se refere o artº 2º do C. Dtº Autor, não se “…confundindo a obra com o suporte material que a encerra… em Portugal o princípio é de que a obra é independente de qualquer fixação ou materialização….”. – cfr nesse sentido de destrinça entre os direitos autorais sobre a obra e o direito de propriedade sobre as coisas materiais que servem de suporte à sua fixação e de que o adquirente destas últimas não gozam dos poderes conferidos no direito de autor, o artº 10º do Código.

E tal como defende aquele autor, toda as obras referidas na alínea g), do artº 2º daquele Código, tais obras que se podem designar genericamente como de “obra de arte plástica”, pressupõe a produção de um exemplar , o qual constitui o “…original… impropriamente chamado de exemplar único, que na realidade é o original…” cfr obra citada pags 490 e segs. Mais,

Quando o Código se refere especialmente à alienação de obra de arte , diz o mesmo Ilte Docente que nesse caso “…não há nenhuma transmissão do direito de autor, há apenas a alienação do suporte material…”, ainda que possa acontecer que uma ( ou várias) faculdades de direito de autor pode ser transferida com a sua alienação ( é o caso apontado no disposto no nº 2, do artº 157º, do mesmo Código). Portanto,

O que se impunha à Mª Juíza da 1ª Instância era o de constatar tal alienação das referidas obras de arte que se aferissem pela sua originalidade e da paternidade da obra, nos termos do artº 27º daquele mesmo diploma legal, o que obviamente não releva se o mesmo se encontra devidamente colectado como tal no âmbito das actividades compreendidas na respectiva classificação das actividades económicas a que se refere o artº 151º do CIRS e Tabela respectiva aprovada pela respectiva Portaria do Ministro das Finanças. Neste âmbito, será relevante convocar a Jurisprudência do TJUE que é chamada à colação no Acórdão deste Tribunal proferido no recente processo nº 825/10, de 11 de fevereiro de 2021, sobre a densificação da mesma questão e relativamente ao mesmo SP, ainda que reportado ao IVA.

Este Acórdão refere o seguinte:

“Como tem sido reiteradamente declarado pelo Tribunal de Justiça o conceito de «obra» é um conceito que deve ser interpretado de modo autónomo e uniforme e que pressupõe que estejam reunidos dois elementos cumulativos, a saber: « [q]ue exista um objeto original, no sentido de que este é uma criação intelectual do próprio autor. Por outro, a qualificação de obra está reservada aos elementos que sejam a expressão dessa criação (v., neste sentido, Acórdãos de 16 de julho de 2019, Infopaq International, C-5/08, EU:C:2009:465, n.os 37 e 39, e de 13 de novembro de 2018, Levola Hengelo, C-310/17, EU:C:2018:899, n.os 33 e 35 a 37 e jurisprudência referida).»

(Acórdão de 12 de setembro de 2019, Cofemel – Sociedade de Vestuário, SA/G-Star Raw CV, processo C-683/17)

(http://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?text=&docid=217668&pageIndex=0&doclang=PT&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=7372125)

Assim, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, para que um objecto seja qualificado de «obra», na acepção do direito de autor, é necessário que seja «original, na acepção de que é uma criação intelectual do próprio autor».

Já quanto à questão de se haver valorizado , nos factos elencados na Alíneas F) e G), como sustentando a anulação do primitivo negócio da venda da referida peça identificada como “ópio”, e da sua aquisição a titulo definitivo pela referida sociedade “Q…..”, resulta da sua impugnação que tais documentos que a sustentam não seriam idóneas a demonstrar a sua anulação por não serem os respectivos originais, importa sublinhar que os documentos que suportam aqueles factos do probatório constam dos autos e traduzem-se em facturas com os respectivos originais e duplicados legais ( cfr fls 164 a 172) e documento relativo à sua aquisição a titulo definitivo de tal obra constante do contrato de compra e venda de fls 159 a 162, são suficientes para considerar como provados tais factos, pelo que improcede a sua impugnação, considerando este Tribunal Superior como correctamente julgados os mesmos.

Já quanto à 2ª questão posta no presente recurso, quanto ao erro de direito na decisão assim proferida, de que nem todas as facturas consideradas se referem a vendas de tais obras de arte, é certo que algumas das facturas apresentadas a que se refere a sentença, dizem respeito a uma exposição artística ( alínea a. ); conferência de arte ( alínea r.), de montagem de peças para exposição ( alíneas j. e k.), todos do ponto E), do probatório, importa afirmar que a sentença sob judicio também considerou que tais obras de divulgação e de exposição e montagem também se inseriam nos ditos propósitos de divulgação pedagógica e dos específicos modos de utilização da obra de arte plástica, pelo que se inseriam no referido preceito do EBF, sendo que assim também a produção de uma peça ainda que produzida sobre 2 000 exemplares, porquanto tal não desvirtua a sua qualidade de obra original na titularidade do respectivo criador intelectual da obra- cfr artºs 11º e segs do Código de direitos autorais. –vd. no mesmo sentido quanto aos modos de utilização da obra de arte enquanto inseridas nas ditas faculdades patrimoniais do autor, Autor supra referido e idêntica obra, pags 492., e atento especialmente ao disposto no artº 68º, nº 2, alínea b), e nº 1, do artº 157º, todas daquele Código. São por esse facto igualmente rendimentos de propriedade artística quanto ao conteúdo patrimonial de tal direito autoral.

Ainda quanto ao cumprimento do ónus da prova a que se refere o artº 74º, nº1 da LGT, entende este Tribunal que os contribuintes cumpriram tal desiderato ao apresentarem os documentos relativos às ditas facturas, que foram tidas como sustentando os factos constitutivos dos direitos que invocam, e que se considerou como integrando aquela natureza de rendimentos provenientes de propriedade artística.

Entende-se assim que a norma jurídica relativa ao beneficio fiscal relativa à propriedade intelectual consubstanciada no nº1, do artº 56º do E.B.F., foi aplicada correctamente aos factos , pelo que improcede o alegado erro de direito por violação da lei substantiva, decisão a que se procede na parte dispositiva do presente Acórdão.

Quanto à conclusão contida no nº20 do presente recurso, pretendendo que o Tribunal A Quo não considerou como enquadráveis como rendimentos de obras de arte originais no que respeita às facturas nº 37 e 38, importa sublinhar que a sentença , na parte de fundamentação de direito , refere-se genericamente a todos os factos elencados do probatório, como constituindo objectos de arte original, apenas realçando o caso particular da transformação pela Impte das ditas peças de cerâmica como se incluindo no conceito de obra de arte, pelo que necessariamente será de entender que improcede tal conclusão.

*

DISPOSITIVO:

Nos termos expostos entende-se negar provimento ao recurso, sendo confirmada a sentença proferida nos autos que anulou o acto tributário em causa nos autos , atento ainda a presente fundamentação ora aduzida aos autos.

*

Custas pela F.P.

Notifique.

[O relator consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Senhores Desembargadores Mário Rebelo e Patrícia Manuel Pires ]