Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1486/19.5BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:01/30/2020
Relator:JORGE PELICANO
Descritores:AUDIÊNCIA PRÉVIA;
PRAZO;
EMISSÃO DE CERTIDÃO.
Sumário:I. O procedimento administrativo previsto no n.º 4 do art.º 6.º da Lei da Tutela Administrativa não tem natureza sancionatória.
II. A contagem do prazo de trinta dias aí previsto para os interessados apresentarem alegações e juntarem documentos, inicia-se na data em que é facultado o P.A. para consulta.
III. O pedido de certidão de teor do P.A. não suspende nem interrompe tal prazo.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul.

*
A........, Bastonária da Ordem dos Enfermeiros, vem reclamar para a conferência da decisão sumária proferida pelo relator, que julgou improcedente o recurso por ela interposto da sentença proferida pelo TAC de Lisboa no âmbito da presente acção de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, que havia julgado improcedente o pedido de intimação do Ministério da Saúde a contar o prazo de trinta dias concedido à Recorrente para se pronunciar sobre o relatório da sindicância efectuada à Ordem dos Enfermeiros, a partir da data em que a Recorrente foi notificada da certidão das 835 folhas que constituem o P.A.
No recurso que interpôs da sentença do TAC de Lisboa, apresentou as seguintes conclusões:
“a) Foi pedido que o Recorrido fosse intimado a que o prazo de trinta dias previsto no artigo 6.º, n.º 4, da LTAL, se iniciasse com a notificação à Recorrente de cópia das 835 folhas que constituem o processo que culminou no relatório final de sindicância, o qual propunha a dissolução do órgão a que a Recorrente preside e, por isso, a extinção do seu mandato como Bastonária da OE;

b) Entendeu o Tribunal a quo que o direito vertido em tal preceito era um mero direito de participação sem a natureza de direito fundamental; Porém,

c) Tal acto foi praticado na sequência de um processo de sindicância, que lhe foi prévio e, de acordo com o iter legalmente prescrito, situa-se antes do acto final, no qual a Ministra da Saúde decide “se for caso disso”, propor ao Ministério Público que impetre acção de dissolução do órgão ou a perda de mandato; Ou seja,

d) Trata-se de um acto inserto num procedimento em que há um risco de agressão a um interesse pessoal do arguido em razão do seu comportamento, o que qualifica o procedimento como sancionatório. Pelo que,

e) O acto pelo qual a lei determina que o sujeito passivo contradite tal pretensão insere-se no direito fundamental de audiência e defesa – artigo 23.º, n.º 10 da CRP;

f) Pelo que, ao entender de forma diversa, violou a sentença a quo tal preceito constitucional e, ainda, os artigos 17.º e 18.º ad CRP e o artigo 109.º, n.º 1, do CPTA. Acresce que,

g) Nem o artigo 6.º, n.º 4, da LTAL nem nenhum outro preceito legal, restringem a obrigatoriedade de notificação a apenas uma das peças do processo, designadamente o relatório final. E,

h) De acordo com a notificação tal peça, que, aliás, amiúde se refere ao restante conteúdo dos autos foi proferido no âmbito de um processo com 825 folhas. De onde,

i) O direito de defesa impõe que o início da contagem do prazo de 30 dias se faça a partir do momento em que a totalidade do processo seja facultada ao sujeito passivo.

j) Trata-se, aliás, de uma situação análoga à referida nos artigos 219.º, n.º 3, 227.º, n.º 1, 191.º, n.ºs 1 e 2 e 192.º do CPC em matéria de citação e que apenas exprime o princípio de que o prazo para a defesa deve contar-se a partir do momento em que ao sujeito passivo é notificada a totalidade da matéria acusatória;

k) Pelo que também assim foram violados os artigos 32.º, n.º 1, 17.º e 18.º da CRP; “.

O Recorrido apresentou contra-alegações em que, em síntese, defendeu:
- a inadmissibilidade do recurso por inutilidade objectiva, por a Recorrente já ter exercido no procedimento o direito de defesa que alega, ao ter apresentado no dia 13/09/2019 a correspondente resposta, tendo o procedimento de sindicância sido remetido para o Ministério Público no dia 14/10/2019;
- a impropriedade da acção utilizada por não estar em causa qualquer direito, liberdade ou garantia titulado pela requerente merecedor de protecção. Defende a inexistência de qualquer lesão jus-fundamental da Recorrente por a audição desta se enquadrar dentro de um sub-procedimento previsto nos n.ºs 4, 5 e 6 do artigo 6.º da Lei da Tutela Administrativa, que, diz, não funciona como garantia do direito de defesa de pendor sancionatório previsto no n.º 10 do artigo 32.º da CRP, mas apenas como mera refração de um direito de audiência de natureza administrativa, que emerge do n.º 5 do art.º 267.º da CRP;
e, a título subsidiário,
- a improcedência do recurso por a Recorrente ter sido notificada do Relatório elaborado pela IGAS na sequência da realização das diligências instrutórias e ainda ter sido disponibilizada a consulta de todo o acervo documental produzido pela IGAS, num conjunto de 5 volumes e 825 folhas, para além de que foi emitida a certidão integral de todos esses documentos, requerida pela Recorrente.

A Recorrente veio responder à matéria excepcionada, defendendo a sua improcedência, reafirmando que está em causa o exercício do direito de defesa no âmbito de um procedimento que tem natureza sancionatória e que o prazo de trinta dias que lhe foi concedido para se pronunciar apenas se pode contar a partir da data em que recebeu a certidão com os documentos que integram o P.A..
Alegou ainda que a Resposta por ela já apresentada no procedimento não corresponde ao exercício pleno do direito de defesa, por ter apresentado a defesa em prazo exíguo, não tendo podido aprofundar matérias, designadamente juntando mais prova, nem tendo tido possibilidade de exercer defesa sobre matérias constantes da certidão que lhe foi entregue e sem que lhe fossem entregues em suporte digital, um CD e uma pen, cuja existência tomou conhecimento com a certidão que lhe foi entregue.

Foi cumprido o disposto no art.° 146.° do CPTA.

*
Foi proferida decisão sumária que decidiu que não se verifica a inutilidade superveniente da lide, que o meio processual utilizado é o próprio e julgou ainda o recurso improcedente, mantendo a sentença recorrida, por esta não sofrer do erro de julgamento que lhe é imputado ao não ter intimado o Ministério da Saúde a contar o prazo de trinta dias concedido à ora Reclamante a partir da data em que foi notificada da certidão das 835 folhas que constituem o P.A..
Na reclamação que ora apresenta para a conferência, a Reclamante vem insurgir-se contra o decidido, na parte em que se entendeu que a sentença recorrida não sofre do apontado erro de julgamento.
O Recorrido, na resposta que apresentou, veio dar por reproduzidas as contra-alegações anteriormente formuladas.

Objecto da reclamação.
Conforme se decidiu no ac. deste TCAS, datado de 01/06/2017, proferido no âmbito do proc.º n.º 72/10.0BELSB, “no regime do artº 652º nº 1 c) e nº 3 ex vi 656º CPC a reclamação para a conferência da decisão sumária proferida apenas pelo relator faz retroagir o conhecimento, em conferência, do mérito da apelação ao momento anterior àquela decisão sumária, limitado às questões especificadas pelo recorrente nas conclusões de recurso, sem prejuízo da faculdade de restringir na reclamação o objecto recursório anteriormente definido, cfr.artº 635º nº 4 CPC.”


Há, assim, que decidir se a sentença recorrida sofre de erro de julgamento, por não ter intimado o Ministério da Saúde a contar o prazo o prazo de trinta dias concedido à Recorrente a partir da data em que esta foi notificada da certidão das 835 folhas que constituem o P.A..
*
Fundamentação.
De facto.
Na sentença recorrida foi fixada a seguinte matéria de facto, que não foi impugnada:
a) Em 31.01.2016, A........ tomou posse do cargo de Bastonária da Ordem dos Enfermeiros Portugueses (cfr. documento n.º1 junto aos autos com a petição inicial, que se dá aqui por integralmente reproduzido).
b) Por despacho de 16.04.2019, da Ministra da Saúde foi instaurado, nos termos do n.º1 do artigo 230.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, um processo de sindicância à Ordem dos Enfermeiros (cfr. documento n.º2 junto aos autos com a petição inicial, que se dá aqui por integralmente reproduzido).
c) Em 01.08.2019, o Conselho Directivo da Ordem dos Enfermeiros, A/c de A….., Bastonária e Presidente do Conselho Directivo da Ordem dos Enfermeiros foi notificada de ofício, relativo à sindicância efectuada pela IGAS, no âmbito do processo n.º 1/2019-SND, com o seguinte teor: «(…) em cumprimento do disposto no n.º 4 do artigo 6.º da Lei n.º 27/96, de 1 de Agosto, na sua redacção actual, aplicável por força dos n.ºs 4 e 8 do artigo 45.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de Janeiro, encarrega-me a Senhora Ministra da Saúde, por seu despacho exarado a 31/07/2019, de notificar V/Exa. na qualidade de Presidente do Conselho Directivo da Ordem dos Enfermeiros, do Relatório n.º 94/2019, de 15/07/2019, cuja cópia devidamente autenticada se envia, em anexo ao presente ofício, e que foi elaborado pela Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS), no âmbito da sindicância efectuada a essa Ordem Profissional através do Processo n.º 1/2019-SND.
Nessa medida, verificando-se que no mencionado Relatório se encontram identificadas situações susceptíveis de fundamentar a dissolução do órgão a que V/Exa. preside, mais se notifica o Conselho Directivo da Ordem dos Enfermeiros para, querendo, apresentar por escrito, no prazo de trinta (30) dias, as alegações tidas por convenientes, juntando os documentos que considere relevantes.
Por fim, informa-se, ainda, que os autos do identificado processo, constituído por cinco (5) volumes, num total de oitocentas e vinte e cinco (825) folhas, se encontram disponíveis para consulta, junto da Secretaria-Geral do Ministério da Saúde, sita na (…), nos dias úteis (de 2.ª a 6.ª-feira) e no respectivo período de atendimento (das 9h30m às 13h00 e das 14h00 às 16h30m)» (cfr. documento junto aos autos com a petição inicial, que se dá aqui por integralmente reproduzida).
d) Por requerimento datado de 01.08.2019, A........, na qualidade de Bastonária da Ordem dos Enfermeiros, tendo sido notificada do ofício referente ao processo n.º 149/2019, solicitou à Ministra da Saúde a emissão de certidão de todo o processo “para que o possa analisar e fazer analisar por peritos abalizados, sem os limites que lhe são impostos no âmbito do direito de consulta” e “atento o disposto no artigo 32.º, n.º 10, da CRP e de forma a garantir o direito de defesa na sua plenitude, se determine que o prazo de 30 dias se inicie da data em que lhe seja entregue a certidão do ora requerido” (cfr. documento junto aos autos com a petição inicial, que se dá aqui por integralmente reproduzido).
e) Através de requerimento datado de 07.08.2019, dirigido à Ministra da Saúde A........, na qualidade de Bastonária da Ordem dos Enfermeiros, insistiu pela resposta ao requerido a 01.08.2019 (cfr. documento junto aos autos com a petição inicial, que se dá aqui por integralmente reproduzido).
f) Por ofício n.º 030.10.02/2019, o Gabinete do Ministério da Saúde informou A........ que: «Por referência ao assunto em epígrafe e na sequência de V. requerimento, datado de passado dia 01/08/2019 e remetido a este Gabinete, através de mensagem de correio electrónico e de ofício com a referência SAI-OE/2019/7204, ambos daquela mesma data, encarrega-me o Senhor Secretário de Estado Adjunto e da Saúde, por seu despacho exarado em 07 de Agosto de 2019, em substituição da Senhora Ministra da Saúde, de notificar V/Exa. do seguinte:
i) Relativamente ao pedido de emissão de certidão do processo n.º 1/2019-SND referente à sindicância efectuada pela Inspecção-Geral das Actividades de Saúde (IGAS), foi o mesmo encaminhado para a Secretária-Geral do Ministério da Saúde, para tratamento subsequente.
(ii) Quanto ao pedido referente ao início do prazo de trinta (30) dias concedido – através do N. ofício com a referência MS S4024/2019, do passado dia 31.07.2019 – para apresentação de alegações escritas e junção de documentos considerados relevantes, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 6.º da Lei n.º 27/96, de 1 de Agosto, na sua redacção actual, aplicável por força dos n.os 4 e 8 do artigo 45.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de Janeiro, foi o mesmo indeferido, por não se encontrarem legalmente previstas quaisquer circunstâncias que suspendam ou interrompam a sua contagem, assim como por não estar o invocado exercício pleno da garantia prevista no n.º 10 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa dependente, in caso, das regras aplicáveis à contagem do referido prazo, nos termos do Código de Procedimento Administrativo.» (cfr. documento junto aos autos com a petição inicial, que se dá aqui por integralmente reproduzido).
g) Por ofício datado de 08.08.2019, a Secretaria-Geral do Ministério da Saúde informou a Bastonária da Ordem dos Enfermeiros que para proceder à emissão de certidão deveria proceder ao pagamento do valor de €211,25; tendo nessa mesma data sido efectuada a respectiva transferência bancária (cfr. documentos juntos aos autos com a petição inicial, que se dá aqui por integralmente reproduzido).
h) Em 12.08.2019, a Assistente Técnica da Secretaria-Geral do Ministério da Saúde enviou o seguinte email (cfr. fls. 132 e 133 do processo administrativo junto aos autos com a contestação, que aqui se dá por integralmente reproduzido):
“(texto integral no original; imagem)”

i) Em 13.08.2019, deu entrada neste Tribunal de petição inicial, que deu origem aos presentes autos (cfr. fls. dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidas).

Nos termos do art.º 662.º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 140.º, n.º 3 do CPTA, aditam-se os seguintes factos à matéria provada:
i) Em 13/09/2019, a Recorrente apresentou alegações no procedimento, nos termos previstos no n.º 4 do art.º 6.º da Lei de Tutela Administrativa – doc. de fls. 383 do SITAF;
j) Em 14/10/2019, foi determinada a remessa do processo administrativo para o M.P. – doc. de fls. 450 do SITAF;
**
Direito
Na decisão sumária reclamada, decidiu-se:
“Do erro de julgamento por se ter declarado a improcedência do pedido de intimação.
Defende a Recorrente que, contrariamente ao decidido, o procedimento em que foi efectuada a sindicância à Ordem dos Enfermeiros apresenta natureza sancionatória, uma vez que pode levar à dissolução do Conselho Directivo da Ordem dos Enfermeiros e à perda do cargo que ali exerce.
Alega que, por força da natureza sancionatória do procedimento, só após ter recebido a certidão com a cópia do P.A. é que fica em posição de exercer plenamente o direito de defesa, que assume, no caso, uma dimensão garantística que não se confunde com o mero direito de participação na tomada de uma decisão susceptível de afectar a esfera jurídica da Recorrente.
Entende que a sentença recorrida violou os artigos 32.º, n.º 10, 17.º e 18.º da CRP, ao considerar que não está em causa um “acto de natureza sancionatória” mas um procedimento administrativo, no qual fora concedido o prazo de 30 dias para audiência de interessados, conforme determina o artigo 6.º da LTAL e, bem assim, o consignado no artigo 121.º e seguintes do CPA.
Não lhe assiste razão.
O direito de defesa que a Recorrente invoca, ainda que existisse nos termos por ela invocados, não determinaria que a contagem do prazo de trinta dias para apresentação de alegações a que se refere o n.º 4 do art.º 6.º da Lei de Tutela Administrativa, se contasse a partir do dia em que recebeu a certidão do P.A..
Veja-se, a título de exemplo e no âmbito dos procedimentos de natureza sancionatória, o regime disciplinar dos trabalhadores em funções públicas, que consta da Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho.
Os direitos de audiência e defesa do trabalhador arguido aí assegurados constituem direitos fundamentais “fora do catálogo” de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias - cfr. Gomes Canotilho, Constituição da República Portuguesa anotada, vol. II, Coimbra Editora, 4ª ed., 2010, pág. 841.
No âmbito daquele regime disciplinar, finda que esteja a fase da instrução do processo disciplinar, entrega-se ao trabalhador uma cópia da acusação (art.º 214.º), assistindo-lhe o direito de examinar o processo “a qualquer hora de expediente” (art.º 216.º, n.º 1), podendo ainda ser-lhe confiado o processo (art.º 217.º).
A disponibilidade do P.A. para consulta faculta ao arguido o exercício pleno dos seus direitos de audiência e defesa.
É ainda condição para que o processo disciplinar seja tido como um “processo justo” - cfr., neste sentido, Gomes Canotilho, Constituição da República Portuguesa anotada, vol. II, Coimbra Editora, 4ª ed., 2010, pág. 841.
É certo que nada impede que o trabalhador peça a entrega de certidão de teor do P.A.. A certidão constitui uma forma de exercer o direito à informação.
No entanto, tal pedido não suspende nem interrompe o prazo de defesa, pois não há norma que o determine.
Ora, se assim é no âmbito dos procedimentos sancionatórios em que o direito de defesa se encontra constitucionalmente assegurado e em que a decisão punitiva é da competência da Administração, não se vê que no presente procedimento a Recorrente tivesse de beneficiar de maiores garantias.
Não estamos perante um procedimento administrativo que termine com uma decisão sancionatória.
O presente procedimento administrativo finda com a remessa do relatório da sindicância para o M.P., juntamente com o despacho do membro do Governo competente em que se defenda que a situação é susceptível de levar à dissolução dos órgãos e à perda de mandato dos seus titulares.
A prolação de tal despacho é precedida da audição dos interessados, que podem apresentar alegações e juntar documentos – n.º 4 do art.º 6.º da Lei da Tutela Administrativa.
Recebido o processo pelo M.P., pode este, caso entenda que se verificam os necessários requisitos, propor a acção judicial com vista à perda de mandato e à dissolução dos órgãos – artigos 6.º, n.ºs 3, 4, 5 e 6, 11.º e 15.º da Lei da Tutela Administrativa.
Nessa acção, os interessados poderão exercer o seu direito de defesa.
Pelo exposto, entendemos que, com a disponibilização do P.A. para consulta da Recorrente, iniciou-se a contagem do prazo de trinta dias previsto no n.º 4 do art.º 6.º da Lei da Tutela Administrativa para apresentação de alegações e junção de documentos, não tendo o pedido de emissão de certidão de teor do P.A., apresentado pela Recorrente, suspendido ou interrompido tal prazo, pelo que há que manter a decisão recorrida.”
Tal decisão é de manter.
Com efeito e contrariamente ao defendido pela Recorrente, não estamos perante um procedimento de natureza sancionatória. Assumem esta natureza os procedimentos que visam aplicar uma sanção pela Administração.
No caso, a decisão final do procedimento administrativo termina com a prolação de um despacho pelo membro do Governo competente, em que se pode determinar a remessa do processo administrativo para o Ministério Público, pressupondo que se verificam irregularidades susceptíveis de fundamentar a dissolução de órgãos ou a perda de mandato dos seus titulares.
A Administração não tem competência para aplicar qualquer sanção.
Deve sim e antes do envio do processo para o Ministério Público, ouvir os visados “para, no prazo de 30 dias, apresentarem, por escrito, as alegações tidas por convenientes, juntando os documentos que considerem relevantes”, o que foi observado no caso – n.º 4 do art.º 6.º da Lei da Tutela Administrativa.
Tal audição enquadra-se no âmbito do exercício do direito de audiência prévia, constituindo expressão do direito de participação na formação da decisão administrativa.
Não constitui o exercício do direito de defesa no âmbito de um procedimento sancionatório.
Acresce que, mesmo no âmbito dos procedimentos sancionatórios de natureza administrativa, como é o caso dos procedimentos disciplinares, apenas se prevê que o exercício do direito de defesa seja precedido da possibilidade do arguido consultar o processo ou requerer a sua confiança. Não se exige mais para que o procedimento seja tido como justo.
Conclui-se, assim, que é de manter o decidido na sentença recorrida.
Decisão
Face ao exposto, julga-se o recurso improcedente e mantem-se a sentença recorrida.

Sem custas, em razão da natureza objectiva da isenção – art.º 4.º, n.º 2, al. b) do RCP.


Lisboa, 30 de Janeiro de 2020

Jorge Pelicano

Celestina Castanheira

Paulo Gouveia