Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1069/12.0BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:05/10/2018
Relator:SOFIA DAVID
Descritores:SINDICATO; ILEGITIMIDADE ACTIVA;
DEFESA DE DIREITOS E INTERESSES INDIVIDUAIS DOS ASSOCIADOS; INTERESSE EM AGIR
Sumário:I-A legitimidade activa dos sindicatos, não obstante dever ser amplamente reconhecida, não os desonera, no caso de figurarem em juízo com uma acção em que a causa de pedir e os pedidos visam a tutela colectiva dos direitos e interesses individuais legalmente protegidos dos trabalhadores que visam representar, de virem a juízo identificar esses concretos trabalhadores, a fim de se poder apreciar da sua legitimidade activa enquanto representantes daqueles, do interesse em agir e dos restantes pressupostos processuais;
II-Interesses colectivos são aqueles que abrangem uma categoria ou um universo de trabalhadores, associados do sindicato, são interesses comuns ou solidários a toda essa categoria ou universo. Já os interesses individuais dizem respeito a um ou a um grupo de trabalhadores, em número restrito, são interesses próprios desses trabalhadores, que não são comuns aos demais trabalhadores representados pelo sindicato;
III-Se um SNES pretende salvaguardar os direitos e interesses dos professores auxiliares e professores associados, com agregação obtida em 2011, vinculados contratualmente à Universidade de Aveiro, visa salvaguardar os interesses individuais desses docentes e não os interesses de todo um grupo ou classe, de um colectivo de trabalhadores e interesses comuns ou indivisíveis;
IV-– Igualmente, neste caso, para que o Sindicato tenha interesse em agir, é necessário que esteja em juízo em representação dos seus associados, a quem a procedência da acção possa trazer algum benefício, directo e pessoal;
V- Apresentar uma acção em defesa de interesses colectivos ou de interesses individuais tem exigências legais diferentes, desde logo ao nível dos pressupostos processuais que se requerem para a procedência da acção. Tutelando-se direitos e interesses colectivos, o Sindicato é ele próprio interveniente da relação controvertida, a par com os trabalhadores que representa. No caso dos interesses individuais, o trabalhador é em primeira linha quem titula tal relação, que lhe é própria, pessoal, agindo o Sindicato em sua representação.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul

I - RELATÓRIO

O S. N. do E. S. (SNES) interpôs recurso da decisão do TAC de Lisboa, que julgou verificada a excepção de ilegitimidade activa do A., por na presente acção estarem em causa interesses individuais dos seus associados e não a defesa de interesses colectivos e, em consequência, absolveu o A. e ora Recorrente da instância.
Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões: ”A) O direito que se discute nos autos é um direito colectivo, um bem jurídico universal e indivisível: o reconhecimento do direito à remuneração devida pelos docentes da Recorrida que adquiriram no ano de 2011, o título académico de agregação;
B) O Recorrente configurou a presente acção, a relação material controvertida e os pedidos formulados, no exercício da defesa de interesses colectivos dos docentes que representa;
C) O não pagamento aos docentes com agregação da retribuição fixada no seu regime remuneratório era uma situação existente, real, actual, certa, desfavorável, comum a todos os docentes nessa qualidade, o que configurava uma situação que exigia a defesa colectiva dos interesses em causa, no exercício do escopo estatutário, ao abrigo da garantia constitucional do art. 56º, n.º1, da CRP;
D) A interpretação colhida na douta sentença recorrida, que exige a identificação dos associados, numa situação que se identifica como defesa colectiva de um interesse comum de um grupo de trabalhadores da recorrida (os professores auxiliares e associados com agregação adquirida em 2011), sob prejuízo de negaçao da legitimidade processual, é violadora do direito fundamental das associações sindicais promoverem a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que representem, plasmado na norma constitucional, padecendo assim, tal interpretação, de inconstitucionalidade material;
E) O Recorrente age em defesa de matérias respeitantes à remuneração, à categoria e à carreira que são matérias constantes do art. 6.º da Lei n.º23/98, de 26 de Maio, pelo que, são matérias que lhe estão especialmente conferidas pelos seus estatutos, bem como, pela legislação aplicável;
F) O Recorrente enquanto associação sindical dos docentes do ensino superior, tem como objectivo defender e dignificar, em geral, o exercício da docência e da investigação científica, pelo que, intentou a presente acção para a defesa de direitos e interesses colectivos com o objectivo de obter uma decisão que defenda e reconheça os interesses e os direitos dos associados com agregação à respectiva remuneração;
G) São interesses colectivos, os de determinado grupo ou categoria de indivíduos relacionados com um determinado bem como é o caso da remuneração de um grupo de trabalhadores ou de grupos de trabalhadores, no caso, dos docentes do ensino universitário público cujo regime remuneratório é essencialmente unitário e estabelecido por diploma oficial normativo;
H) Está claramente identificado o efeito jurídico que se propõe obter, ou seja, a defesa dos direitos e interesses dos doentes que representa, em especial o direito potestativo à remuneração devida pela aquisição do título de agregação pelos professores auxiliares/ associados da Recorrida;
I) Existe uma evidente necessidade e uma evidente utilidade, justificadas e fundadas do Recorrente defender o direito dos professores auxiliares e associados, agregados em 2011, à remuneração legalmente devida pela categoria retributiva a que acederam;
J) Acresce que, contrariando uma das prenussas da douta sentença recorrida, existe inequívoca "solidariedade de interessei' entre todos os docentes associados ou não associados do Recorrente que se encontrem nestas condições, não conflituando tais direitos entre si nem com os de quaisquer outros associados, pelo que, é forçoso reconhecer que o Recorrente tem legitimidade activa;
) A interpretação conforme a norma constitucional, do n.º2, do art. 310º do RCTFP, exige que seja sufragada a legitimidade activa do Recorrente na defesa colectiva dos direitos dos professores auxiliares e associados da U. de A. com agregação obtida em 2011,sejam eles seus associados ou não, e independentemente da sua identificação individual;
L)Incorre assim, a douta sentença recorrida, em erro de julgamento de direito de interpretação e aplicação da norma do n.º 2, do art. 310º, do RCTFP, ao dar como procedente a falta de legitimidade activa do Recorrente e em consequência absolver a Ré da instância, por tal motivo.“

O Recorrido não contra-alegou.
O DMMP apresentou pronúncia no sentido da improcedência do recurso.



II – FUNDAMENTAÇÃO

As questões a decidir neste processo, tal como vêm delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são:
- aferir do erro decisório porque na PI o A. e ora Recorrente visa defender os interesses colectivos dos seus associados, designadamente de um determinado grupo, que ali indica, os professores auxiliares ou associados, que obtiveram a agregação em 2011 e que estejam vinculados contratualmente à U. de A.

Diga-se, desde já, que a decisão recorrida é para manter, porque é acertada.
Conforme decorre da PI , o A. veio pedir para “a) ser declarado pelo Tribunal, o reconhecimento (i) do direito dos docentes com a categoria de professores auxiliares e professores associados com agregação obtida em 2011, vinculados contratualmente à Ré, à percepção da remuneração mensal devida por tal categoria retributiva desde a data da obtenção da aquisição do título de agregado e (ii) da inaplicabilidade a estes casos, da proibição de valorização remuneratória prevista no artº 24º da lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro (Lei de Orçamento Geral do estado para 2011; b) ser declarada a inaplicabilidade das normas dos artºs 24º nºs 1 e 2 al a)da Lei nº 55-A/2010, de 31-12, por violação da obrigação da negociação colectiva (Lei nº 23/98) e manifesta inconstitucionalidade material quando interpretados no sentido de que a sua aplicação resulta o impedimento do pagamento da retribuição devida pelo índice retributivo correspondente ao da respectiva categoria com agregação aos professores auxiliares e professores associados contratualmente vinculados à Ré e que adquiriram no ano de 2011 ao título académico de agregado, com efeitos peticionados em a)”.
A acção foi interposta pelo SNES, alegadamente em defesa dos direitos e interesses colectivos dos trabalhadores que representa, ao abrigo do art.º 310.º, n.º 2, da Lei n.º 59/2008, de 11-09, que aprovou o Regime e o Regulamento do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (cf. também o artigo 56º da Constituição da República Portuguesa- CRP)
Porém, como decorre do petitório antes indicado, em causa nestes autos não está a defesa de interesses colectivos, porque abranja interesses comuns ou solidários de toda uma categoria ou universo de trabalhadores associados do Sindicato, mas está em causa, sim, a defesa dos interesses individuais dos seus sócios que sejam “docentes com a categoria de professores auxiliares e professores associados com agregação obtida em 2011, vinculados contratualmente à Ré”.
Interesses colectivos são aqueles que abrangem uma categoria ou um universo de trabalhadores, associados do sindicato, são interesses comuns ou solidários a toda essa categoria ou universo.
Já os interesses individuais dizem respeito a um ou a um grupo de trabalhadores, em número restrito, são interesses próprios desses trabalhadores, que não são comuns aos demais trabalhadores representados pelo sindicato.
Ora, no caso da acção em apreciação, as pretensões aqui deduzidas apenas interessam a um grupo restrito de trabalhadores: aos professores auxiliares e professores associados, com agregação obtida em 2011, vinculados contratualmente à U. de A.
Logo, no caso em apreço, o A. e Recorrente só seria parte legítima se actuasse em defesa dos interesses individuais dos seus associados, concretamente identificados, actuando como mero representante dos mesmos.
Refira-se, que fls. 67, foi suscitada a excepção de ilegitimidade activa e foi o A. e ora Recorrente convidado a aperfeiçoar a sua PI, indicando os associados que estivessem vinculados contratualmente à R. e que estivessem nas condições descritas na PI. Nesse seguimento, o A. e ora Recorrente manteve os termos da sua PI e continuou a esgrimir visar a defesa de interesses colectivos.
Por conseguinte, na decisão recorrida julgou-se verificada a excepção de ilegitimidade activa do A. com o seguinte argumentação: ”a intervenção do sindicato no caso dos autos não se enquadra na defesa de interesses colectivos assim definido.
Desde logo, porque há associados que, perante o objecto do processo, se encontram numa posição diferenciada relativamente a estes que o A representa, como expressamente se extrai da causa de pedir.
Não há a solidariedade de interesses que caracteriza o «interesse colectivo», pois o eventual provimento da pretensão deduzida não é idóneo a satisfazer as necessidades comuns a todos os associados do A.
Os interesses em jogo não são idênticos, coincidentes e instrumentais a todos os associados do A, mas sim antagónicos, conflituosos e autónomos pois exclui todos os associados que não preencham os requisitos para que lhes seja reconhecido o direito que se pretende com a presente demanda – o reconhecimento do direito de ascender à categoria de professor auxiliar, quem detenha a categoria de assistente, tenha obtido o grau de doutor (e demais requisitos do regime transitório) e esteja contratualmente vinculado à R.
No caso, não há um interesse colectivo que seja valorado com independência e autonomia e que ocupe uma posição de superioridade relativamente aos interesses de cada docente que seja membro do sindicato.
Claramente o caso enquadra-se pois na «defesa colectiva de interesses individuais», ou seja, na protecção de direitos e interesses legalmente protegidos de cada um dos docentes que se encontrem em condições específicas.
Acontece, porém, que o sindicato interpôs a acção em defesa dos direitos e interesses dos seus associados «professores auxiliares e professores associados com agregação em 2011, vinculados contratualmente à Ré» sem individualizar quem ou quais deles, embora tendo sido convidado para o efeito.
Ora, no universo dos candidatos poderá haver associados do A que, por exemplo, não estejam vinculados contratualmente à Ré e sejam assistentes, nas mesmas condições e, por isso não têm qualquer interesse pessoal e directo no resultado desta acção, não retiram daqui nenhuma vantagem. E, todos são (em termos hipotéticos) associados do A.
Para estes não há necessidade de tutela judicial, de “interesse processual” ou “interesse em agir”, pois, do ponto de vista objectivo, não há qualquer utilidade na procedência do pedido.
A escolha de uns interessados (associados do A) em detrimento de outros transforma a «defesa colectiva» em «defesa individual de interesses individuais».
(…) Ora, o sindicato entra em contradição com esse objectivo quando para defender os interesses de uns associados, contende com os interesses de outros, que pugnam pela mesma protecção.
Assim, a falta de indicação dos associados, mediante a indicação individual de cada um e á luz do que se explanou e da norma invocada, o A não tem legitimidade activa já que em causa estão interesses individuais dos associados e não interesses colectivos.”
Esta decisão e argumentação é para manter.
Como decorre da PI, o que o A. e ora Recorrente pretende a salvaguarda dos direitos e interesses de um grupo muito restrito de trabalhadores: os professores auxiliares e professores associados com agregação obtida em 2011, vinculados contratualmente à U. de A.
Nesse mesmo sentido, nos art.ºs 27.º, 37.º e 38.º da PI, o A. alega que o grupo de docentes que está em causa nesta acção está prejudicado, porque tratado de forma desigual com outros docentes, igualmente professores auxiliares ou associados com agregação, vinculados a outras instituições e que sejam recrutados externamente pela R. a U. de É.
Ora, esta alegação é sintomática do tipo de interesses que se pretendem acautelar: os individuais, dos concretos associados do A. que sejam professores auxiliares e professores associados, com agregação obtida em 2011, que estejam vinculados contratualmente à U. de A. e não de todos os professores auxiliares e professores associados com agregação, independentemente da universidade ou instituto com o qual tenham celebrado o vínculo laboral e independentemente de terem obtido a agregação no preciso ano de 2011 ou nos anos subsequentes.
Frente a estas alegações do SNES, fica claro que em causa nesta acção não estão interesses de todo um grupo ou classe, de um colectivo de trabalhadores, com um interesse comum, indivisível, que abranja de forma igual todos os associados do Sindicato. Diversamente, em causa estão interesses de alguns docentes, que conflituarão com os interesses de outros, em iguais condições.
E aqui cruza-se outra questão concernente ao interesse em agir do A. e Recorrente. Na verdade, não se sabendo se o Sindicato em apreço tem entre os seus associados professores auxiliares e professores associados com agregação obtida em 2011, vinculados contratualmente à U. de A., não é certo, sequer, que a eventual procedência da presente acção traga vantagens ou benefícios directos e pessoais, nem ao próprio Sindicato, nem para os seus associados. Fica-se sem saber se houve uma efectiva lesão na esfera jurídica de alguém, que tenha causado um prejuízo directo e imediato, que interesse remover por via da tutela judicial. Explicando mais detalhadamente: frente à causa de pedir e aos pedidos formulados nesta acção, é óbvio, que o próprio Sindicato ou, em geral, os trabalhadores que representa, não terão qualquer interesse directo e pessoal na eventual procedência desta acção. Tal interesse, a existir, só pode repercutir-se na esfera jurídica dos associados do A., Sindicato, no caso destes associados serem professores auxiliares e professores associados, com agregação obtida em 2011, vinculados contratualmente à Universidade de Aveiro. Logo, aqui estão em causa os interesses individuais e identificáveis destes últimos associados e não um interesse colectivo, comum, ou que abranja a globalidade dos associados do SNES.
Consequentemente, para que o SNES tenha interesse em agir, é necessário que o mesmo esteja em juízo em representação dos seus associados a quem a procedência da acção pode trazer algum benefício directo e pessoal, apresentando-se, então, em defesa dos direitos ou interesses individuais desses trabalhadores que representa.
Como se refere no Ac. do STA n.º 788/10, de 16-12-2010 (in www.dgsi.pt) “um direito ou um interesse é “colectivo” quando pertence a todo o colectivo de trabalhadores representados pelo sindicato. Em termos literais a palavra “colectivo” significa: “ (…) que se refere a muitas pessoas ou coisas ao mesmo tempo; opõe-se a individual”. “ (…) A palavra colectivo emprega-se para designar o sentido de um termo geral quando ele se refere à colecção, quer dizer, ao conjunto dos indivíduos que pertencem à sua extensão” – GRANDE ENCICLOPÉDIA PORTUGUESA E BRASILEIRA, Vol. 7, pág. 120.
Quando a expressão “colectivo” se reporta ao interesse, - como é o caso - tem em vista um bem jurídico protegido que é comum, que tem como co-titulares todo o universo de representados no sindicato. Há, nestas situações, uma “solidariedade de interesses”, que se traduz “em a necessidade de uma pessoa não poder ser satisfeita sem que o seja também a necessidade de outrem” – CARNELUTTI, Teoria Geral do Direito, pág. 83/84. Com efeito, explicita o mesmo autor: “Entre os interesses de várias pessoas, felizmente actua também, até mesmo em primeiro lugar, a solidariedade. (…) No campo da intersubjectividade – como soe dizer-se – a solidariedade traduz-se em a necessidade de uma pessoa não poder ser satisfeita sem que o seja também uma necessidade de outrem. Nessa hipótese, a posição favorável para a satisfação de uma necessidade determina-se ao mesmo tempo a respeito de um e do outro. Delineia-se, assim, a noção de interesse comum ou colectivo, em antítese com o interesse singular ou individual” – ob. cit. pág. 84.
MARQUES ANTUNES, Direito de Acção Popular no Contencioso Administrativo, pág. 36/37 caracteriza os interesses colectivos, como sendo “… tal como os interesses individuais, interesses egoístas e particulares…(…).” (…) organizados por forma a adquirirem uma estabilidade unitária e organizada, de tal forma que se agregam a um determinado grupo ou categoria de indivíduos relacionados com um determinado bem jurídico”.
Atributo dos direitos ou interesses colectivos (legalmente protegidos) é, assim, a sua indivisibilidade o que implica que se trata de um direito ou interesse de todos. Quando um direito ou interesse colectivo é exercido o bem jurídico tutelado pela norma é alcançado por todos.
Aos direitos e interesses colectivos contrapõe a mesma lei, direitos e interesses individuais dos trabalhadores representados, que são os direitos e interesses de cada um dos trabalhadores. Neste caso o direito ou o interesse pode considerar-se a afectação jurídica do bem à realização dum ou mais fins de pessoas individualmente consideradas – como dizia GOMES DA SILVA, Dever de Prestar Dever de Indemnizar, pág. 52, ao definir direito subjectivo. E, portanto, o seu titular é identificado e claramente demarcado do demais, através da norma que protege esse bem jurídico. Nestes casos, o sindicato visa defender os direitos ou interesses concretamente identificados “que entregam à associação sindical o exercício dos direitos ou interesses em litígio”. Esta modalidade de legitimidade assenta “na titularidade dos interesses directos e imediatos por parte dos associados que delegam nela associação a representação em conjunto” – F. NICOLAU SANTOS SILVA, citado por GUILHERME DA FONSECA, Cadernos de Justiça Administrativa, 43, pág. 29.
Deste modo, embora o sindicato tenha uma ampla legitimidade processual para defender interesses dos seus associados, a verdade é que os requisitos de uma e outra das apontadas modalidades não são iguais:
(i) Pode defender direitos ou interesses colectivos, sem ter que identificar qualquer dos associados, mas os direitos e interesses a prosseguir devem ser comuns e indivisíveis (colectivos). Nestes casos está isento de custas.
(ii) Pode defender colectivamente direitos ou interesses individuais dos seus associados. Nestes casos não goza de isenção de custas.” (cf. ainda, em sentido semelhante, entre outros, os Acs. do STA n.ºs 269/08, de 18-04-2013, 458/10, de 30-06-2011, 2018/03, de 03-11-2011, 89/07, de 29-03-2007, 1887/03, de 06-10-2005, 1945/03, de 04-03-2004, 190/04, de 03-11-2004, ou 1888/03, de 06-05-2004).
Ou seja, estando o SNES em juízo a defender a presente pretensão, que visa a tutela de direitos ou interesses individuais de alguns dos seus associados, havia que figurar como representante dos mesmos, estando estes concretamente identificados. Se tal não ocorrer, está o SNES a litigar em nome próprio relativamente a relações jurídicas que lhe são alheias, porque próprias, individuais, relativamente a cada um dos seus associados abrangidos pela relação controvertida.
Conforme é jurisprudência firme dos nossos tribunais superiores, os art.s. 56.º da CRP 4.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 84/99, de 19.03, 55.º, n.º 1, al c), do CPTA, e agora o art. 310.º, n.º 2, do RRCTFP, que atribuem legitimidade activa aos sindicatos, devem ser lidos de forma a acolherem uma ampla legitimidade daqueles, quer para a defesa dos direitos e interesses colectivos, quer para a defesa colectiva dos direitos e interesses individuais legalmente protegidos dos trabalhadores que visam representar – cf. neste sentido, entre muitos, os Acs. do TC n.º 75/85, de 06-05, n.º 118/97, de 19-02 e n.º 160/99, de 10-03 e os Acs. do STA já antes citados).
Porém, para que o SNES tivesse legitimidade activa para a presente acção – onde defende interesses individuais legalmente protegidos dos trabalhadores que visam representar - teria aqui de apresentar-se nessas vestes, ou seja, enquanto representante desses trabalhadores, individualmente identificados e a quem a eventual procedência da presente acção pudesse, efectivamente, beneficiar.
A legitimidade activa dos sindicatos, não obstante dever ser amplamente reconhecida, não os desonera, no caso de figurarem em juízo com uma acção em que a causa de pedir e os pedidos visam a tutela dos direitos e interesses individuais, legalmente protegidos dos trabalhadores que visam representar, de virem a juízo identificar esses concretos trabalhadores, a fim de se poder apreciar da sua legitimidade activa enquanto representantes daqueles, do interesse em agir e dos restantes pressupostos processuais.
Apresentar uma acção em defesa de interesses colectivos ou de interesses individuais tem exigências legais diferentes, desde logo ao nível dos pressupostos processuais que se requerem para a procedência da acção. Tutelando-se direitos e interesses colectivos, o S. é ele próprio interveniente da relação controvertida, a par com os trabalhadores que representa. No caso dos interesses individuais, o trabalhador é em primeira linha quem titula tal relação, que lhe é própria, pessoal, agindo o S. em sua representação. Logo, para poder demonstrar ter interesse em representar o trabalhador em juízo para dirimir a sua relação material controvertida, terá o sindicato que identificar tal ou tais trabalhadores e os seus interesses individuais ou pessoais. E será com base nessa indicação que será aferido o interesse em agir do S., ou a tempestividade da acção, ou o regime de custas a que fica sujeito, por exemplo (cf. neste sentido, os Acs. do TCAS. n.ºs. 08695/12, de 18-05-2017, 09685/13, 20-06-2013, ou do TCAN n. º 00344/10.3BECBR, de 08-09-2010 ou n.º 02517/08.0BEPRT, de 27-05-2010, ou do TRP n.º 729/13.3TTVNG.P1, de 22-09-2014. Vide também, ainda que a apreciar a questão apenas para efeitos de custas, os Acs. do TCAS n.ºs. 13185/16, de 02-06-2016, 12120/15, de 29-10-2015).
Nestes autos foi o A. e ora Recorrente convidado a aperfeiçoar a sua PI, vindo indicar os concretos trabalhadores que representava. O SNES manteve-se a alegar que pretendia defender interesses colectivos. Na presente acção não estão em causa tais interesse. Assim, há que confirmar a decisão recorrida quando julgou o SNES parte ilegítima.

III- DISPOSITIVO

Pelo exposto, acordam:
- em negar provimento ao recurso interposto, confirmando a decisão recorrida;
- custas pelo Recorrente (cf. art.ºs. 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do RCP e 189.º, n.º 2, do CPTA).

Lisboa, 10 de Maio de 2018.
(Sofia David)

(Catarina Jarmela)

(Helena Canelas)