Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:12013/15
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:05/14/2015
Relator:ANTÓNIO VASCONCELOS
Descritores:INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS.
DECISÃO DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA, PROFERIDA EM SEDE DE PROCESSO DE CONTRAORDENAÇÃO.
Sumário:Perante uma decisão de uma autoridade administrativa, proferida em sede de processo de contraordenação e no âmbito das suas competências de fiscalização do cumprimento das obrigações previstas no artigo 4º nº 1 da Lei Geral do Ruído (Decreto – Lei nº 9/2007, de 17 de Janeiro, com as alterações introduzidas pela Declaração de Rectificação nº 18/2007, de 14 de Março), tal medida deve ser impugnada nos tribunais judiciais, através do meio processual próprio – recurso de impugnação judicial – nos termos constantes dos artigos 55º nº 1 e 3, 59º nº 3 e 61º nº 1 do Decreto – Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, que instituiu o ilícito de mera ordenação social, alterado e republicado pelo Decreto – Lei nº 244/95, de 14 de Setembro.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em Conferência , na Secção de Contencioso Administrativo, 2º Juízo , do Tribunal Central Administrativo Sul:


V................ PORTUGAL – Comunicações Pessoais S.A., com sinais nos autos, inconformada com a sentença do TAF de Loulé, de 9 de Fevereiro de 2015, que declarou esse Tribunal incompetente em razão da matéria para conhecer do presente processo cautelar e consequentemente absolveu o Município de Loulé e a contra – interessada Margarida ………………….. da instância, dela recorreu e, em sede de alegações, formulou as seguintes conclusões:

“ 1. Ao ter decidido que a medida cuja suspensão se requer foi adoptada no decurso de um processo de contra-ordenação, unicamente com base na existência de uma queixa, a douta decisão recorrida fez errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 54º, nº 1, que assim sai violado.
2. E violou também a decisão recorrida, ao ter decidido que a medida da Câmara foi adoptada no decurso de um processo contra-ordenacional, o disposto no artigo 55ºs e 3 do RGCO, pois, no caso em apreço, não se encontra em curso qualquer percurso dessa natureza.
3. A decisão impugnada fez ainda errada interpretação e aplicação ao caso concreto do disposto no artigo 27º do Regulamento Geral do Ruído, baseado no errado pressuposto de que as medidas emitidas ao abrigo de tal disposição configuram necessariamente medidas adoptadas no decurso de um processos de contra-ordenação.
4 – Vicio em que a sentença incorre por ter entendido, erradamente, que tal disposição encontra o seu lugar paralelo, ou a sua lei habilitante, no artigo 41º da LQCOA.
5 – Em consequência de tais errados pressupostos, a douta decisão recorrida fez errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 59º e 61º do RGCO.
6 – E fez errada interpretação, pelos esmos motivos, do disposto nos artigos 103º, nº 1, al. e) e nº 3 al. b) da Lei nº 62/2013.
7 – A douta decisão recorrida, ao ter concluído pela incompetência dos tribunais administrativos, em razão da matéria, e decretado a absolvição do Requerido e contra – interessada da instância, fez assim errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 96º, 99º, nº 1, 278º, nº 1, al. a), 576º, nº 2 e 577º, al. a) do CPC; igualmente viola o artigo 4º, nº 1 do ETAF.”
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O Município de Loulé contra – alegou pugnando pela manutenção do decidido.

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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste TCAS emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional e confirmada a sentença recorrida.

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Sem vistos foi o processo submetido à conferência para julgamento.

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A matéria de facto pertinente é a constante ad sentença recorrida, a qual se dá aqui por reproduzida, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 663º nº 6 do Código de Processo Civil.

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Tudo visto, cumpre decidir.

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O Recorrente e então Autor V........... Portugal S.A. intentou no TAF de Loulé contra o Município de Loulé os presentes autos de providência cautelar de suspensão de eficácia do acto consubstanciado no despacho de 17 de Outubro de 2014 da Veredadora daquela Autarquia, por força do qual a ora Recorrente foi intimada, em sede de processo de natureza contraordenacional e respeitante à violação dos limites impostos pela Lei do Ruído, a retirar os equipamentos ali identificados e instalados num edifício localizado em ...................
Por sentença do TAF de Loulé foi declarado esse Tribunal incompetente, em razão da matéria, por se entender que os Tribunais Administrativos carecem da necessária competência para conhecerem de questões suscitadas no âmbito de processos de natureza contraordenacional , como é o caso em apreciação.
No essencial a Recorrente discorda da sentença recorrida ao alegar que esta parte de um pressuposto que nada permite dar como verificado: o de que a decisão cuja suspensão se quer ver decretada foi tomada pela Câmara no decurso de um processo de contraordenação tal como prevê o artigo 55º nº 1 e 3 do RGCO.

Analisemos a questão.
No caso em apreço estamos perante uma medida cautelar, de natureza preventiva ou antecipatória ( imprescindível para “evitar a produção de danos graves para a saúde humana e para o bem estar das populações”), traduzida na imposição à Requerente de um determinado ónus – in casu a remoção do equipamento que alegadamente é fonte do ruído -, com carácter meramente provisório e pré-ordenada à repressão de um comportamento tipificado como contraordenação ambiental grave, cuja previsão consta do nº 2 do artigo 28º do Regulamento Geral do Ruído.
Como tal, a medida cautelar, temporária e intercalar, mostra-se instrumentalizada – como resulta da inserção sistemática do artigo 27º do Regulamento Geral do Ruído – ao poder sancionatório reconhecido à entidade requerida de aplicação de coimas e sanções acessórias, no âmbito de um procedimento contraordenacional, que encontra apoio legal nos artigos 28º, 29º e 30º do referido Regulamento.
Deparamo-nos pois perante uma decisão de uma autoridade administrativa, proferida em sede de processo de contraordenação e no âmbito das suas competências de fiscalização do cumprimento das obrigações previstas no artigo 4º nº 1 da Lei Geral do Ruído (Decreto – Lei nº 9/2007, de 17 de Janeiro, com as alterações introduzidas pela Declaração de Rectificação nº 18/2007, de 14 de Março).
Por conseguinte, tal medida deve ser impugnada nos tribunais judiciais, através do meio processual próprio – recurso de impugnação judicial – nos termos constantes dos artigos 55º nº 1 e 3, 59º nº 3 e 61º nº 1 do Decreto – Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, que instituiu o ilícito de mera ordenação social, alterado e republicado pelo Decreto – Lei nº 244/95, de 14 de Setembro.
Com efeito, nos termos do artigo 211º da CRP, os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais; E nos termos do nº 2 do mesmo preceito, na primeira instância pode haver tribunais com competência especifica e tribunais especializados para o julgamento de determinadas matérias – cfr. igualmente o artigo 18º e 64º nº 2 da Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro – Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais .
Nestes termos a competência para apreciar da legalidade da medida acessória inerente pertence aos juízos de pequena instância criminal nos termos do artigo 102º nº 2 da Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro.

Em conformidade com o exposto, é de negar provimento ao presente recurso jurisdicional e confirmar a sentença recorrida que entendeu que os tribunais administrativos são incompetentes em razão da matéria em sede de processo de natureza contraordenacional e respeitante à violação dos limites impostos pela Lei do Ruído.

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Acordam, pois, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo deste TCAS, 2º Juízo, em negar provimento ao presente recurso jurisdicional e confirmar a sentença recorrida.

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Custas pela Recorrente.

Lisboa, 14 de Maio de 2015
António Vasconcelos
Pedro Marchão Marques
Conceição Silvestre