Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1528/07.7BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:05/13/2021
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:IRC
ESPECIALIZAÇÃO DOS EXERCÍCIOS
CUSTOS 23.º DO CIRC
REDUÇÃO DE TAXA RAA
Sumário:I-O princípio da especialização dos exercícios encontra-se consagrado no artigo 18.º do CIRC e tem uma densidade vinculativa elevada, não tolerando, fora dos casos expressamente consignados na lei, qualquer margem de manobra do contribuinte na afetação temporal dos movimentos económico-financeiros da empresa, devendo, no entanto, ser sopesado com os demais princípios constitucionais basilares, mormente, da justiça.
II-Numa situação em que não é colocada em causa a efetividade dos custos e a sua documentabilidade, e já não é possível fazer-se a correção simétrica, por razões de tempestividade, então a AT deve abster-se de tributar, ressalvadas, claro, as situações em que tenha existido uma intenção deliberada de transferência de custos com o intuito de lesar o Estado.
III-Não resultando do acervo fático dos autos, por um lado, que ocorreu uma transferência de resultados com um intuito fraudulento, e por outro lado, que está inviabilizada a alocação desse custo ao exercício correspondente, ter-se-á, de propugnar pela anulação da correção.
IV-A mera junção de um contrato de prestação de serviços, celebrado inclusive, em data ulterior à emissão de algumas faturas em contenda, e do qual se retira que o prestador não tem qualquer elo de vinculação à sociedade e bem assim que os serviços são prestados de forma totalmente independente e autónoma, e mediante uma contrapartida monetária, inexistindo, outrossim, qualquer elemento que permita identificar a que título e com que intuito as viagens foram realizadas, por forma a estabelecer-se o inerente nexo com a empresa e o seu escopo societário, então, ter-se-á de concluir que os custos não podem ser dedutíveis fiscalmente ao abrigo do artigo 23.º do CIRC.
V-A redução de 30% na taxa nacional do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, prevista no artigo 5º, nºs 2, alíneas a) e b) e 3 do Decreto Legislativo Regional nº 22/99/A de 20/1, só é concedida quando o contribuinte tiver a sede ou direção efetiva da sua empresa nos Açores e ali exerça a sua atividade.
VI-In casu, constatando-se que a Recorrente, apesar de estar sediada nos Açores, desenvolveu a sua atividade em cerca de 98,52% no Continente, a taxa de imposto aplicável tem de ser distribuída proporcionalmente de acordo com o disposto no n.º 3 do artigo 5.º do Decreto Legislativo Regional nº 2/99-A, não tendo, por conseguinte, direito à redução de 30% da taxa de IRC relativamente ao volume de negócios realizados no Continente.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
I-RELATÓRIO

C....., SA (doravante Recorrente), com os demais sinais nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o ato de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC), referente ao exercício de 2002, e respetivos juros compensatórios, no valor global de €73.719,75.


***

A Recorrente veio apresentar as suas alegações, formulando as conclusões que infra se reproduzem:

“1. A Recorrente contabilizou em 2002 facturas de 2001, que foram recebidas após o fecho de contas em 15 de Janeiro de 2001, o que tem sucedido desde a transformação em sociedade anónima, criando uma compensação entre os valores considerados como custo em anos diferentes, tendo já suportado em 2001 a diferença de imposto que pretende agora adicionar à sua matéria colectável, sucedendo o mesmo de 2002 face a 2003;

2. A correcção efectuada pela DDF enferma de violação de lei, por não se conformar com o princípio da justiça com dignidade constitucional e legal (artigo 55.º da LGT e artigo 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (“CRP”)), visto que a correcção não teve por objecto o interesse público, uma vez que o Estado não ficou prejudicado com a actuação da Recorrente, nem está em causa a obtenção de um imposto devido, apenas a Recorrente tem sido prejudicada pela não contabilização de todos os custos do respectivo exercício;

3. Aliás, não foi efectuada qualquer omissão voluntária e intencional com vista a operar a transferência de resultados entre exercícios;

4. A actuação da Recorrente tem demonstrado ser-lhe prejudicial em longo prazo, conforme se pode atestar pelo quadro, junto como doc. 4 na petição inicial de impugnação judicial, que demonstra peremptoriamente todos os custos diferidos de um exercício para outro, desde 1997 a 2006, nunca tendo o Estado sido prejudicado;

5. A Recorrente aplicou o princípio contabilístico da consistência em conjugação com o princípio da especialização dos exercícios, embora considerasse como fecho de contas a data de 15 de Janeiro do ano seguinte, para recepção e contabilização da documentação;

6. Deve ter-se em consideração, na aplicação ao caso concreto dos princípios da verdade material, igualdade tributária e capacidade contributiva, de forma a assegurar a adequada justiça fiscal, visto que nunca qualquer pagamento de IRC ficou em causa, apenas o momento do seu cálculo;

7. No mesmo sentido pode ler-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do processo n.º 0291/08, de 25 de Julho de 2008, do qual resulta a conclusão que, no caso em apreço, afigura-se efectivamente irrelevante o ano em que o imposto é deduzido, uma vez que o impacto é sempre similar no sentido da dedução daquele custo ao imposto a ser pago (de taxa fixa no caso do IRC), ou podendo dar lugar a um acumular de prejuízos fiscais a deduzir futuramente.

8. Aliás, conforme decorre ainda deste Acórdão do STA, as deduções em causa deverão ser aceites por não terem resultado de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar transferência de resultados entre exercícios, por exemplo: quando está para acabar ou, para se iniciar um período de isenção, quando há interesse em reduzir os prejuízos de determinado exercício, para retirar benefícios do seu reporte e quando se pretende reduzir o montante dos lucros tributáveis para reduzir o IRC, no caso concreto.

9. Nunca se verifica qualquer prejuízo para a Administração Tributária, uma vez que ao deduzir um custo no ano seguinte àquele em que o deveria ter deduzido, não diminuiu o montante do imposto correspondente no ano em que tal diminuição deveria ter ocorrido, só tal correndo no ano seguinte e, paralelamente, a Administração Tributária não tem qualquer prejuízo, pois recebera no ano anterior o imposto sem que fosse tido em conta esse custo que o deveria diminuir.

10. A manter-se a correcção considerada pelos Serviços de Inspecção Tributária, nos termos supra, isso conduz efectivamente a uma dupla tributação (em sentido não técnico), uma vez que, embora não se trate da tributação do mesmo facto tributário pelo mesmo imposto por duas vezes, tal prática conduz a que a Recorrente seja tributada em dois anos distintos em IRC sem que sejam considerados os custos apresentados, devidamente comprovados e sem correcções.

11. A Recorrente admitiu as correcções mencionadas nas secções 7.2 a 7.6 do Relatório, excepto no que à prestação de serviços do Exmo. Sr. M..... diz respeito, os quais se encontram devidamente comprovadas pelo respectivo contrato realizado em 2002, nos termos do artigo 23.º, n.º 1, alínea d), do CIRC;

12. O entendimento da DDF do artigo 5.º número 2 alínea a) do Decreto Legislativo Regional não tem qualquer apoio na letra da lei nem tão pouco se conforma com os cânones de interpretação jurídica consagrados no artigo 9.º do Código Civil aplicáveis por remissão do artigo 11.º da LGT;

13. Este entendimento (da DDF), se porventura fosse adoptado teria a consequência de permitir que uma disposição prevista num Decreto Legislativo Regional derrogasse o disposto numa Lei da República, ao arrepio de princípios consagrados na Constituição da República Portuguesa;

14. O facto de a Recorrente ter a sua sede na Região Autónoma dos Açores é, por si só, e de acordo com o citado artigo 5.º número 2 alínea a) do Decreto Legislativo Regional, suficiente para que a redução da taxa de IRC nacional consagrada no Decreto Legislativo Regional seja aplicada, sendo essa a intenção inequívoca do legislador nacional e regional;

15. A distinção, prevista quer na Lei de Finanças das Regiões Autónomas e no Decreto Legislativo Regional”, entre “residentes” e “não residentes” corresponde ao critério da localização da sede ou direcção efectiva, que consta do Código do IRC e da Convenção Modelo;

16. O critério de localização deve assim ser aferido de acordo com a lei, considerando a sua sede ou direcção efectiva de acordo com o devidamente estatuído no seu contrato de sociedade, sendo que a sede social de uma sociedade se determina pela dos seus órgãos, sendo na Região Autónoma dos Açores que reuniam o Conselho de Administração e a Assembleia Geral da Recorrente.

17. Não poderá assim considerar-se como outra a localização da Recorrente, considerando as regras da interpretação da lei fiscal, nos termos do artigo 11.º da LGT.

18. Realçando ainda que a actividade da Recorrente é de venda por correio e à distância de objectos de arte e decoração estando, por consequência, ligada à realização da sua actividade por todo o território nacional.

19. As importâncias de IRC pagas são efectivamente receita da Região Autónoma dos Açores, pelo facto de a sede social da Recorrente estar localizada em Ponta Delgada, independentemente da percentagem de lucro tributável “obtido” na Região e fora dela, e isto exclusivamente por força da aplicação do critério legal da localização da sede.

Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, e, em consequência, ser determinada a anulação do correspondente acto de liquidação e do acto de compensação, em apreço, com base na sua ilegalidade e inconstitucionalidade, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”


***

A Recorrida, devidamente notificada para o efeito, optou por não apresentar contra-alegações.

***

O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

***

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

***

II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

Com relevância para a decisão da presente impugnação, consideram-se provados os seguintes factos:

A. A Impugnante, “C....., S.A.”, é uma sociedade anónima, que tem como objeto social a comercialização de uma diversidade de coleções de objetos de arte, alguns deles manufaturados em metais preciosos, a que corresponde o CAE 52610 (cfr. fls. 64 do PAT – facto não controvertido);

B. No exercício de 2002, a Impugnante tinha a sede social na Região Autónoma dos Açores, localizada em Ponta Delgada, estando enquadrada, para efeitos de IRC, no regime geral e, em sede de IVA, no regime normal com periodicidade mensal (cfr. fls. 65 do PAT – facto não controvertido);

C. No exercício de 2002, a atividade da Impugnante foi desenvolvida, em cerca de 98,52%, no Continente, e em 1,48% nos Açores (cfr. fls. 77 do PAT – facto não controvertido);

D. A Impugnante foi objeto de uma ação inspetiva, credenciada pela Ordem de Serviço n.º OI2006003538, de âmbito geral, com incidência no exercício de 2002 (cfr. fls. 64 do PAT);

E. Em 15/12/2006, a Impugnante foi notificada do projeto de relatório de inspeção tributária elaborado na sequência da ação inspetiva mencionada na alínea D), para exercer, querendo, no prazo de 10 dias, o direito de audição prévia, nos termos dos artigos 60.º da LGT e 60.º do RCPIT (cfr. “Mandado” e “Certidão de Notificação” constantes de fls. 131 a 133 do PAT, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);

F. Em 27/12/2006, deu entrada, na Direção de Finanças de Lisboa, requerimento através do qual a impugnante exerceu o respetivo direito de audição prévia (cfr. Doc. constante de fls. 83 a 85 do PAT, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);

G. No âmbito do referido procedimento inspetivo, foi elaborado relatório final de inspeção tributária, sobre o qual recaiu Despacho de concordância da Chefe de Divisão dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, e de cujo teor se retira o seguinte:

3- Tributação peta taxa da Região Autónoma dos Açores versus tributação pelo regime geral

O sp em 2002 tinha a sede social na Região Autónoma dos Açores» em Ponta Delgada, tendo por esta razão sido tributado em sede de IRC, à taxa em vigor nos Açores.

Nos exercícios de 1999 e 2000, os Serviços de Finanças de Ponta Delgada corrigiram a taxa de imposto utilizada pelo sp na auto liquidação de IRC, aduzindo como fundamento, o facto de, não obstante o sp ter a sede social nos Açores, não desenvolver a sua actividade na região e ter os negócios concentrados no Continente, pelo que não deveria beneficiar da redução de taxa de IRC em vigor na RAA.

O sp não se conformando com a decisão de correcção e de liquidação dos tributos, impugnou os actos administrativos tributários dos exercícios de 1999 e 2000, e relativamente ao exercício de 1999, os fundamentos por si aduzidos foram, como pedido principal, a caducidade do direito de liquidação nos termos do artigo 45 n° 5 da LGT e subsidiariamente, a anulação da liquidação por a mesma padecer de deficiente interpretação da norma do n° 5 do Decreto Legislativo Regional 2/99/A

O Tribunal Administrativo de Ponta Delgada, em sentença com trânsito em julgado, relativamente à impugnação às correcções ao exercício de 1999, reconhecendo o mérito dos argumentos aduzidos pelo sp, quanto à questão da caducidade, deu provimento as suas pretensões e consequentemente, mandou anular a liquidação adicional de IRC, repondo a situação existente antes da correcção. ANEXO 1

No que concerne ao pedido subsidiário, referente à aplicação da taxa especial de 21% de IRC, aplicável na RAA, o tribunal, embora entendendo desnecessária a análise do mérito desta questão, por ter sido reconhecida razão ao sp quanto à questão da caducidade, afirmou expressamente que o sp não tinha razão, porque “em 1999 o sp não teve qualquer actividade na Região e em 2000 essa actividade tinha uma ínfima representação nos seus resultados declarados”. ANEXO 1

A impugnação relativa ao exercício de 2000, corre os seus termos em tribunal, não tendo sido proferida, até a presente data, qualquer decisão.

Considerando que o sp tinha em 2002 a sede social na RAA e sendo a situação no exercício em inspecçlo idêntica á de 1999 e 2000 e considerando que os valores declarados em vendas brutas nos Açores, foi de 227 612,72 6 e no Continente ascendeu a 15 466 741,81 6 e vendas isentas de IVA a partir do Continente totalizaram a verba de 192 030,50 6 (Anexo2) então, face ao espírito e à letra da lei e de acordo com o que foi proferido na sentença pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada, a taxa que deve ser aplicada à matéria colectável será proporcional em função dos proveitos gerados, no Continente e nos Açores.( ver ponto 7.7 deste projecto de relatório).

(...)

7 — Situações irregulares passíveis de correcção

No decurso da acção inspectiva foram analisadas as contas de custos, tendo sido verificado que alguns lançamentos não obedecem aos princípios geralmente aceites em contabilidade e às normas fiscais, conforme exposição nos seguintes pontos:

7.1 - Princípio da especialização de exercício o artigo 18 do CIRC

No ponto 1 - princípios contabilísticos - do anexo ao balanço e à demonstração de resultados, anexo 7 A, o sp proclama que as demonstrações financeiras foram preparadas de acordo com os princípios geralmente aceites, entre os quais, o princípio da especialização de exercícios, tendo o ROC, no ponto 6 da certificação legal de contas, anexo 7 B, também emitido opinião de que as demonstrações financeiras se conformavam com os princípios contabilísticos geralmente aceites em Portugal, porém na verificação cm concreto dos lançamentos e dos documentos de suporte, especialmente os documentos lançados no mês de Janeiro, constatou-se que o sp não teve em devida consideração o cumprimento deste principio, contabilizando facturas com data de 2001, no exercício de 2002, conforme evidenciado no quadro 1.

Este procedimento contraria o disposto no n° 1 al a) e b) do n°3 do artigo 17 e o artigo 18, ambos do CIRC.

O artigo 18 n° 1 preconiza que “os proveitos e os custos, são imputáveis ao exercício a que digam respeito...” e o n° 2 do mesmo artigo refere que “as componentes positivas ou negativas respeitantes a exercícios anteriores só são imputáveis ao exercício quando, na data do encerramento das contas daquele a que deveriam ser imputadas, eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas”.

Ora analisando o artigo 18 do CIRC e fazendo a subsunção do texto do artigo aos documentos de suporte abaixo identificados, conclui se que os referidos custos deveriam ter sido imputados ao exercício de 2001, dado que, o sp, tinha pleno conhecimento das responsabilidades que assumira perante os fornecedores a na data da emissão das facturas os débitos não eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidos, pelo que, o sp cometeu uma irregularidade fiscal, ao contabilizar indevidamente, no exercício a que não diziam respeito, os custos elencados, alterando deste modo o resultado líquido do exercício, a matéria colectável e imposto a pagar.

Tendo em conta o exposto, propõe-se que os custos em análise não sejam aceites como uma componente negativa do exercício de 2002

Entretanto o Toc ao ser questionado sobre o incumprimento do princípio da especialização de exercício e do artigo 18 do CIRC e a consequente alteração do resultado, respeitante às facturas de 2001 contabilizadas em 2002, respondeu reconhecendo que, efectivamente os documentos deveriam ter sido escriturados nos respectivos exercícios, se os mesmos tivessem dado entrada no departamento da contabilidade da sociedade antes do encerramento das contas de 2001, dado que, por imperativos de regras de gestão o encerramento das contas do exercício ocorria no termo do mês de Janeiro, não tendo havido possibilidade de contabilizar documentos recepcionados após esta data, tendo acrescentado que da mesma forma que acontecera no exercício em análise, tinham sido contabilizados no exercício de 2003, vários custos respeitantes ao exercício de 2002 e que estes deveriam ser tidos em conta para o apuramento do resultado de 2002.

A justificação supra citada apresentada pelo Toc de que só contabilizava os custos que chegassem ao departamento da contabilidade até ao termo do mês de Janeiro, antes das contas do exercício serem encerradas, não tem acolhimento porque:

- A lei fiscal prevê no n° 4 do artigo 115 do CIRC, um período até 90 dias, para escrituração dos documentos em circulação, nomeadamente de fornecedores e de movimentos de regularização da escrita e um período ainda mais alargado para a entrega da declaração de rendimentos, (30/05/03) e poderia ainda proceder à entrega da declaração de substituição, nos termos do n° 1 e 2 do artigo 1 14 do CIRC, não obstante o modelo 22 entregue ser também de substituição.

- O sp poderia e deveria contabilizar, em conformidade com os princípios e com a lei, os documentos de terceiros recepcionados após o último dia do exercício;

- O sp no termo do exercício sabia quais os custos em que tinha incorrido, assim como as responsabilidades decorrentes das prestações de serviços de que foi beneficiário, tais., como, serviços de comunicações, de viagens, de seguros ou em alternativa, os custos deveriam ter sido contabilizados através de um documento interno, com valores estimativos, debitando as respectivas contas de custo por contrapartida de uma conta apropriada.

- Por outro lado nem o Toc nem o representante legal fizeram quaisquer provas de que os documentos de 2001 contabilizados cm 2002 e os de 2002 registados em 2003, tivessem dado entrada após o encerramento das contas dos respectivos exercícios.

O Toc fez o arrolamento dos custos de 2002, contabilizados em 2003, que ascendem a 423 138,75 € ANEXO 8, que foram conferidos, pelo que, cm obediência ao princípio da especialização de exercícios plasmado no artigo 18 do CIRC se propõe que sejam retirados do exercício de 2003, para serem integrados no exercício de 2002, por forma a repor a legalidade fiscal e à determinação do resultado real.

No quadro seguinte apresentamos a descrição dos custos de 2001, contabilizados indevidamente em 2002:

   

         

Assim nos termos do exposto, propõe-se que, em relação ao exercício de 2002, sejam subtraídos 547 844,01€ de custos de 2001,contabilizados em 2002 e sejam acrescidos os custos no valor de 423 138,75€, indevidamente contabilizados em 2003, mas que dizem respeito ao exercício de 2002.

Assim, neste exercício vai ser proposto o acréscimo à matéria colectável declarada, o valor de 124 705,26€.

No que diz respeito ao exercício de 2003, quando for elaborada a informação respeitante a este exercício, serão deduzidos custos no valor de 423 138,75€

De acordo com o procedimento adoptado pelo sp, nos exercícios de 2002 e 2003, que se traduz numa irregularidade de elevada relevância, pode-se concluir que nos exercícios anteriores a 2002, foram, provavelmente, contabilizados custos não respeitantes aos exercícios em causa, pelo que foi solicitado ao Toc que procedesse ao somatório dos custos do exercício de 2000 contabilizados no exercício de 2001, por forma a realizar um estudo comparativo dos custos não contabilizados nos respectivos exercícios, sendo que, até a presente data, não se obteve esta informação.

7.2 - Ajudas de custo da gerência

A conta 64.19 - Remunerações de Gerência, Ajudas de custo - encontra-se debitada mensalmente, pelo valor de 1 287,31€, num valor total anual de 15 447,72€, abonados ao presidente do conselho de administração, tendo como documento de suporte apenas a folha de vencimentos designada por “ mapa de vencimentos 2002“.

O mapa de vencimento apresentado pelo sp para justificar as ajudas de custo não reúne os requisitos mencionados na norma, tais como locais, tempo de permanência e objectivos, pelo que infringe a al) f do n° 1 do artigo 42 do CIRC. Anexo 9.

Tendo em atenção o exposto propõe-se o acréscimo da verba de 1,2 048;44, visto que, o sp já tinha acrescido no quadro 07 campo 223 a verba de 3 399,28€.

7.3 - Viagens de pessoas que não fazem parte dos quadros da sociedade

Na verificação da conta 6222712- deslocações e estadas, constatou-se que o sp suportou custos com viagens e estadias de pessoas, algumas das quais não têm um vínculo contratual com o sp, outras prestaram serviços que foram remunerados sem incluir tais valores, indevidamente contabilizados com custos e outros custos não têm documento de suporte válido (facturas), conforme observações no quadro abaixo. Anexo 10.

No que diz respeito aos documentos, 4420109, 4440038, 4450176 e 3350122, identificados no quadro 2, o valor a corrigir proposto é de metade do valor, uma vez que os beneficiários das viagens, foram as esposas do presidente do conselho de administração e do senhor A..... que na data da viagem era o Toc do sp, bem como os valores contabilizados que carecem do documento de suporte.

Pelo exposto é proposta a correcção dos custos, no total de 13 881,32, por não caberem na previsão do nº 1 do artigo 23 do CIRC

 

7.4- Outros custos com pessoal

O sp contabilizou na conta 648216- Encargos Diversos a verba de 20 340,26€ respeitante a despesas de refeições consumidas pelos trabalhadores em restaurantes e de ofertas quando estes aniversariavam. Dado que os trabalhadores já são beneficiários de subsídio de alimentação, conforme consta do extracto da conta 648215 - subsídio de refeição, configura-se nesta situação, uma duplicação de custos - subsídio de alimentação e os documentos constantes na conta 64.8216(anexo 11)-porém o representante do sp afirmou

que as refeições pagas relacionavam-se com trabalhos efectuados para a sociedade, fora do horário normal de serviço.

Analisada a questão, constatou-se que não havia débitos de horas extraordinárias nas sub contas da classe 64, pelo que parece não haver uma conexão directa entre as alegadas horas extraordinárias e as despesas de refeições consumidas em restaurantes.

Nestes termos, os custos que o sp suportou, com refeições em restaurantes, concedidos aos trabalhadores, sem que tivesse comprovado a realização de horas extraordinárias, e tendo em conta que estes são beneficiários de subsídio de refeição, são consideradas dispensáveis para a manutenção da fonte produtora, nos termos do n° 1 do artigo 23 do CIRC, pelo que se propõe o seu acréscimo.

Na sub conta 64.82.16, encontram - se lançados aos longo do exercício valores suportados respeitantes a prendas oferecidas aos funcionários aniversariantes, na sua grande maioria de valor de 50€, amêndoas na época da Páscoa, vacinas e relógios etc que são aceites fiscalmente como custos de exercício, e que totalizam 4 038,88 € porque podem configurar um custo social e têm a natureza de ofertas.

Nos termos do exposto, a correcção proposta é de 16 301.386, (20 340,266-4 038,886) que se encontram discriminados no extracto de conta 648216- Encargos diversos

7.5- Juros compensatórios

O sp contabilizou na conta 68152, o documento 32100156, no valor 2 364,47 respeitante aos juros compensatórios calculados e liquidados pelos Serviços Centrais do Imposto sobre o Rendimento em 2002, pela nota de liquidação n° ....., respeitante ao exercício de

2001, todavia o mesmo não foi acrescido no quadro 07 campo 212, conforme dispõe o artigo 42, n° 1 al d) do CIRC, pelo que se propõe a correcção do mencionado valor. Anexo 12.

7.6 - Custo não fiscal de viatura ligeira

O sp tem escriturado no seu imobilizado uma viatura ligeira de passageiros com a matrícula ....., com valor de aquisição de 31 803,696 e cuja amortização contabilística foi de 7 950,92€. Anexo 13.

Nos termos do artigo 33 n° 1 al e) do CIRC, não são aceites como custos as reintegrações de viaturas ligeiras, na parte excedente ao custo de aquisição de 29 927,87€, pelo que nos termos desta disposição o limite de reintegração deveria ser de 7 481,97 €.

29 927,87*0.25=7 481,97

Nestes termos propõe-se a correcção de:

468,95= 7950,92- 7481,9700

7.7 - Correcção ao quadro 10 (cálculo do imposto) da declaração mod. 22 de IRC de 2002, entregue cm 30.05.03

Tendo em conta o exposto no ponto 3 desta informação, c subscrevendo na integra os fundamentos aduzidos pela Direcção de Finanças de Ponta Delgada, quanto à questão da aplicação da taxa de IRC prevista no DLR n° 2/99/A; Anexo 14,

Atendendo ao facto de o DLR 2/99/A proceder à adaptação do Sistema Fiscal Nacional e no preâmbulo consagrar o princípio da atenuação da carga fiscal, sobre as pessoas singulares e colectivas, com vista à melhoria das condições de vida e criação de emprego das empresas com actividade no arquipélago, para suportar os custos incontornáveis da insularidade, princípios estes concretizados nos n0s 2 e 3 do artigo 5o da DLR 2/99/A;

e relacionando estes princípios e normas com a actuação concreta do sp, constata-se que, não obstante este estar sediado nos Açores, a sua actividade desenvolveu-se em cerca de 98,52% no Continente;

e considerando que no exercício de 2002 a situação tributária do sp é idêntica à verificada em 2000, a quase totalidade do volume de vendas é realizado a partir do Continente, no valor de 14 093 717,B4€ e que os proveitos originados na RA A, no valor de 211 809,26 € representam apenas 0,0148 do volume total de proveitos de 14 305 527,10€, a taxa de imposto aplicável será distribuída proporcionalmente de acordo com o n° 3 do artigo 5 do DLR 2/99/A, pelo que o sp não tem direito à redução de 30% da taxa de IRC, relativo ao volume de negócios realizados no Continente, prevista nos termos do n° 1 do artigo 5o do diploma supra citado.

 


VI - Regularização efectuada pelo s.p.

Não aplicável

VII - Infracções verificadas

Tendo em conta os factos tributários expostos no ponto 7 desta informação, o sp infringiu o disposto nos artigos 17 e 18 do CIRC, quanto aos custos de outros exercícios contabilizados em 2002, e infringiu o disposto no artigo 23 do mesmo diploma, relativamente aos custos contabilizados e referidos nos pontos 7.2 a 7,6 considerados como dispensáveis para a manutenção da fonte produtora, e infringiu o disposto no artigo 80 do CIRC, conjugado com o n" 3 do artigo 5 do DLR2/99/A, cm vigor a partir de 01/01/99, quanto aos factos expostos no ponto 7.7,

VIII - Direito de audição

0 sp, tendo sido notificado nos termos do artigo 60 da Lei Geral Tributária, para exercer o direito de audição, sobre as propostas de correcção, veio ao processo responder por escrito, dentro do prazo que lhe foi concedido, tendo concordado com as projecções de correcção referidas nos pontos 7.2 a 7.6 da presente informação e discordado das projecções mencionadas nos pontos 7.1 - Princípio da especialização dos exercícios, artigo 18° do CIRC - e 7.7.- Correcção ao quadro 10 do modelo 22.

Após o estudo e análise aos argumentos aduzidos pelo sp, no exercício do direito de audição, tecem-se os seguintes considerandos: (anexo 16)

1 - Princípio da especialização dos exercícios

0 sp quanto à proposta de correcção de €124 705,26, que resultam de custos que não pertencem ao exercício de 2002, começou por afirmar que não contestava a factualidade das situações apontadas no relatório, acrescentando que em teoria a proposta de correcção parecia equilibrada, para logo em seguida referir que na prática, a solução adoptada era iníqua por ser geradora de uma penalização gravíssima, fundamentando a sua discordância com os seguintes argumentos:

A- As facturas objecto de proposta de correcção tinham sido recebidas, após a data em que o fecho de contas deveria ter tido lugar, ou seja, a 31 de Janeiro, em obediência aos critérios de gestão internos;

B- A contabilização das facturas em causa tinham sido efectuadas em conformidade com o princípio contabilístico da “consistência”;

C- Que tinha suportado em 2001, diferencial do imposto, que o fisco se propunha acrescer i matéria colectável em 2002; 1

Concluindo o sp que, a manter-se a projectada correcção estaria a ser sujeita a uma dupla tributação em sentido não técnico.

Em resposta aos argumentos avançados pelo sp, a posição assumida nesta informação é a seguinte:

D- A prqjecção de correcção exposta ponto 7.1 desta informação, foi feita no estrito cumprimento dos princípios geralmente aceites em contabilidade e com fundamento na lei, designadamente, nos artigos 17 e 18 do CIRC, conforme explanação na fundamentação da proposta de correcção, e esta é legal, equilibrada e justa quer na teoria quanto na prática;

E- Os critérios internos de gestão utilizados pelo sp que implicam o fecho de contas em 31 de Janeiro de cada exercício e invocados este para justificar a contabilização de custos que não pertencem aos exercícios, não se devem sobrepor aos comandos legais e aos princípios contabilisticos, designadamente ao princípio da especialização, antes pelo contrário, devem estar conformados com a lei, ou seja, com o disposto no artigo 18 do CIRC:

F- O sp alegou que a contabilização das facturas em questão foi feita consistentemente, em obediência ao princípio da consistência, porém este argumento não é válido, dado que, este princípio preconiza que a empresa não deve alterar as suas políticas contabilísticas de um exercício para o outro se as políticas adoptadas estiverem em conformidade com a lei.

No caso vertente, as políticas contabilísticas seguidas pelo sp e já referido, traduzem-se na contabilização de custos materialmente relevantes, em exercícios que aos mesmos (custos) não dizem respeito.

Assim, o princípio da consistência só se consideraria cumprido perante a lei desde que não ferisse outros princípios e normas legais; ora no caso em apreço, o sp ao contabilizar custos em exercidos a que não pertencem, não se pode apurar um resultado real da actividade em cada exercício e não se obtém uma imagem verdadeira e apropriada da siluação financeira da sociedade.

Dado que os custos suportados eram conhecidos ou manifestamente previsíveis na data da assumpção das responsabilidades, c no sentido de obviar situações de documentos que chegam de forma tardia - documentos em transito de um exercício para o outro - à posse do sp, os mesmos devem-ser contabilizados na conta 27- Acréscimos e deferimentos

G- Não_se pode aceitar o argumento do sp de que estariam a ser prejudicados em relação ao exercício de 2001, visto que, o sp não deu a conhecer qua! o montante ou a ordem de grandeza dos custos contabilizados no exercício de 2000, que pelo princípio da especialização de exercícios, deveriam pertencer a 2001, e de custos do exercício de 1999, que pertenceriam ao exercício de 2000 e assim sucessivamente.

Para testar o impacto no resultado líquido e lucro tributável dos exercícios de 1999,2000 e 2001, que os custos de um exercício tiveram nos seguintes, foi solicitado ao sp, na pendência da acção de inspecção, parte final do ponto 7.1, que fizesse a demonstração dos expurgos dos custos contabilizados em 2001 pertencentes a 2000 e de custos registados neste, respeitantes a 1999, porém tal demonstração não foi apresentada na fase de inspecção, e dado que o sp contesta a proposta de correcção, seria de esperar que, na fase da audição prévia, o sp fizesse a demonstração concreta de que irá ficar prejudicado em 2001, porém tal não aconteceu.

2- Quadro 10 - Tributação pela taxa do Continente

No que concerne a proposta de correcção exposta no ponto 7.7 - aplicação da taxa de IRC do Continente e a não aplicação da taxa de IRC da RAA, prevista no DLR 2/99/A, respeitante ao exercício de 2002 - o sp não concorda com a mesma.

O sp veio no direito de audição argumentar que recorreu aos tribunais - exercício de 2000- para fazer valer os seus direitos de aplicação da taxa em vigor nos Açores, e até a presente data, ainda não obteve qualquer decisão judicial.

Qualquer correcção que a Administração entenda que deva propor, desde que legal e fundamentada, não deve depender do pronunciamento dos órgãos judiciais, pelo que não devem ser atendidos os argumentos aduzidos pelo sp, com base na espera do pronunciamento do tribunal, quanto à aplicação da taxa reduzida em vigor na RAA.

Nestes termos, no caso em análise, deve ser mantida a proposta de tributação do exercício de 2002, pela taxa do Continente, conforme expresso no projecto de relatório dado que a mesma está fundamentada no DLR 2/99/A e é entendimento assente da Direçção de Finanças de Ponta Delgada e da Direcção de Finanças de Lisboa,

Nos termos do exposto nos pontos I e 2, propõe-se que sejam mantidas as correcções projectadas.

Para efeitos de liquidação adicional vai ser preenchido o modelo DC-Único, para o exercício de 2002, arredondando-se por excesso de 0.0148 para 0.02 a percentagem de negócios realizados pelo sp nos Açores, dado que o sistema informático só reconhece taxas com dois dígitos.

Vai ser levantado o competente auto de notícia, para aplicação das sanções relativas às infracções cometidas pelo s.p.

Não são remetidos os anexos mencionados neste relatório, fazendo parte integrante do mesmo, à excepção do anexo 16, dado que os mesmos já foram enviados na fase de audição prévia.

(cfr. fls. 64 a 82 do SITAF e Doc. 1 junto com a petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);

H. O relatório de inspeção tributária mencionado na alínea antecedente foi notificado à Impugnante em 16/01/2007 (cfr. fls. 61 a 88 do PAT, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);

I. Na sequência das correções efetuadas na referida ação inspetiva, foi emitida a liquidação adicional de IRC n.º ....., de 22/01/2007, e a respetiva liquidação de juros compensatórios n.º ....., consubstanciadas na demonstração de acerto de contas n.º .....e compensação n.º ....., com um valor a pagar de €83.802,34 e data limite de pagamento de 05/03/2007 (cfr. Doc. 3 junto com a petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);

J. Na sequência da falta de pagamento voluntário da totalidade do montante referido na alínea anterior, foi instaurado, em 27/03/2007, o processo de execução fiscal n.º ..... (cfr. fls. 113 do PAT, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);

K. No âmbito do processo de execução fiscal mencionado na alínea antecedente, foi efetuado um pagamento no valor de €10.593,52 (cfr.Doc. 2 junto com a petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);

L. Com data de 1 de setembro de 2002, foi celebrado um contrato de prestação de serviços entre a aqui Impugnante e M....., do qual se retira o seguinte: “(…)

   

 CLÁUSULA PRIMEIRA
1. A Primeira Contraente contrata os serviços do Segundo Contraente e este obriga-se a prestar os serviços de artista/gravador (doravante designados por «serviços»).
2. Os serviços prestados pelo Segundo Contraente têm por objecto o retoque de cunhos fornecidos pela Primeira Contraente tendo em vista a cunhagem de réplicas de moedas antigas.
3. Os cunhos referidos no parágrafo anterior serão retocados pelo Segundo Contraente a partir de documentos de referência colocados à disposição pela Primeira Contraente e são destinados à produção de punções em aço e à edição de medalhas que serão réplicas de moedas originais.

CLÁUSULA SEGUNDA
1. A Segunda Contraente obriga-se a realizar, num espaço máximo de doze meses, a contar da data da assinatura do presente contrato, os serviços previstos na cláusula primeira, identificados do seguinte modo: 1) Alemanha – 1873 ** 2) Irlanda – 1928 ** 3) Holanda – 1824 ** 4) Itália – 1863 ** 5) Grécia – 1832 ** 6) Luxemburgo – 1924 ** 7) Áustria – 1924 ** 8) Finlândia – 1864 ** 9) Bélgica – 1833 ** 10) Espanha – 1869 ** 11) França – An 12

CLÁUSULA TERCEIRA
1. Como contrapartida dos serviços prestados, a Primeira Contraente obriga-se a pagar ao Segundo Contraente o montante sem IVA de 18.292,96€.
2. Tal montante deverá ser pago pela Primeira Contraente em função e medida da prestação dos serviços pela Segunda Contraente.

CLÁUSULA QUARTA
As Partes acordam desde já que o presente contrato não constitui em qualquer caso um elo de subordinação entre elas, prestando o Segundo Contraente os serviços de forma autónoma e totalmente independente, na qualidade de prestador de serviços independente.

CLÁUSULA QUINTA
1. As Partes acordam expressamente que o retoque das gravuras nos moldes fornecidos não confere em qualquer caso ao Segundo Contraente direitos de autor sobre aquelas, quer sejam de natureza moral patrimonial.
2. O Segundo Contraente reconhece à Primeira Contraente a plena e inteira propriedade dos cunhos bem como da totalidade dos direitos de autor (morais e patrimoniais) adjacentes aos referidos cunhos, podendo a Primeira Contraente livremente editar e comercializar as medalhas marcadas com os cunhos originais da prestação de serviços de retoque de gravação objecto deste contrato.

CLÁUSULA SEXTA
Como consequência do disposto na Cláusula Quinta supra, a Primeira Contraente beneficia, sem dever qualquer remuneração suplementar que seja ao Segundo Contraente, do direito de reproduzir as gravuras retocadas resultantes da execução do presente contrato, sob qualquer forma e tamanho que seja, e de comercializar os exemplares reproduzidos ao preço, quantidade e segundo a modalidade mais favorável, em Portugal e no mundo inteiro, bem como do direito de utilizar como entender a reprodução fotográfica, nomeadamente no seu material promocional ou publicitário.

CLÁUSULA SÉTIMA
O presente contrato está sujeito à lei portuguesa. As partes acordam que o tribunal competente para dirimir quaisquer conflitos emergentes do presente contrato é o tribunal de Lisboa, renunciando expressamente a qualquer outra competência judicial.”

 (cfr. Doc. 5 junto com a petição inicial e com o requerimento apresentado em 07/07/2008 constante do SITAF, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);

M. Foram emitidas pela “A.....”, em nome da aqui Impugnante, faturas referentes a viagens com o itinerário Paris-Lisboa-Paris, relativas ao passageiro M....., nos valores de €1.258,36, €1.256,02 e €1.256,02, com datas de 12/07/2002, 30/09/2002 e 14/11/2002, respetivamente (cfr. fls. 244, 252 e 257 do PAT, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);

N. A Impugnante contabilizou em 2002 custos respeitantes a 2001, no valor de €547.844,01, e contabilizou em 2003 custos referentes a 2002, no valor de €423.138, 75, sendo esta prática adotada desde a sua transformação em sociedade anónima em 1991 (cfr. fls. 74 e 238 do PAT, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais – facto não controvertido).


***

A decisão recorrida consignou como factualidade não provada, o seguinte:

“Nada mais se provou com interesse para a decisão da causa.”


***

A motivação da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte:

“A decisão da matéria de facto efetuou-se com base no exame dos documentos juntos aos autos pelas partes e constantes do processo administrativo tributário (PAT), bem como na posição assumida pelas partes, conforme referência feita em cada uma das alíneas do probatório.”


***

III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente, não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 2002, e respetivos juros compensatórios.

Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, ao ter mantido as correções relacionadas com custos respeitantes ao exercício de 2001 e contabilizados no exercício de 2002, viagens realizadas por pessoal sem vínculo de subordinação à empresa, e redução de taxa atenta a percentagem de atividade prestada no Continente.

Apreciando.

Comecemos pelos custos respeitantes ao exercício de 2001, mas contabilizados no exercício de 2002.

A Recorrente reconhece, desde logo, que contabilizou em 2002 faturas de 2001, releva, no entanto, que só o concretizou porquanto foram recebidas após o fecho de contas em 15 de janeiro de 2001, sendo certo que é prática assumida desde a transformação em sociedade anónima.

Defende, neste particular, que a manter-se a aludida correção a mesma enferma de vício de violação de lei, mormente, preterição do princípio da justiça, visto inexistir uma omissão voluntária e intencional com vista a operar a transferência de resultados entre exercícios não tendo, outrossim, decorrido qualquer prejuízo para o Estado.

Mais sublinhando que tal atuação tem, efetivamente, resultado prejudicial para a Recorrente, conforme dimana do quadro junto como doc. 4 que atesta todos os custos diferidos de um exercício para outro, desde 1997 a 2006, e do qual se infere, inequivocamente, que nunca o Estado foi prejudicado.

Termina relevando que tal atuação foi norteada pelo princípio contabilístico da consistência em conjugação com o princípio da especialização dos exercícios, e que a manter-se a visada correção a mesma acarreta, in limite, uma dupla tributação.

Sem embargo do exposto, reclama, convocando jurisprudência que reputa relevante para o efeito, a aplicação ao caso vertente dos princípios da verdade material, igualdade tributária e capacidade contributiva, de forma a assegurar a adequada justiça fiscal, visto que nunca qualquer pagamento de IRC ficou em causa, apenas o momento do seu cálculo.

O Tribunal a quo assim o não entendeu tendo entendido que competia à Impugnante provar “[o] que por si vem alegado no sentido de estarmos perante um efetivo prejuízo resultante da correção efetuada, o qual, adiante-se, a verificar-se, resultaria da diferença entre o valor de custos concernentes a 2001 erradamente considerados em 2002 (e corrigido na liquidação impugnada) e o valor de custos indevidamente considerados em 2001 referentes ao ano de 2000. Concluindo, assim, que a conduta da Impugnante concretizou uma violação ao princípio da especialização dos exercícios, e não sendo aqui possível concluir, sem mais, que, do procedimento por aquela levado a cabo, não resultou qualquer prejuízo para a Fazenda Pública, bem como que a correção efetuada pelos SIT se concretizou num efetivo prejuízo não justificado para a Impugnante, conclui-se que a correção controvertida não padece da ilegalidade que lhe vem assacada, improcedendo, nesta parte, a presente impugnação judicial.”

Vejamos, então, se a decisão recorrida merece a censura que lhe é endereçada.

Para o efeito, convoquemos o quadro normativo e os considerandos que reputamos relevantes para o caso sub judice.

Por imposição constitucional, a tributação das pessoas coletivas obedece ao princípio da tributação do rendimento real efetivo, ou seja, o imposto deve incidir sobre o rendimento efetivamente obtido (artigo 104.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa - CRP).

Em obediência a este princípio, determina-se no artigo 16.º, n.º 1 do CIRC que a matéria tributável é, por regra, determinada com base na declaração do contribuinte, sem prejuízo do controlo que a Administração Tributária (AT) venha a fazer da mesma.

O IRC incide, então, sobre o “lucro das sociedades comerciais”, sendo que, conforme estabelece o n.º 2 do artigo 3.º do CIRC “o lucro consiste na diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas no código”.

O lucro tributável das pessoas coletivas, de acordo com o artigo 17.º do CIRC, é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas nesse mesmo período e não refletidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos daquele Código.

Mais se refira, com particular interesse para os presentes autos, que vigora, neste âmbito, o princípio da especialização dos exercícios, ou seja, “os proveitos e custos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício que digam respeito”, sendo que “as componentes positivas ou negativas consideradas como respeitando a exercícios anteriores só são imputáveis ao exercício quando na data de encerramento das contas daquele a que deveriam ser imputadas eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas” (cfr. artigo 18.º, n.ºs 1 e 2 do CIRC).

Conforme refere Rui Duarte Morais, em sede de IRC, “[h]á, (…), que dividir a vida da empresa em períodos, A cada um desses períodos deverão ser imputados determinados ganhos e perdas (incluindo variações patrimoniais), dos quais decorrerá o cálculo do lucro desse exercício. (…) A imputação de um proveito ou custo a certo exercício obedece a um critério económico (e não a um critério financeiro), ou seja, as operações nele efectuadas afectam o respectivo resultado, independentemente do recebimento ou pagamento do respectivo preço ou outra contrapartida. Contabilizam-se créditos e débitos e não pagamentos e recebimentos”[1].

Para os efeitos deste preceito legal, o exercício corresponde ao ano fiscal, o qual, por seu turno, coincide com o ano civil[2].

Como sobredito, o princípio da especialização dos exercícios encontra-se consagrado no artigo 18.º do CIRC e tem uma densidade vinculativa elevada, não tolerando, fora dos casos expressamente consignados na lei, qualquer margem de manobra do contribuinte na afetação temporal dos movimentos económico-financeiros da empresa, devendo, no entanto, ser sopesado com os demais princípios constitucionais basilares, mormente, da justiça.

Vistos os considerandos de direito que relevam para o caso vertente, regressemos ao caso dos autos.

Do teor do Relatório de Inspeção Tributária, resulta que a AT entendeu que “[o]s custos deveriam ter sido imputados ao exercício de 2001, dado que, o s.p, tinha pleno conhecimento das responsabilidades que assumira perante fornecedores e na data da emissão das facturas os débitos não eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidos, pelo que, o sp cometeu uma irregularidade fiscal, ao contabilizar indevidamente, no exercício a que não diziam respeito, os custos elencados, alterando deste modo o resultado líquido do exercício, a matéria colectável e imposto a pagar.”

In casu, não há dúvida que os custos no valor de €547.844,01, assentam em faturas datadas de 2001, porquanto face a todo o supra expendido a sua imputação deveria ter sido realizada nesse mesmo ano.

Aliás, a Recorrente assume tal circunstância, no entanto advoga que tal prática tem vindo a ser implementada desde a sua transformação em sociedade anónima, e que a mesma não constituiu qualquer omissão voluntária e intenção deliberada de transferir resultados entre os exercícios com o intuito de diminuir a carga fiscal e tributação.

De facto, há um erro contabilístico reconhecido e o mesmo assume um carácter recorrente, não procedendo a esteira de razão invocada no sentido de que esta prática é adotada face a critérios de gestão interna cujo encerramento de contas do exercício ocorria no termo do mês de janeiro, desde logo, porque é desconforme com o artigo 115.º, nº4 do CIRC, descurando, outrossim, o teor do artigo 114.º, nº2, do CIRC.

No entanto, conforme já evidenciado anteriormente e, como propugna, a Recorrente o princípio da especialização dos exercícios deve ser sopesado com o princípio da justiça, sendo que numa situação em que não é colocada em causa a efetividade dos custos e a sua documentabilidade, e já não é possível fazer-se a correção simétrica, designadamente, por já não ser possível apresentar reclamação de autoliquidação, requerer a revisão do ato tributário, ou mesmo diligenciar a AT nessa correção por estar caducado o direito à liquidação, então a AT deve abster-se de tributar, ressalvadas, claro, as situações em que tenha existido uma intenção deliberada de transferência de custos com o intuito de lesar o Estado.

Com efeito, como doutrinado no Aresto do STA, proferido no processo nº 0716/13, de 14 de março de 2018:

“O princípio da especialização dos exercícios, do qual resulta uma segmentação da vida das empresas em períodos de certo modo independentes entre si, correspondentes ao ano civil, tem em vista tributar a riqueza gerada em cada exercício, respondendo também a necessidades de natureza económica, contabilística e de gestão.

A periodização anual do imposto implica que tanto os rendimentos como os gastos (e as variações patrimoniais fiscalmente relevantes) sejam imputados a cada período de tributação. Esta imputação resulta essencialmente da aplicação das normas contabilísticas, justamente porque o legislador entendeu que as regras de periodização aí previstas oferecem um sistema coerente, fiável e eficaz também para efeitos fiscais (Vide António Rocha Mendes, IRC e as Reorganizações Empresariais, ed. da Universidade Católica, pag. 72.).(…)

Constitui no entanto jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal que a rigidez deste princípio tem de ser colmatada ou temperada com a invocação do princípio da justiça, nas situações em que, estando já ultrapassados todos os prazos de revisão do acto tributário e não havendo prejuízo para o Estado, se deve evitar cair numa injustiça não justificada para o administrado – vide, neste sentido, acórdãos da Secção de Contencioso Tributário de 19.11.2008, recurso 325/08, de 02.04.2008, recurso 807/07, de 19.05.2010, recurso 214/07, de 25.06.2008, recurso 291/08, de 09.052012, recurso 269/12 e de 02.03.2016, recurso 1204/13.(…)

Numa situação destas, em que não seja possível a “correcção simétrica”, por razões de tempestividade, a doutrina (Neste sentido Lei Geral Tributária Anotada, Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, 4ª edição, Encontro da Escrita, pag. 454 e Rui Duarte Morais, ob. citada, pag. 70.) e a jurisprudência supracitadas vêem afirmando que o custo, ainda que indevidamente contabilizado, deve ser aceite, nomeadamente quando a respectiva imputação não tenha resultado de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar transferência de resultados entre exercícios.

De facto, como ficou sublinhado no referido Acórdão 214/07, «no caso do referido art. 18, n.º 1, do CIRC resulta uma vinculação para a Administração, que, em regra, deve aplicar o princípio da especialização dos exercícios na sua actividade de controle das declarações apresentadas pelos contribuintes.

Mas, o exercício deste poder de controle, predominantemente vinculado, pode conduzir a uma situação flagrantemente injusta e, nessas situações, é de fazer operar o princípio da justiça, consagrado nos arts. 266, n.º 2, da CRP e 55 da LGT, para obstar a que se concretize essa situação de injustiça repudiada pela Constituição.

Na ponderação dos valores em causa (por um lado o princípio da especialização dos exercícios que é uma regra legislativamente arbitrária de separação temporal, para efeitos fiscais, de um facto tributário de duração prolongada e, por outro lado, o princípio da justiça, que reflecte uma das preocupações nucleares de um Estado de Direito), é manifesto que, numa situação de incompatibilidade se deve dar prevalência a este último princípio.»

Neste contexto haveremos de concluir que serão de considerar anuláveis, por vício de violação de lei, actos de correcção da matéria tributável que, como no caso subjudice, conduzam a situações injustas deste tipo.

Pelo que é de aceitar, para efeitos fiscais, a contabilização efectuada pela recorrida já que não estão alegados ou provados factos através dos quais se demonstre que houve a intenção deliberada de proceder à transferência de resultados de exercício ou de fuga à tributação.” (destaques e sublinhados nossos).

Ora, transpondo a fundamentação expendida no Aresto citado, para o caso vertente, e não resultando do acervo fático dos autos, por um lado, que ocorreu uma transferência de resultados com um intuito fraudulento, e por outro lado, que está inviabilizada a alocação desse custo ao exercício correspondente, ter-se-á, na senda da argumentação constante no citado Acórdão, que acompanhamos, de propugnar pela sua anulação.

É certo que a AT advoga que requereu no decurso da ação de inspeção ao TOC da Recorrente que fizesse um estudo comparativo dos custos não contabilizados nos exercícios para que daí se extrapolassem as devidas ilações em termos de prejuízo efetivo para os cofres do Estado, e a verdade é que o mesmo não foi entregue, mas a verdade é que essa realidade, per se, não permite fundamentar a existência de uma omissão deliberada e intencional, ademais, como visto, sem sindicar qualquer outro pressuposto ou requisito atinente ao custo não pode legitimar a correção visada.

De resto, tendo a AT realizado correções aos exercícios de 1999 e 2000, as quais foram objeto de impugnação, e estando, outrossim, na posse, designadamente, das competentes Declarações Modelo 22, sempre poderia/deveria ter realizado esse confronto, para, designadamente, provar que houve uma transferência de resultados com um intuito específico de defraudar o Estado, o que, como visto, não logrou realizar.

Sem embargo do exposto, sempre importa relevar que a Recorrente apresenta um quadro resumo que permite atestar que o diferimento dos custos em nada foi penalizador para a AT, o qual, não pode, sem mais, sem descurado e no limite teria de redundar num non liquet, a ser, portanto, valorado a favor da Recorrente.

Acresce que a atuação da Recorrente, sendo como visto, adotada reiteramente-realidade essa asseverada pela AT nos demais exercícios, mormente, de 2003, e independentemente da censura que tal prática possa acarretar no âmbito da própria determinação do lucro tributável-  consubstancia, na falta de quaisquer outros elementos, uma antecipação do imposto que apenas deveria entregar no ano seguinte, porquanto ao não contabilizar todos os custos correspondentes ao respetivo exercício, atrasou a correspondente dedução para o ano seguinte.

Neste particular, e na senda do, ora, propugnado convoque-se o doutrinado por Diogo Leite Campos, Benjamin Rodrigues e Jorge de Sousa[3]:

“Transcorrido ‘o prazo em que podiam ser efectuadas correcções’, ‘se a administração fiscal tinha razão na correcção que efectuou, o contribuinte, em princípio, teria sido prejudicado pelo seu próprio erro ao declarar a matéria colectável, pois, abatendo um custo no ano seguinte àquele em que o deveria ter deduzido, deixou de ver diminuído o montante do imposto correspondente no ano em que tal diminuição deveria ter ocorrido, para só ver tal diminuição ocorrer no ano seguinte e, paralelamente, a administração fiscal não tinha tido qualquer prejuízo, pois recebera no ano anterior o imposto sem que fosse tido em conta esse custo que o deveria diminuir’ pois, em tal circunstância, ‘o contribuinte, que já era o único prejudicado pelo seu erro, veria ainda agravada a sua situação, vendo-se impossibilitado de efectuar a dedução desse custo em qualquer dos anos. A administração fiscal, assim, reteria em seu poder um imposto a que manifestamente não teria direito’.

‘Esta é uma situação em que o exercício de um poder vinculado (correcção da matéria colectável em face de uma violação do princípio da especialização dos exercícios) conduz a uma situação flagrantemente injusta e em que, por isso, se coloca a questão de fazer operar o princípio da justiça, consagrado nos artigos 266.º, n.º 2, da Constituição, e 50.º da Lei Geral Tributária, para obstar à possibilidade de efectuar a referida correcção.

Há, nesta situação, dois deveres a ponderar, ambos com cobertura legal: um é o de repor a verdade sobre a determinação da matéria colectável dos exercícios referidos, dando execução ao princípio da especialização, reposição essa que a administração fiscal deve efectuar mesmo que não lhe traga qualquer vantagem; outro é o de evitar que a actividade administrativa se traduza na criação de uma situação de injustiça.

Entre esses dois valores, designadamente nos casos em que a administração fiscal não teve qualquer prejuízo com o erro praticado pelo contribuinte, deve optar-se por não efectuar a correcção, limitando aquele dever de correcção por força do princípio da justiça.

Por outro lado, é de notar que numa situação deste tipo não se verifica sequer qualquer interesse público na actuação da administração fiscal, pois não está em causa a obtenção de um imposto devido, pelo que, devendo toda a actividade administrativa ser norteada pela prossecução deste interesse, a administração deveria abster-se de actuar.

Consequentemente, serão de considerar anuláveis, por vício de violação de lei, actos de correcção da matéria tributável que conduzam a situações injustas deste tipo’”. (destaques e sublinhados nossos).

Dir-se-á, portanto, que nada decorrendo dos elementos coligidos pela AT que permita concluir estar-se perante uma omissão intencional com vista à transferência de resultados entre exercícios, e não sendo já possível à data da elaboração do RIT, face ao prazo de caducidade do direito à liquidação, imputar o custo ao exercício de 2001, a manutenção da correção traduz uma injustiça[4].

Assim, tudo visto e ponderado, numa situação como a do caso vertente, em que a efetividade dos custos, e a sua documentabilidade nem é posta em causa, e em que já nem é possível à AT corrigir o exercício de 2001, no sentido de a este serem imputados os custos em contenda, e em que nada faz concluir pela intencionalidade no sentido de se visar a transferência de resultados entre exercícios, deveria a AT ter-se abstido de corrigir, com base no princípio da justiça.

E por assim ser procede o recurso nesta parte.

Atentemos, ora, na correção atinente aos custos com viagens e estadas de M......

A Recorrente defende que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento porquanto não tomou em devida em conta a relação laboral subjacente com a empresa, concretamente a prestação de serviços com M....., os quais se encontram devidamente comprovadas pelo respetivo contrato realizado em 2002, nos termos do artigo 23.º, n.º 1, alínea d), do CIRC.

A AT no seu Relatório de Inspeção Tributária, fundamentou a correção aludindo que foi contabilizado “[n]a conta 6222712, deslocações e estadas que o sujeito passivo suportou custos com viagens e estadias de pessoas, algumas das quais não têm vínculo contratual com o sp.” , donde não são subsumíveis no artigo 23.º do CIRC.

O Tribunal a quo, corroborou o entendimento da AT, porquanto entende que:

“[a] propósito da correção controvertida, relevante será trazer à colação o contrato celebrado entre o prestador de serviços e a Impugnante, do qual consta, designadamente, o seguinte: “1. Como contrapartida dos serviços prestados, a Primeira Contraente obriga-se a pagar ao Segundo Contraente o montante sem IVA de 18.292,96€. // 2. Tal montante deverá ser pago pela Primeira Contraente em função e medida da prestação dos serviços pela Segunda Contraente.” (cláusula terceira).

Mais ficou consignado no mencionado contrato (cláusula quarta) que “As Partes acordam desde já que o presente contrato não constitui em qualquer caso um elo de subordinação entre elas, prestando o Segundo Contraente os serviços de forma autónoma e totalmente independente, na qualidade de prestador de serviços independente.”.

Face ao exposto, ter-se-á de concluir não estarmos aqui perante encargos incorridos com as deslocações efetuadas por trabalhadores dependentes da Impugnante, ou seja, com os quais a mesma tivesse celebrado um contrato de trabalho subordinado, estabelecendo-se (desde que devidamente comprovado que os mesmos haviam sido suportados no âmbito e por força da sua atividade laboral diretamente relacionada com a atividade da empresa) uma conexão objetiva entre a atividade desta e os encargos que daí decorreriam.

Ora, no caso em apreço, tendo em conta que este tipo de custos não estava, por força do contrato celebrado, a cargo da Impugnante, sendo, por princípio, encargos do prestador de serviços a incorrer no âmbito da sua atividade, não poderá concluir-se, sem mais, pela existência de um nexo causal entre tais custos e os proveitos ou ganhos, “explicado em termos de normalidade, necessidade, congruência e racionalidade económica”.

Ora, analisando a aludida fundamentação nenhuma censura merece a decisão recorrida, porquanto realizou uma correta análise do regime jurídico vigente com a devida transposição para o caso vertente.

Mas, expliquemos porque assim o entendemos.

Como visto, do teor do Relatório Inspetivo, o normativo convocado para legitimar as correções foi o artigo 23.º do CIRC, e o pressuposto colocado em crise para efeitos de dedutibilidade fiscal, assentou na falta de vínculo contratual que permitisse atestar o seu nexo causal com a empresa.

Importa, relevar, ab initio, que, em regra, todos os custos contraídos por um sujeito passivo serão relevados negativamente na determinação do seu lucro tributável, conforme dimana expressamente do artigo 17.º, nº1, do CIRC. De resto, por imperativo constitucional, estatuído no artigo 104.º, n.º 2 da CRP, a tributação das empresas deve incidir sobre o rendimento real.

Contudo, conforme dimana da letra do artigo 23.º do CIRC, o legislador não estabeleceu uma correspondência absoluta entre os custos contabilísticos e os custos fiscais, porquanto só devem relevar negativamente no apuramento do lucro tributável os custos ou perdas que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

Com efeito, dispunha o artigo 23.º do CIRC, à data da prática dos factos tributários, sob a epígrafe de “custos ou perdas” que:

“Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora nomeadamente os seguintes:

a) Encargos relativos à produção ou aquisição de quaisquer bens ou serviços, tais como matérias utilizadas, mão-de-obra, energia e outros gastos gerais de fabricação, conservação e reparação;

b) Encargos de distribuição e venda, abrangendo os de transportes, publicidade e colocação de mercadorias;

c) Encargos de natureza financeira, como juros de capitais alheios aplicados na exploração, descontos, ágios, transferências, diferenças de câmbio, gastos com operações de crédito, cobrança de dívidas e emissão de ações, obrigações e outros títulos e prémios de reembolso;

d) Encargos de natureza administrativa, tais como remunerações, ajudas de custo, pensões ou complementos de reforma, material de consumo corrente, transportes e comunicações, rendas, contencioso, seguros, incluindo os de vida e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de poupança-reforma, contribuições para fundos de pensões e para quaisquer regimes complementares da segurança social;

e) Encargos com análises, racionalização, investigação e consulta; (…)

A lei, de facto, não recorta o conceito objetivo de custo ou perda apenas desenha o conceito numa vertente finalística, traduzida, tão-somente, numa certa relação de causalidade com as componentes positivas do resultado.

De todo o modo, o citado artigo 23.º do CIRC permite aferir da existência de diversos requisitos. Como predicado essencial, tem que existir um gasto económico como contraprestação da aquisição de um fator de produção, em segundo lugar, mostra-se necessário que a componente negativa da base contabilística no âmbito da atividade da empresa não esteja precludida por uma qualquer previsão legal expressa, numa terceira esteira, surgem as exigências formais que determinam a imprescindibilidade de uma idónea comprovação das componentes negativas do rendimento e por último, tem de existir um nexo de indispensabilidade entre os encargos e os proveitos para a obtenção de proveitos e/ou para a manutenção da fonte produtora.

Sendo que indispensabilidade não é sinónimo de razoabilidade. “A noção legal de indispensabilidade recorta-se, portanto, sobre uma perspectiva económico-empresarial, por preenchimento, directo ou indirecto, da motivação última de contribuição para a obtenção do lucro (...) o Fisco filtra as decisões da empresa em face do escopo da organização, quer sobre o crivo imediatístico (subsunção dos actos ao ramo ou ramos de actividade estatutariamente definida) quer, sobretudo, em função do fim mediato (obtenção de lucros através dessa actividade, com vista à sua posterior repartição entre os sócios). (...) «Reprime os actos desconformes com o escopo da sociedade, não inseríveis no interesse social, sobretudo porque não visam o lucro, mediante a preclusão da dedutibilidade fiscal dos inerentes custos[5]”.

O requisito da indispensabilidade tem sido jurisprudencialmente entendido como um conceito indeterminado de necessário preenchimento casuístico, em resultado de uma análise de perspetiva económica-empresarial, na perceção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um custo e a sua realização no interesse da empresa, atento o objeto societário do ente comercial em causa.

E nessa medida, tem sido entendido pela Jurisprudência que estão vedadas à Administração Tributária atuações que coloquem em causa o princípio da liberdade de gestão e de autonomia da vontade do sujeito passivo[6].

In casu, a decisão recorrida entendeu, como visto -e sem que mereça a censura visada- que inexistindo vínculo laboral -entenda-se de subordinação entre a entidade e o prestador de serviço M..... - não podem, por princípio, tais custos ser aceites na esfera daquela entidade, por não configurarem encargos indispensáveis à respetiva atividade, nos termos do disposto no artigo 23.º do CIRC.

Com efeito, e atendendo ao supra expendido, importa, desde já, relevar que não logra provimento a argumentação da Recorrente no sentido de que a decisão recorrida não teve em consideração o contrato de prestação de serviços, e isto porque o mesmo foi valorado, apenas não se extraindo os efeitos pretendidos pela Recorrente.

E a verdade é que a mera junção do contrato de prestação de serviços sem qualquer outro elemento que permita identificar a que título e com que intuito as viagens em contenda foram realizadas, por forma a estabelecer-se o inerente nexo com a empresa e o seu escopo societário a decisão de manutenção da correção não merece qualquer censura.

É certo que a Recorrente aduz  que tais verbas podem subsumir-se no artigo 23.º nº1, alínea d), do CIRC, porém, in casu, não nos encontramos perante verbas que possam ser apelidadas de ajudas de custo, porquanto a característica essencial das ajudas de custo é o seu carácter compensatório, visando reembolsar o trabalhador pelas despesas que foi obrigado a suportar em favor da sua entidade patronal, por motivo de deslocações ou novas instalações ao serviço desta, e a inexistência de qualquer correspectividade entre a sua perceção e a prestação de trabalho.

Mais importa, outrossim, relevar que a eventual qualificação como despesa de representação estaria, igualmente, dependente da prova e como o seu próprio nome indicia de “representação”, ou seja, prova de a sua finalidade se coadunar com a representação da sociedade visada onde ela não se encontra.

 Ora, nada tendo sido demonstrado e provado que permita percecionar a que título a viagem foi realizada, e se a mesma visava, por qualquer forma representar ou promover a atividade da Recorrente, ter-se-á de validar o juízo do Tribunal a quo.

Com efeito, atentando no probatório e no que a este particular respeita dimana, tão-só, como realidade provada o contrato de prestação de serviços (alínea L) e as faturas emitidas em nome da Recorrente (alínea M).

Note-se, inclusive, que do teor do contrato não resulta, tão-pouco, clausulado que as viagens a realizar pelo prestador estivessem a cargo da Recorrente. Aliás, o que resulta do contrato é que o mesmo receberá a quantia de €18.292,96, sem qualquer elo de vinculação e os serviços são prestados de forma totalmente independente e autónoma.

De relevar, in fine, que uma das faturas em contenda foi emitida em julho de 2002, ou seja, em data anterior à celebração do mencionado contrato, sendo, portanto, ainda mais premente a necessidade de prova da relação causal e/ou representação da empresa.

E por assim ser, improcede o recurso quanto a esta correção, mantendo-se o decidido.

Subsiste por analisar o erro de julgamento atinente, à correção respeitante ao cálculo de imposto por não aplicação da redução de 30% à taxa de IRC em relação ao volume de negócios realizados no Continente.

A AT no seu Relatório Inspetivo fundamenta a correção, aduzindo, expressamente, que “[a] quase totalidade do volume de vendas é realizado a partir do Continente, no valor de 14 093 717,84€ e que os proveitos de 14 305 527,10€, a taxa de imposto aplicável será distribuída proporcionalmente de acordo com o nº 3 do artigo 5.º do DLR 2/99/A, pelo que o sp não tem direito à redução de 30% da taxa de IRC, relativo ao volume de negócios realizados no Continente, prevista nos termos do nº1 do artigo 5º do diploma citado”.

Nessa medida, concretiza o seguinte: “[e]m relação à matéria colectável, será subdividida em duas partes, uma com o peso específico de 0.0148 correspondente às vendas realizadas nos Açores, e a outra com o peso de 0.9852 respeitantes às vendas do Continente”.

O Tribunal a quo, convocando a Jurisprudência vertida no Aresto do STA prolatado no processo nº 0645/07, de 23 de janeiro de 2008, propugnou pela manutenção da correção, porquanto no caso vertente constatando-se que a Recorrente, apesar de estar sediada nos Açores, desenvolveu a sua atividade em cerca de 98,52% no Continente, a taxa de imposto aplicável teria de ser distribuída proporcionalmente de acordo com o disposto no n.º 3 do artigo 5.º do Decreto Legislativo Regional nº 2/99-A, não tendo, por conseguinte, a Recorrente direito à redução de 30% da taxa de IRC relativamente ao volume de negócios realizados no Continente.

A Recorrente defende que o facto de ter a sua sede na Região Autónoma dos Açores é, por si só, face ao consignado no artigo 5.º, nº 2, alínea a), do Decreto Legislativo Regional, suficiente para que a redução da taxa de IRC nacional consagrada no Decreto Legislativo Regional seja aplicada, sendo essa a intenção inequívoca do legislador nacional e regional.

Mais sublinha que a distinção, prevista quer na Lei de Finanças das Regiões Autónomas e no Decreto Legislativo Regional”), entre “residentes” e “não residentes” corresponde ao critério da localização da sede ou direção efetiva, que consta do Código do IRC e da Convenção Modelo, donde, deve considerar-se como sede ou direção efetiva de acordo com o devidamente estatuído no seu contrato de sociedade.

Adensa, in fine, que as importâncias de IRC pagas são efetivamente receita da Região Autónoma dos Açores, pelo facto de a sede social da Recorrente estar localizada em Ponta Delgada, independentemente da percentagem de lucro tributável “obtido” na Região e fora dela, e isto exclusivamente por força da aplicação do critério legal da localização da sede.

Vejamos, então.

Para o efeito, importa convocar o quadro jurídico que para os autos releva.

O Decreto Legislativo Regional n.º 2/99/A, de 20 de janeiro, conforme resulta do seu preâmbulo, visou adaptar o sistema fiscal nacional à realidade das ilhas, e atenuar a carga fiscal sobre as pessoas singulares e coletivas, entendendo que tal desiderato “[é] uma exigência para garantir a melhoria das condições de vida dos que residem nos Açores e a competitividade e criação de emprego das empresas com atividade no arquipélago, que suportam os custos incontornáveis da insularidade.”

Relativamente ao IRC, consagrava o artigo 5.º do citado Decreto Legislativo Regional o seguinte:

“1 - Às taxas nacionais do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, em vigor em cada ano, é aplicada uma redução de 30%.

2 - A diminuição na taxa nacional aplica-se ao IRC:

a) Devido por pessoas coletivas ou equiparadas que tenham sede, direção efetiva ou estabelecimento estável nos Açores;

b) Devido por pessoas coletivas ou equiparadas que tenham sede ou direção efetiva em território português e possuam sucursais, delegações, agências, escritórios, instalações ou quaisquer formas de representação permanente sem personalidade jurídica próprias em mais de uma circunscrição;

c) Retido, a título definitivo, os rendimentos gerados na Região Autónoma dos Açores, relativamente às pessoas coletivas ou equiparadas que não tenham sede, direção efetiva ou estabelecimento estável em território nacional.

3 - O imposto devido nos termos da alínea b) do n.º 2 é determinado pela proporção entre o volume anual correspondente às instalações situadas nos Açores e o volume anual, total, de negócios do exercício.

4 - Na aplicação da alínea b), relativamente aos estabelecimentos estáveis de entidades não residentes, o volume de negócios efetuado no estrangeiro será imputado à Região se o estabelecimento estável, onde se centraliza a escrita, se situar nos Açores.” 

Mais consignava o artigo 80.º, nº1, do CIRC, com a redação conferida pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de dezembro que, regra gera, e ressalvadas as situações constantes nos nºs 2 a 4, a taxa do IRC cifrava-se em 30%.

Por seu turno, dispunha o artigo 13.º da Lei de Finanças das Regiões Autónomas -Lei n.º 13/98, de 24 de fevereiro de 1998, sob a epígrafe “Imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas”, que:

“1 – Constitui receita de cada Região Autónoma o imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas:

a) Devido por pessoas coletivas ou equiparadas que tenham sede, direção efetiva ou estabelecimento estável numa única Região;

b) Devido por pessoas coletivas ou equiparadas que tenham sede ou direção efetiva em território português e possuam sucursais, delegações, agências, escritórios, instalações ou quaisquer formas de representação permanente sem personalidade jurídica próprias em mais de uma circunscrição, nos termos referidos nos n.ºs 2 e 3 do presente artigo; (…)

2 - Relativamente ao imposto referido na alínea b) do número anterior, as receitas de cada circunscrição serão determinadas pela proporção entre o volume anual correspondente às instalações situadas em cada Região Autónoma e o volume anual, total, de negócios do exercício”.

Visto o direito que releva para o caso dos autos, importa regressar ao caso vertente, e responder à seguinte questão:

Desenvolvendo a Recorrente a maior parte da sua atividade, entenda-se 98,52% no Continente, e o remanescente de 1,46% na Região Autónoma dos Açores, se o critério para aplicação da redução da taxa se deve ater, tão-só, à localização, ou  ter-se-á de ter presente, também, o local efetivo em que é desenvolvida a atividade.
Neste particular, e uma vez que a questão foi tratada pelo STA no Acórdão proferido no processo nº 0645/07, de 23 de janeiro de 2008-Aresto aliás, convocado, pela decisão recorrida- e uma vez que a questão é, em tudo, similar à dos autos, tendo ainda em vista uma interpretação e aplicação uniformes do direito, em conformidade com o preceituado no artigo 8º, nº 3 do Código Civil, eximimo-nos de expender novas considerações, reproduzindo aqui o raciocínio jurídico vertido no citado Acórdão, ao qual se adere, segundo o qual:

“No caso em apreço, a recorrente socorre-se essencialmente do elemento literal de interpretação que - há-de reconhecer-se - favorece a sua tese, mas que não é determinante, como se verá.

É certo que, como vimos, no nº 2, al. a) do predito artº 5º do Decreto Legislativo Regional, se estabelece que “a diminuição na taxa nacional aplica-se ao IRC…devido por pessoas colectivas ou equiparadas que tenham sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável nos Açores”, o que parece deixar entender que basta o contribuinte ter a sua sede ou direcção efectiva nos Açores para beneficiar da redução da taxa de IRC.

Todavia, o preâmbulo do citado Decreto Legislativo, referido na sentença recorrida, elucida-nos da “ratio” e circunstâncias que presidiram à concessão de tal benefício, a saber: “Atenuar a carga fiscal sobre as pessoas singulares e colectivas é uma exigência para garantir a melhoria das condições de vida dos que residem nos Açores e a competitividade e criação de emprego das empresas com actividade no arquipélago, que suportam os custos incontornáveis da insularidade…
Os impactes orçamentais do desagravamento fiscal devem, assim, ser vistos como uma valorização da iniciativa privada…”.

Assim, concretizando o desígnio legislativo anunciado neste preâmbulo, surge com evidência que a referência que no artº 5º, nº 2, al. a) é feita à sede ou direcção efectiva das pessoas colectivas ou equiparadas só pode ser interpretada como referida à sede ou direcção efectiva das pessoas colectivas ou equiparadas que tenham a sua actividade nos Açores.

De contrário, a deslocação da sede da impugnante para os Açores não contribuía em nada para que a competitividade e criação de emprego atingissem níveis minimamente aceitáveis, o que só se consegue, como é evidente, com o exercício ali da respectiva actividade, já que e como resulta do probatório, aquela limita-se a ter a sua sede naquela ilha, não exercendo aí qualquer actividade, nem tendo sequer ficado provado que deu emprego a pessoas naturais ou residentes nos Açores, não contribuindo, também, para a melhoria das suas condições de vida.
Mas outros argumentos nos afastam dessa interpretação literal.

Com efeito, dispõe o artº 4º do citado DLR que:

“1. Às taxas nacionais do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, em vigor em cada ano, é aplicada uma redução de 15%.

2. A diminuição na taxa nacional aplica-se ao IRS:
a) Devido por pessoas singulares consideradas fiscalmente residentes nos Açores, independentemente do local em que exerçam a respectiva actividade…”.
Do cotejo dos, artºs 4º e 5º é possível retirar a seguinte ilação jurídica: enquanto no tocante ao IRS o que é relevante é o domicílio fiscal do contribuinte (citado art. 4º, 2, a) do DLR n. 2/99/A), no caso das pessoas colectivas, relevante é isso sim o montante dos negócios realizados nos Açores e na proporção entre este volume e o volume anual dos negócios da empresa (art. 5º, nºs 2, al. a) e n. 3).

O que bem se compreende.

Como é sabido, o IRS está desenhado sobre o princípio da universalidade ou do rendimento mundial, sendo sujeitos passivos, entre outras, as pessoas singulares residentes no território nacional que aí são tributadas pela totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora do território nacional – cfr. os artigos 13.º, n.º 1, e 1.º, n.º 2, do CIRS.

E é este princípio que está subjacente àquele artigo 4.º do Decreto Legislativo Regional, pelo que não estranha que “a diminuição na taxa nacional (se aplique) ao IRS devido por pessoas singulares consideradas fiscalmente residentes nos Açores, independentemente do local em que exerçam a respectiva actividade” – n.º 2, alínea a).

Já os não residentes são tributados de acordo com o princípio da territorialidade, isto é, são tributados, apenas, pelos rendimentos auferidos no território nacional.

Esta dicotomia encontra-se, também, prevista no IRC. Com efeito, nos termos do artigo 4.º do CIRC, “relativamente às pessoas colectivas e outras entidades com sede ou direcção efectiva em território português, o IRC incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território” – n.º 1 – (princípio do rendimento mundial), enquanto que – n.º 2 – “as pessoas colectivas e outras entidades que não tenham sede nem direcção efectiva em território português ficam sujeitas a IRC apenas quanto aos rendimentos nele obtidos” (princípio da territorialidade).
E, na adaptação do sistema fiscal à Região Autónoma dos Açores, operada pelo citado Decreto Legislativo Regional que, como se deixou dito, pretendeu atenuar a carga fiscal sobre as pessoas colectivas, com actividade no arquipélago, para garantir a sua competitividade e criação de emprego, a diminuição na taxa nacional de IRC, prevista no artigo 5.º, aplica-se, apenas, no domínio daquele princípio da territorialidade, isto é, aos rendimentos obtidos na região autónoma, como é notório nos n.ºs 2, alínea b), e 3.

É, pois, ao IRC que incide sobre os rendimentos derivados de “actividades no arquipélago”, que a diminuição da taxa nacional se justifica e aplica.

Sendo que, para que tal actividade seja prestada na região autónoma é necessário que as pessoas colectivas, ou equiparadas, em suma, os sujeitos passivos, aí tenham sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável – artigo 5.º, n.º 2, alínea a) – ou, tendo sucursais, delegações, agências, escritórios, instalações ou quaisquer formas de representação permanente sem personalidade jurídica próprias em mais de uma circunscrição – alínea b).

Todavia, se é certo que para serem auferidos rendimentos derivados da actividade prestada no arquipélago, é necessário que aqui exista sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável de uma pessoa colectiva, a mera existência destas não implica a existência de rendimentos sujeitos a taxa de IRC diminuída. Para tal, sempre será necessária prática (lucrativa) de uma actividade no arquipélago, pois que é a competitividade destas actividades – e o emprego por estas criado – que a diminuição da taxa visa promover.

Aliás, só em casos especiais podem os rendimentos sujeitos à diminuição da taxa nacional de IRC ser superior aos resultantes da actividade prestada na região autónoma. É o que sucede nas hipóteses do n.º 4 do mesmo artigo 5.º: “na aplicação da alínea b) (do dito n.º 2), relativamente aos estabelecimentos estáveis de entidades não residentes, o volume de negócios efectuado no estrangeiro será imputado à Região se o estabelecimento estável, onde se centraliza a escrita, se situar nos Açores”.

Ora, o recorrente não é uma entidade não residente nem teve negócios no estrangeiro. Pelo contrário, tem sede nos Açores e negócios no continente – cfr. pontos 9 e 10 do probatório. E à míngua de actividade aí prestada, não pode beneficiar da diminuição da taxa nacional de IRC, nos preditos termos.
Por outro lado, a redacção pouco articulada deste artigo 5.º não convida à sua interpretação literal.

A alínea a), do n.º 2, refere-se, expressamente, às pessoas colectivas ou equiparadas que tenham estabelecimento estável nos Açores, sem distinguir a origem dos seus titulares.

Sendo que o artigo 5.º, n.º 2, alíneas b) e c), do CIRC, manda “(incluir) na noção de estabelecimento estável, desde que satisfeitas as condições estipuladas no n.º anterior” (instalação fixa através da qual seja exercida uma actividade e de natureza comercial, industrial ou agrícola) as sucursais e escritórios.

Ora, a alínea b), do n.º 2, do artigo 5.º, do Decreto Legislativo Regional, refere-se às “pessoas colectivas ou equiparadas que tenham sede ou direcção efectiva em território português e possuam sucursais (…) (e, entre outros) escritórios (…) em mais de uma circunscrição”. Isto é, define o âmbito de aplicação da diminuição da taxa nacional de IRC aos estabelecimentos estáveis que se encontrem nos Açores e que sejam detidos por pessoas colectivas, ou equiparadas, que tenham sede ou direcção efectiva em território continental português.

E apesar de esta alínea b) se referir expressamente ao território continental português, o n.º 4 alarga o seu âmbito de aplicação “aos estabelecimentos estáveis de entidades não residentes”.

Pelo que, literalmente interpretado o artigo 5.º, as alíneas a) e b) do n.º 2 têm, no ponto, a mesma previsão!

O que, no caso, não assume proporções mais graves porque o imposto devido é sempre determinado da forma prevista no n.º 3 do dito artigo 5.º quando o sujeito passivo aufere rendimentos nos Açores e noutra circunscrição geográfica, e nos termos do n.º 1 quando o rendimento tem origem exclusiva na Região Autónoma.
Certo que o n.º 1 determina que “às taxas nacionais do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, em vigor em cada ano, é aplicada uma taxa de 30%”, sendo que esta diminuição se aplica ao IRC “devido por pessoas colectivas ou equiparadas que tenham sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável nos Açores” – n.º 2, alínea a) – e também ao IRC “devido por pessoas colectivas ou equiparadas que tenham sede ou direcção efectiva em território (continental) português e possuam sucursais, delegações, agências, escritórios, instalações ou quaisquer formas de representação permanente sem personalidade jurídica próprias em mais de uma circunscrição” – n.º 2, alínea b).

Todavia, o n.º 3, ainda que com menção expressa apenas àquela alínea b), dispõe que “o imposto devido (…) é determinado pela proporção entre o volume anual correspondente às instalações situadas nos Açores e o volume anual, total, de negócios do exercício”.

Isto é, o legislador pretendeu que apenas aos rendimentos resultantes de actividades desenvolvidas nos Açores fosse aplicável a diminuição da taxa, e não a outros, com a dita excepção prevista no n.º 4.

De outro modo, aquele n.º 3 não faria qualquer sentido: nenhuma razão se descortina para uma pessoa colectiva (maxime, uma sociedade) com sede mas sem actividade nos Açores, fosse fiscalmente beneficiada e outra que apenas aí dispusesse de mera sucursal tivesse, para o efeito, que aí ter actividade. O legislador não exarou expressamente tal necessidade no artigo 5.º, n.º 2, alínea a), porque, dado o referido desígnio legal, nem sequer pôs a hipótese de que uma pessoa colectiva, com sede nos Açores, pudesse gozar do benefício, sem aí exercer qualquer actividade.

Nos termos do predito artigo 3.º, só a sucursal que exerça actividade no arquipélago é que goza do benefício fiscal.

Em suma: se o rendimento provém exclusivamente de actividades prestadas na Região Autónoma, a taxa de IRC aplicável sofre uma diminuição de 30%, nos termos do n.º 1; se o rendimento do sujeito passivo tem origem em actividades desenvolvidas nos Açores e fora dele, aplica-se a regra do n.º 3; e se o rendimento do sujeito passivo não tem qualquer conexão com uma actividade desenvolvida no arquipélago, não é aplicável a taxa diminuída prevista no Decreto Legislativo Regional, mas a taxa normal prevista no CIRC” (Acórdão desta Secção do STA de 14/11/07, in rec. nº 644/07, prolatado em situação em tudo idêntica).
7 – Por último, constituindo o texto do artº 5º do Decreto Legislativo Regional uma transposição do artº 13º da Lei de Finanças das Regiões Autónomas, deverá este preceito legal ser entendido como aquele normativo, “estabelecendo-se aí também o critério da percentagem de negócios produzida na Região, pelo que não se vislumbra nessa interpretação qualquer derrogação dessa Lei habilitante ou violação do texto constitucional”, nomeadamente do disposto no artº 112º, nº 4.
(…) é, assim, de
concluir, como se concluiu na sentença recorrida, que apenas quando a empresa tiver a sua sede ou direcção efectiva nos Açores e aí exerça a sua actividade há lugar à redução de 30% na taxa nacional do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, em vigor em cada ano.”
Transpondo os ensinamentos supra expostos para o caso vertente, e tendo presente que, in casu, pese embora a Recorrente possuísse, à data, sede na Região Autónoma dos Açores, a verdade é que a sua atividade era, maioritariamente, entenda-se 98,52% desenvolvida no Continente -em nada relevando, neste e para este efeito o aduzido em 18 das suas conclusões-donde a redução de taxa apenas pode ser aplicada na devida proporção, ou seja, no remanescente 1,48%.
Pelo que, a decisão recorrida que assim o decidiu não merece qualquer censura, não se vislumbrado que a aludida interpretação-face à fundamentação expendida no aludido Aresto à qual se adere- possa traduzir qualquer violação de princípios constitucionais basilares, mormente, da legalidade e determinar qualquer inconstitucionalidade, de resto, realidade não devidamente substanciada pela Recorrente.


***

IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

CONCEDER PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, conforme se descreve:
· Conceder provimento relativamente à correção referente aos custos de 2001 contabilizados em 2002, revogando, nessa parte, a decisão recorrida e em consequência julgar procedente a impugnação judicial, com a consequente anulação do ato impugnado, nesse segmento;
· Manter a decisão recorrida no atinente às correções referente às viagens de M..... e bem assim à correção inerente à redução de taxa, com a consequente manutenção da decisão recorrida e do ato impugnado nessa parte.

Custas pela Recorrida e pela Recorrente, fixando-se o respetivo decaimento em 69% e 31%, respetivamente.

Registe. Notifique.


Lisboa, 13 de maio de 2021


[A Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Desembargadores Susana Barreto e Vital Lopes]

Patrícia Manuel Pires

________________________
[1] Apontamentos ao IRC, Almedina, Coimbra, 2009, pág. 64
[2] Vide, designadamente, o Acórdão do STA, proferido no processo n.º 0291/08, de 25.06.2008.
[3] in LGT anotada:3.ª edição, pp. 242, 243.
[4] Vide, designadamente, Acórdãos deste Tribunal prolatados nos processos nºs 1374/08, de 13.12.2019 e 1374/08, de 07.05.2020.
[5] TOMÁS TAVARES, «Da Relação de Dependência Parcial entre a Contabilidade e o Direito Fiscal na Determinação do Rendimento Tributável das Pessoas Colectivas: Algumas Reflexões ao Nível dos Custos», C.T.F. n.º 396, página 135
[6] Neste sentido, vide, designadamente, os Acórdão do STA, proferidos nos processos 0627/16, 1236/05, datados de 28.06.2017 e de 29.03.2006, respetivamente.