Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03583/09
Secção:CT - 2:ª Juízo
Data do Acordão:01/12/2010
Relator:José Correia
Descritores:IMPUGNAÇÃO DE IVA.
OMISSÃO DE PRONÚNCIA.
CONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA NO PROCESSO DE IMPUGNAÇÃO.
OBRIGAÇÕES DECLARATIVAS. MUDANÇA DE REGIME.
Sumário:I) -A sentença só enferma de nulidade por omissão de pronúncia quando não se pronuncia sobre questão que foi invocada violando o disposto na alínea d) do n° l do art.° 668.° do CPC – cfr. artº 125º do CPPT.
II) -Não obstante o tribunal tenha também o dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr. parte final do n° 2 do artigo 660° do CPC), a omissão de tal dever não constituirá nulidade, mas sim eventual erro de julgamento na medida em que se deve considerar que o tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa.
III) -Assim, ainda que se verificasse a prescrição das dívidas exequendas, posto que era de conhecimento oficioso (cfr. artº 175º do CPPT), a omissão de pronúncia sobre tal questão nunca consubstanciaria nulidade da sentença, mas, tão-somente, erro de julgamento.
IV) -No caso posto ao veredicto deste Tribunal, porque ocorreu a instauração da execução fiscal tendo por objecto a cobrança coerciva da dívida, a reclamação e a própria impugnação, seguindo a pacífica jurisprudência dos tribunais superiores, deveriam ser também consideradas na eficácia interruptiva que a lei lhe outorga.
V) -Porque os autos não contêm elementos que, com base apenas na execução, reclamação e/ou impugnação, facultem o seu conhecimento, improcede a referida questão da prescrição, sem prejuízo de a mesma poder/dever ser suscitada junto da execução fiscal para ser apreciada pela AT com base em todos os pertinentes elementos de que disponha.
VI) -Impende sobre os sujeitos passivos de IVA a obrigação de declarar o seu enquadramento para efeitos fiscais, nomeadamente quanto à obrigatoriedade de liquidar e deduzir ou não o Imposto Sobre o Valor Acrescentado, sem prejuízo de a administração tributária fiscalizar se estão verificados os pressupostos legais de que o sujeito passivo se arroga.
VII) -Tendo a AT baseado a liquidação do IVA impugnado no facto de a Impugnante durante o ano em causa ter liquidado e deduzido indevidamente o Imposto Sobre o Valor Acrescentado, postergando o enquadramento legal imperativo do art° 53° do CIVA, quando é certo que os sujeitos passivos de IVA, mesmo que indevidamente liquidem o imposto, estão obrigados a entregá-lo ao Estado sem que possam deduzir o Imposto suportado a montante, nenhuma censura merece o seu agir.
VIII) –Isso porque no período de 01/01/93 a 31/01/95, a Impugnante estava enquadrada no regime de isenção previsto no art° 53° do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado e liquidou o IVA que não podia deduzir, irrelevando para o efeito o facto de já ter atingindo o volume de negócios que a afastavam do regime estabelecido no art° 53° do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado, facto que, embora alegado, nem sequer foi provado e que, de todo o modo, era inócuo, dada a falta de apresentação da declaração de alterações a que aquela estava obrigada se se verificasse tal pressuposto, como também era seu ónus.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDA-SE, EM CONFERÊNCIA, NA 2ª SECÇÃO DO TCAS:

I. - RELATÓRIO

A..., inconformada com a sentença do Mº Juiz do TT de Lisboa que julgou improcedente a impugnação por si deduzida contra a liquidação de IVA e respectivos juros compensatórios, relativa ao ano fiscal de 1993, com os sinais dos autos, veio recorrer concluindo a sustentar que:
“1. - É hoje pacífico na Jurisprudência que a prescrição da obrigação tributária constitui questão de natureza substantiva e de conhecimento oficioso em qualquer grau de jurisdição, até ao trânsito em julgado da decisão final sobre o objecto da causa.
2. Verifica-se, pois, que a douta sentença, ao não conhecer da prescrição, é nula por omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do n.° 1 do artigo 668° do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do artigo do CPPT.
3. Por outro lado, importa ainda referir que, a jurisprudência tem entendido que, embora a prescrição da obrigação tributária não constitua por si, fundamento de impugnação judicial, a possibilidade de declaração da prescrição no âmbito de um processo de Impugnação Judicial deverá ser admitida com fundamento na inutilidade superveniente da lide.
4. Pelo que, no caso sub judice deveria ter sido reconhecida a prescrição pelo tribunal a quo.
5.a De acordo com o disposto no artigo 34° do CPT, a obrigação tributária prescreve no prazo de 10 anos, salvo se outro mais curto estiver fixado na lei, sendo que, o prazo de prescrição conta-se desde o início do ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário;
6. Ora, no presente caso, sendo que se trata de uma dívida do exercício de 1993 temos que as dívidas em causa já se encontram prescritas desde 2005;
7 No entanto, mesmo aplicando-se o prazo prescricional previsto no artigo 48° da LGT verifica-se que estas dívidas encontram-se já prescritas, pois, desde 01 de Janeiro de 1999 até à presente decorreram já mais de 10 anos;
8. A ora Recorrente dedica-se ao comércio de artigos de ourivesaria, tendo ficado enquadrada no regime de isenção de IVA previsto no artigo 53° do CIVA aquando do início da sua actividade.
9. -Porém, em 1993, a ora Recorrente constatou que os limites de isenção fixados naquele preceito legal seriam ultrapassados em 1993;
10. Pelo que, procedeu à entrega das declarações periódicas Modelo B referentes à sua actividade, tendo procedido à liquidação de imposto e respectiva dedução, tudo nos termos da lei;
11. No entanto, no final de 1994 apercebeu-se que, por lapso, havia olvidado a entrega da declaração de alterações. Assim, que detectou este erro, a ora Recorrente apressou-se a corrigi-lo, tendo apresentado a competente declaração de alterações;
12. Por razões que não sabe determinar, a declaração indicava que a Recorrente ficava sujeita ao regime dos pequenos retalhistas;
13. Tendo constatado o mencionado lapso, a Recorrente apressou-se na sua correcção, tendo apresentado logo em Maio do mesmo ano nova declaração de alterações, onde se subsumia ao regime normal do IVA;
14. O legislador tributário estabeleceu, no artigo 60° CIVA, o direito à isenção de IVA dos comerciantes pequenos retalhistas que sejam pessoas singulares, não possuam nem sejam obrigados a possuir contabilidade organizada para efeitos de IRS e não tenham tido no ano civil anterior um volume de compras superior a, na altura, 7.500.000$00, os sujeitos passivos para apurar o imposto devido ao Estado, aplicarão um coeficiente de 25% ao valor do imposto suportado nas aquisições de bens destinados a vendas sem transformação.
15. Ora, ou pela vontade do sujeito passivo ou uma vez ultrapassados os limites quantitativos referidos no artigo 60° do Código do IVA, aqueles deixam de poder beneficiar do regime de isenção passando a estar obrigados a liquidar o respectivo IVA nas operações tributáveis que pratiquem.
16. No entanto, a passagem, por iniciativa própria ou por força da lei, deste regime excepcional de isenção para o regime geral de cumprimento das obrigações principiais de liquidação e pagamento do imposto, exige ainda o cumprimento de obrigações acessórias, mormente o de inscrição para efeitos de IVA prevista no artigo 31° do mesmo Código.
17. Ora, a Recorrente apenas olvidou o cumprimento atempado desta obrigação acessória de apresentação da declaração de alterações para efeitos de liquidação de IVA.
18. A ora recorrente que, inicialmente e perante o reduzido volume de actividade, havia ficado abrangida pelo regime de isenção de IVA previsto no artigo 53° do Código do IVA, logo no início de 1993 e constatando que aqueles limites de isenção fixados naquele preceito legal seriam ultrapassados, iniciou a entrega das declarações periódicas modelo B referentes à sua actividade, tendo procedido à liquidação de imposto e respectiva dedução, tudo nos termos da lei. Tendo sempre agido como se de um sujeito passivo não isento se tratasse.
19. A desconsideração da actuação material da ora Recorrente com fundamento na preterição de uma obrigação acessória resulta numa cominação legal desproporcionada, injusta e contrária a todos os princípios estruturantes e sistematizantes deste imposto - este mesmo sistema tributário que manda tributar os meros actos isolados.
A liquidação a que a ora Recorrente foi sujeita promove uma desvantagem verdadeiramente injustificada para a Recorrente, na medida em que lhe veda o direito a optar pela aplicação do regime normal.
TERMOS EM QUE,
Deve o presente recurso interposto da douta sentença recorrida ser julgado procedente, com as legais consequências.
Só assim se decidindo
SERÁ CUMPRIDO O DIREITO E FEITA JUSTIÇA.”
Não houve contra-alegações e a EPGA emitiu a fls. 135/136 douto parecer no sentido de que se verifica a prescrição sendo, pois, inútil o conhecimento das demais questões suscitadas no presente recurso.
Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.
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2. - FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - DE FACTO:
Na sentença recorrida consignou-se a seguinte matéria de facto provada, não provada e respectiva motivação:
1) Em 09/01/09, a Impugnante apresentou junto da 2a Repartição de Finanças de Loures, Odivelas, a declaração de início de actividade em sede Imposto Sobre o Valor Acrescentado (fl. 8 e 9 do processo de reclamação apenso aos autos);
2) No documento referido no n° anterior a Impugnante declarou que iniciava como actividade principal "ourivesaria" com o CAE (código das actividades económicas) 620940, constante na tabela anexa ao Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (fl. 8 do apenso);
3) No documento referido em 1 declarou que iniciava a actividade, referida no n° anterior, a partir de 16/01/1990, não efectuava importações, teria como volume de negócios o valor de € 2.493,99, (500 contos). O volume total de compras e total de mercadorias, teria, para cada um, o valor de €3.491,59 (700 contos), (fl. 8 do apenso);
4) No documento referido em 1, declarou ainda que no exercício da actividade efectuaria transmissões de bens e/ou prestações de serviços, com direito à dedução e que não tinha contabilidade organizada (fl. 8 verso do apenso);
5) A Impugnante apresentou declarações periódicas Mod. B, referentes aos períodos de 01/01/93 a 31/03/093, 01/04/93 a 30/06/93, 01/07/93 a 30/09/93 e 01/10/93 a 31/12/93 (fl. 10 a 13 do apenso);
6) Nas declarações referidas no ponto anterior, a Impugnante quantificou imposto a favor do estado e a seu favor, (fl. 10 a 13 do apenso);
7) Face à factualidade descrita no ponto anterior, a Impugnante quantificou a seu favor os valores de 1.400$00, 161.738$00, 80.371$00 e 31.880$00, referentes ao período de 01/01/93 a 31/03/093, 01/04/93 a 30/06/93, 01/07/93 a 30/09/93 e 01/10/93 a 31/12/93, respectivamente (fl. 10 a 15 e 20 a 23 do apenso);
8) Em 25/01/95 a Impugnante apresentou junto do serviço de finanças referido em 1, a declaração de alteração de dados, para efeito de Imposto Sobre o Valor Acrescentado, segundo a qual, durante o ano de 1994 atingiria um volume de negócios no valor de 7.336. Contos, €36.591,81, o volume de compras no valor de 6.842 contos €34.127,75 e ficava enquadrada no regime especial de pequenos retalhistas (fl. 14 do apenso);
9) Em 17/05/95 a Impugnante apresentou junto do serviço de finanças referido em 1, a declaração de alteração de dados, para efeito de Imposto Sobre o Valor Acrescentado, segundo a qual, a partir de 01/07/95 ficava enquadrada, para efeito do imposto, no regime normal trimestral (fl. 15 do apenso);
10) No cadastro do Imposto Sobre o Valor Acrescentado, para efeito de enquadramento da actividade exercida pela Impugnante resulta que:
-Em 01/01/90 se encontrava no regime isento - R.E.l. 53, (regime de isenção do art° 53°);
-Em 01/02/95 no regime não isento - de R.E.P.R., (regime de pequenos retalhistas);
-A partir de 01/07/95 se encontra enquadrada no regime não isento - regime normal trimestral (fl. 30 do apenso).
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Ao abrigo do artº 712º nº 1 do CPC aditam-se os seguintes factos com relevância para apreciar e decidir a questão da prescrição:
11 – Em 02.02.1999 a contribuinte apresentou reclamação graciosa a que coube o nº3484-99/400026, que se encontra apensada a estes autos e que foi indeferida por despacho proferido em 29.10.2003 – cfr. fls. 58 do apenso.
12 – A presente impugnação foi deduzida em 20.11.2003 conforme carimbo aposto na 1ª pág. Da p.i..
23 – O tributo impugnado não foi pago, encontrando-se a ser exigido coercivamente no processo de execução fiscal nº 4227-00/111530,8 e apensos como decorre da informação prestada a fls. 40 do PAT e dos ofícios juntos de fls. 84/85 a 88.
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2.2. – DE Direito:

Atenta esta factualidade e aquelas conclusões que delimitam o objecto do recurso, vejamos agora a sorte deste em que a questão decidenda se desdobra nas seguintes vertentes, cuja apreciação e decisão prejudica todas as demais que de forma directa ou meramente argumentativa sejam suscitadas:
a) - A nulidade da sentença por omissão de pronúncia;
b) - A prescrição da dívida;
c) - O erro de julgamento;
Assim:

Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia

No fundamental, a omissão de pronúncia na decisão colhe-a a recorrente – vd. conclusões 1ª e 2ª - no argumento de que a prescrição da obrigação tributária constitui questão de natureza substantiva e de conhecimento oficioso em qualquer grau de jurisdição, até ao trânsito em julgado da decisão final sobre o objecto da causa pelo que, ao não conhecer da prescrição, a sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do n.° 1 do artigo 668° do CPC, aplicável ex vi da alínea e) do artigo do CPPT.
Sendo certo que o juiz deve conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido ao seu veredicto e cuja apreciação não tenha ficado prejudicada, bem como que só pode conhecer das questões que lhe tenham sido colocadas, com excepção das que sejam do conhecimento oficioso, sob pena, num como noutro caso, de a sentença ficar ferida de nulidade (cfr., para além do já referido art. 125.º do CPPT, os arts. 660.º, n.º 2, e 668, n.º 1, alínea d), do CPC).
A omissão de pronúncia, verifica-se apenas em relação a questões e não em relação a argumentos ou razões invocadas: - as “questões” não se confundem com os “argumentos” ou “razões” pois o tribunal, devendo embora «resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação» e não podendo «ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras» (art. 660.º, n.º 2, do CPC), não está vinculado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes, do mesmo modo que não está impedido de, na decisão, usar considerandos por elas não produzidos.
Regressando ao caso sub judice, é inquestionável que na sentença recorrida a Mª Juíza não se pronunciou sobre a questão suscitadas nos autos apenas em sede de recurso, apesar de a ter suscitado no despacho de fls. 79, em que entendeu reabrir a instrução nos termos do artº 13º do CPPT.
Ora, como se disse, a nulidade de omissão de pronúncia ocorre apenas quando se verifica violação do dever processual que o tribunal tem em relação às partes, de se pronunciar sobre todas as questões por elas suscitadas.
Todavia, embora o tribunal tenha também o dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (parte final do n.° 2 do artigo 660.° do CPC), a omissão de tal dever não constituirá nulidade, mas sim erro de julgamento.
Nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso significará que o tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa ou a mesma não procedia.
Ora, se esta posição for errada haverá um erro de julgamento e, se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão.
Na esteira ainda de Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 2006, e no Acórdão do STA de 2003.05.28, proferido no recurso n.° 1757/02, disponível no sítio da internet www.dgsi.pt, nem seria razoável que se impusesse ao tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia e que não se afiguram como controvertíveis no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias do conhecimento oficioso (arts. 494.° e 495.° do CPC), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no art. 133.° do CPA".1
Destarte, mesmo que se verificasse a prescrição da dívida exequenda, a omissão de pronúncia sobre tal questão nunca consubstanciaria nulidade da sentença, mas, tão-somente, erro de julgamento.
Improcede, pois, esse fundamento de recurso.
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Da prescrição da dívida
Vejamos, então, se se verifica o aventado erro de julgamento sobre a questão da prescrição, que é de conhecimento oficioso por força do disposto no artº 175º do CPPT.
Afirma a recorrente (conclusões 3ª a 7ª) que neste momento já se mostra prescrita a dívida de IVA e juros de 1993 face ao disposto no art. 34 do CPT, importando, após fixação dos factos atinentes, declarar a prescrição da obrigação tributária, questão de conhecimento oficioso, como pressuposto da decisão sobre a não manutenção de utilidade no prosseguimento da lide, a implicar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide de harmonia com o disposto no artigo 287° alínea e) do CPC, assim se devendo dar provimento ao recurso jurisdicional, referente àquela dívida.
O Dec.-Lei n° 398/98 de 17 de Dezembro, que veio aprovar a nova Lei Geral Tributária, estipula no n° 2 do seu art° 5° que "Aos impostos já abolidos à data da entrada em vigor da lei geral tributária (1/1/1999) aplicam-se os novos prazos de prescrição, contando-se para o efeito todo o tempo decorrido, independentemente de suspensões ou interrupções de prazo".
Por sua vez o art.° 48° da citada Lei Geral Tributária, consagra que as dívidas tributárias prescrevem no prazo de oito anos contados, "nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu."
No caso em apreço, uma vez que o imposto em causa não foi abolido e não se mostra paga a dívida a ele inerente, da conjugação dos dois preceitos com a data do facto tributário, prima facie, poderemos estar face a uma obrigação tributária prescrita.
Porém, à partida, não poderá dizer-se que a prescrição não pode ser atendida em sede de impugnação, por aqui se discutirem as ilegalidades inerentes à liquidação e, no caso, o instituto da prescrição nada ter a ver com a liquidação, pois que se situa para além dela.
Com efeito, constituindo a prescrição uma excepção peremptória, em que o facto relevante (decurso de determinado prazo) dá origem à extinção do efeito jurídico inicialmente pretendido (cumprimento da obrigação tributária), nada obsta a que possa ser invocada em impugnação, atacando não o acto formal de liquidação mas a obrigação tributária, independentemente de esta ter dado azo ou não a uma liquidação.
Este é, aliás, o entendimento perfilhado no douto Ac. do S.T.A. de 22-10-97 (recurso n°21.813) onde expressamente se refere: "O facto da lei evidenciar a prescrição como fundamento de oposição falando de «prescrição da dívida exequenda», não quer dizer que a prescrição releve apenas em relação a uma obrigação tributária liquidada..."
(…)
"Mas isso não quer dizer que a causa de extinção por prescrição não possa situar-se em momento anterior ao do acto da liquidação... e, como tal, não possa ser invocada, em outros campos como em sede de impugnação judicial...como fundamento de ilegalidade da dívida cujo cumprimento então se exija e cuja legalidade se queira, então, controverter".
Ora, sendo efectivamente possível a apreciação da prescrição da obrigação tributária em sede de impugnação, vejamos como ela se concretiza no caso em apreço.
A ratio do instituto da prescrição liga-se a razões de certeza, de segurança e de paz jurídica, pela qual se extingue a obrigação tributária.
Nos autos está em causa (atendendo ao objecto do recurso) obrigação proveniente de IVA do ano de 1993, pelo que se nos impõe determinar qual o regime legal aplicável, visto que desde essa data até hoje se sucederam dois regimes diversos e que se elencam:
· o do art. 34.° do CPT, cuja vigência se manteve no período compreendido entre l de Julho de 1991 e l de Janeiro de 1999, data em que entrou em vigor a Lei Geral Tributária (LGT), cujo diploma de aprovação, o DL n.° 398/98, de 17 de Dezembro, revogou expressamente aquele preceito (cfr. arts. 2°, n° l, e 6° do referido DL);
· o dos arts. 48° e 49° da LGT, desde l de Janeiro de 1999 até à presente data.
No diploma legal que aprovou o CPT não encontramos norma correspondente à do art. 5°, nº1, do referido DL nº398/98, de 17 de Dezembro, e que preceitua que ao novo prazo de prescrição estabelecido na LGT se aplica o disposto no art. 297° do CC, mas a jurisprudência passou a perfilhar o entendimento uniforme de que era aplicável, quanto à sucessão de leis relativamente ao art. 34° do CPT, a solução que veio a ser consagrada naquela norma de direito transitório.
Dada a flagrante equiparação das obrigações fiscais às civis, impõe-se a observância das regras do art. 297 do CC na área do direito fiscal e, concretamente, na zona da prescrição das dívidas(1).
Na verdade, é forçoso concluir que o regime prescricional aplicável à situação sub judice é o do art. 34° do CPT, tanto mais que, por força do princípio geral de Direito em matéria de sucessão de leis, segundo o qual a lei que estabelecer, para qualquer efeito um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar.
Vale isto por dizer que, em atenção ao caso concreto, no regime do CPT, o prazo conta-se com início do ano seguinte ao do facto tributário.
Nesse sentido, importa então ter em conta os seguintes factos:
a) A dívida impugnada reporta-se ao ano de 1993.
b) A impugnante não efectuou o pagamento voluntário, pelo que foi instaurado processo executivo para cobrança da dívida do IVA de 1993, desconhecendo-se se a execução ficou suspensa dado que foi deduzida reclamação graciosa e, posteriormente, impugnação judicial.
Como se demonstrou, dado que as dívidas se reportam ao ano de 1993, é aplicável em matéria de prescrição o disposto no artº 34º, nº 1 do CPT, que estabelece que o prazo de prescrição é de dez anos. Este prazo, de acordo com o artº 34º, nº 2 do mesmo diploma, conta-se a partir do termo daquele em que se verificar o facto tributário.
Há que ter ainda em atenção que a dedução de reclamação e de impugnação interrompe a prescrição cessando, porém, esse efeito se o processo estiver parado por facto não imputável ao contribuinte durante mais de um ano, somando-se nesse caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
Vínhamos entendendo que "a lei não quer interrupções sucessivas da prescrição (...)" (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul - Secção de Contencioso Tributário, Processo nº6861/02, de 08 de Outubro de 2002). Assim, e ainda que se tenha verificado, em data posterior à instauração do processo de execução, uma qualquer circunstância determinante da interrupção do prazo de prescrição, a mesma não teria qualquer repercussão sobre o presente processo, pois esse efeito - interrupção -verificava-se, e consumava-se, em termos definitivos, aquando da instauração do primeiro dos processos (reclamação, execução ou impugnação judicial).
Sobreveio, entretanto, o Acórdão do Peno da Secção do CT do STA de 24/10/2007, tirado no Recurso nº 244/07 que resolveu a reconhecida oposição de acórdãos radicada, em, no domínio da mesma legislação, terem entendido, um, que havendo duas causas interruptivas da prescrição, é de considerar a primeira, e só a primeira; outro que, pelo contrário, se deve desprezar a primeira e atender à segunda.
Sobre essa matéria foi fixada a seguinte posição doutrinária:
I -Sucedendo-se no tempo vários dos factos elencados no artigo 34º nº 3 do Código de Processo Tributário como interruptivos da prescrição, não pode atender-se apenas ao segundo, ignorando o primeiro, como seria o caso de, deduzida reclamação graciosa após a instauração de execução fiscal, se considerar interrompido o prazo só a partir da dedução daquela.
II -Achando-se interrompido o prazo prescricional, pela ocorrência de algum daqueles factos, a posterior eclosão de outro, embora em abstracto capaz de interromper o prazo, é inócua, pela impossibilidade de interromper o que já está interrompido.
III -Porém, se, após a cessação do efeito interruptivo, ocorrer nova causa de interrupção da prescrição, não pode deixar de se lhe atribuir esse efeito.
À semelhança do que aconteceu no caso posto à apreciação daquele Venerando Tribunal Supremo, no caso dos presentes autos a instauração da execução fiscal tendo por objecto a cobrança coerciva da dívida proveniente de IVA de 1993, e/ou a reclamação e a própria impugnação, seguindo o doutrinado naquela aresto do STA deveriam ser também consideradas na eficácia interruptiva que a lei lhe outorga.
Pelo que ficou dito, os autos não contêm elementos que, com base apenas na reclamação e/ou impugnação, facultem o seu conhecimento e, por isso, não se conhece da referida questão da prescrição, sem prejuízo de a mesma poder/dever ser suscitada junto da execução fiscal para ser apreciada pela AT com base em todos os pertinentes elementos de que disponha.
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Do erro de julgamento:
Sustentou inicialmente a impugnante – posição que agora em sede de recurso reitera – que liquidou e deduziu o Imposto Sobre o Valor Acrescentado porque verificou que no início de 1993 tinha ultrapassado os limites legais previstos para beneficiar de isenção, sendo por isso que liquidou e deduziu o IVA que originou a liquidação controvertida.
Sucede que, quando apresentou a declaração de alterações, em 25/01/95, para um enquadramento a partir de 01/02/95, a Impugnante referiu que passava a estar enquadrada no regime especial de pequenos retalhistas a partir de 01/07/95 vindo, em 17/05/95, apresentar outra declaração de alterações com enquadramento em vigor a parte de 01/07/95, de acordo com a qual passaria a partir dessa data a estar enquadrada ao regime normal trimestral, para efeito de Imposto Sobre o Valor Acrescentado.
A ora recorrente pretende, então, que, inicialmente e perante o reduzido volume de actividade, havia ficado abrangida pelo regime de isenção de IVA previsto no artigo 53° do Código do IVA, logo no início de 1993 e constatando que aqueles limites de isenção fixados naquele preceito legal seriam ultrapassados, iniciou a entrega das declarações periódicas modelo B referentes à sua actividade, tendo procedido à liquidação de imposto e respectiva dedução, tudo nos termos da lei.
E, uma vez que sempre agiu como se de um sujeito passivo não isento se tratasse, a desconsideração da actuação material da ora Recorrente com fundamento na preterição de uma obrigação acessória resulta numa cominação legal desproporcionada, injusta e contrária a todos os princípios estruturantes e sistematizantes deste imposto - este mesmo sistema tributário que manda tributar os meros actos isolados.
Enfim, para a recorrente a liquidação em causa promove uma desvantagem verdadeiramente injustificada para a Recorrente, na medida em que lhe veda o direito a optar pela aplicação do regime normal.
Na tese perfilhada na sentença recorrida, a AT liquidou o imposto em crise porque a Impugnante durante o ano de 1993 liquidou e deduziu indevidamente o Imposto Sobre o Valor Acrescentado, à revelia do enquadramento legal previsto no art° 53° do CIVA, quando é certo que se os sujeitos passivos de Imposto Sobre o Valor Acrescentado liquidam indevidamente o imposto ficam desde logo obrigados a entregá-lo ao Estado, sem que possam deduzir o Imposto suportado a montante.
E como decorre do probatório que no período de 01/01/93 a 31/01/95, a Impugnante estava enquadrada no regime de isenção previsto no art° 53° do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado e liquidou o Imposto e não o podia deduzir, não colhe a tese da impugnante no sentido de que teve esse procedimento porque já tinha atingindo o volume de negócios que a afastavam do regime previsto no art° 53° do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado, até porque alega tal facto, mas não o prova, acrescendo que nem sequer apresentou a declaração de alterações a que estava obrigada comprovativa de tal pressuposto, como era seu ónus.
Não podemos deixar de concordar com a Mª Juíza.
Como ensina o Conselheiro JORGE LOPES DE SOUSA, em anotação ao artigo 136º do CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO, a pág. 611 e 612 da 2ª edição), “No caso do IVA os factos tributários não perduram no tempo nem se renovam pelo mero decurso do tempo, mas apenas, eventualmente, pela prática de novos factos tributários instantâneos que, ainda que se possam repetir, são considerados autonomamente para efeitos de tributação. A dívida de IVA surge e efectiva-se em conexão com a ocorrência dos actos ou factos isolados sobre que incide, não se renovando automaticamente pelo mero decurso do tempo.
Por outro lado, o IVA pode ser devido pela prática de um único acto tributável [art. 2.º, n.º 1, alínea a), 2.ª parte, do C.I.V.A.], tipo de situações em que será indefensável considerá-lo como um imposto de obrigação periódica. E, eventualmente, quando é praticada uma operação tributável, pode não ser detectável se é ou não o início de uma prática continuada.
Assim, o IVA caberá no conceito de imposto de obrigação única, pois só essa qualificação é adequada a todas as situações que podem surgir no âmbito de incidência deste imposto.
Para além disso, por aplicação do regime de apuramento do IVA, previsto nos artigos 19.º a 25.º do C.I.V.A., pode não resultar sequer uma dívida de imposto mas um crédito, no caso de os montantes que o sujeito passivo têm direito a deduzir superarem o imposto que liquidou no período e, mesmo nesse caso, continuam a existir os factos tributários que estão subjacentes ao IVA liquidado. Por isso, não se podem confundir os factos tributários (actos autónomos entre si) que geram a dívida de imposto com os momentos (que, em certos casos, pode ocorrer com periodicidade) da entrega do imposto liquidado.
E é das características dos factos tributários e não dos momentos da entrega do imposto, se for devido, que se tem de partir para a caracterização do imposto.”
Tendo presentes estas considerações, enfrentemos então a problemática trazida aos autos.
Decorre do artº 35º nº 1 do CIVA, que a factura ou documento equivalente, devem ser emitidos até ao quinto dia útil seguinte ao do momento em que o imposto é devido nos termos do artº 7º do mesmo compêndio legal.
Este último normativo estipula que nas transmissões de bens, o imposto é devido e exigível quando os bens são postos à disposição do adquirente.
E, quanto a saber se o bem foi posto à disposição, vale a guia de remessa, que é um documento que acompanha a mercadoria, facto que justifica a sua natureza de documento de transporte, logo, comprovante de que o bem foi posto efectivamente à disposição do adquirente naquela data, sendo o tributo devido e exigível nessa mesma data.
Todavia, o artº 8º do CIVA estabelece que quando haja uma transmissão de bens que dê lugar à obrigação de emitir factura ou documento equivalente, o imposto torna-se exigível na data da emissão (i. é, 5 dias úteis de harmonia com o nº 1 do artº 35º do mesmo Código).
Anote-se que o artº 8º do CIVA encontra a sua ratio na necessidade de controlo eficaz da contabilidade de modo que, revelando a mesma que houve transmissões de bens ou prestações de serviços que dava lugar à obrigação de emitir factura ou documento equivalente com observância do prazo estabelecido para a sua emissão, o imposto se tornava exigível no momento da própria emissão, sendo que se o prazo de emissão não for respeitado, o imposto se torna exigível no momento em que esse prazo terminar.
Como expendem F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes no seu CIVA Anotado e Comentado, 4ª ed., pág. 167, “A grande relevância que apresenta a factura ou documento equivalente na estrutura do IVA está bem patente no número dois do artigo em anotação (o 8º), na medida em que se sobrepõe ao próprio facto gerador do imposto – a transmissão ou prestação de serviços- desencadeando, assim, a sua exigibilidade, o mesmo sucedendo com o pagamento antecipado, total ou parcial, das referidas operações.
Tais situações são de primordial importância no mecanismo do imposto porquanto fazem nascer desde logo para o adquirente dos bens ou tomador dos serviços o direito à dedução, não tendo, por outro lado, o Estado de aguardar para o recebimento do IVA a verificação do facto tributário”.
Assim sendo e em conclusão geral e definitiva, o pagamento pelo cliente do valor da factura ou documento equivalente, não tem nenhuma interferência na determinação dos prazos de entrega do IVA pelo transmitente dos bens ou pelo prestador de serviços, sendo os mesmos determinados a partir da data da emissão da factura ou documento equivalente, a qual, nos termos do artº 35º nº 1 do CIVA, ocorrerá o mais tardar no quinto dia útil seguinte ao do momento em que o imposto é devido, pelo que, o imposto liquidado pelo transmitente de bens ou fornecedor de serviços, ainda que não recebido dos clientes, terá de ser entregue nos cofres do Estado.
Por outro lado, como bem se refere na sentença recorrida, em sede de Imposto Sobre o Valor Acrescentado o contribuinte está obrigado a determinadas obrigações declarativas, que determinam o seu enquadramento para efeito de liquidação e dedução para efeito de imposto.
Nesse sentido, releva para o caso dos autos o regime ínsito no art° 28° do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado, por força do qual, para além do pagamento do imposto, os sujeitos passivos referido na al. a) do n° 1 do art° 2° são obrigados a entregar, segundo as modalidades e formas prescritas na lei, uma declaração de início, de alteração ou cessação de actividade, obrigações declarativas igualmente referidas nos art°s 30º e 31º do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado.
Assim, no sistema do IVA, é obrigação essencial do sujeito passivo, o envio, mensalmente, da declaração relativa às operações efectuadas no exercício da sua actividade no decurso do mês precedente, com a indicação do imposto devido ou do crédito de imposto existente, com a indicação dos elementos que serviram de base ao respectivo cálculo.
E, por força do disposto no art° 31° do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado o contribuinte está também obrigado a entregar na repartição de finanças competente, no prazo de 15 dias, a declaração de alterações, a contar da data de alteração de qualquer dos elementos declarados anteriormente.
Tendo em conta os contornos da situação sub judice que ficaram supra desenhados, a impugnante estava obrigada a entregar uma declaração de alteração do regime de enquadramento em sede de Imposto Sobre o Valor Acrescentado, para poder liquidar e deduzir o imposto de acordo copm as normas constantes dos art° 19° e seguintes do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado.
E, em particular, deveria ter em conta a determinação estatuída no art° 53° n° 1 do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado, na redacção aplicável do Dec. Lei n° 233/91 de 26/01, no sentido de que só "beneficiam da isenção de imposto os sujeitos passivos que, não possuindo nem sendo obrigados a possuir contabilidade organizada para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares ou Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas nem praticando operações de importação, exportação ou actividades conexas, não tenham atingindo, no ano civil anterior, um volume de negócios superior a 1.200.000$00" (€5.985,57).
E o nº esse inciso legal, explicitava que, "não obstante o disposto no n° anterior, serão ainda isentos do imposto os sujeitos passivos com um volume de negócios superior a 1.200.000$0 (€5.985,57), mas inferior a 1.700.000$00 (8.479,56), que, se tributados preencheriam as condições de inclusão no regime dos pequenos retalhistas".
Evocando Clotilde Celorico de Palma In Estudos de Imposto sobre o Valor Acrescentado, Almedina, pag. 84 e 85 como, com pertinácia, o fez a sentença recorrida, "As isenções de Imposto Sobre o Valor Acrescentado têm uma alógica diferente das isenções concedidas no âmbito dos impostos sobre o rendimento. Ao passo que nestes impostos a isenção libera o beneficiário do pagamento do imposto, no Imposto Sobre o Valor Acrescentado as situações de isenção clássica traduzem-se na não liquidação de imposto nas operações activas por parte do sujeito passivo beneficiário (o beneficiário paga o imposto mas não o liquida). Isto é, nas suas operações passivas (aquisições de bens e prestações de serviços) os sujeitos passivos de Imposto Sobre o Valor Acrescentado não beneficiam de isenção" (...) "no IVA temos duas modalidades de isenções atendendo à possibilidade do direito à dedução: a)isenções completas, totais, plenas, ou que conferem o direito à edução do Imposto Sobre o Valor Acrescentado suportado. Nestas isenções o sujeito passivo beneficiário nãos liquida imposto nas suas operações activas (transmissões de bens ou prestações de serviços efectuadas), e tem direito a deduzir o IVA suportado para a respectiva realização" (...) b) Isenções incompletas, simples, parciais, ou que não conferem o direito à dedução do IVA suportado. Nestas isenções o sujeito passivo beneficiário não liquida imposto nas suas operações activas, mas não tem o direito a deduzir o IVA suportado para a respectiva realização. É o caso de todas as isenções do art° 9° e da isenção prevista no art° 53° do CI VA ".
Como já se demonstrou, o enquadramento para efeito de sujeição ou isenção em termos de Imposto Sobre o Valor Acrescentado, é a pedra de toque para o funcionamento de todo o sistema do IVA que é um imposto formal.
Na verdade, a determinação da parcela do imposto que cumpre entregar ao Estado assenta basicamente no mecanismo das deduções através do chamado método subtractivo indirecto - indirecto porque não implica a determinação do efectivo valor acrescentado do bem em todas e cada uma das fases do circuito económico, e subtractivo porque, não sendo cumulativo, ao imposto das vendas é subtraído o imposto das aquisições - pelo que não é demais realçar a enorme importância que as deduções têm no apuramento do imposto, pelos efeitos compensatórios entre o direito de crédito de que o sujeito passivo é titular pelo IVA suportado nas operações a montante, e a dívida tributária pelas operações efectivadas a jusante.
É o carácter decisivo das operações de dedução na mecânica do apuramento do imposto que explica os termos rigorosos postos pelo legislador na definição do conceito, do campo de aplicação, dos métodos de dedução parcial, do cálculo provisório e definitivo do "pró -rata" e da regularização das deduções, a par das obrigações de facturação e de evidenciação contabilística das operações.
É assim que se explica que nos termos do art° 28° n° l g) CIVA os sujeitos que face à lei comercial e fiscal estão obrigados a dispor de contabilidade organizada, devem observar, ainda, certas obrigações em ordem a obter segurança e clareza no registo das operações decorrentes da aplicação do Código do IVA, cfr. art°s. 44° a 52° CIVA - vd. A. Borges, A. Rodrigues e R. Rodrigues in "Elementos de Contabilidade Geral". Rei dos Livros, págs. 274 e sgts.; C. Baptista da Costa e G. Correia Alves, in "Contabilidade Financeira", Rei dos Livros, págs. 703 e sgts.
Donde que, como assertivamente afirma a Mª Juíza «a quo», são os sujeitos passivos de Imposto Sobre o Valor Acrescentado que declaram o seu enquadramento para efeitos fiscais, nomeadamente quanto à obrigatoriedade de liquidar e deduzir ou não o Imposto Sobre o Valor Acrescentado, sem prejuízo de a administração tributária fiscalizar se estão verificados os pressupostos legais de que o sujeito passivo se arroga.
E não subsistem dúvidas de que a Administração tributária baseou a liquidação do IVA impugnado no facto de a Impugnante durante o ano de 1993 ter liquidado e deduzido indevidamente o Imposto Sobre o Valor Acrescentado, postergando o enquadramento legal imperativo do art° 53° do CIVA.
É que, como supra e ex abundantis se demonstrou, os sujeitos passivos de IVA, mesmo que indevidamente liquidem o imposto, estão obrigados a entregá-lo ao Estado sem que possam deduzir o Imposto suportado a montante.
E o que os autos revelam com absoluta segurança foi que no período de 01/01/93 a 31/01/95, a Impugnante estava enquadrada no regime de isenção previsto no art° 53° do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado e liquidou o IVA que não podia deduzir, irrelevando para o efeito o facto de já ter atingindo o volume de negócios que a afastavam do regime estabelecido no art° 53° do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado.
E, como enfatiza a Mª Juíza, embora alegue tal facto, não o prova nem apresentou a declaração de alterações a que estava obrigada, se se verificasse tal pressuposto, como também era seu ónus.
A essa luz, porque não respeita os ditames legais, não pode afirmar-se, como o faz a recorrente, que a desconsideração da sua actuação material com fundamento na preterição de uma obrigação acessória resulta numa cominação legal desproporcionada, injusta e contrária a todos os princípios estruturantes e sistematizantes deste imposto - este mesmo sistema tributário que manda tributar os meros actos isolados, não promovendo a liquidação a que a ora Recorrente foi sujeita uma desvantagem verdadeiramente injustificada para a Recorrente, na medida em que lhe veda o direito a optar pela aplicação do regime normal porque resulta claramente dos autos que não exerceu essa opção correctamente.
Porque nenhuma censura nos merece a interpretação operada na sentença dos citados preceitos face ao que se provou, tem-se por inverificado o vício de violação primária de lei substantiva por erro de julgamento que vem assacado à sentença a qual deve manter-se na ordem jurídica.
Improcede, por isso, o fundamento em análise.
*

3. - DECISÃO

Termos em que acordam os juízes deste tribunal em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.
Custas pela recorrente com 5 Ucs de taxa de justiça.
*
Lisboa, 12/01/2010
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Aníbal Ferraz)



1 - Como bem refere Oliveira Coutinho, na anotação a paginas 277 do Cód. Proc. das Contrib. e Impostos, editado por Jornal do Fundão, em 1969, a interrupção consagrada no n°. 1 do art. 34°. do Cód. Proc. Tributário já tinha o mesmo regime no CPCI, no art. 27°., onde era pacificamente entendido e interpretado como se de suspensão se tratasse.
Oliveira Coutinho, é claro ao afirmar que o legislador deveria ter usado o termo de "suspensão" e não interrupção, pois é de suspensão que se trata, com regime especial, e com o prazo máximo de um ano.
Chama-se ainda à colação o Conselheiro Dr. Alfredo José de Sousa, no Cód. Proc. das Contribuições e Impostos, Editado por Almedina, 2a. Edição, Coimbra, a pág, 147 em anotação ao art. 27°, dizendo que é peremptório em manter a interpretação de que a figura é de suspensão e não de interrupção.
Em termos jurisprudenciais parece ser esta também a jurisprudência do S.T.A., conforme Acórdão proferido no processo n° 15.804, publicado em Apêndice ao D. R. de 30-04-96, citado por Diogo Leite de Campos e Benjamim Rodrigues, Lei Geral Tributária, Vislis Editores, em anotação ao art. 49º da LGT.
Tudo isso para concluir que não pode haver dúvidas de interpretação de que o prazo da prescrição pode ser suspenso, pelo prazo máximo de um ano, traduzindo-se na prática o prazo de 10 em 11 anos, quando ocorra um dos factos suspensivos, que, no caso concreto, foi a instauração de processo de execução.
Na verdade, doutrinalmente, a interrupção da prescrição supõe uma causa que inutiliza o tempo decorrido anteriormente; produz-se quando dadas certas circunstâncias se inutiliza o tempo decorrido para a prescrição, tendo como efeito inutilizar todo o tempo anterior, podendo, todavia, iniciar-se uma nova prescrição – cfr. Vaz Serra, Prescrição e Caducidade, 58 e M. Brito, CC Anot., 1º-410).
Já a suspensão da prescrição supõe que existe uma causa que obsta ao curso da prescrição. Havendo suspensão, a prescrição corre enquanto ela não cessar, mas, cessada a causa da suspensão, volta a correr, somando-se ao tempo ulterior o que decorrera antes da suspensão –idem.
E o regime dos citados normativos é claramente de suspensão:- a paragem dos processos aí referidos tem o efeito de suster a contagem do tempo da prescrição, não se incluindo no prazo desta o espaço de tempo durante o qual ocorreu a suspensão. O vencimento do prazo é, assim, prorrogado pelo tempo em que a prescrição esteve suspensa.