Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1284/13.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:07/11/2019
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:SELO
PRÉDIO DEVOLUTO E EM RUÍNAS
VERBA 28.1 TGIS
Sumário:1 - O prédio em questão – devoluto e em ruínas - não pode ser considerado como prédio “com afectação habitacional”, para efeitos do disposto na verba 28.1 da TGIS, na redacção que aqui vem sendo considerada.
2 - À data do facto tributário, o imóvel em causa era insusceptível de, efectivamente, ser afecto à habitação, já que um prédio devoluto e em ruínas não apresenta funcionalidade, para a habitação, real e presente, independentemente da afectação futura ou expectável e/ou da afectação pretérita.
3 - Inexiste norma no CIS, ou por remissão, no CIMI, que defina como prédios com afectação habitacional os que como tal se encontrem inscritos na matriz, pelo que não pode relevar-se, positivamente, a forma sobre a substância.
4 - Com efeito, para efeitos de aplicação da norma/verba em questão, não se nos afigura que a circunstância de o prédio se encontrar inscrito na matriz predial como prédio com afectação habitacional seja impeditiva da demonstração – que aqui foi feita – da sua situação real e actual não condizente com a habitação, como acontece com um prédio em ruínas e, consequentemente, devoluto.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1 – RELATÓRIO

No Tribunal Tributário de Lisboa foi deduzida, pela T..........., SA, impugnação judicial contra a liquidação de Imposto de Selo (IS), referente ao ano de 2012, emitida com o nº 2012 490......., respeitante ao prédio 110..., de São Sebastião da Pedreira, artigo U - 000..., com o valor patrimonial de € 1.002.392,56.

A impugnação judicial foi julgada procedente e, consequentemente, foi anulada a liquidação de IS contestada.


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Com tal decisão não se conforma a Recorrente, Fazenda Pública, a qual interpôs recurso jurisdicional dirigido ao STA, tribunal este que veio a julgar-se hierarquicamente incompetente.

Remetidos os autos de recurso a este TCA, vejamos, então, os termos em que se mostram formuladas as conclusões da alegação recursória:

A. Na douta sentença nos presentes autos foi julgada procedente a impugnação interposta pela Sociedade T.........., SA, NIF 502......, por se ter considerado que o imóvel aqui em causa se encontra devoluto

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A Recorrida apresentou contra-alegações, as quais apresentam o seguinte teor:
« A. Vem o presente recurso interposto da decisão do Tribunal a quo que julgou procedente a impugnação judicial da liquidação do Imposto do Selo, referente ao ano de 2012 e à Verba 28, que incidiu sobre o prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de S.Sebastião da Pedreira sob o artigo U-8..., na qual se decidiu que a liquidação deve ser anulada por vício de violação de lei.
B. Para o efeito, considerou o Tribunal a quo que:
i) O Prédio não tinha, à data da liquidação, afectação habitacional ou qualquer outra, na medida em que foi declarado devoluto, não podendo, por esse motivo, ser sujeito à tributação prevista na Verba 28, exclusivamente aplicável a prédios com afectação habitacional;
ii) Mesmo que assim não se entendesse, o Prédio encontrava-se, a essa data, em ruínas, pelo que sempre seria avaliado, para efeitos de IMI, como terreno para construção, não podendo, por esse motivo, ser sujeito à tributação prevista na Verba 28, que, à data dos factos, esse aplicava exclusivamente a prédios com afectação habitacional e não a terrenos para construção.
C. O Tribunal a quo considerou ainda provado o facto de o Prédio estar devoluto e em ruínas à data dos factos.
D. A Recorrente discorda da decisão do Tribunal a quo, considerando estarem verificados os pressupostos de facto e de direito da previsão normativa da Verba 28, não se verificando o vício de violação de lei.
E. Alega a Recorrente que:
i) O despacho do Senhor Vereador da Câmara Municipal de Lisboa que declarou o Prédio devoluto não produziu os efeitos fiscais assumidos pelo Tribunal a quo;
ii) Para que tal despacho produzisse o efeito retirado pelo Tribunal a quo - de que o prédio não está afecto a habitação - seria necessário que a Recorrida apresentasse uma reclamação à matriz (por incorrecção da inscrição matricial) e que tivessem sido actualizados todos os elementos de descrição da matriz predial, sendo novamente apurado o VPT do imóvel;
iii) Não tendo a Recorrida pedido a alteração da matriz predial, a situação do imóvel em termos fiscais no momento em causa era a constante da caderneta predial do Prédio.
iv) Encontram-se por isso reunidos os requisitos da incidência do imposto previstos na Verba 28, sendo a liquidação em causa legal e devendo manter-se na ordem jurídica.
F. A Recorrente admite, nas suas Alegações, que à data do facto tributário o Prédio se encontrava devoluto, não se destinando a habitação.
G. Não obstante, ainda que reconheça que o Prédio, no seu estado real e atual à data dos factos, não se destinava nem se podia destinar a habitação, a Recorrente conclui pela legalidade da liquidação de Imposto do Selo, considerando que a afetação habitacional do Prédio decorre exclusivamente da matriz predial do mesmo.
H. A Recorrente pretende atacar a decisão do Tribunal a quo com o único fundamento de que, para aferir da incidência objectiva da tributação prevista na Verba 28 (e, em consequência, determinar a legalidade da liquidação de imposto do selo sub judice) não pode atender-se à situação de facto do Prédio, (como se verificou nos presentes autos), devendo, ao invés, ser valorados, apenas e exclusivamente, os elementos constantes da matriz predial do mesmo.
I. Apesar de concluir que a afectação de um prédio para efeitos da Verba 28 deve aferir-se exclusivamente com base nos elementos matriciais desse prédio, a Recorrente não invoca qualquer norma legal que justifique essa posição.
J. E não o faz porque não só tal norma não existe, como tal entendimento contraria as normas aplicáveis ao caso sub judice.
K. A Recorrente confunde incidência do imposto do selo, i.e. facto tributário passível de determinar a aplicação da Verba 28 com um mero procedimento, previsto no Código do IMI como garantia dos contribuintes, para rectificação de erros da matriz para efeitos de IMI.
L. Ao confundir tais conceitos, a Recorrente faz tábua rasa das normas de incidência objectiva previstas no Código do IMI e aplicáveis, por remissão, para determinação da incidência objectiva da Verba 28 (nomeadamente do disposto na Verba 28.1da TGIS e no artigo 6.2 do Código do IMI).
M. Decorre das normas indicadas que, caso um prédio não se destine, ou não se possa destinar, no seu estado actual e real à data dos factos, a habitação, não pode o mesmo ser sujeito à tributação da Verba 28,
N. Não podendo os elementos do prédio constantes da matriz relevar para verificação do facto tributário que determina a incidência objectiva da Verba 28 quando, de facto, e de acordo com uma potencialidade real e actual, o prédio não se destine a habitação.
O. Acresce que é certo e unanimemente aceite que, não se encontrando o conceito de "prédio com afectação habitacional" definido nos termos do Código do Imposto do Selo, deve tal conceito ser aferido nos termos do disposto no artigo 6.º do Código do IMI.
P. Podemos assim concluir que, para efeitos de preenchimento da incidência objectiva da Verba 28, releva exclusivamente o facto de um prédio, no seu estado real e actual, se encontrar afecto a habitação, nos termos previstos no artigo 6.º do Código do IMI,e não, como pretende a Recorrente, que tal prédio se encontre inscrito na matriz predial urbana como prédio com afectação habitacional.
Q. Para que o entendimento propugnado pela Recorrente pudesse ser aceite, seria necessário que o Código do Imposto do Selo (ou, por remissão, o Código do IMI) contivessem uma disposição legal de acordo com a qual se consideram prédios com afectação habitacional os que, como tal, se encontrem inscritos na matriz.
R. Não existindo tal normativo legal não pode, no caso sub judice, valorar-se positivamente a forma face à substância, relativas à afetação do Prédio, porquanto, à data dos factos, o Prédio encontrava-se devoluto e em ruínas, não tendo, no seu estado real e actual a essa data, afetação habitacional.
S. O entendimento perfilhado pela Recorrida foi corroborado, de forma clara, pela jurisprudência do CAAD e deste Supremo Tribunal Administrativo, quer no que respeita aos prédios edificados, quer no que respeita aos terrenos para construção.
T. Das doutas decisões desses tribunais resulta, com clareza, que:
i) Para que um prédio seja sujeito à tributação prevista na Verba 28,ou seja, para que se verifique um facto sujeito a tributação nos termos desse normativo, é necessário que o prédio objecto de tributação tenha, no seu estado real e actual à data da liquidação, uma afectação correspondente a habitação, o que implica, desde logo, que o prédio reúna as condições mínimas necessárias para que nele se poder habitar.
ii) Mesmo que tal prédio tenha sido avaliado para efeitos de IMI ou se encontre inscrito na matriz predial urbana como prédio com afectação habitacional - o que, no caso dos autos, não foi sequer dado por provado -, quando a sua afectação real e actual não seja para habitação, não se verifica o facto tributário necessário à tributação prevista na Verba 28.
iii) É, por isso, irrelevante a inscrição matricial do prédio como prédio para habitação, ou o facto de o prédio ter sido avaliado como tal para efeitos de IMI, sempre que o prédio não tenha, de facto, real e actualmente, uma afectação habitacional.
U . O entendimento propugnado pela ora Recorrida e corroborado pela jurisprudência citada é, aliás, o único conforme às normas legais aplicáveis, nomeadamente ao disposto na verba 28.1da TGIS e ao disposto no artigo 6.º do Código do IMI, como resulta cabalmente demonstrado nos presentes autos.
V. Nestes termos, resultando provado, nos autos objecto de recurso, que o Prédio se encontrava, à data dos factos, devoluto e em ruínas, não se destinando e não podendo destinar-se, no seu estado real e actual a essa data, a habitação, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 6.º do Código do IMI, não pode o Prédio ser considerado como um "prédio com afectação habitacional" e, como tal, não pode ser sujeito à tributação prevista na Verba 28,
W. Independentemente dos elementos constantes da sua matriz predial.
X. Termos em que a Recorrente faz uma errónea interpretação do direito aplicável ao caso sub judice, nomeadamente do disposto no artigo 6.º do Código do IMI, devendo por esse motivo improceder totalmente .
Y. Acresce que, nas Conclusões C. a F. das suas Alegações, refere a Recorrente que, uma vez que o Prédio se encontrava em ruínas, cabia à Recorrida o "ónus de formular uma reclamação da incorrecção da inscrição matricial, nos termos do artigo 130.º do CIMI", pelo que "não tendo cumprido o ónus de ter pedido a alteração da matriz predial [...] Manté[m-se] a situação, por responsabilidade exclusiva da Impugnante".
Z. De acordo com o disposto no artigo 112.º, n. º 15, do Código do IMI na redacção em vigor à data dos factos, "[…] a identificação dos prédios ou fracções autónomas em ruínas compete às câmaras municipais e deve ser comunicada à Direcção-Geral dos Impostos [actual AT], no termos e prazos previstos no artigo 13.º"•
AA. Da referida norma resulta que a eventual alteração à matriz no sentido de nela reflectir o estado de ruína (e a condição de devoluto) de um prédio cabe à AT, por indicação da câmara municipal, não tendo o contribuinte qualquer responsabilidade nessa matéria.
BB. Nestes termos, não pode proceder a conclusão da Recorrente de que o facto de o Prédio não ter sido considerado ou inscrito na matriz como prédio devoluto ou em ruínas é imputável à Recorrida,
CC. Não se podendo extrair qualquer consequência da conclusão da Recorrente que, como demonstrado, é errada.
DD. Refira-se, a título complementar, que, como reconhecido e invocado pela própria Recorrente nos autos objecto do presente recurso, encontrando-se o Prédio devoluto e em ruínas à data dos factos, o VPT do mesmo deveria ser determinado como se de um terreno para construção se tratasse, nos termos do disposto no artigo 46.º, n.º 4 do Código do IMI.
EE. Neste sentido, defendeu a Recorrente - posição que não acompanhamos, mas por dever de patrocínio admitimos -, nos autos objecto de recurso, que o Prédio poderia ficar sujeito à tributação prevista na Verba 28, nos termos aplicáveis aos terrenos para construção.
FF. No entanto, como foi corroborado à exaustão pela mais relevante jurisprudência, o conceito de "prédio com afetação habitacional" previsto na Verba 28 na redacção em vigor à data dos factos não inclui os terrenos para construção (conforme jurisprudência citada infra).
GG. Do entendimento da jurisprudência em causa podem retirar-se dois efeitos que contrariam em absoluto a posição assumida pela Recorrente no presente recurso - de que, independentemente da situação de facto do Prédio (devoluto e em ruínas), para efeitos da Verba 28 deve ser exclusivamente valorada a informação constante da caderneta predial do mesmo:
i) Em primeiro lugar, esclarece aquela jurisprudência que, para que possa ser considerado como "prédio com afetação habitacional", o mesmo tem que dispor, na sua condição actual e real, de condições que permitam a sua afetação a habitação.
ii) Tal juízo conduz necessariamente à conclusão de que a consideração de um "prédio com afetação habitacional" não pode depender de uma afetação futura (baseada numa licença de construção) ou de uma afetação pretérita (baseada numa ruína), só podendo verificar-se quando tal afetação seja real e actual.
iii) Mas tal juízo conduz igualmente à conclusão de que, para determinação da afetação habitacional do prédio para efeitos da Verba 28 sempre seriam irrelevantes, quando não correspondam a uma afetação real e actual, os elementos constantes da matriz/caderneta predial.
HH. Caso assim não fosse, como justificaria a Recorrente que os terrenos para construção, em cujas cadernetas prediais consta uma afetação para habitação (elemento formal), não se encontrem abrangidos pelo conceito de "prédio com afetação habitacional" com base no facto de não disporem de uma real e actual afetação para habitação (elemento substantivo)?
II. E como poderia a Recorrente admitir, face aos mais elementares princípios de justiça e igualdade admitidos, que um terreno no qual foi já autorizada uma construção para a habitação não esteja abrangido pelo conceito de "prédio com afetação habitacional" - porquanto o mesmo não dispõe de uma afteação real e actual para habitação -, mas que um prédio que não dispõe igualmente dessa afetação real e actual seja considerado como "prédio com afetação habitacional" apenas e tão só porque a respectiva matriz predial contém alegadamente um lapso que assim o qualifica?
JJ. Ora, considerando que o Prédio não tem nem poderia ter como destino normal a habitação, porquanto, não só se encontra devoluto, como não reúne, na senda da citada jurisprudência, " as características exigíveis para como tal ser(em) classificado(s)", é entendimento unânime da jurisprudência que o mesmo não fica sujeito à Verba 28 que depende de uma afetação real, atual, e não de uma afetação futura ou expectável, de uma afetação pretérita, ou, porque tal seria absurdo, de uma afetação que decorre exclusivamente de um alegado lapso da matriz predial do prédio.
KK. Termos em que é, também por este motivo, evidente que a tese propugnada pela Recorrente não tem aderência à lei nem acolhimento jurisprudencial, violando, ao invés, os mais elementares princípios e normas aplicáveis à tributação do património.
LL. Por fim, não vislumbra a Recorrida como poderia a Recorrente pretender ver satisfeita a sua pretensão - de justificar a legalidade da liquidação do imposto do selo com base no alegado facto de a matriz predial do Prédio conter uma menção a afectação para habitação - quando tal facto nem sequer foi dado como provado nos presentes autos (e bem, porque sendo evidente que, mesmo que da caderneta predial do prédio constasse uma afectação para habitação, tal facto seria irrelevante, na medida em que o que releva é a real e actual afectação do Prédio).
MM. Neste caso, se por mero absurdo, o entendimento da Recorrente pudesse colher junto deste douto tribunal, desse entendimento não poderia resultar uma decisão diferente da decisão objecto do presente recurso.
NN. Termos em que não podem, uma vez mais, proceder as conclusões alegadas pela Recorrente para fundamentar o presente recurso, que deve ser julgado improcedente.
Nestes termos e nos demais de Direito que este Supremo Tribunal Administrativo doutamente suprirá, deve o presente recurso ser julgado improcedente, com todas as consequências legais.»
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O Exmo. Magistrado do Ministério Público (EMMP) proferiu parecer sustentando, em síntese, a manutenção da sentença recorrida, remetendo para o parecer antes proferido pelo EMMP junto do STA.
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Colhidos os vistos dos Senhores Desembargadores Adjuntos, vêm os autos à conferência para decisão.
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Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Assim sendo, lidas as conclusões temos que as questões a apreciar são:

- Saber se a sentença recorrida errou ao considerar que a liquidação de Imposto de Selo de 2012, com nº 2012 490......., padece de violação de lei, por aí se ter considerado que o prédio dos autos, declarado devoluto e em ruínas, não está incluído no âmbito da incidência objectiva da verba nº 28.1 da TGIS, anexa ao CIS;

- Considerando, ainda, o constante da decisão proferida pelo STA, em 10/04/18, na qual este Tribunal se declarou hierarquicamente incompetente, importa que, previamente, este Tribunal tenha em consideração que “como se depreende do artigo 4º do corpo das alegações, a recorrente alega que não se deu como provado na sentença uma situação de ruína do imóvel em questão, porém, no ponto 6º da matéria de facto da sentença recorrida refere-se expressamente que o imóvel se encontra em ruínas”.


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2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

É a seguinte a matéria de facto constante da decisão recorrida:

1. A T...........,SA. é proprietária de um prédio urbano sito na Avª. .........., nº 39 a 39-A e Avª. .........., nº 39 Lisboa, com o artigo matricial nº U-000..., sito na freguesia de São Sebastião da Pedreira, concelho e distrito de Lisboa- Acordo e cfr. fls. 33 dos autos;

2. Na caderneta predial urbana o prédio, identificado no ponto anterior, consta como inscrito matricialmente em propriedade total, sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente – cfr. fls. 33 dos autos;

3. Em 2012, o valor patrimonial tributário do prédio dos autos era de € 1.002.392,56 – cfr. fls. 33 dos autos;

4. Em 22/03/2013, é realizada a liquidação de imposto de selo do ano de 2012 nº 2012 490......., documentos de cobrança nº 20130......., 20130........ e 20130......., respetivamente, 1ª, 2ª e 3ªs prestações no valor cada de 3.341,31, no valor total de € 10.023,93 – cfr. fls.35, 36 e 145 dos autos;

5. A impugnante procedeu ao pagamento das três prestações do imposto de selo, correspondentes ao ano de 2012 – cfr. fls. 37, 38 e 146 e 147 dos autos;

6. Em 30/10/2012, por despacho do Vereador da Camara Municipal de Lisboa, declara totalmente devoluto o prédio urbano sob o artigo matricial nº U-000..., sito na freguesia de São Sebastião da Pedreira, concelho e distrito de Lisboa, o qual se encontra em ruínas – cfr. fls. 43 a 45 dos autos.

II. 2- DOS FACTOS NÃO PROVADOS

Não existem factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados.

II. 3 – MOTIVAÇÃO

A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos não impugnados, juntos aos autos e expressamente referidos no probatório supra.


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2.2. De direito

Enunciadas as questões a apreciar, entremos na análise do presente recurso jurisdicional.
Em primeiro lugar, importa que nos detenhamos sobre o julgamento da matéria de facto, nos termos que foram apontados pelo STA. E, relembrando, “como se depreende do artigo 4º do corpo das alegações, a recorrente alega que não se deu como provado na sentença uma situação de ruína do imóvel em questão, porém, no ponto 6º da matéria de facto da sentença recorrida refere-se expressamente que o imóvel se encontra em ruínas”.
Vejamos.
No ponto 4 do corpo da alegação recursória lê-se: “4. O mesmo se diga relativamente à situação de uma eventual ruína do edifício que, embora não tivesse sido provado na sentença, na nossa opinião, seria igualmente fundamento para procedimento idêntico ao descrito no número anterior, conduzindo a uma nova avaliação do imóvel e eventuais consequências.”
Portanto, para a Recorrente a situação de ruína do prédio não ficou provada na sentença.
Sucede, porém, que no ponto 6 dos factos provados pode ler-se que: “6. Em 30/10/2012, por despacho do Vereador da Camara Municipal de Lisboa, declara totalmente devoluto o prédio urbano sob o artigo matricial nº U-000..., sito na freguesia de São Sebastião da Pedreira, concelho e distrito de Lisboa, o qual se encontra em ruínas – cfr. fls. 43 a 45 dos autos” (sublinhado e negrito nossos).
Quer isto dizer que, ao contrário do afirmado, a situação de ruína do edifício foi expressamente dada como provada no probatório fixado na sentença, o que permitiu ao Tribunal a quo considerar tal circunstancialismo para efeitos de análise e decisão da situação concreta.
Ora, como é patente, a asserção transcrita, tal como formulada pela Recorrente, não corresponde à impugnação da matéria de facto, nos moldes em que, nos termos da lei, a mesma se mostra prevista e exigida (cfr. artigo 640º do CPC), pois que, nem vem identificado o concreto facto que se considera incorrectamente julgado, nem os meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão diversa sobre a matéria de facto, nem a decisão que, segundo a Recorrente, se devia proferir sobre o facto impugnado.
Com efeito, repete-se, o que a Recorrente se limita a dizer é que a situação de ruína do prédio não foi dada como provada na sentença e isso, como demonstrado, não corresponde à realidade.
Coisa diferente, como está bem de ver, é saber se o circunstancialismo de facto correspondente ao nº6 do probatório foi, com acerto (ou sem ele), dado como provado. Contudo, tal perspectiva de ataque à sentença prende-se, como se infere do já dito, com a impugnação da matéria de facto e essa, reitera-se, obedece a regras para a sua impugnação eficaz que, de modo algum, foram observadas.
Improcede, assim, esta primeira questão que nos vinha dirigida.
Está, pois, estabilizada a matéria de facto.
E, assim sendo, avancemos.

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O Tribunal a quo, respondendo à questão de saber se no “âmbito de incidência da verba nº 28.l. da Tabela Geral de Imposto de Selo (TGIS), na redacção dada pela Lei nº 55-A/2012, de 29/10, nela se incluem os “prédios devolutos” ou, mais precisamente, se os prédios devolutos com valor patrimonial tribunal igual ou superior a € 1.000.000, podem subsumir-se no conceito de prédios urbanos “com afectação habitacional” a que alude a referida verba”, concluiu - com expresso apelo ao teor do acórdão do STA, de 09/04/14, proferido no recurso nº 01870/13 - nos seguintes termos:
“(…)
Em 2012, com a introdução da Lei 55-A/2012, de 29/10 (art. 4º), veio a tributar-se o prédio com afetação habitacional à taxa de 1%, nos casos em que a propriedade, usufruto ou direito de superfície desses prédios urbanos tivesse valor patrimonial tributário igual ou superior a € 1.000.000,00.
Ora, o prédio em causa nos autos não tem afetação habitacional, ou qualquer outra, na medida em que, por despacho do Vereador da Camara Municipal de Lisboa de 30/10/2012 foi declarado totalmente devoluto (ponto 6 do probatório).
Nestes termos, não pode este ser considerado como “prédio com afectação habitacional” para efeitos do disposto na verba nº 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, na sua redacção originária, que lhe foi conferida pela Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro. Verificando-se que a liquidação dos autos foi realizada com base nesse pressuposto, esta padece de violação de lei e por isso não pode manter-se na ordem jurídica”.
A Fazenda Pública, aqui Recorrente, discorda do assim decidido.
Em síntese útil, defende a Fazenda que:
- o tribunal a quo parte do pressuposto de que o prédio em questão está devoluto, em ruínas, e, como tal, não pode ser considerado como prédio de afectação habitacional;
- sucede, porém, que, para a Recorrente, o despacho do Vereador da Câmara Municipal que assim declarou não produz os efeitos fiscais pretendidos, pois que, perante tal despacho, competia ao sujeito passivo o ónus de apresentar uma reclamação da incorrecção matricial, nos termos do artigo 130º do CIMI;
- assim, conclui a Recorrente, não tendo sido apresentada tal reclamação, vale, para o que aqui importa (para efeitos fiscais), a situação do imóvel, tal como consta da caderneta predial.
Portanto, sublinha a Recorrente, à data dos factos, o imóvel encontrava-se inscrito em propriedade total, sem andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, com um VPT superior a 1 milhão de euros, e afecto à habitação, pelo que se mostram preenchidos os requisitos de incidência do IS, previstos na Verba 28.1 da TGIS.
Vejamos, então, lembrando que os factos se reportam ao ano de 2012.
À data que aqui importa considerar, a verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS) estatuía:
“28- Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000,000,00 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:
28.1 – Por prédio com afectação habitacional …. 1%”
Não obstante a lei não nos dar uma definição de “afectação habitacional”, conceito este a que se reporta a norma de incidência transcrita, a verdade é que a jurisprudência dos Tribunais Superiores o tem feito coincidir, como refere o EMMP junto do STA (cfr. parecer de fls. 237), com a ideia de “afectação objectiva, actual, efectiva, do imóvel, pelo que tem sustentado que os terrenos para construção, destinados a habitação, não estão sujeitos a tributação nos termos da verba 28.1 da TGIS, até à redação introduzida pela Lei 83-C/2013, de 31/12, em vigor em 01/01/14”.
E, na verdade, assim é, pois, como tem sido entendido, a dita expressão – “afectação habitacional” - pressupõe a existência de uma edificação apta para ser utilizada para habitação.
A este propósito, e embora por referência aos terrenos para construção, vale a pena recuperar o que ficou dito no acórdão do STA, de 19/04/17, no processo nº 01343/15. Aí se escreveu o seguinte:
“É jurisprudência uniforme deste STA, inexistindo motivos para não se acompanhar, o entendimento de que não tendo o legislador definido o conceito de “prédios (urbanos) com afetação habitacional”, e resultando do artigo 6º do CIMI (subsidiariamente aplicável ao Imposto do Selo previsto na verba nº 28 da TGIS uma clara distinção entre “prédios urbanos habitacionais” e “terrenos para construção”, não podem estes ser considerados, para efeitos de incidência do Imposto do Selo (verba 28.1 da TGIS, na redação da Lei nº 55-A/2012, de 29 de outubro), como prédios urbanos com afetação habitacional”.
Acompanha-se, por isso, o recente acórdão de 01-02-2017, recurso 01069/16, bem como o acórdão de 09.07.2014, recurso n.º 0676/14, na parte que aquele transcreve, nos seguintes termos:
“Desde já se adiantará que o recurso não merece provimento e que a sentença deve ser confirmada pelos motivos já devidamente explicitados nos acórdãos proferidos por esta Secção no dia 9 de Abril 2014, nos processos nºs 1870/13 e 48/14, e no dia 23 de Abril de 2014, nos processos nº 270/14 e 272/14 … bem como em todos os demais acórdãos que se lhes seguiram e que firmaram jurisprudência no sentido de que os “terrenos para construção” não podem ser considerados para efeitos de incidência do Imposto do Selo prevista na Verba 28.1 (na redacção da Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro) como prédios urbanos com afectação habitacional. Trata-se de jurisprudência que também aqui se acolhe, por com ela concordarmos plenamente, pelo que nos limitaremos a reproduzir o que sobre a questão ficou dito no referido acórdão proferido no processo nº 1870/13: «O conceito de “prédio (urbano) com afectação habitacional” não foi definido pelo legislador. Nem na Lei n.º 55-A/2012, que o introduziu, nem no Código do IMI, para o qual o nº 2 do artigo 67º do Código do Imposto do Selo (igualmente introduzido por aquela Lei), remete a título subsidiário. E é um conceito que, provavelmente mercê da sua imprecisão – facto tanto mais grave quanto é em função dele que se recorta o âmbito de incidência objectiva da nova tributação -, teve vida curta, porquanto foi abandonado aquando da entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2014 (Lei nº 83-C/2013, de 31 de Dezembro), que deu nova redacção àquela verba n.º 28 da Tabela Geral, e que recorta agora o seu âmbito de incidência objectiva através da utilização de conceitos que se encontram legalmente definidos no artigo 6º do Código do IMI.
Esta alteração - a que o legislador não atribuiu carácter interpretativo, nem nos parece que o tenha –, apenas torna inequívoco para o futuro que os terrenos para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação se encontram abrangidos no âmbito da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (desde que o respectivo valor patrimonial tributário seja de valor igual ou superior a 1 milhão de euros), nada esclarecendo, porém, em relação às situações pretéritas (liquidações de 2012 e 2013), como a que está em causa nos presentes autos. Ora, quanto a estas, não parece poder perfilhar-se a interpretação da recorrente, porquanto não resulta inequivocamente nem da letra, nem do espírito da lei que a intenção desta tenha sido, ab initio, a de abranger no seu âmbito de incidência objectiva os terrenos para construção para os quais tenha sido autorizada ou prevista a construção de edifícios habitacionais, como resulta hoje inequivocamente da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo. Da letra da lei nada de inequívoco decorre, aliás, pois ela própria ao utilizar um conceito que não definiu e que também não se encontrava definido no diploma para o qual remeteu a título subsidiário prestou-se, desnecessariamente, a equívocos, em matéria – de incidência tributária - em que a certeza e a segurança jurídica deviam também ser preocupações cimeiras do legislador.
E do seu “espírito”, apreensível na exposição de motivos da proposta de lei que está na origem da Lei nº 55-A/2012 (Proposta de Lei nº 96/XII – 2ª, Diário da Assembleia da República, série A, nº 3, 21/09/2012, p. 44, disponível em www.parlamento.pt) nada mais decorre senão a preocupação de angariar novas receitas fiscais, sobre fontes de riqueza “mais poupadas” no passado … que os rendimentos do trabalho, em particular os rendimentos de capitais, mais-valias mobiliárias e a propriedade, motivos estes que nenhum contributo relevante trazem ao esclarecimento do conceito de “prédios (urbanos) com afectação habitacional”, porquanto o dão como assente, sem preocupação alguma de o esclarecer. Tal esclarecimento terá, porém, surgido, aquando da apresentação e discussão na Assembleia da República daquela proposta de lei, nas palavras do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que terá referido expressamente, conforme se colhe do Diário da Assembleia da República (DAR I Série nº 9/XII – 2, de 11 de Outubro, p. 32) que: «O Governo propõe a criação de uma taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor. É a primeira vez que em Portugal é criada uma tributação especial sobre propriedades de elevado valor destinadas à habitação. Esta taxa será de 0,5% a 0,8% em 2012 e de 1% em 2013, e incidirá sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros” (sublinhados nossos), donde se colhe que a realidade a tributar tida em vista são, afinal, e não obstante a imprecisão terminológica da lei, “os prédios (urbanos) habitacionais”, em linguagem corrente “as casas”, e não outras realidades. O facto de se poder considerar que na determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos classificados como terrenos para construção se deve levar em conta a afectação que terá a edificação para ele autorizada ou prevista para determinação do respectivo valor da área de implantação (cfr. os nºs 1 e 2 do artigo 45º do CIMI), não determina que os terrenos para construção possam ser classificados como “prédios com afectação habitacional”, porquanto a “afectação habitacional” surge sempre no Código do IMI referida a “edifícios” ou “construções”, existentes, autorizados ou previstos, porquanto apenas estes podem ser habitados, o que não sucede no caso dos terrenos para construção, que não têm, em si mesmos, condições para tal, não sendo susceptíveis de serem utilizados para habitação senão se e quando neles for edificada a construção para eles autorizada e prevista (mas nesse caso não serão já “terrenos para construção” mas outra espécie de prédios urbanos – “habitacionais”, “comerciais, industriais ou para serviços” ou “outros” – artigo 6º do CIMI).
Estranho seria, aliás, que a determinação do âmbito da norma de incidência tributária da verba nº 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo se encontrasse, ao fim e ao cabo, nas normas de determinação do valor patrimonial tributário do Código do IMI, e que a imprecisão terminológica do legislador na redacção daquela regra fosse, afinal, elucidada e finalmente esclarecida por via de uma remissão, indirecta e equívoca, para o coeficiente de afectação estabelecido pelo legislador em relação a prédios edificados (artigo 41º do Código do IMI). Assim, atendendo a que um terreno para construção – qualquer que seja o tipo e a finalidade da edificação que nele será, ou poderá ser, erigida – não satisfaz, só por si, qualquer condição para como tal ser licenciado ou para se poder definir como sendo a habitação o seu destino normal, e referindo-se a norma de incidência do imposto do selo a prédios urbanos com “afectação habitacional”, sem que seja estabelecido qualquer conceito específico para o efeito, não pode dela extrair-se que na mesma se contenha uma potencialidade futura, inerente a um distinto prédio que porventura venha a ser edificado no terreno”.
Conclui-se pois, em conformidade com o decidido na sentença sob recurso que, resultando do artigo 6º do Código do IMI uma clara distinção entre prédios urbanos “habitacionais” e “terrenos para construção”, não podem estes ser considerados como “prédios com afectação habitacional” para efeitos do disposto na verba nº 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, na sua redacção originária, que lhe foi conferida pela Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro».”.
Ora, no caso concreto em análise, e tal como decorre do ponto 6 dos factos provados (o qual não foi impugnado), em 30/10/2012, por despacho do Vereador da Camara Municipal de Lisboa, foi declarado totalmente devoluto o prédio em questão; tal prédio encontra-se em ruínas.
Significa isto que, à data do facto tributário, o imóvel em causa era insusceptível de, efectivamente, ser afecto à habitação, já que um prédio devoluto e em ruínas não apresenta funcionalidade (para a habitação) real e presente, independentemente da afectação futura ou expectável e/ou da afectação pretérita.
Diga-se, ainda, que, nos termos do artigo 46º (Valor patrimonial tributário dos prédios da espécie «Outros»), nº4, do CIMI, “O valor patrimonial tributário dos prédios urbanos em ruínas é determinado como se de terreno para construção se tratasse, de acordo com deliberação da câmara municipal”, o que nos afasta, e muito, da ideia de prédio urbano habitacional e nos remete para o entendimento da jurisprudência já citada a propósito da verba 28.1 da TGIS e dos terrenos para construção.
A este propósito, como defende a Recorrida, mal se perceberia, aliás, que “se os prédios em ruínas não são susceptíveis de ser qualificados, para efeitos de IMI, como prédios habitacionais” …pudessem “ser havidos como prédios com afectação habitacional para efeitos de tributação em sede de Imposto do Selo”.
Como tal, em face de tudo quanto ficou dito, e como a sentença concluiu, entende-se que o prédio em questão – devoluto e em ruínas - não pode ser considerado como prédio “com afectação habitacional”, para efeitos do disposto na verba 28.1 da TGIS, na redacção que aqui vem sendo considerada.
Acrescente-se, ainda, como se referiu numa enunciação certeira em processo arbitral (processo nº 50/2013-T, de 20/10/13), que “Assim, à face da primitiva redacção da verba 28.1 da TGIS, é de concluir que se visou tributar a titularidade de direitos sobre habitações de luxo, por ela revelar superior capacidade contributiva de quem os detém, como se entendeu no acórdão arbitral de 29-10-2013, proferido no processo n.º 50/2013-T, que esteve subjacente ao referido acórdão do Tribunal Constitucional”. No mesmo sentido, o processo arbitral nº 72/2014-T e 50/2013-T, do CAAD.
Sem prejuízo daquilo que ficou dito, importa não desconsiderar o que a Recorrente defende nas suas conclusões B, C e D, já antes referidas, a propósito do alcance do despacho do Vereador da Câmara Municipal de Lisboa e, bem assim, da falta de promoção, por banda da Recorrida, do procedimento a que se reporta o artigo 130º, nº 3 do CIMI, nos termos do qual o sujeito passivo, a câmara municipal e a junta de freguesia podem, a todo o tempo, reclamar de qualquer incorrecção nas inscrições matriciais, com fundamento, designadamente, no previsto nas diversas alíneas de tal nº 3, do artigo 130º do CIMI.
Com efeito, para a Recorrente, não tendo a Recorrida promovido o procedimento previsto no artigo 130º, nº 3 do CIMI, tendo em vista a alteração da matriz, então o que releva (para efeitos fiscais) é o que consta da matriz, independentemente da realidade do prédio.
Salvo o devido respeito, não acompanhamos a posição da Recorrente, pois que, como bem evidencia o EMMP, no parecer de fls. 237 dos autos, “inexiste norma no CIS, ou por remissão, no CIMI, que defina como prédios com afectação habitacional os que como tal se encontrem inscritos na matriz, pelo que não pode relevar-se, positivamente, a forma sobre a substância”.
Com efeito, não se nos afigura, para efeitos de aplicação da norma/verba em questão, que a circunstância de o prédio se encontrar inscrito na matriz predial como prédio com afectação habitacional seja impeditiva da demonstração – que aqui foi feita – da sua situação real e actual não condizente com a habitação, como acontece com um prédio em ruínas e, consequentemente, devoluto.
No caso, demonstrou-se, tal como resulta do ponto 6 do probatório, uma realidade substantiva/material diversa da que consta da matriz predial urbana, não podendo tal verdade material deixar de prevalecer, o que aqui expressamente deverá ser evidenciado.
Aliás, o entendimento da Recorrente parece ter pressuposta a atribuição de força probatória plena às matrizes prediais, quando, na realidade, não apenas o sujeito passivo, a câmara municipal e a junta de freguesia podem, a todo o tempo, reclamar de qualquer incorrecção nas inscrições matriciais (nº3 do artigo 130º do CIMI), como, também, “o chefe do serviço de finanças competente pode, a todo o tempo, promover a rectificação de qualquer incorrecção nas inscrições matriciais, salvo as que impliquem alteração do valor patrimonial tributário resultante de avaliação directa com o fundamento previsto na alínea a) do n.º 3”.
E note-se que, nos termos do nº 15 do artigo 112º do CIM, na redacção em vigor em 2012, “para efeitos da aplicação da taxa do IMI prevista no n.º 3, a identificação dos prédios ou fracções autónomas em ruínas compete às câmaras municipais e deve ser comunicada à Direcção-Geral dos Impostos, nos termos e prazos referidos no n.º 13”, donde resulta que o mecanismo para fazer a identificação, e posterior comunicação, dos prédios na condição de “ruínas” está previsto e ao alcance da AT.
Em suma, e sobre este esteio do recurso, dir-se-á, em síntese útil, que, conforme resulta do probatório, provou-se uma realidade substantiva divergente daquela que consta da matriz predial urbana, circunstancialismo que não pode ser ignorado, independentemente de o contribuinte não ter lançado mão do mecanismo previsto no artigo 130º, nº 3 do CIMI.
Face a tudo o que vem dito, e sem necessidade de maiores considerações, há que confirmar a análise feita pelo TT de Lisboa e que levou à anulação da liquidação impugnada.
Nega-se, pois, provimento ao recurso jurisdicional e mantém-se a sentença recorrida.
Realce-se, por fim, que é de manter inalterada a análise e decisão do TT de Lisboa quanto ao reconhecimento do direito a juros indemnizatórios, a qual, se bem virmos o recurso, não é atacada.
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3 – DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 11/07/19


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(Catarina Almeida e Sousa)

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(Hélia Gameiro)

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(Jorge Cortez)