Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07216/13
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:03/13/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:NULIDADES PROCESSUAIS.
NULIDADES PROCESSUAIS SECUNDÁRIAS. REGIME DE ARGUIÇÃO.
PRINCÍPIO DA PLENITUDE DA ASSISTÊNCIA DOS JUÍZES.
VIGÊNCIA NO PROCESSO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO.
NATUREZA SUBSTANTIVA E SUBSIDIÁRIA DO MÉTODO DE AVALIAÇÃO INDIRECTA DA MATÉRIA COLECTÁVEL.
DEVER DE CUIDADA FUNDAMENTAÇÃO QUANTO À OPÇÃO PELA SUA UTILIZAÇÃO POR PARTE DA A. FISCAL.
ESPECIFICIDADE DO I.V.A.
AVALIAÇÃO INDIRECTA DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL AO ABRIGO DO ARTº.87, AL.B), DA L.G.TRIBUTÁRIA.
ARTº.88, AL.A), DA L.G.TRIBUTÁRIA.
UTILIZAÇÃO SIMULTÂNEA DE CORRECÇÕES TÉCNICAS E MÉTODOS INDIRECTOS POR PARTE DA A. FISCAL.
Sumário:
1. As nulidades processuais consubstanciam os desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder, embora não de modo expresso, uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais (cfr.artº.195, do C.P.Civil). As nulidades de processo que não sejam de conhecimento oficioso têm de ser arguidas, em princípio, perante o Tribunal que as cometeu (cfr.artºs.196 e 199, do C.P.Civil). São as nulidades secundárias, com o regime de arguição previsto no artº.199, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6.
2. O princípio da plenitude da assistência dos juízes, consagrado no actual artº.605, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, corolário do princípio da imediação, diz-nos que só podem intervir na decisão da matéria de facto os juízes que tenham assistido a todos os actos de instrução e discussão praticados na audiência final, assim impondo as regras aplicáveis aos casos de falecimento, impossibilitação temporária ou permanente, transferência, promoção ou aposentação do juiz durante a discussão e julgamento da causa, mais sendo vigente quanto à decisão da matéria de facto.
3. Em sede de contencioso tributário o julgamento da matéria de facto e o julgamento de direito estão cometidos ao juiz que profere a sentença, não existindo a dicotomia que se verifica em processo civil, entre a fase de audiência de julgamento, onde são produzidas as provas para a determinação dos factos, e a da prolação da decisão, onde é efectuado o enquadramento jurídico dos factos determinados ao caso e declarada a consequente decisão.
4. No contencioso tributário não existe norma que determine o julgamento da matéria de facto pelo mesmo juiz que presidiu à produção de prova. O princípio da plenitude da assistência do juiz pressupõe a existência de actos de instrução e discussão praticados na audiência final que, em bom rigor, não existe no contencioso tributário.
5. Como se conclui do exame do passado legislativo do contencioso tributário (cfr.§ 3, do artº.90, e o § 1, do artº.96, do antigo C.P.C.I.; artºs.127, nº.4, e 133, nº.2, do C.P.T.), o legislador não teve grande preocupação em assegurar que o julgamento da matéria de facto fosse efectuado por quem preside às diligências de instrução. De resto, actualmente, com a generalização da gravação da prova nos Tribunais tributários, a qual assegura muito mais proximidade entre o juiz e a produção da prova do que a que permitia a sua redução a escrito, há ainda menos razão do que anteriormente para não se sobrepor a mera conveniência da imediação entre o julgador em relação à produção de prova face ao prejuízo da eficiência global do serviço público de Justiça.
6. No âmbito do processo contencioso tributário não se verifica a violação do princípio da plenitude da assistência dos juízes quando as diligências de prova, designadamente a inquirição das testemunhas arroladas, cujo depoimento fique devidamente registado, não tiverem sido presididas pelo juiz que depois proferiu a sentença, na qual incorporou a decisão sobre a matéria de facto, sendo que tal situação não constitui, nem nulidade da sentença, nem nulidade processual.
7. A avaliação indirecta reveste natureza substantiva, dado que através dela se pode determinar o essencial do facto tributário, isto é, a sua quantificação. Por outro lado, a mesma avaliação indirecta tem carácter subsidiário (cfr.artº.85, nº.1, da L.G.T.), visto que o respectivo regime só se aplica em casos em que exista uma impossibilidade ou uma dificuldade grave em determinar a matéria tributável através da avaliação directa ou objectiva, não se devendo a ela recorrer sem a verificação plena desse requisito. Isto significa que, mesmo quando o sujeito passivo viole os deveres de cooperação, a primeira forma a que se deve recorrer para fixar a matéria colectável é a avaliação directa (v.g.correcções técnicas), mais devendo ser efectuada a devida fundamentação relativamente à inviabilidade desta, antes de se recorrer à avaliação indirecta. Por outras palavras, a Administração Fiscal deve justificar, motivar e comprovar a relação de causa/efeito entre a acção/omissão do contribuinte e a impossibilidade de aplicar o método de avaliação directa (cfr.artº.77, nº.4, da L.G.T.).
8. O recurso ao método de avaliação indirecta só é legalmente possível quando o apuramento da matéria colectável através de correcções técnicas se revele, de todo, impraticável, pois que a fixação da matéria tributável por tais métodos deve revestir a natureza de “ultima ratio fisci” e exigir uma cuidada fundamentação quanto à opção pela sua utilização (cfr.artº.81, nº.1, da L.G. Tributária).
9. Atendendo à especificidade do I.V.A., não pode a A. Fiscal operar alterações à quantificação da base tributável deste imposto, sem que fique demonstrado terem sido praticadas omissões ou inexactidões no registo de compras ou no registo de vendas do sujeito passivo em causa.
10. O artº.87, al.b), da L.G.Tributária, cuja redacção foi estabelecida pela Lei 30-G/2000, de 29/12, prevê a possibilidade de avaliação indirecta da matéria tributável quando se verifica a falta dos elementos necessários para comprovar e quantificar directa e exactamente a matéria tributável, pelo que a avaliação directa é impossível. Esta impossibilidade, porém, só pode resultar das anomalias e incorrecções taxativamente indicadas nas várias alíneas do artº.88, da L. G. Tributária (cfr.artº.81, nº.1, da L.G. Tributária). Nestes casos, a avaliação da matéria tributável é feita com base em indícios, presunções ou outros elementos de que a Administração Tributária dispuser, de entre os taxativamente indicados no artº.90, nº.1, do mesmo diploma.
11. Como se constata pelas situações descritas no artº.87, da L.G.Tributária, o que releva para determinar o impedimento não é uma impossibilidade absoluta de avaliação directa da matéria tributável, mas sim a impossibilidade de tal avaliação no momento em que ela deve ser efectuada (impossibilidade relativa), assim se fazendo cessar a presunção de veracidade dos elementos declarativos e de escrita do sujeito passivo e incidindo sobre a A. Fiscal o ónus da prova de tal factualidade (cfr.artºs.74, nº.3, e 75, nº.1, da L.G.T.).
12. No artº.88, al.a), da L.G.Tributária, prevêem-se várias situações constitutivas de infracções tributárias (cfr.v.g.artº.121, do R.G.I.T.), designadamente a falta de entrega de declarações, a inexistência de contabilidade ou de livros fiscalmente relevantes, a não organização da contabilidade de harmonia com as regras de normalização contabilística e os atrasos na sua execução.
13. A circunstância da contabilidade ser una não colide com a sua correcção, por parte da A. Fiscal, através da utilização simultânea de correcções técnicas e métodos indirectos, como acontece no caso "sub judice". A utilização simultânea de tais metodologias alternativas quando, em face dos factos patrimoniais sujeitos a registo, se apresente possível, torna-se, não só uma faculdade, mas um poder/dever da Fazenda Pública na medida em que impliquem uma maior proximidade à realidade a tributar.



O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
... , com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Loulé, exarada a fls.129 a 140 do presente processo, através da qual julgou totalmente improcedente a impugnação intentada pelo recorrente tendo por objecto liquidações de I.V.A. e juros compensatórios, relativas ao 3º. trimestre de 2005 e de 2006 e no montante total de € 110.212,66.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.155 a 164 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-O juiz do julgamento não é o juiz que profere a sentença;
2-Da conjugação dos artºs.605, nºs.1, 1ª. parte, e 4, e 607, nº.1, 1ª. parte, do C.P.C., resulta que encerrada a audiência final é o juiz do julgamento que profere a sentença, o que acontece mesmo que o juiz do julgamento seja transferido ou promovido;
3-Desconhecendo-se a causa para que exista juiz substituto, é o juiz do julgamento que profere a sentença;
4-Não proferindo a sentença o juiz do julgamento, há nulidade (artº.195, nº.1. do C.P.C.);
5-Nulidade, essa, que existe, por, a não prolação da sentença pelo juiz do julgamento, consistir na prática de acto que a lei não admite e omissão de acto ou formalidade que a lei prescreve, que, como irregularidade, influi no exame e decisão da causa (artº.195, nº.1, do C.P.C.);
6-A Administração Tributária (AT, abreviadamente), só pode "proceder a avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previstas na lei (artº.81, nº.1, 2a parte, da L.G.T.);
7-A avaliação indirecta "visa a determinação dos rendimentos ou bens tributáveis a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária disponha" (artº.83, nº.2, da L.G.T.);
8-A avaliação indirecta é subsidiária da avaliação directa e nela aplicam-se, sempre que possível e a lei não prescrever em sentido diferente, as regras da avaliação directa (artº.85, nºs.1 e 2, da L.G.T.);
9-"A avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de: (...) Impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto" (artº.87, nº.1, al.b), da L.G.T.);
10-A regra é a avaliação directa (ou correcções aritméticas) e a excepção é a avaliação Indirecta (ou métodos indirectos ou indiciários);
Ora,
11-Entende-se que, no relatório de inspecção tributária (RIT, abreviadamente), não existem ou transparecem elementos que afastem, em definitivo e na totalidade, a avaliação directa, por aqueles que se encontram em falta, alegadamente, não serem de impossível comprovação e quantificação directa e exacta, em relação aos da avaliação indirecta;
12-O l.V.A. em apreço respeita aos anos de 2005 e 2006 e o RIT é de 2009/02/18;
Logo,
13-Era sempre possível que a inspecção tributária, na elaboração do RIT, se socorresse e valorizasse as declarações de I.R.S. (não as liquidações) existentes e anteriores a 2009, com excepção de 2005 e 2006, e os respectivos documentos da contabilidade do sujeito passivo (s.p. abreviadamente), o que não fez;
Doutro modo,
14-Sobre os outras documentos do s.p. não existem juízos de falta de correspondência, na contabilidade de idoneidade ou mesmo de falsidade;
15-Acrescendo:
i) que o princípio do inquisitório aplica-se apenas à AT e não ao s.p. embora este também esteja sujeito ao dever de colaboração ou cooperação, que não o violou;
ii) que o recurso aos métodos indirectos ou indiciários só é possível quando o apuramento da matéria colectável, através das correcções técnicas, se revele, de todo, impraticável;
iii) que não há inexistência de elementos de escrituração, na contabilidade;
iiii) que não há inidoneidade para comprovar o lucro pela escrita do s.p.;
iiiii) e que não há evidência de contradições, erros ou omissões para a determinação da matéria colectável, por avaliação directa;
16-É possível a comprovação directa e exacta da matéria tributável e que não se justifica o recurso à avaliação indirecta pela AT;
17-Existindo meras conclusões da AT, no RIT, que determinaram o recurso à avaliação indirecta, e não factos que afastem a avaliação directa;
18-Não existe justificação para o recurso à avaliação indirecta, nem legitimação, e cabe à AT o ónus da prova para determinação da matéria tributável por métodos indirectos (artº.74, nº.3, 1ª. parte, da L.G.T.);
19-Não é sobre o s.p. que recaia o ónus da prova das bases da avaliação indirecta (inversão material do ónus da prova);
20-Nas bases da avaliação indirecta da AT há falta de objectividade, em especial, nas receitas de bilheteira dos eventos e na assistência do público aos eventos, não cabendo ao s.p. a inversão do ónus, que não tem que provar que o resultado da avaliação indirecta é outro inferior nas receitas de bilheteira e na assistência do público;
21-Não é o s.p, que tem que provar que a quantificação da avaliação indirecta está errada;
22-Embora caiba ao s.p, o ónus da prova do excesso da quantificação por métodos indirectos, o que o s.p, não logrou provar e prova;
23-Por o erro da quantificação ser diferente do excesso de quantificação da avaliação indirecta;
24-É censurável a avaliação indirecta das receitas de bilheteira e na assistência do público aos eventos;
25-A avaliação indirecta da AT carece de aderência à realidade e é desconforme com a realidade;
26-Termos em que, com o douto suprimento, o presente recurso deve ser julgado procedente, devendo-se declarar a nulidade arguida ou, não se entendendo como se pede, anular-se o recurso à avaliação indirecta.
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.179 e 180 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.182 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.129 a 133 dos autos - numeração nossa):
1-O impugnante tem por actividade principal a organização de eventos desportivos e secundária a prestação de serviços de estampagem e impressão (publicidade e brindes), pelas quais está colectado desde 1/07/2004, encontrando-se enquadrado no regime simplificado de tributação em sede de IRS nos exercícios de 2004 e 2005 e no regime de contabilidade organizada nos exercícios de 2006 e seguintes, e em sede de IVA no regime normal trimestral desde o início da atividade (cfr.cópia de relatório de inspecção junto a fls.21 a 43 dos presentes autos; informação exarada no processo administrativo apenso);
2-Ao abrigo da ordem de serviço externa nº.01200800655, de 16/07/2008, a Administração Fiscal levou a cabo uma acção inspetiva ao impugnante relativa aos exercícios de 2005, 2006 e 2007 (cfr.cópia de relatório de inspecção junto a fls.21 a 43 dos presentes autos; informação exarada no processo administrativo apenso);
3-Em 18/2/2009 foi elaborado o relatório final de inspeção tributária (RIT), sancionado em 26/02/2009, do qual se extrai o seguinte:

(...)
I. Conclusões da Ação Inspetiva
I.1. Descrição sucinta das conclusões da ação de inspeção
No decurso da ação foram detetadas situações irregulares nos registos contabilistícos e nas declarações fiscais apresentadas pelo sujeito passivo ... , nomeadamente omissões de proveitos, omissões de tributações autónomas em sede de IRS, omissões de IVA liquidado, deduções indevidas de IVA, resultando as seguintes correções.
(...)
I.1.2 IVA
Nos exercícios de 2005 e 2006 apurou-se imposto em falta nos montantes de 24.292.31 euros e 136.556,38 euros respetivamente, decorrente das correções meramente aritméticas e presunções efetuadas conforme descrito nos pontos III.2 e V do presente relatório.
Destas correções resulta o indeferimento total do reembolso de IVA solicitado na declaração periódica do 4.º trimestre de 2007 no montante 31.412,58 euros, por este se mostrar indevido em virtude das correções efetuadas em sede de IVA e por se verificar que o s.p. é devedor perante o estado em sede de IVA liquidado e não entregue.
(...)
III. Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria tributável
(...)
III. 1.2.1. Proveitos não contabilizados
Da análise efetuada aos elementos de escrita, verificou-se a falta de diversas faturas emitidas pelo s.p., tendo as mesmas sido apresentadas posteriormente, conforme certidão de notificação elaborada para o efeito.
Das faturas apresentadas, apenas as faturas n.º 23 e n.º 24 foram dadas como emitidas, tendo as restantes sido apresentadas como anuladas.
Para confirmar a veracidade dos elementos apresentados foram efetuados pedidos de informação adicional aos clientes mais significativos do s.p.
Como resultado deste procedimento verifica-se que as faturas n.º 20, 22, 32, 36, 42, 60, 63, 64, 66 apresentadas como anuladas, constam na contabilidade de terceiros emitidas e não anuladas (anexo 1).
(...)
Daqui resulta uma omissão total de proveitos de 624.437,98 euros.
(...)
III.2. Correcões aritméticas em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA)

III.2.1. exercício de 2005

III.2.1.1. Deduções indevidas de IVA
Constatou-se que foi deduzido o IVA contido em despesas de alojamento e alimentação das equipas participantes nos eventos desportivos, bem como em bebidas, no montante total de 6.818,38 euros, IVA que não confere o direito a dedução nos termos da alínea d) do nº.1 do art. 21.º do CIVA.
(...)
III.2.1.2. Falta de liquidação de IVA
Verificou-se a falta de liquidação de IVA no montante total de 9.525,60 euros relativamente a aquisição de serviços de publicidade e de aluguer de bens móveis efetuadas por prestadores com domicílio em Espanha, operações tributáveis em Portugal nos termos da alínea b) e i) do n.° 8 do art. 6.º do CIVA, cabendo a liquidação e entrega do IVA ao s.p. nos termos do art. 26.º do CIVA. Operações tributáveis a taxa de 21% nos termos da alínea c) n.º1 do art.18.º do CIVA.
(...)
III.2.2. exercício de 2006

III.2.2.1. IVA liquidado e não entregue
No exercício de 2006 verificou-se a omissão na contabilidade e nas declarações periódicas de IVA previstas na alínea c) n.º1 do art. 28.º do CIVA de diversas faturas emitidas pelo s.p. conforme descrito no ponto III 1.2.1, faturas sobre as quais foi liquidado IVA a taxa de 21% nos termos da alínea c) do n.º1 do art.º18.º do CIVA, no montante total de IVA liquidado de 131.131,97 euros, não tendo procedido a sua entrega conforme previsto no n.º1 art. 26.º do CIVA (anexo 1).
(...)
Caso o s.p. tivesse inscrito as faturas omitidas nas suas declarações periódicas de IVA, teria apurado imposto a entregar ao Estado nos montantes de 38.549,34 euros, 6.875,18 euros, 70.528,70 euros nos períodos 0603T 0606T e 0609T, respetivamente.
III.2.2.2. Deduções indevidas de IVA
Foi igualmente apurada a dedução de IVA no montante de 259,31 euros contido em despesas com viaturas ligeiras de passageiros, o que nos termos da alínea a) do n.º1 do art 21.° do CIVA está excluído do direito a dedução.
(...)
IV. Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indiretos
(...)
No decurso da ação verificou-se entre outros factos a omissão de faturas de proveitos realizados, omissão de custos, situações retificadas por via das correções aritméticas efetuadas com base nos elementos fornecidos por terceiros.
Da análise aos elementos de contabilidade foram identificadas faturas de fornecimento de bilhetes de entrada, numerados e com valor pré-impresso, bem como convites, respeitantes a alguns eventos desportivos organizados pelo s.p. conforme quadro.
(...)
Relativamente a estes eventos desportivos cuja assistência pelo público estava sujeita a aquisição de bilhete de entrada, gerando receita de bilheteira, apenas consta na contabilidade o doc. 13-A com a seguinte designação "Receita de bilheteira do Troféu Guadiana realizado nos dias 27 e 28 de Julho de 2006 - Euros 93.603,00" (anexo 3).
Este valor foi considerado com IVA incluído a 5% (Lista I Verba 2.13 do CIVA). Questionado o s.p sobre a ausência de receita de bilheteira gerada pelos eventos organizados e solicitada a exibição dos bilhetes não vendidos, informou:
Relativamente aos jogos Taça Albufeira 2005 e Taça Amizade - 2005 declarou "Nestes jogos não houve receita de bilheteira, visto estes serem patrocinados pela Câmara Municipal de Albufeira, tendo as entradas sido feitas através de convite da Câmara Municipal e dos pequenos patrocinadores. Recordo que o Estádio Municipal de Albufeira tem uma capacidade mais ou menos de dois mil lugares, não permitindo assim qualquer tipo de receita", não tendo exibido no entanto qualquer bilhete não vendido, sendo certo que os 10500 bilhetes de entrada emitidos foram pré-impressos com preços de entrada.
Relativamente ao Torneio do Guadiana o s.p informou "No que respeita a 2005 a receita de bilheteira pela fraca afluência ao Estádio Algarve nem sequer foi quantificada. Em relação a 2006 a receita encontra-se reflectida no balancete". Quanto aos bilhetes não vendidos informou "Em relação aos bilhetes não vendidos do Troféu de 2005 no estádio Algarve, os mesmos encontravam-se em armazém nas antigas instalações, mas devido a falta de uso houve uma praga de ratos que destruíram todo o material que se encontrava em caixas de cartão entre esse material estavam os bilhetes." No ano de 2006 foram identificadas as seguintes sobras: 869 bilhetes a 20 euros, 737 bilhetes a 40 euros e 2014 bilhetes a 35 euros.
Igualmente não foi possível quantificar a receita de bilheteira por via dos depósitos efetuados na conta bancária do s.p. por este não possuir uma conta bancária afeta exclusivamente a atividade empresarial. "Quero referir que os movimentos no extrato bancário, não são da minha atividade, mas também da minha vida particular, visto ser a única conta bancária em meu nome que tenho com movimento". Sobre este facto refira-se que foram identificados muitos pagamentos de faturas de fornecedores efetuados pela pessoa de ... que segundo declarações do s.p. " foi em tempos uma colaboradora noutra empresa, ficando entre nós alguma amizade e confiança, como na altura os elevados prejuízos acumulados com estes eventos, causaram-me problemas bancários, tal como a inibição de cheques, tendo-me socorrido da sua ajuda para poder fazer face aos pagamentos que era necessário fazer, utilizando cheques seus. Após a emissão dos seus cheques eu colocava-lhe a quantia na sua conta para cobrir os mesmos. Não existia qualquer vínculo empresarial entre nós, apenas pessoal."
Relativamente a este facto o s.p. não fez exibição dos pagamentos efetuados à referida colaboradora e os pagamentos feitos por esta aos fornecedores.
Estas omissões de receita de bilheteira, conjugada com a não exibição da totalidade dos bilhetes não vendidos, a não utilização de uma conta bancária afeta exclusivamente a atividade empresarial que evidencie os depósitos, pagamentos relativos a atividade, justifica o recurso a avaliação indireta da matéria tributável de acordo com a alínea b) do art. 87°, alínea a) do art. 88. ° e alíneas a), d) e h) do n.º1 do art. 90 da LGT e art. 39 do CIRS, por não ser possível a comprovação direta e exata dos elementos indispensáveis a determinação da matéria tributável dos exercícios de 2005 e 2006.
V. Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indiretos
Conforme factos e fundamentos descritas no capítulo anterior, é manifestamente impossível proceder à determinação direta e exata em sede de IRS, nomeadamente no que respeita a receita de bilheteira, pelo que se procederá à sua determinação por aplicação de métodos indiretos.
Neste sentido, considerou-se que o critério mais adequado no caso em apreço para a determinação da receita de bilheteira não declarada terá em consideração os seguintes elementos:
• quantidade e valor unitário dos bilhetes emitidos;
• assistência de público aos eventos deduzida dos eventuais convites e entradas gratuitas, apurando-se assim a quantidade de bilhetes vendidos.

Dado a existência de bilhetes emitidos com diferentes preços unitários de entrada, procedeu-se em 1° lugar à determinação do peso que cada conjunto de bilhetes representa no total de bilhetes emitidos e de seguida repartiu-se proporcionalmente a quantidade de bilhetes vendidos em função do seu valor unitário (com arredondamento a unidade).
A assistência de público e as eventuais sobras de bilhetes emitidos e não vendidos serão determinadas com recurso a fontes externas, atendendo ao princípio da proporcionalidade, dado não terem sido apresentados pelo s.p. elementos que permitam a sua quantificação.
No decurso do direito de audição, conforme descrito no capítulo IX, veio o s.p apresentar uma declaração emitida pelo Município de Albufeira na qual é referida a cedência pelo s.p. de 2000 entradas para cada um dos eventos (Taça Albufeira Capital do Turismo e Taça Amizade) e uma declaração do Município de Vila Real de Santo António ao qual foram cedidas 2000 entradas para o evento Torneio do Guadiana 2006. Essas ofertas foram tidas em conta nos cálculos efetuados.
V.1. exercício de 2005
Com base na informação obtida no site www.correiomanha.pt e www.observatoriodoalgarve. com apurou-se uma assistência aos jogos de 4000 espectadores no jogo SL ... - West Bromwich, 5500 espectadores no jogo ... CP - ... e 3000 espectadores na final do Torneio do Guadiana, desconhecendo-se a existência de receita de bilheteira nos jogos realizados no estádio do Ayamonte e do Portimonense. Daqui resulta uma receita bruta de bilheteira com IVA incluído a 5% no Trofeu Taça Albufeira de 45.710,00 euros e 1250 bilhetes de sobras consideradas, Trofeu Taça Amizade de 69.645,00 euros e zero de bilhetes não vendidos, dado a assistência apurada superar o número de bilhetes emitidos e no Torneio do Guadiana uma receita de 51.560.00 euros e 27000 bilhetes de sobras consideradas.
(...)
Tomando em consideração que a receita apurada inclui IVA a taxa de 5%, a correção a apurar nos proveitos será de 158.966.67 euros.
(...)
De acordo com os cálculos efetuados propõe-se a correção por métodos indirectos aos proveitos nos montantes de 158.966,67 euros para 2005, resultando uma correção ao rendimento líquido da Categoria B do s.p. ... de 103.328,34 com recurso a métodos indiretos, valor apurado após aplicação do coeficiente de 0,65 de acordo com as regras do regime simplificado, conforme disposto no n.° 2 do artigo 31 do Código do IRS (redação da Lei n.°32-B/2002, de 30 de Dezembro).
Tomando em consideração as correções acima referidas bem como as descritas no ponto III. 1.1, apura-se uma correção ao rendimento líquido da Categoria B de 174.653,34 euros.
Deste acréscimo, resulta um rendimento líquido da Categoria B de 206.353,34 euros.
(...)
Em sede de IVA, na sequência das correções efetuadas aos proveitos e decorrendo da aplicação do disposto no art. 84.º do CIVA, resulta uma liquidação adicional de imposto de 7.948,33 euros no período 0509T, tomando em consideração que os proveitos em causa enquadram-se na Lista l anexa ao Código do IVA pelo que a taxa a aplicar é de 5% de IVA.
(...)
V.2. EXERCÍCIO DE 2006
Os bilhetes de entrada aos jogos do Torneio do Guadiana de 2006 permitiam o acesso aos três jogos, pelo que se considerou a assistência máxima de 10000 espectadores (fonte www.maisfutebol.iol.pt) no jogo SL ... - ... CP como referencia a quantificação dos bilhetes vendidos. Aos 10000 espectadores foi deduzida a assistência de 3575 espectadores que corresponde a totalidade dos bilhetes convite, free pass, clubes, imprensa emitidos para o evento, e as 2000 entradas cedidas a título gratuito ao Município de Vila Real de Santo António. Ao resultado obtido de acordo com o critério definido neste ponto V, foi apurada uma receita bruta de 202.070,00 euros sendo deduzida a receita já declarada deste evento de 93.603,00 euros, bem como considerado o total de 7075 bilhetes de sobras em detrimento das sobras apresentadas pelo s.p. no total de 3620 bilhetes.
(...)
De acordo com os cálculos efetuados propõe-se a correção por métodos indiretos aos proveitos nos montantes de 103.301,90 euros para 2006, resultando uma correção total ao rendimento líquido coletável da Categoria B do s.p. ... de 477.739,88 euros, sendo 374.437,98 euros provenientes de correções aritméticas conforme descrito no ponto III.1.2 e 103.301,90 euros com recurso a métodos indiretos. Deste acréscimo, resulta um rendimento líquido da Categoria B de 488.819,49 euros.
(...)
Em sede de IVA, na sequência das correções efetuadas aos proveitos e decorrendo da aplicação do disposto no art. 84.º do CIVA, resulta uma liquidação adicional de imposto de 5.165,10 euros no período 0609T, tomando em consideração que os proveitos em causa enquadram-se na Lista I anexa ao Código do IVA pelo que a taxa a aplicar é de 5% de IVA."
(cfr.cópia de relatório de inspecção junto a fls.21 a 43 dos presentes autos que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos e cujas conclusões foram confirmadas pela testemunha ... );
4-O impugnante foi notificado do relatório que antecede através do ofício nº.1879 de 27/02/2009 (cfr.documento junto a fls.79 e 80 dos presentes autos);
5-Na sequência da notificação do RIT foi apresentado pedido de revisão da matéria coletável fixada nos termos do disposto no artº.91, da LGT (cfr.factualidade admitida pelo impugnante no artº.27 da p.i.; informação exarada no processo administrativo apenso);
6-Em 3/06/2009 foi lavrada ata da reunião dos peritos da qual consta não ter sido alcançado acordo, tendo cada um dos peritos lavrado o seu laudo com a fundamentação sucinta das posições expressas tomadas, que são parte integrante da ata (cfr.documentos juntos ao processo administrativo apenso, que aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos);
7-Em 4/06/2009 o Diretor de Finanças de Faro proferiu decisão na qual concluiu que:
"(...)
ponderados todos os fundamentos invocados e tendo em conta as posições assumidas pelos peritos, concordo com a posição assumida pelo Perito da Administração Tributária, e mantenho a fixação do rendimento coletável (IRS), e imposto (IVA) para os anos 2005 e 2006 nos valores de: € 215.956,32, € 501.754,54 (IRS) e € 24.292,31 e € 75.888,24 (IVA), fixados por métodos indiretos" (cfr.documento junto ao processo administrativo apenso);
8-Em 15/06/2009 o impugnante foi notificado da decisão que antecede (cfr.documentos juntos ao processo administrativo apenso);
9-Na sequência da ação inspetiva mencionada no nº.2 a Autoridade Tributária efetuou, em 20/07/2009, a liquidação adicional de IVA nº.09114628, relativa ao período de 0509T, em que apurou imposto no valor de € 24.292,31, e respetiva liquidação de juros compensatórios nº.09114630 no montante de € 3.162,66, ambas com data limite de pagamento de 30/09/2009 (cfr.documentos juntos a fls.85 e 86 dos presentes autos);
10-Relativamente ao período de 0609T foi efetuada, em 20/07/2009, a liquidação adicional de IVA nº.09114629, em que apurou imposto no valor de € 75.888,24 e juros compensatórios no montante de € 6.869,45, conforme liquidação nº.09114631, ambas com data limite de pagamento de 30/09/2009 (cfr.documentos juntos a fls.87 e 88 dos presentes autos);
11-Para cobrança dos valores provados em 9 e 10, foi instaurada execução fiscal (cfr. informação exarada no processo administrativo apenso);
12-Em 28/12/2009 o impugnante apresentou a presente impugnação judicial, remetida por via postal sob registo a este Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé (cfr.data de registo aposta a fls.3 dos presentes autos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte:
“…1.Que a lotação máxima do estádio de Vila Real de Sto. António seja de 1600 lugares e que pode ir até mais 4000 lugares com a montagem de uma bancada amovível - sobre esta matéria depuseram todas as testemunhas indicadas pelo Impugnante, no entanto, nenhuma delas depôs com a clareza e objetividade necessárias à formação da convicção do tribunal sobre o concreto número de assistência possível, pelo que a prova produzida foi inconclusiva.
2.A quantidade de espectadores presentes em cada evento como convidados, considerando que as testemunhas que sobre esta matéria prestaram depoimento, ... e ... , forneceram informações vagas e, por isso, inconclusivas, tendo esta última (que era colaboradora do Impugnante) afirmado, inclusivamente, que "a bilheteira não era controlada" e que eram reservadas centenas de entradas para os municípios e amigos e familiares dos jogadores e de jornalistas, mas sem concretizar em termos numéricos…”.
X
Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão do recurso e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
13-Do relatório final de inspeção tributária identificado no nº.3 do probatório igualmente consta o seguinte (cfr.cópia de relatório e anexos junta ao processo administrativo apenso):
"(...)
IX. Direito de audição
(...)
Correcções com recurso a métodos indirectos
14. A quantificação da matéria tributável com recurso a métodos indirectos resultou da impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da receita de bilheteira obtida com a organização dos eventos desportivos organizados pelo s.p. nos anos de 2005 e 2006.
15 e 16. Encontra-se justificada na medida em que o s.p., tendo sido notificado para apresentar as receitas de bilheteira e exibição de eventuais bilhetes não vendidos, apenas exibiu 3620 bilhetes de sobras referentes ao Torneio do Guadiana de 2006, não tendo apresentado outros meios probatórios que permitissem o apuramento directo e exacto das receitas de bilheteira como sejam a assistência de publico e eventuais ofertas d.e bilhetes ou destruição dos mesmos .por causas alheias.
17.A obtenção da prova com recurso a fontes externas no processo de quantificação indirecta da matéria tributável torna o processo mais claro e próximo da verdade material que se pretende.
18 e 19. No referido procedimento de quantificação foi tido em conta a capacidade dos estádios (oficial) acrescida da instalação de bancadas suplementares, pois em nenhum dos cálculos de vendas estimadas foi a mesma ultrapassada, sendo que se tal não fosse, os valores apurados seriam consideravelmente maiores, pois ao invés de calcular a receita em função da assistência aos jogos deduzida de eventuais ofertas e sobras declaradas de bilhetes, ter-se-ia aplicado um outro critério, como seja o cálculo da receita de bilheteira em função dos bilhetes emitidos deduzida das ofertas e sobras declaradas.
Em 2009/02/11 o s.p. veio trazer ao processo factos novos, nomeadamente declarações de entidades externas relativas a ofertas de bilhetes (anexo 6).
Pese a que o prazo para o exercício do direito de audição ter terminado em 2009/02/03, os referidos elementos foram sujeitos a apreciação, resultando da sua análise as seguintes conclusões:

1. EVENTOS TROFÉU ALBUFEIRA CAPITAL DO TURISMO E TAÇA AMIZADE 2005

É de aceitar a declaração emitida pelo Município de Albufeira segundo a qual foram oferecidos a essa entidade 2000 entradas para cada um dos eventos. No entanto não é aceite a lotação de 3500 lugares como capacidade máxima do estádio, pois esta refere-se apenas a lugares fixos, podendo a capacidade do estádio ser alargada com a instalação de bancadas amovíveis, conforme se verificou noutros eventos. Mais ainda quando para estes eventos foram emitidos 5250 bilhetes e a assistência de publico, segundo fontes externas cifrou-se em 4000 e 5500 espectadores, respectivamente.
Vêm o s.p. manifestar que os restantes bilhetes foram distribuídos na totalidade por outras entidades, não tendo feito junção de qualquer meio probatório, pelo que não é de aceitar tal pretensão.
Como tal, rectifica-se a quantidade de bilhetes vendidos no Troféu Albufeira Capital do Turismo de 4000 para 2000 e na Taça Amizade de 5250 para 3250.

2. EVENTO TROFÉU DO GUADIANA 2006

É de aceitar a declaração emitida pelo Município de Vila Real de Santo António segundo a qual foram oferecidas a essa entidade 2000 entradas.
Vêm o s.p. manifestar que foram oferecidos a SIC 500 bilhetes, Clubes 450 bilhetes e Outros (patrocinadores, entidades, convidados) 1000 bilhetes.
Relativamente aos bilhetes oferecidos a SIC e outros, já haviam sido tidos em conta nas correcções propostas no projecto de relatório. Quanto aos clubes mantêm-se a quantidade de 75 bilhetes emitidos e entregues aos clubes constante na factura emitida pela tipografia e rejeita-se a pretensão de aceitar 450 bilhetes pois não foi feita a junção de qualquer meio probatório.
De ressalvar que de um total de 7075 bilhetes de sobras calculadas, apenas foram exibidos 3620 bilhetes não vendidos.
Como tal rectifica-se a quantidade de bilhetes vendidos de 8425 para 6425.
(...)".
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou totalmente improcedente a impugnação intentada pelo recorrente, em virtude do decaimento de todos os seus fundamentos, mais mantendo na ordem jurídica os actos tributários objecto do presente processo (cfr.nºs.9 e 10 do probatório).
X
Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em primeiro lugar e como supra se alude, que da conjugação dos artºs.605, nºs.1, 1ª. parte, e 4, e 607, nº.1, 1ª. parte, do C.P.C., resulta que encerrada a audiência final é o juiz do julgamento que profere a sentença, o que acontece mesmo que o juiz do julgamento seja transferido ou promovido. Desconhecendo-se a causa para que exista juiz substituto, é o juiz do julgamento que profere a sentença. Não proferindo a sentença o juiz do julgamento existe uma nulidade (artº.195, nº.1. do C.P.C.). Nulidade, essa, que existe porque, a não prolação da sentença pelo juiz do julgamento, consiste na prática de acto que a lei não admite e omissão de acto ou formalidade que a lei prescreve, como irregularidade, que influi no exame e decisão da causa (cfr.conclusões 1 a 5 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar uma nulidade processual consistente na alegada e ilegal estruturação da sentença recorrida por juiz que não o que presidiu à instrução do processo.
Dissequemos se a decisão recorrida padece de tal vício.
A sentença é uma decisão judicial proferida pelos Tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, no caso posto à sua apreciação, dirimem um conflito de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativo-tributárias. Tem por obrigação conhecer do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto.
Abordando as nulidades processuais, dir-se-á que as mesmas consubstanciam os desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder, embora não de modo expresso, uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais (cfr.artº.195, do C.P.Civil; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/1/2014, proc.6995/13; Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág.176; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.79).
As nulidades de processo que não sejam de conhecimento oficioso têm de ser arguidas, em princípio, perante o Tribunal que as cometeu (cfr.artºs.196 e 199, do C.P.Civil). São as nulidades secundárias, com o regime de arguição previsto no artº.199, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6.
Se bem percebemos, o recorrente chama à colação o princípio da plenitude da assistência dos juízes, consagrado no actual artº.605, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (cfr.anterior artº.654, do C.P.Civil), defendendo a violação do mesmo, em virtude da estruturação da sentença recorrida por juiz que não o que presidiu à instrução do processo, nomeadamente à diligência de produção de prova testemunhal (cfr.acta junta a fls.113 a 115 dos presentes autos).
O dito princípio da plenitude da assistência dos juízes, corolário do princípio da imediação, diz-nos que só podem intervir na decisão da matéria de facto os juízes que tenham assistido a todos os actos de instrução e discussão praticados na audiência final, assim impondo as regras aplicáveis aos casos de falecimento, impossibilitação temporária ou permanente, transferência, promoção ou aposentação do juiz durante a discussão e julgamento da causa, mais sendo vigente quanto à decisão da matéria de facto (cfr.Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág.293 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.657 e seg.).
No processo contencioso tributário, independentemente de ser conveniente a coincidência entre o juiz que preside à instrução e o que profere sentença, que está subjacente àquela regra do artº.605, do C.P.Civil, é de notar que é duvidosa a sua aplicabilidade (a qual só pode ser subsidiária, "ex vi" da alínea e), do artº.2, do C.P.P.T.) nos processos de impugnação judicial, visto existir mesmo uma longa tradição no sentido oposto.
Na verdade, relativamente aos processos regulados pelo antigo C.P.C.I., o § 3, do artº.90, e o § 1, do artº.96, estabeleciam expressamente a regra contrária, determinando que, se as partes não declarassem que pretendiam produzir prova directamente no Tribunal, ela era produzida na repartição de finanças. O § único do artº.99, do C.P.C.I. impunha mesmo que a inquirição de testemunhas por cartas precatórias se fizesse em repartições de finanças, o que revela que, legislativamente, era perfeitamente indiferente que o julgamento da matéria de facto fosse efectuado por quem preside à produção de prova.
Com o C.P.T., alterou-se este regime, estabelecendo-se a regra da produção de prova se efectuar no Tribunal, mas continuou a admitir-se que ela fosse produzida nas repartições de finanças, a requerimento do impugnante (cfr.artºs.127, nº.4, e 133, nº.2, do C.P.T.).
O actual C.P.P.T., na sua redacção inicial, manteve essencialmente este regime de alternatividade da produção de prova (cfr.artº.114, nº.2, do C.P.P.T.). Só com a redacção dada pela Lei 15/2001, de 5/6, àquele artº.114, do C.P.P.T., se passou a estabelecer a obrigatoriedade de produção de prova nos Tribunais tributários (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.545 e seg.).
Por outro lado, em sede de contencioso tributário o julgamento da matéria de facto e o julgamento de direito estão acometidos ao juiz que profere a sentença, não existindo a dicotomia que existe em processo civil, entre a fase de audiência de julgamento, onde são produzidas as provas para a determinação dos factos e a da prolação da decisão, onde é efectuado o enquadramento jurídico dos factos determinados ao caso e declarada a consequente decisão.
Cumpre também observar que, em processo tributário, a apresentação de alegações escritas, as quais se destinam à discussão da matéria de facto e de direito, constitui, inequivocamente, o encerramento da discussão da causa na 1ª. Instância (cfr.artº.120, do C.P.P.T.).
Com efeito, como se vê por este passado legislativo do contencioso tributário, o legislador não teve grande preocupação em assegurar que o julgamento da matéria de facto fosse efectuado por quem preside às diligências de instrução.
De resto, actualmente, com a generalização da gravação da prova nos Tribunais tributários, a qual assegura muito mais proximidade entre o juiz e a produção da prova do que a que permitia a sua redução a escrito, há ainda menos razão do que anteriormente para não se sobrepor a mera conveniência da imediação entre o julgador em relação à produção de prova face ao prejuízo da eficiência global do serviço público de Justiça.
Assim, no contencioso tributário, desde há muito confrontado com litigação em massa, com enorme crescimento nos últimos anos, há mesmo uma longa tradição no sentido de não haver preocupação com a observância daquela regra, tendo-se sobreposto às conveniências daquela imediação, os interesses da eficiência do funcionamento dos Tribunais tributários, que podem com aquelas não se compatibilizarem, sendo esta eficiência que está subjacente, nomeadamente, à norma do artº.48, nº.3, al.g), do E.T.A.F., a qual permite a redistribuição de processos.
Em conclusão, no contencioso tributário não existe norma que determine o julgamento da matéria de facto pelo mesmo juiz que presidiu à produção de prova. O princípio da plenitude da assistência do juiz pressupõe a existência de actos de instrução e discussão praticados na audiência final que, em bom rigor, não existe no contencioso tributário. E sempre assim foi conforme já aludimos supra.
Ainda, igualmente importa atentar no "desaforamento" generalizado de processos ou na sua remessa para prolação de sentença a magistrados entretanto destacados para equipas extraordinárias de recuperação de processos como as criadas pela Lei 59/2011, de 28/11, onde se prevê no seu artº.2, nº.1, as equipas extraordinárias de juízes tributários que são integradas por juízes exclusivamente afectos à área tributária e com a missão de movimentarem os processos fiscais de valor superior a um milhão de euros pendentes nos respectivos Tribunais.
Por último, deve referir-se que a jurisprudência dos Tribunais Superiores desta jurisdição já se pronunciou sobre a alegada violação deste princípio da plenitude da assistência dos juízes, a qual se não verifica no âmbito do processo contencioso tributário quando as diligências de prova, designadamente a inquirição das testemunhas arroladas, cujo depoimento fique devidamente registado, não tiverem sido presididas pelo juiz que depois proferiu a sentença, na qual incorporou a decisão sobre a matéria de facto, sendo que tal situação não constitui, nem nulidade da sentença, nem nulidade processual (cfr.ac.S.T.A-Pleno da 2ª.Secção, 12/12/2012, rec.1152/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/9/2011, proc.2021/07; ac.T.C.A.Norte-2ª.Secção, 15/11/2013, proc.054/05.3BEPRT).
Rematando, não existe qualquer nulidade processual relativa ou secundária, assim improcedendo o presente fundamento do recurso.
Defende, igualmente e em síntese, o apelante que é possível a comprovação directa e exacta da matéria tributável e que não se justifica o recurso à avaliação indirecta pela A. Fiscal no caso dos autos, existindo meras conclusões no relatório de inspecção tributária que determinaram o recurso à avaliação indirecta, e não factos que afastem a avaliação directa. Que o recurso aos métodos indirectos ou indiciários só é possível quando o apuramento da matéria colectável, através das correcções técnicas, se revele, de todo, impraticável. Que não existe justificação para o recurso à avaliação indirecta, nem legitimação, cabendo à A.T. o ónus da prova para determinação da matéria tributável por métodos indirectos (artº.74, nº.3, 1ª. parte, da L.G.T.). Que nas bases da avaliação indirecta da A.T. há falta de objectividade, em especial, nas receitas de bilheteira dos eventos e na assistência do público aos eventos. Que a avaliação indirecta da A.T. carece de aderência à realidade (cfr.conclusões 6 a 25 do recurso), com base em tal alegação pretendendo, supomos, consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal vício.
A A. Fiscal no exercício da sua competência de fiscalização da conformidade da actuação dos contribuintes com a lei, actua no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabendo-lhe o ónus de prova da existência de todos os pressupostos do acto de liquidação adicional. Mais deve chamar-se à colação que a Administração Fiscal, no âmbito do procedimento tributário, está sujeita ao princípio do inquisitório (cfr.artº.58, da L.G.T.), o qual é um corolário do dever de imparcialidade que deve nortear a sua actuação. Este dever de imparcialidade reclama que a Fazenda Pública procure trazer ao procedimento todas as provas relativas à situação fáctica em que vai assentar a decisão, mesmo que elas tenham em vista demonstrar factos cuja revelação seja contrária aos interesses patrimoniais da Administração. Mais se deve realçar que o órgão instrutor pode utilizar, para conhecimento dos factos necessários à decisão do procedimento, todos os meios de prova admitidos em direito (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.5721/12; artº.72, da L.G.T.).
"In casu", examinemos, então, se a A. Fiscal não fez prova, como defende o recorrente, dos pressupostos para recurso ao método de avaliação indirecta da sua matéria colectável, na cédula de I.V.A. e relativamente aos anos de 2005 e 2006.
A avaliação indirecta reveste natureza substantiva, dado que através dela se pode determinar o essencial do facto tributário, isto é, a sua quantificação. Mais se dirá que a avaliação indirecta tem carácter subsidiário (cfr.artº.85, nº.1, da L.G.T.), visto que o respectivo regime só se aplica em casos em que exista uma impossibilidade ou uma dificuldade grave em determinar a matéria tributável através da avaliação directa ou objectiva, não se devendo a ela recorrer sem a verificação plena desse requisito. Isto significa que, mesmo quando o sujeito passivo viole os deveres de cooperação, a primeira forma a que é mester recorrer para fixar a matéria colectável é a avaliação directa (v.g.correcções técnicas), mais devendo ser efectuada a devida fundamentação relativamente à inviabilidade desta, antes de se recorrer à avaliação indirecta. Por outras palavras, a Administração Fiscal deve justificar, motivar e comprovar a relação de causa/efeito entre a acção/omissão do contribuinte e a impossibilidade de aplicar o método de avaliação directa (cfr.artº.77, nº.4, da L.G.T.; João Sérgio Ribeiro, Tributação Presuntiva do Rendimento, Um contributo para reequacionar os métodos indirectos de determinação da matéria tributável, Almedina, 2010, pág.201 e seg.).
A tributação por métodos indirectos não só não constitui o meio normal, como a possibilidade do seu uso está restringida aos casos em que a lei expressamente a admite, verificados que estejam determinados pressupostos (cfr.artºs.81, nº.1, 87 e 88, da L. G. Tributária). O que vale por dizer que nem a Fazenda Pública, nem o contribuinte, podem, de seu livre alvedrio, optar pela tributação indiciária, ainda que aquela cuide assim arrecadar receita maior, ou este acredite furtar-se a uma tributação mais pesada. Por outras palavras, o apuramento alternativo pela A. Fiscal deve ser feito, sempre que possível, com recurso a métodos directos ou correcções técnicas, isto é, pela determinação da matéria colectável através dos elementos da própria contabilidade do sujeito passivo, e só pode haver recurso a métodos presuntivos quando aquele apuramento directo se mostre de todo inviável, não gozando a Fazenda Pública de qualquer margem de discricionariedade relativamente à opção do método (directo ou indirecto) de avaliação da matéria tributável. Em suma, o recurso aos métodos indiciários só é legalmente possível quando o apuramento da matéria colectável através de correcções técnicas se revele, de todo, impraticável, pois que a fixação da matéria tributável por tais métodos deve revestir a natureza de “ultima ratio fisci” e exigir uma cuidada fundamentação quanto à opção pela sua utilização (cfr.artº.81, nº.1, da L.G.Tributária; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 2/2/2006, rec.1011/05; ac.T.C.A.Sul, 15/5/2012, proc.2956/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.5721/12; J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, 2ª.edição, Lex, 2000, pág.303).
O recurso ao método indirecto está legitimado por força do princípio da capacidade contributiva que só se respeita fielmente quando se mede directamente a matéria tributável e sendo, por isso, uma faculdade da A. Fiscal (cfr.artº.82, nº.2, da L.G.T.) no exercício do seu poder/dever de liquidar impostos quando, comprovadamente, demonstre não poder, por via directa, calcular o rendimento tributável do sujeito passivo em causa.
As situações em que a matéria colectável é fixada por métodos indirectos são as taxativamente indicadas no actual artº.87, da L. G. Tributária. Subjacente a todas elas encontra-se uma de duas situações: ou a inexistência de elementos de escrituração ou a sua não idoneidade para comprovarem o lucro revelado pela escrita do contribuinte. De notar a preocupação do legislador em objectivar as aludidas situações, por forma a evitar valorações subjectivas por parte da A. Fiscal (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/7/2012, proc.4397/10).
No que diz respeito ao específico regime do I.V.A., o legislador socorre-se de presunções que estabelecem a prova legal para alguns factos particulares, as quais implicam uma verdadeira inversão do ónus da prova e se explicam pela natureza deste tributo (cfr.v.g.artº.80, do C.I.V.A.; J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, 2ª.edição, Lex, 2000, pág.314 e seg.). Por outro lado, atendendo também à especificidade do I.V.A., mais se refere que não pode a A. Fiscal operar alterações à quantificação da base tributável deste imposto, sem que fique demonstrado terem sido praticadas omissões ou inexactidões no registo de compras ou no registo de vendas do sujeito passivo em causa (cfr.ac.S.T.A.-2ª. Secção, 26/11/97, rec.21676, Ap.Dr., 30/3/2001, pág.3108 e seg.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/10/98, rec.20568, Ap. Dr., 21/1/2002, pág.2964 e seg.; ac.T.C.A.-2ª.Secção, 16/3/1999, proc.280/97, Antologia de Acórdãos, ano II, nº.2, pág.288 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/7/2012, proc.4397/10).
Relativamente à possibilidade de recurso à aplicação de métodos indiciários, com vista à determinação da matéria colectável no âmbito do I.V.A., faz-se esta de acordo com os vectores consagrados nos citados artºs.87 e seg. da L.G.Tributária, "ex vi" do artº.84, do C.I.V.A.
Revertendo ao caso dos autos, do probatório se retira que a determinação do resultado tributável do impugnante/recorrente, nos exercícios de 2005 e 2006, foi efectuada por recurso a métodos indirectos ao abrigo dos vectores constantes dos artºs.87, al.b), e 88, al.a), ambos da Lei Geral Tributária ("ex vi" do artº.84, do C.I.V.A.), tendo resultado da impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta das receitas de bilheteira obtidas com a organização dos eventos desportivos pelo s.p. nos aludidos anos, sendo que as liquidações adicionais deste tributo surgiram na sequência das correções, para mais, efectuadas aos rendimentos do apelante e decorrendo da aplicação do citado artº.84, do C.I.V.A., visto que tais proveitos se enquadram na Lista l anexa ao C.I.V.A., sendo a taxa a aplicar de 5% de I.V.A., nos termos do artº.18, nº.1, al.a), do mesmo diploma (cfr.nºs.3 e 13 do probatório).
O artº.87, al.b), da L. G. Tributária, cuja redacção foi estabelecida pela Lei n.º 30-G/2000, de 29/12, prevê a possibilidade de avaliação indirecta da matéria tributável quando se verifica a falta dos elementos necessários para comprovar e quantificar directa e exactamente a matéria tributável, pelo que a avaliação directa é impossível. Esta impossibilidade, porém, só pode resultar das anomalias e incorrecções taxativamente indicadas nas várias alíneas do artº.88, da L. G. Tributária (cfr.artº.81, nº.1, da L.G.Tributária). Nestes casos, a avaliação da matéria tributável é feita com base em indícios, presunções ou outros elementos de que a Administração Tributária dispuser, de entre os indicados no artº.90, nº.1, do mesmo diploma. Como se constata pelas situações descritas no preceito, o que releva para determinar o impedimento não é uma impossibilidade absoluta de avaliação directa da matéria tributável, mas sim a impossibilidade de tal avaliação no momento em que ela deve ser efectuada (impossibilidade relativa). Já o artº.88, al.a), da L. G. Tributária, consagra um dos casos em que pode ser impossível a comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável (cfr.Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, Encontro da Escrita, 4ª. edição, 2012, págs.757 e seg.; João Sérgio Ribeiro, Tributação Presuntiva do Rendimento, Um contributo para reequacionar os métodos indirectos de determinação da matéria tributável, Almedina, 2010, pág.247 e seg.).
Na indicada al.a), do artº.88, da L.G.T., prevêem-se várias situações constitutivas de infracções tributárias, designadamente a não organização da contabilidade de harmonia com as regras contabilísticas, a qual se encontra prevista no artº.121, do R.G.I.T. (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/7/2012, proc.4397/10; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, Encontro da Escrita, 4ª. edição, 2012, págs.765 e seg.).
“In casu”, mais uma vez voltando à matéria de facto provada (cfr.nºs.3 e 13 da matéria de facto provada), pode concluir-se que os factores que levaram a A. Fiscal a considerar que era impossível a comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável do impugnante/recorrente, no que diz respeito aos anos de 2005 e 2006, em sede de I.V.A. e especificamente quanto às operações tributáveis havidas em virtude da organização dos eventos Troféu Albufeira Capital do Turismo e Taça Amizade em 2005, tal como o Troféu do Guadiana em 2006, foram os seguintes:
1-Omissões de receita de bilheteira na contabilidade;
2-Não exibição da totalidade dos bilhetes não vendidos;
3-Não utilização de uma conta bancária afecta exclusivamente à actividade empresarial do impugnante/recorrente que evidencie os depósitos e pagamentos relativos à mesma actividade.
Ou seja, todos os factos que determinaram o recurso à avaliação indirecta se mostram detalhadamente descritos no relatório de inspecção, não tendo a A. Fiscal fundado a mesma, como quer fazer crer o impugnante/recorrente, em meras conclusões. Pelo contrário, a Administração Tributária, no exercício da sua competência de fiscalização, cumpriu o ónus de demonstrar a existência de todos os pressupostos do recurso necessário à avaliação indirecta, conforme disposto no artº.74, nº.3, da L.G.T., não se limitando a afirmar a falta de fiabilidade da contabilidade, mas fazendo um esforço no sentido de trazer à evidência um conjunto de situações que demonstram a sua falta de rigor e verdade.
Arrematando, a Administração Tributária fez prova de que a contabilidade do recorrente contém irregularidades e omissões tais que impossibilitavam o apuramento da matéria tributável através de correcções meramente técnicas, tal implicando o recurso a métodos indirectos de apuramento da mesma, especificamente quanto aos rendimentos havidos em virtude da organização dos eventos Troféu Albufeira Capital do Turismo e Taça Amizade em 2005, tal como o Troféu do Guadiana em 2006 (cfr.artºs.87, al.b) e 88, al.a), da L.G.Tributária).
Por consequência se impõe concluir que, no caso vertente, se encontravam verificados os necessários pressupostos legais para que a A. Fiscal lançasse mão da metodologia indirecta com base na factualidade constante do probatório, assim naufragando, nessa precisa medida, as conclusões de recurso sob análise, ou seja, a invocação da ilegalidade das liquidações por inexistência dos pressupostos de recurso à avaliação indirecta.
Refira-se, ainda, que a circunstância da contabilidade ser una não colide com a sua correcção, por parte da A. Fiscal, através da utilização simultânea de correcções técnicas e métodos indirectos, como acontece no caso "sub judice". A utilização simultânea de tais metodologias alternativas quando, em face dos factos patrimoniais sujeitos a registo, se apresente possível, torna-se, não só uma faculdade, mas um poder/dever da Fazenda Pública na medida em que impliquem uma maior proximidade à realidade a tributar (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/6/2009, proc.2803/08).
Resta mencionar que o impugnante e ora recorrente, apesar de contestar o critério que serviu de base à quantificação administrativa da matéria tributável(1), não disponibilizou outro ou outros que fossem mais credíveis, por coerentes e adequados à quantificação exacta e justa, propiciando uma certeza (exigível) como meio de prova, revelando-se por isso incapaz de, justificadamente, se desonerar do ónus da prova que nesta matéria do alegado excesso de quantificação sobre si impendia, em ordem à anulação das liquidações em causa, tudo nos termos do artº.74, nº.3, da L.G.T. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/6/2011, proc.2477/08).
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 13 de Março de 2014


(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)



1- (embora não seja líquido, do exame das conclusões de recurso, que o apelante tenha questionado o excesso de quantificação da matéria colectável fixada por métodos indirectos).