Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2237/15.9BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:11/11/2021
Relator:LUÍSA SOARES
Descritores:PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO POR CONTRA-ORDENAÇÃO; CONHECIMENTO OFICIOSO
Sumário:I - A prescrição do procedimento por contra-ordenação prevista e punida pelo art. 114.º do RGIT tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo de seis anos (art. 28.º, n.º 3, do RGCO).

II - A suspensão da prescrição nos procedimentos pendentes não pode ultrapassar seis meses (art. 27.º-A, n.º 2, do RGCO).


III - A prescrição do procedimento por contra-ordenação prevista e punida pelo art. 114.º do RGIT tem sempre lugar quando, desde o seu início, tiver decorrido o prazo de seis anos e seis meses;


IV - A prescrição do procedimento por contra-ordenação é questão de conhecimento oficioso.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I – RELATÓRIO


Vem a AT – Autoridade Tributária e Aduaneira interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente o recurso e julgou extinto, por prescrição, o procedimento contraordenacional instaurado à sociedade Q. S.A. no âmbito do qual foi aplicada a coima única no montante de € 24.332,50.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
“A. Foi aplicada à arguida, pelo Serviço de Finanças de Cascais 1, a coima de €24.332,50, pela prática da infração aos artigos 27.º n.º 1 e 41.º do CIVA, punida pelos artigos 114.º n.º 2 e 26.º n.º 4 do RGIT.

B. De acordo com o artigo 28.º n.º 1 al. d) do RGCO o prazo de prescrição do
procedimento contra-ordenacional interrompe-se com a aplicação da coima pela
autoridade administrativa.

C. No caso concreto, tendo o Chefe do Serviço de Finanças de Cascais 1, proferido decisão de aplicação de coima, em 09.03.2014, iniciou-se, nessa data, a contagem de um novo prazo de prescrição,

D. Deste modo, contado o prazo prescricional de sete anos e meio, a partir 09.03.2014, verifica-se que o mesmo ainda não se consumou.

E. Pelo que, ao decidir como decidiu, violou o Tribunal a quo, na sentença recorrida o disposto nos arts. 33º do RGIT e 27º-A e 28º do RGCO.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue o recurso de contraordenação totalmente improcedente.
PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA”.
* *
A Recorrida apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões:

“A. Por ofício recebido pela Recorrida aos 21FEV2021 a ora Recorrente Autoridade tributária (AT) imputou, em suma, àquela a prática aos 14FEV2012 das seguintes infrações:
iii. Falta de Liquidação de IVA, prevista pelo artigo 18.º, n.º1 do CIVA; e
iv. Falta de Entrega de Imposto exigível, conjuntamente com a respectiva declaração periódica, prevista pelos artigos 27.º, n.º1 e 41.º, n.º1 do CIVA, infracções punidas pelos artigos 114.º, n.º2 e 26.º, n.º 4 do RGIT.

B. Aos 03MAR2014 a Recorrida apresentou a sua defesa negando a prática/preenchimento do tipo das referidas contra-ordenações;

C. Aos 15DEZ2014 a Recorrida recorreu da decisão administrativa proferida em 09MAR2014 pelo chefe de Finanças de Cascais-1;

D. Dispõe o nº 1 do art. 33 do RGIT, a propósito da Prescrição do procedimento, o seguinte:
“O procedimento por contra-ordenação extingue-se, por efeito da prescrição, logo que sobre a prática do facto sejam decorridos cinco anos.”

E. Não há dúvida que a alegada prática das ditas infrações, - sem conceder quanto a verificação das mesmas -, terá ocorrido aos 14FEV2012;

F. A posição defendida pela Recorrente AT invocando o nº 3 do art. 33º do RGIT e o art. 28º do RGCO, para efeitos de contagem de prescrição, que “(…) tendo o Chefe do Serviço de Finanças de Cascais 1, proferido decisão de aplicação de coima, em 09.03.2014, iniciou-se, nessa data, a contagem de um novo prazo de prescrição,” é errada por contrária à lei; e isto porque

G. Tal alegação não faz qualquer sentido dada a redação do referido nº 1 do art. 33 do RGIT que clara, expressa e inequivocamente prescreve a “prática do facto”,- e não qualquer outro facto -, para efeitos de contagem/extinção do procedimento de contra-ordenação por efeito de prescrição, decorridos que se encontrem cinco anos, acrescentando o seu nº 3 que “3 - O prazo de prescrição interrompe-se e suspende-se nos termos estabelecidos na lei geral (…)”.

H. Conforme resulta do nº 3 do art. 28º do RGCO “A prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade”;

I. No mesmo sentido veja-se o nº 3 do art. 121º do Código Penal “A prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar quando, desde o início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade”;

J. Nenhuma das disposições invocadas faz referência à Interrupção mas tão-somente à Suspensão, e não o faz por acaso…

K. É que este nº 3 do art. 28º do RGCO foi introduzido no RGCO pela Lei 109/2001, de 24DEZ, após o Acórdão de uniformização de jurisprudência nº 6/2001 do STJ que determinou que “a regra do nº 3 do artigo 121º do Código Penal, que estatui a verificação da prescrição do procedimento quando, descontado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição, acrescido de metade, é aplicável, subsidiariamente, nos termos do artigo 32º do regime geral das contra-ordenações (Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro; alterado pelo Decreto-Lei nº 244/95, de 14 de Setembro) ao regime prescricional do procedimento contra-ordenacional”.

L. O objectivo da norma supra referida foi o de estabelecer um prazo máximo findo o qual o procedimento penal ou contra-ordenacional já não pode ter lugar, apesar da ocorrência de eventos interruptivos, porquanto a renovação do prazo de prescrição, depois de cada interrupção, conduziria a que se eternizasse a pendência do processo mediante a prática de actos processuais idóneos para o efeito, tendo assim sido estabelecido um limite à admissão de um número infinito de interrupções, alterando-se o efeito dos eventos interruptivos, porquanto com tal limitação a interrupção deixou de implicar um novo decurso de «todo» o prazo de prescrição.

M. É de concluir que a Sentença se encontra bem fundamentada e aplica correctamente o Direito quando refere:
“(…) Assim, tendo em conta que, as infracções se consumaram em 14/02/2012, é aplicável o Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), que entrou em vigor em 05/07/2001 - artigo 14.º da Lei n.º 15/2001 de 05/06, que o aprovou.
Sublinhe-se, contudo que, de acordo com o disposto no artigo 3.º, n.º 2 do Regime Geral das Contraordenações (RGCO - com as alterações introduzidas pelo Dec-Lei n.º 356/89, de 17/10 e pelo DL n.º 244/95, de 14/10), aplicável subsidiariamente às contraordenações fiscais, por remissão do artigo 3.º, alínea b) do RGIT, ocorre uma excepção ao princípio da não retroactividade das Leis: “se a Lei vigente ao tempo da prática do facto for posteriormente modificada, aplicar-se-á a Lei mais favorável ao arguido, salvo se este já tiver sido condenado por decisão definitiva ou transitada em julgado e já executada.” (…)
Dispunha o artigo 33.º, n.º1 do RGIT, na redacção em vigor que, “o procedimento por contra-ordenação se extingue, por efeito de prescrição, logo que sobre a prática do facto sejam decorridos cinco anos”.
Ora, ainda que esse prazo pudesse ter sido interrompido em data que não é relevante apurar, com a primeira notificação à recorrente dos factos que lhe são imputados e da sua notificação para exercer o direito de audição, ficando assim anulado o prazo prescricional entretanto decorrido (cf. artigos 33.º, n.º3 do RGIT,
28.º, n.º1 alínea a) do RGCO e 121.º, n.º2 do Código Penal, estes últimos aplicáveis por remissão do artigo 3.º, alínea b) do RGIT), há que atender ao dispositivo contido no artigo 121.º, n.º 3 do Código Penal.
Refere-se neste último preceito legal que, “A prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar quando, desde o início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade.”.
Também este dispositivo é subsidiariamente aplicável ao processo de contraordenação (Acórdão de fixação de jurisprudência do STJ de 08/03/2001, em DR n.º 76, 1.ª Série-A de 30/03/2001).
Em igual sentido, preceitua o artigo 28.º, n.º 3 do RGCO que “a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade”.
Cumpre ainda sublinhar que, in casu, se verifica a causa de suspensão, a que alude o artigo 27.º A, n.º 1, alínea c) do RGCO (notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso), a qual opera pelo período máximo de 6 meses, de acordo com o n.º 2, da citada disposição legal.
Do exposto se conclui que, consumadas as infracções em 14/02/2012, já decorreu o prazo máximo da prescrição, acrescido de metade (sete anos e meio), ainda que ressalvando o período de suspensão da prescrição pelo período máximo de 6 meses, nos termos supra descritos), pois que decorreram quase 9 anos desde a data da prática das alegadas infracções.
Pelo que, cumpre declarar extinto o procedimento de contraordenação, procedendo assim, o presente recurso. (…)”;

N. A Sentença encontra-se, pois, clara e bem fundamentada, o que deve ser reconhecido devendo o recurso improceder e ser mantida a decisão no sentido de julgar extinto, por prescrição, o procedimento contra-ordenacional.

O. Mesmo que fosse considerada a data pretendida pela Recorrente AT de 09MAR2014 (data em que foi proferida a decisão de aplicação de coima pelo Chefe do Serviço de Finanças de Cascais 1) e se iniciasse “(…) nessa data, a contagem de um novo prazo de prescrição”, como defendido pela Recorrente AT,
então ter-se-ia que a prescrição do procedimento já teria ocorrido aos 09MAR2019 (09MAR2014 + 5 anos - nº 1 do art. 33º do RGIT) uma vez que, após a última interrupção, decorreu o prazo prescricional,

P. pelo que a semelhante resultado, o da verificação da prescrição, se chegaria devendo igualmente ser julgado extinto, por prescrição, o procedimento contra-ordenacional.

Q. No sentido das posições defendidas e das presentes conclusões prescreve o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10OUT2012, Processo 0456/12 que:
“I – O objectivo do nº 3 do artigo 28º do RGCO é estabelecer um prazo máximo findo o qual o procedimento contra-ordenacional já não pode ter lugar, apesar da ocorrência de eventos interruptivos. (…)
É evidente que, em consequência de eventos suspensivos ou interruptivos, um determinado prazo prescricional pode extinguir-se muito para além daquele prazo de cinco anos. Como o artigo 33º do RGIT remete para a «lei geral» nessa matéria, as causas de suspensão e de interrupção aplicáveis ao caso são as previstas nos artigos 27º-A e 28º do DL nº 433/82 de 27 de Novembro (Regime Geral das Contra-ordenações). (…)
Esta norma foi introduzida no RGCO pela Lei nº 109/2001, de 24 de Dezembro após o Acórdão de uniformização de jurisprudência nº 6/2001 do STJ (publicado no DR, I série, de 30/3/2001) que determinou que «a regra do nº 3 do artigo 121º do Código Penal, que estatui a verificação da prescrição do procedimento quando, descontado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição, acrescido de metade, é aplicável, subsidiariamente, nos termos do artigo 32º do regime geral das contra-ordenações (Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro; alterado pelo Decreto-Lei nº 244/95, de 14 de Setembro) ao regime prescricional do procedimento contra-ordenacional».
O objectivo da norma é estabelecer um prazo máximo findo o qual o procedimento penal ou contra-ordenacional já não pode ter lugar, apesar da ocorrência de eventos interruptivos. É que, a renovação do prazo de prescrição depois de cada interrupção conduziria a que se eternizasse a pendência do processo mediante a prática de actos processuais idóneos para o efeito. Estabeleceu-se assim um limite à admissão de um número infinito de interrupções e alterou-se o efeito dos eventos interruptivos, pois com tal limitação a interrupção deixou de implicar um novo decurso de «todo» o prazo de prescrição. (…)
Mas não se pode confundir (…) o prazo de prescrição, que é de cinco anos, com o prazo máximo de prescrição, que é de sete anos e meio. Se, após a última interrupção, o prazo de cinco anos se extingue, sem que ainda tenham decorridos sete anos e meio desde a prática da infracção, naturalmente que a prescrição se extingue nessa data e não no termo dos sete anos e meio. (…)”;

R. Deve o Recurso interposto pela Autoridade Tributária improceder e ser mantida a decisão no sentido de julgar extinto, por prescrição, o procedimento contra-ordenacional.
Termos em que se requer seja :
a) reconhecido que a Sentença recorrida se encontra, pois, clara e bem fundamentada, aplicando correctamente o Direito;
b) mantida a decisão no sentido de julgar extinto, por prescrição, o procedimento contra-ordenacional.
c) reconhecido que mesmo que fosse considerada a data do início de contagem do prazo pretendida pela Recorrente AT de 09MAR2014 e se iniciasse “(…) nessa data, a contagem de um novo prazo de prescrição” a prescrição do procedimento teria ocorrido aos 09MAR2019 (09MAR2014 + 5 anos - nº 1 do art. 33º do RGIT) pelo que também por aqui se deve igualmente considerar extinto, por prescrição, o procedimento contra-ordenacional;
d) negado provimento ao Recurso da AT devendo ser mantida a decisão no sentido de julgar extinto, por prescrição, o procedimento contra-ordenacional;
e) a Recorrente AT condenada nas Custas a que deu causa com a apresentação do presente recurso.”.

* *
O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, pronunciou-se no sentido de ser concedido provimento ao recurso.
* *
Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.
* *
II- OBJECTO DO RECURSO

A Recorrente nas conclusões das suas alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, defende que a decisão recorrida padece de erro de julgamento por errada interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis in casu, ao ter declarado a prescrição do procedimento contra-ordenacional.
* *
III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“De acordo com a prova documental, infra referida, a propósito de cada uma das alíneas do probatório, considero provados os seguintes FACTOS:
a) Em 09/30/2014, foi proferida decisão, pelo chefe do serviço de finanças de Cascais-1, em sede do processo de contraordenação que, na fase administrativa, possuía o n.º 1503201206000133606 e que condenou a ora recorrente Q. S.A. na coima única de € 24.332,50 (vinte e quatro mil, trezentos e trinta e dois euros e cinquenta cêntimos), pela prática das seguintes infracções, consumadas em 14/02/2012: Falta de Liquidação de IVA, prevista pelo artigo 18.º, n.º1 do CIVA e Falta de Entrega de Imposto exigível, conjuntamente com a respectiva declaração periódica, prevista pelos artigos 27.º, n.º1 e 41.º, n.º1 do CIVA, sendo as duas infracções punidas pelos artigos 114.º, n.º2 e 26.º, n.º4 do RGIT - decisão de condenação, junta de fls. 44 e 45 dos autos, em suporte físico;

b) As referidas infracções respeitam ao período 12T2011 e consumaram-se em 14/02/2012 - citada decisão administrativa;

c) O presente recurso foi apresentado em 16/02/2014 - documento junto a fls. 26 dos autos, em suporte físico;

d) Em 05/04/2017, foi proferido despacho, que procedeu ao exame preliminar do recurso - despacho de fls. 111 dos autos, em suporte físico.
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4.2
FACTOS NÃO PROVADOS:
Não há factos não provados, com relevância para a questão a apreciar.
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4.3.
MOTIVAÇÃO:
A convicção do Tribunal baseou-se no teor dos documentos, juntos aos autos, supra identificados a propósito de cada uma das alíneas do probatório, cujo conteúdo não foi impugnado pelas partes.”.
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IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

A Recorrente vem defender no presente recurso que o procedimento contra-ordenacional não se mostra prescrito contrariamente ao decidido pelo tribunal recorrido.

Vejamos então.

A prescrição, que consiste na extinção de um direito por motivo do decurso de um certo lapso de tempo estabelecido na lei, constitui causa de extinção do procedimento contra-ordenacional, que deve ser conhecida oficiosamente em qualquer estado do processo, enquanto este não tiver terminado, obstando à apreciação do mérito da causa e gerando o arquivamento dos autos (cf. arts. 33.º, n.º 1, 61.º, alínea b), 77.º, n.º 1, do RGIT e Acórdão do STA de 20/05/2020, proc. n.º 01901/15.7BELRA).

Seguiremos, com as necessárias adaptações, o entendimento vertido no Acórdão do STA de 12/05/2021- proc 02248/15, que pela sua clareza, sufragamos sem qualquer reserva.

O procedimento por contraordenação extingue-se, por efeito da prescrição, decorridos cinco anos sobre a prática do facto (cfr. art. 33º, nº 1 do RGIT).

Para determinar o momento da prática da infração é necessário ter em conta que o facto se considera praticado no momento em que o agente atuou ou, no caso da omissão no momento em que deveria ter atuado ou naqueles em que o resultado típico se tiver produzido (art. 5.º, n.º 1 do RGIT), sendo que “As infracções tributárias omissivas se consideram praticadas na data em que termine o prazo para o cumprimento dos respectivos deveres tributários” (art. 5.º, n.º 2 do RGIT).

Contudo, nos termos do n.º 2 do art. 33.º do RGIT, o prazo de prescrição do procedimento por contra-ordenação é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infracção depender daquela liquidação.

Para efeitos deste dispositivo legal, o STA tem entendido que a infracção depende da liquidação sempre que a determinação do tipo de infracção ou da sanção que lhe é aplicável depende da prévia determinação do valor da prestação tributária devida (cfr Acórdão do STA de 28 de Abril de 2010, proferido no processo com o n.º 777/09).

Trata-se de um prazo especial relativamente ao n.º 1, sendo casos em que a existência da contraordenação depende da liquidação da prestação tributária os previstos nos arts. 108.°, n.°1, 109.°, n.° 1, 114.°, 118.° e 119.°, n.° 1, todos do RGIT (nesse sentido, v. Jorge Lopes de Sousa, e Manuel Simas Santos, in Regime Geral das Infracções Tributárias – anotado, 3.ª ed., anotação ao art. 33.º , Áreas Editora, p. 320).

E como se sumariou no acórdão do TCAS de 16/12/2020, proc. n.º 1579/13.2BESNT:
“Para efeitos de aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 33.º do RGIT, deve entender-se que a infração depende da liquidação sempre que a determinação do tipo de infração ou da sanção que lhe é aplicável depende da prévia determinação do valor da prestação tributária devida.
II-Tendo sido imputada infração à Arguida punida pelo artigo 114.º, nºs. 2, e 5, al.f), do RGIT, e estando a mesma dependente do apuramento do imposto em falta o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional tem de ser igual ao prazo de caducidade do direito à liquidação desse imposto, o qual, de harmonia com o artigo 45.º, nº.4, da LGT, é de quatro anos contados a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário.”

No caso em apreço, estando em causa a contra-ordenação prevista pelo art. 114.º do RGIT e punível pelo mesmo artigo com coima cujo montante se determina pelo valor da prestação devida, pois os respectivos limites mínimo e máximo são fixados tendo por referência o valor do imposto em falta (cfr. Acórdão do STA de 30 de Abril de 2019, proferido no processo com o n.º 679/11.8BEALM), o prazo de prescrição do procedimento por contra-ordenação é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária, ou seja, é reduzido a quatro anos, a contar do início do ano civil seguinte (dado estarmos perante a falta de pagamento do IVA), de acordo com o disposto nos n.ºs 1 e 4 do art. 45.º da LGT.

Nos termos do disposto no art. 28.º, n.º 3 do Regime Geral das Contra-Ordenações, (RGCO), “A prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo de prescrição, acrescido de metade”.

Conforme a jurisprudência do STA, esta norma é também aplicável, subsidiariamente, ao procedimento contra-ordenacional tributário, ex vi o disposto na alínea b) do art. 3.º do RGIT (Cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 5 de Fevereiro de 2020, no processo n.º 273/12.6BEALM (197/18); - de 20 de Maio de 2020, no processo n.º 1901/15.BELRA; - de 16 de Setembro de 2020, proferido no processo n.º 1476/15.7BELRA e de 7 de Abril de 2021 no processo com o n.º 635/15.7BEVIS).

Assim, e para os efeitos do citado artigo 28.º, n.º 3, do RGCO, a prescrição do procedimento terá lugar quando, desde a data em que se verificou o facto tributário, tiver decorrido o prazo de quatro anos, acrescido de metade.

Vejamos o caso em apreço.

Como resulta do probatório estamos perante infrações praticadas em 14/02/2012 (cfr. alíneas a) e b) do probatório) decorrentes da falta de entrega de imposto (IVA), previstas e punidas pelo art. 114º, nº 2 e 26º nº 4 do RGIT pelo que o prazo de prescrição decorreu desde 01/01/2013 até 31/12/2019 (4 anos + 2).

Contudo importa atender ainda na contagem do prazo de prescrição, ao tempo de suspensão, que todavia, nos termos do n.º 2 do artigo 27.º-A do RGCO, não pode ultrapassar seis meses.

Destarte conclui-se que, na presente data, o procedimento contra-ordenacional encontra-se prescrito, o que conduz à sua extinção, nos termos da alínea b) do art. 61.º do RGIT, devendo ser determinado o arquivamento do processo nos termos do art. 77.º do RGIT, e art. 64.º, n.º 3 do RGCO, a sentença que também assim decidiu deve manter-se, embora com a presente fundamentação.


Em face do exposto conclui-se ser de negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida com a presente fundamentação.

* *
V- DECISÃO

Nos termos expostos, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida com a presente fundamentação.

Sem custas.
Lisboa, 11 de Novembro de 2021
Luisa Soares
Vital Lopes
Susana Barreto