Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06488/13
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:03/19/2013
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:CITAÇÃO EM EXECUÇÃO FISCAL.
NULIDADES EM PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL.
FALTA/NULIDADE DA CITAÇÃO.
FORMALIDADES DA CITAÇÃO PESSOAL REALIZADA NOS TERMOS DOS ARTºS.191 E 192, DO C.P.P.T., NA REDACÇÃO RESULTANTE DA LEI 64-B/2011, DE 30/12.
Sumário:1. A citação é o acto pelo qual se chama a juízo o réu numa dada acção, dando-lhe conhecimento dos termos da mesma e concedendo-lhe prazo para se defender (cfr.artº.228, do C.P.Civil; artºs.35, nº.2, e 189, do C.P.P.Tributário). Actualmente, a regulamentação nuclear da matéria relativa à citação, e respectivas formalidades a respeitar, no âmbito dos processos de execução fiscal, acha-se vertida nos artºs.188 a 194, do C.P.P.T.
2. Levando em consideração o montante da dívida exequenda no âmbito do presente processo de execução fiscal e o valor da U.C. que se cifra em € 102,00, deve concluir-se que a citação do reclamante/recorrente devia ser pessoal e efectuada antes da eventual realização de quaisquer diligências de penhora de bens do executado (cfr.artº.192, nº.1, do C.P.P.T.).
3. É no artº.165, do C.P.P.Tributário que estão previstas as nulidades em processo de execução fiscal. Distintas das situações de falta de citação, que são susceptíveis de constituir casos de nulidade insanável, para efeitos deste artigo, são as situações de nulidade da citação, que ocorrem quando não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cfr.artº.198, nº.1, do C.P.C.). Estas nulidades da citação só podem ser conhecidas na sequência de arguição dos interessados, que, em sintonia com o preceituado no artº.198, nº.2, do C.P.Civil, deve ser feita no prazo que tiver sido indicado para deduzir oposição, equivalente à contestação em processo declarativo, ou, nos casos de citação edital ou quando não tiver sido indicado prazo para deduzir oposição, na primeira intervenção do citado no processo. A arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado (cfr.artº.198, nº.4, do C.P.C.), solução esta que sempre resultaria, por maioria de razão, do preceituado no artº.165, nº.1, al.a), do C.P.P. Tributário.
4. A mencionada falta de citação não ocorre apenas nos casos em que ela é omitida. Na verdade, no artº.195, do C.P.C., indicam-se várias outras situações em que se considera ocorrer falta de citação e esta norma será aplicável subsidiariamente ao processo de execução fiscal, na medida em que o que nela se dispõe não for prejudicado por normas do C.P.P.T., uma vez que não se indicam neste Código as situações em que deve entender-se ocorrer tal falta (cfr.artº.2, al.e), do C.P.P.T.).
Nos termos do referido artº.195, do C.P.C., haverá falta de citação:
a) Quando o acto tenha sido completamente omitido;
b) Quando tenha havido erro de identidade do citado;
c) Quando se tenha empregado indevidamente a citação edital;
d) Quando se mostre que foi efectuada depois do falecimento do citando ou da extinção deste, tratando-se de pessoa colectiva ou sociedade;
e) Quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do acto, por facto que não lhe seja imputável (cfr.artº.190, nº.6, do C.P.P.T.).
5. Nos termos do artº.192, nºs.2 e 3, do C.P.P.T., na redacção aplicável ao caso “sub judice” e resultante da Lei 64-B/2011, de 30/12, a citação pessoal do executado considera-se efectuada mediante o envio de duas cartas registadas com aviso de recepção para o seu domicílio fiscal, ressalvando-se a hipótese de o citando fazer prova da impossibilidade de comunicação da alteração do seu endereço fiscal.


O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
A..., com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Sintra, exarada a fls.56 a 69 do presente processo, através da qual julgou improcedente a reclamação de acto do órgão de execução fiscal deduzida pelo reclamante/recorrente, no âmbito do processo de execução fiscal nº.1503-2011/130805.0 que corre seus termos no 1º. Serviço de Finanças de Cascais, visando despacho que indeferiu pedido de arguição de nulidade da citação formulado no âmbito do citado processo executivo.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.74 a 84 dos autos) do recurso articulando as seguintes Conclusões:
1-Os avisos de recepção referidos em 2 e 4 do probatório, não foram assinados, tendo os ofícios “citação” sido devolvidos ao remetente, com as indicações “Objecto não reclamado” e “Não reclamado”, conforme 3 e 5, da matéria de facto da sentença recorrida;
POR ISSO
2-Não pode considerar-se a citação do executado A... efectuada;
E
3-Não é aqui aplicável “a al.b), do nº.2, do artº.233, do CPC”, uma vez que não foi dado cumprimento ao estipulado no nº.5, do artº.237-A, do Código de Processo Civil;
E DE FACTO
4-Não se mostra cumprido o formalismo previsto naquele normativo;
TODAVIA
5-Tal regime é apenas para os casos de domicílio convencionado em contrato reduzido a escrito, como se refere na epígrafe e no nº.1, do preceito citado;
6-Nos outros casos em que há lugar a citação postal aplica-se apenas o regime do artº.236, do Código de Processo Civil;
7-E conforme consta do probatório, está-se perante situação em que foram remetidas duas cartas registadas com aviso de recepção ao executado A... para citação para a execução fiscal, as quais foram devolvidas simplesmente com as menções de “Objecto não reclamado” e “Não reclamado”;
OU SEJA
8-As cartas remetidas não foram entregues ao seu destinatário, nem a terceiro, nos termos dos nºs.2, 3 e 4 do artº.236, do Código de Processo Civil, nem ele as reclamou;
PELO QUE
9-A única via de efectuar a sua citação seria a de contacto directo com o citando, uma vez que não é aqui aplicável o regime do depósito previsto no artº.237-A, do Código de Processo Civil, o qual apenas é aplicável nos casos especiais de obrigações emergentes de contratos em que tenha sido convencionado o domicílio;
10-Como tal não sucedeu, a citação pessoal não se pode, pois, considerar efectuada;
DO MESMO MODO
11-Não são aplicáveis ao caso sujeito os artºs.193 e 194, do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
POIS
12-O (s) expediente (s) postal (ais) foi (ram) devolvido (s) e não se trata de citando não encontrado, até porque não foram feitas diligências para o encontrar ou pelo menos, nada consta do probatório;
ENTÃO
13-Deveria ter sido tentada citação, nomeadamente através de contacto pessoal de funcionário;
PELO QUE
14-Temos que considerar que o A... não foi citado para a execução fiscal e proceder ao pagamento da dívida exequenda ou, querendo, requerer o pagamento em prestações, a dação em pagamento ou, ainda, opor-se à execução;
15-A Administração Tributária ao proceder às penhoras referidas em 6 e 7, da da matéria de facto da sentença recorrida antes de ser efectuada validamente a citação do reclamante/executado, violou o artº.188, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que estabelece que, instaurada a execução, “o órgão da execução fiscal ordenará a citação do executado” e com isso, praticou um acto ilícito;
16-Se as penhoras tivessem sido precedidas de citação (como decorre da lei), o A... teria tido a virtualidade de evitar a sua realização: o executado pode pagar a dívida (ou deduzir oposição ou requerer pagamento em prestações ou dação em pagamento) no prazo de 30 dias subsequentes à citação (artº. 203, nº.1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário), só se procedendo à penhora findo esse prazo, conforme artº.189, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que estipula que a citação deveria comunicar ao devedor “os prazos para oposição à execução e para requerer o pagamento em prestações ou a dação em pagamento” e os artigos do Código de Procedimento e de Processo Tributário que podem levar à suspensão da instância;
17-Aquelas penhoras estão feridas de ilegalidade, por ilícitas;
TAMBÉM
18-A falta de citação do executado A... implica a nulidade de todos os actos posteriormente praticados (artºs.195, nº.1, al.a) e 194, al.a), ambos do Código de Processo Civil, aplicáveis subsidiariamente, nos termos da al.e), do artº.2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário);
19-TERMOS EM QUE E SEMPRE COM O SÁBIO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVE JULGAR-SE PROCEDENTE O RECURSO E CONSEQUENTEMENTE, REVOGAR-SE A SENTENÇA RECORRIDA E SUBSTITUIR-SE POR OUTRA QUE CONSIDERE A CITAÇÃO DO EXECUTADO CARLOS JOSÉ SANCHO RODRIGUES COSTA NÃO EFECTUADA, E QUE AS PENHORAS ESTÃO FERIDAS DE ILEGALIDADE, POR ILICÍTAS.
TAMBÉM
IMPLICA A NULIDADE DE TODOS OS ACTOS POSTERIORMENTE PRATICADOS.
DECIDINDO EM CONFORMIDADE FARÃO VOSSAS EXCELÊNCIAS SERENA, SÃ E OBJECTIVA JUSTIÇA.
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr.fls.82 dos autos) no sentido de se negar provimento ao recurso e manter-se a decisão recorrida.
X
Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr.artº.707, nº.4, do C.P.Civil; artº.278, nº.5, do C.P.P.T.), vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.61 a 64 dos autos):
1-Em 6/12/2011, foi instaurado no 1º. Serviço de Finanças de Cascais, contra A..., o processo de execução fiscal (PEF) nº.1503-2011/130805.0, para cobrança de I.R.S., do ano de 2007, no montante de € 140.531,72 (cfr.documentos juntos a fls.1 e 2 do processo de execução apenso);
2-No âmbito do processo de execução fiscal referido no nº.1, foi em 11/01/2012 remetida ao ora reclamante, o ofício “citação”, mediante registo com aviso de recepção (registo nº. RC 9068 2708 5 PT), constando no campo relativo à “Identificação do executado” o seguinte: “A..., R. DOM JOSÉ DE AVILEZ 3F 1-A - 2750 CASCAIS”, e no campo “Objecto e Função da Citação” que, “Fica por este meio citado(a), nos termos dos artigos 189 e 190 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), de que foi instaurado neste Serviço de finanças o processo de execução fiscal à margem referido, para cobrança da dívida supra identificada. No prazo de 30 dias após a presente citação, deverá proceder ao pagamento da dívida exequenda e acrescido. No mesmo prazo poderá requerer a dação em pagamento, nos termos do artigo 201 do CPPT, ou deduzir oposição, com os fundamentos previstos no artigo 204 do CPPT. Até à marcação da venda dos bens penhorados poderá, ainda, requerer o pagamento em prestações, nos termos do artigo 196 do CPPT.
Decorrido o prazo antes referido sem que a dívida exequenda e acrescido tenham sido pagos, ou tenha sido prestada garantia que suspenda a execução, nos termos dos artigos 169 e 199 do CPPT, prosseguirá o processo com a penhora de bens ou direitos existentes no seu património, de valor suficiente para a cobrança da dívida, conforme valor supra indicado.” (cfr.documentos juntos a fls.3 a 7 do processo de execução apenso);
3-O ofício “citação” referido no nº.2 foi devolvido ao remetente em 23/01/2012, com a indicação “Objecto não reclamado” (cfr.documento junto a fls.5 do processo de execução apenso);
4-Em 25/01/2012 foi remetida ao ora reclamante, o ofício “2ª. citação”, mediante registo com aviso de recepção (registo n° RC 7881 4635 5 PT), com o mesmo teor do ofício citação referido no nº.2, constando ainda o seguinte:
Artigo 192, nº.2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)
Nº.2 - No caso de a citação pessoal ser efectuada mediante carta registada com aviso de recepção e este vier devolvido ou não vier assinado o respectivo aviso por o destinatário ter recusado a sua assinatura ou não ter procedido, no prazo legal, ao levantamento da carta no estabelecimento postal e não se comprovar que o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio ou sede fiscal, nos termos do artigo 43.°, é repetida a citação, enviando-se nova carta registada com aviso de recepção ao citando, advertindo-o da cominação prevista no número seguinte.
Nº.3 - A citação considera-se efectuada, quando nos termos do artigo 192, nº.2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8º. dia posterior a essa data, presumindo-se que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados, sem prejuízo de fazer prova da impossibilidade de comunicação da alteração do seu domicílio ou sede.” (cfr.documentos juntos a fls.8 a 13 do processo de execução apenso);
5-O ofício “2ª. citação” referido no nº.4 foi devolvido ao remetente em 6/02/2012, com a indicação “Não reclamado” (cfr.documento junto a fls.11 do processo de execução apenso);
6-Consta do cadastro fiscal do ora reclamante o seguinte endereço: R. DOM JOSÉ DE AVILEZ 3F 1-A - 2750-398 CASCAIS (cfr.documento junto a fls.14-A do processo de execução apenso);
7-Em 5/05/2012 foi remetido ao ora reclamante o ofício “Notificação de Penhora/Citação Pessoal”, mediante registo com aviso de recepção (registo nº. RQ 245722406 PT), onde consta o seguinte:
“Nos termos do artigo 864º do Código de Processo Civil (CPC), pela presente fica notificado da penhora do imóvel abaixo identificado, efectuada por este Serviço de finanças (838° do CPC e do artigo 231° do CPPT) no processo de execução fiscal abaixo identificado, que corre aqui termos para cobrança da respectiva dívida, ficando nomeado na qualidade de fiel depositário (233° do CPPT e 843° do CPC).
Poderá, querendo, apresentar reclamação para o Tribunal Administrativo e fiscal (276° do CPPT) no prazo de 10 dias a contar da presente notificação.
Caso não tenha sido anteriormente deverá então considerar-se citado no âmbito do processo executivo abaixo identificado, devendo, no prazo de 30 dias a contar da presente citação, proceder ao pagamento da dívida exequenda e acréscimos legais ou, querendo, requerer o pagamento em prestações se legalmente aplicável (196° CPPT), a dação em pagamento (201° CPPT), ou ainda deduzir oposição judicial (203º e 204º CPPT).
Decorrido aquele prazo, sem que tenha sido efectuado o referido pagamento, nem tenha sido deduzida oposição judicial com prestação de garantia (169° CPPT), proceder-se-á à venda coerciva do imóvel, sendo o montante resultante da mesma, aplicado no processo de execução fiscal em causa, podendo ainda vir a ser incluído na lista de contribuintes devedores sujeita a divulgação pública (...).”
Elementos da penhora efectuada
Identificação do Imóvel
Data da penhora
DISTRITO: 11 - LISBOA CONCELHO: 05-CASCAIS FREGUESIA: 03 CASCAIS TIPO: URBANO ARTIGO: 7022 FRACÇÃO: EX
2012-04-23
(cfr.documento junto a fls.22 do processo de execução apenso);

8-Em 5/05/2012 foi remetido ao ora reclamante o ofício “Citação Pessoal”, mediante registo com aviso de recepção (registo nº. RQ 245753690PT), onde consta o seguinte:
“Pela presente fica citado/notificado, nos termos do nº2 do artigo 193 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e do artigo 864 do Código de Processo Civil (CPC), da penhora efectuada por este Serviço de finanças no processo de execução fiscal abaixo identificado, que corre aqui termos, para cobrança da respectiva dívida.
Poderá, querendo, apresentar reclamação para o Tribunal Administrativo e Fiscal, nos termos do 276º do CPPT, no prazo de 10 dias a contar da presente citação/notificação. Caso ainda não tenha sido realizada anteriormente à citação, deverá, no prazo de 30 dias a contar da presente citação, proceder ao pagamento da dívida exequenda e acrescido (...)
Decorrido o prazo de 30 dias acima referido, sem que a dívida exequenda e o acrescido tenham sido pagos, nem tenha sido deduzida oposição, prosseguirá a execução da penhora (...).”
Elementos da penhora efectuada
Activo penhorado
Data da Penhora
Entidade
Valor Penhorado
Valores mobiliários e contas bancárias
2012-03-26
BANCO COMERCIAL PORTUGUÊS SA
€ 37.141,12
(cfr.documento junto a fls.23 do processo de execução apenso);

9-Os ofícios referidos em 7 e 8 foram recebidos pelo reclamante em 18/05/2012 (cfr.documentos juntos a fls.17 do processo de execução apenso; factualidade admitida no artº.7 da p.i. que o originou o presente processo).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “… Inexistem factos não provados com interesse para a decisão da causa…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…O Tribunal considerou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e constantes do processo de execução fiscal, bem como o posicionamento assumido pelas partes nos seus articulados…”.
X
Levando em consideração que a factualidade em análise nos presentes autos se baseia em prova documental, este Tribunal julga provados mais os seguintes factos que se reputam relevantes para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.712, nºs.1, al.a), e 2, do C. P. Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
10-Na p.i. que originou os presentes autos o reclamante/recorrente formula os seguintes pedidos no final (cfr.articulado junto a fls.5 a 13 dos presentes autos):
a)Que a reclamação deve subir imediatamente;
b)Que a A. Fiscal deve comprovar se houve algum tipo de citação no processo de execução fiscal;
c)Que devem ser anuladas as penhoras efectuadas ao reclamante.
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida, depois de decidir pela subida e conhecimento imediato da reclamação, julgou a mesma improcedente, mais mantendo os actos reclamados.
X
Antes de mais, refere-se que são as conclusões das alegações do recurso que, como é sabido, definem o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.684 e 685-A, do C.P.Civil; António Santos Abrantes Geraldes, Recurso em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, 2008, Almedina, pág.89 e seg.; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.41).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em síntese e como supra se alude, que os avisos de recepção referidos em 2 e 4 do probatório, não foram assinados, tendo os ofícios “citação” sido devolvidos ao remetente, com as indicações “Objecto não reclamado” e “Não reclamado”. Que não pode considerar-se a citação do executado A... efectuada. Que as cartas remetidas não foram entregues ao seu destinatário, nem a terceiro, nos termos dos nºs.2, 3 e 4, do artº.236, do Código de Processo Civil, nem ele as reclamou. Que deveria ter sido tentada a citação, nomeadamente através de contacto pessoal de funcionário. Que a falta de citação do executado A... implica a nulidade de todos os actos posteriormente praticados, sendo que as penhoras estão feridas de ilegalidade (cfr.conclusões 1 a 18 do recurso), com base em tais alegações pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão recorrida sofre de tal pecha.
Constituindo o acervo normativo jurídico-tributário um ramo próprio do direito público, o legislador previu um processo de execução fiscal primordialmente direccionado à cobrança dos créditos tributários de qualquer natureza, estruturado em termos mais simples do que o processo de execução comum, com o objectivo de conseguir uma maior celeridade na cobrança dos citados créditos, recomendada pelas finalidades de interesse público das receitas que através dele são cobradas (cfr.Jorge Lopes de Sousa, Código do Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 5ª. edição, II Volume, Áreas Editora, 2007, pág.20 e seg.).
A citação é o acto pelo qual se chama a juízo o réu numa dada acção, dando-lhe conhecimento dos termos da mesma e concedendo-lhe prazo para se defender (cfr. artº.228, do C.P.Civil; artºs.35, nº.2, e 189, do C.P.P.Tributário).
É no artº.165, do C.P.P.Tributário que estão previstas as nulidades em processo de execução fiscal. Distintas das situações de falta de citação, que são susceptíveis de constituir casos de nulidade insanável, para efeitos deste artigo, são as situações de nulidade da citação, que ocorrem quando não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cfr.artº.198, nº.1, do C.P.C.). Estas nulidades da citação só podem ser conhecidas na sequência de arguição dos interessados, que, em sintonia com o preceituado no artº.198, nº.2, do C.P.Civil, deve ser feita no prazo que tiver sido indicado para deduzir oposição, equivalente à contestação em processo declarativo, ou, nos casos de citação edital ou quando não tiver sido indicado prazo para deduzir oposição, na primeira intervenção do citado no processo. A arguição só é atendida se a falta cometida puder prejudicar a defesa do citado (cfr.artº.198, nº.4, do C.P.C.), solução esta que sempre resultaria, por maioria de razão, do preceituado no artº.165, nº.1, al.a), do C.P.P. Tributário (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, pág.107 e seg.; Carlos Paiva, O Processo de Execução Fiscal, Almedina, 2008, pág.193 e seg.; ac.T.C.A.Sul, 6/2/2007, proc.1065/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/7/2012, proc.5763/12).
No entanto, a mencionada falta de citação não ocorre apenas nos casos em que ela é omitida. Na verdade, no artº.195, do C.P.C., indicam-se várias outras situações em que se considera ocorrer falta de citação e esta norma será aplicável subsidiariamente ao processo de execução fiscal, na medida em que o que nela se dispõe não for prejudicado por normas do C.P.P.T., uma vez que não se indicam neste Código as situações em que deve entender-se ocorrer tal falta (cfr.artº.2, al.e), do C.P.P.T.).
Nos termos do referido artº.195, do C.P.C., haverá falta de citação:
a) Quando o acto tenha sido completamente omitido;
b) Quando tenha havido erro de identidade do citado;
c) Quando se tenha empregado indevidamente a citação edital;
d) Quando se mostre que foi efectuada depois do falecimento do citando ou da extinção deste, tratando-se de pessoa colectiva ou sociedade;
e) Quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do acto, por facto que não lhe seja imputável (cfr.artº.190, nº.6, do C.P.P.T.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.136).
Presentemente, a regulamentação nuclear da matéria relativa à citação, e respectivas formalidades a respeitar, no âmbito dos processos de execução fiscal, acha-se vertida nos artºs.188 a 194, do C.P.P.T. (cfr.artºs.272 a 278, do anterior C.P.Tributário).
No artº.191, nºs.1 e 2, do C.P.P.T., prevê o legislador a forma de citação através de postal, registado ou não, consoante o valor da execução em causa for ou não superior a dez U.C., mais se fixando em 250 U.C. o limite para além do qual a citação tem de ser pessoal, tal como nos casos de efectivação de responsabilidade subsidiária (cfr.artº.191, nº.3, do C.P.P.T.).
Voltando ao caso concreto, atento o montante da dívida exequenda no âmbito do processo de execução fiscal nº.1503-2011/130805.0 (cfr.nº.1 do probatório) e o valor da U.C. que se cifra em € 102,00, deve concluir-se, como na sentença recorrida, que a citação do reclamante/recorrente devia ser pessoal no âmbito do mesmo processo executivo e efectuada antes da eventual realização de quaisquer diligências de penhora de bens do executado (cfr.artº.192, nº.1, do C.P.P.T.).
Assim sendo, igualmente se deve referir que consagra o artº.192, nºs.2 e 3, do C.P.P.T., na redacção aplicável ao caso “sub judice” (resultante da Lei 64-B/2011, de 30/12), o seguinte:
Artigo 192.º
(Citações pessoal e edital)
(…)
2 - No caso de a citação pessoal ser efectuada mediante carta registada com aviso de recepção e este vier devolvido ou não vier assinado o respectivo aviso por o destinatário ter recusado a sua assinatura ou não ter procedido, no prazo legal, ao levantamento da carta no estabelecimento postal e não se comprovar que o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio ou sede fiscal, nos termos do artigo 43.º, é repetida a citação, enviando-se nova carta registada com aviso de recepção ao citando, advertindo-o da cominação prevista no número seguinte.
3 - A citação considera-se efectuada, nos termos do artigo anterior, na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados, sem prejuízo de fazer prova da impossibilidade de comunicação da alteração do seu domicílio ou sede.
(…)
Revertendo ao caso dos presentes autos, atenta a matéria de facto provada (cfr.nºs.2 a 5 do probatório), a A. Fiscal efectuou a citação pessoal do executado nos termos previstos nos citados nºs.2 e 3, do artº.192, do C.P.P.T., assim tendo operado a presunção de conhecimento dos elementos constantes da mesma nos termos do nº.3 do preceito em exegese (e refira-se que não são de aplicar, subsidiariamente e contrariamente ao que defende o recorrente, ao caso concreto as normas sobre citação pessoal constantes do C.P.Civil, dado que existe normativo específico previsto no C.P.P.T.).
Após, decidiu a A. Fiscal avançar para a penhora de bens nos termos do artº.194, nº.3, do mesmo diploma, igualmente levando a cabo nova citação pessoal do executado depois da penhora, como resulta deste preceito, o qual remete para os procedimentos previstos no artº.193, nº.2, do C.P.P.T. (cfr.nºs.7 a 9 do probatório).
Atento tudo o referido, deve concluir-se que não nos encontramos, manifestamente, perante situação de falta de citação/nulidade da citação(1) nos termos expostos supra, sendo legais as penhoras realizadas pela Fazenda Pública e identificadas no probatório (cfr.nºs.7 e 8 do probatório), pelo que não pode vingar a tese do recorrente de que se verifica a falta da sua citação (e consequente nulidade de todos os actos posteriormente praticados no processo executivo) para o processo de execução fiscal nº.1503-2011/130805.0, visto que tal acto se realizou de acordo com os requisitos consagrados na lei processual aplicável ao caso “sub judice”.
Finalizando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão.
X
DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o reclamante/recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 19 de Março de 2013



(Joaquim Condesso - Relator)

(Lucas Martins - 1º. Adjunto)


(Aníbal Ferraz - 2º. Adjunto)





1- (recorde-se que qualquer destes vícios, para ser procedente, implica que possa prejudicar a defesa do interessado o que no caso presente de todo não acontece - cfr.artº.165, nº.1, al.a), do C.P.P.T.; artº.198, nº.4, do C.P.C.).