Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:152/10.1BEBJA
Secção:CT
Data do Acordão:05/12/2022
Relator:VITAL LOPES
Descritores:OPOSIÇÃO
GERÊNCIA DE FACTO
ÓNUS PROBANDI
Sumário:I - Sendo o exercício efectivo de funções de administração ou gestão um dos pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária prevista no art. 24.º da LGT, e cabendo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária, deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efectivo exercício de funções de administração ou gestão pelo Oponente.
II - Se o que de pertinente se colhe do probatório é unicamente que a SDO se obrigava, no período das dívidas, com a assinatura de dois gerentes, havendo dois únicos nomeados, o oponente e um outro, não está verificado o requisito da efectividade da gerência, de que depende a reversão.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

1 – RELATÓRIO

D…, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja que julgou improcedente a oposição por si deduzida à execução fiscal n.º …, originariamente instaurada contra “A…– SOCIEDADE DE PRODUTOS DE LIMPEZA, LDA.” e contra si revertida, por dívidas provenientes de IRS dos anos de 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006 e IVA do período 2006/03T, no montante global de 5.816,38€, apresentando para tal as seguintes e doutas conclusões:
«
II- Das Conclusões
1. A devedora originária da presente execução é a sociedade comercial «
Sociedade de Produtos de Limpeza, Lda.n, pelo que será a esta quem deverá quem em primeira linha deverá responder por quaisquer dívidas existentes à Administração Tributária.
2.O projecto da reversão fiscal menciona somente que a «inexistência ou insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do beneficio da excussâo», pelo que caberia à Administração Tributária a demonstração cabal de como averiguou essa inexistência de património da devedora originária que pudesse responderá presente execução, demonstrando os factos que integram o fundamento previsto na lei para que se possa chamar à execução os responsáveis subsidiários pela dívida exequenda, revertendo a execução contra eles.
3. Cabe à Administração Fiscal o ónus de provar que se verificam os pressupostos legais dos quais depende essa reversão, pela demonstração de que não existem bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo que eles são fundadamente insuficientes para a satisfação da dívida exequenda e acrescido.
4. O ónus de averiguação e prova dos requisitos constitutivos do direito à reversão da execução, designadamente quanto à inexistência ou insuficiência dos bens do executado originário, não cabe ao responsável subsidiário, mas à Administração Tributária.
5. O despacho de reversão da execução não obedeceu ao pressuposto da efectiva verificação da inexistência ou da fundada insuficiência do património do devedor originário para a satisfação da dívida exequenda.
6. Não deve ser o Recorrente ser responsabilizado, uma vez que, além de não resultar provada a insuficiência de bens da executada originária, também não deu azo a uma diminuição das garantias patrimoniais da sociedade, devedora originária, enquanto gerente da referida Executada.
7. A Administração Tributária deveria ter averiguado os bens penhoráveis da Executada originária, bem como o seu estado e valor, para a partir daí poder extrair uma conclusão justificada e segura sobre a respectiva suficiência ou insuficiência para pagamento da dívida exequenda e sustentar a legalidade da reversão contra o devedor subsidiário, o que no caso vertente não aconteceu.
8. Deveria ter a Administração Tributária ter responsabilizado a devedora originária, sendo liquidada a dívida exequenda através do seu património, dos bens sociais da mesma, ou em alternativa ter demonstrado realmente e efectivamente que a existia uma fundada insuficiência do seu património social.
9. A prévia excussão do património do devedor é condição objectiva da reversão.
10. Consequentemente, a reversão operada e agora em crise viola o disposto no art.º 23.5, n.º 1 e 2, da Lei Geral Tributária, conjugado com o artigo 1532, n.º 2, do CPPT;
11. Pelo que, não se pode afirmar que há fundada insuficiência de meios da originária devedora para proverão pagamento das dívidas fiscais, prova que lhe competia, até porque existem bens, indicados nos autos, que podem servir para redução da divida reclamada no âmbito da execução.
12. Por outro lado, o Recorrente nunca exerceu a gerência de facto da referida sociedade.
13. De acordo com o art.º 342.º do Código Civil, quem invoca um direito deve demonstrar os factos constitutivos do mesmo, pelo que, no caso subjudice, cabia à Administração Tributária alegar o exercício do cargo de gerente, e, além disso, produzir a prova do exercício real e efectivo das funções de gestão do Recorrente, não o tendo feito.
14. E a Administração Tributária nem sequer o tentou demonstrar, em violação ao disposto no n.º 4 do art.º 23.º da LGT.
15. Perante a necessidade de efectuar prova da gerência de facto, a Administração Tributária veio emitir o Ofício-Circulado n.º 60058, de 17 de Abril de 2008, no âmbito do qual alerta para a necessidade de instruir devidamente os processos, nas situações em que se pretendesse apelar à responsabilidade tributária dos gestores, devendo carrear para os autos todos os elementos que possam provar a gerência efectiva.
16. O sobredito Oficio-Circulado refere ainda que «A reversão contra os responsáveis subsidiários (relembra-se que a redacção do nº 1, do art. 160º, do CPPT, manda reverter contra todos os responsáveis subsidiários), deve ser accionada somente nas hipóteses contempladas no nº 2 do artigo 153º do C.P.P.T., o que envolve os seguintes procedimentos prévios: A averiguação da existência ou não de bens penhoráveis do devedor originário, suficientes para o pagamento integral da divida em execução; A comprovada insuficiência do património do devedor originário para satisfazer a dívida exequenda e seus acréscimos legais.»
17. O que manifestamente não ocorreu no caso vertente, pelo que fica claramente demonstrado que a Administração Tributária não cumpriu o dever de fundamentação a que se encontrava vinculada, na medida em que não faz prova do exercício efectivo de funções de gestão de facto do Recorrente no seio da executada originária.
18. O valor da dívida não é exigível independentemente da legitimidade do Recorrente, para que as mesmas lhe sejam reclamadas, em virtude de terem já decorrido o prazo de oito anos contados a partir do termo em que se verificou o facto tributário, conforme o art.º 48.º, n.º 1 da LGT.
19. Pelo que, não podem ser exigidas, ao ora Recorrente, dívidas que se tenham vencido há mais de oito anos, pelo que, tratando-se de impostos respeitantes aos anos de 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006, e os mesmos estão prescritos.
20. Desta forma, suscitando-se a verificação da excepção de prescrição de créditos, de conhecimento oficioso, implica que o devedor possa opor-se ao seu cumprimento.
Termos em que deverá ser concedido provimento ao recurso interposto pelo ora Recorrente, e em consequência, deverá ser determinada a extinção da execução contra o mesmo, por assim ser de inteira Justiça!”
».

Não foram apresentadas contra-alegações

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu mui douto parecer concluindo que o recurso não merece provimento.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação do Recorrente (cf. artigos 634.º, n.º4 e 639.º, n.º1 do CPC), são estas as questões que importa apreciar: (i) se a sentença incorreu em erro de julgamento, de facto e de direito, ao concluir estarem verificados os pressupostos de que depende a reversão contra os gerentes de sociedades, nomeadamente, o exercício efectivo do cargo e a inexistência/ insuficiência de bens da SDO; (ii) se ocorre prescrição das dívidas.

3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Em sede factual, deixou-se consignado na sentença recorrida:
«

6. FACTOS PROVADOS
Contra a sociedade comercial “A… – Sociedade de Produtos de Limpeza, LDA” foram instauradas as execuções fiscais nº … e a diversas outras que a ela foram apensas, para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IRS dos anos de 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006 e IVA referente ao período 2006/03T.

Das diligências levadas a cabo no seio de tais execuções foi apurado não serem conhecidos bens penhoráveis na titularidade da sociedade executada.

Apurada a gerência da sociedade caber ao aqui oponente ao tempo das dívidas tributárias em cobrança foi o mesmo notificado para efeitos de audição prévia à reversão da execução.

O oponente não exerceu o seu direito.

A execução veio a reverter contra o oponente por despacho de 17/03/2010, na qualidade de sócio gerente da sociedade executada, por esta não possuir qualquer património de acordo com auto de diligências lavrado com tal teor.

O oponente foi citado em reversão para a aludida execução em 28/03/2010.

Em 22/04/2010 apresentou a petição inicial que deu origem aos presentes autos.

6.1.
Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados no teor dos documentos dos autos os quais não foram impugnados directamente pelo oponente.
7.
FACTOS NÃO PROVADOS
Não resultaram provados todos os factos alegados pelo oponente que se mostrem contrários aos considerados assentes.
7.1.
A falta de prova decorreu do facto de não ter sido apresentado qualquer meio de prova idóneo a satisfazê-la.».

Ao abrigo do disposto no art.º 662/1 do CPC, altera-se o 3.º parágrafo do probatório, que passa a ter a seguinte redacção:

“Apurado pela certidão da CRC de Loulé relativa à matrícula da sociedade devedora originária ser o oponente gerente inscrito ao tempo das dívidas tributárias em cobrança, foi o mesmo notificado para efeitos de audição prévia à reversão da execução (cf. CRC a fls. 12 a 14 e projecto de reversão a fls.28, todas do apenso de execução).

4 – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Como enunciamos já nas questões a decidir, a linha de defesa do oponente, tal como se apreende da P.I., prende-se com a falta de prova dos pressupostos da reversão, nomeadamente, com a ausência de prova do exercício efectivo da gerência no período das dívidas revertidas e da inexistência/ insuficiência de bens penhoráveis da sociedade devedora originária (SDO), tendo sido suscitada em sede recursiva, como questão nova, a prescrição das dívidas exequendas.

Começaremos por apreciar a questão da falta de prova da efectividade da gerência do oponente no período a que se reportam as dívidas revertidas, adiantando-se que sendo este um dos pressupostos essenciais da reversão, a sua não verificação, compromete de imediato a legitimidade substantiva do revertido para a execução, sendo inútil indagar dos demais pressupostos.

Em causa, está a reversão de dívidas provenientes de IRS de 2002 e anos seguintes e IVA de 2006.

Aplica-se o regime de responsabilidade subsidiária previsto na Lei Geral Tributária, cujo art.º 24.º, n.º 1, dispõe:

«1 - Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento»
.

Resulta daquele preceito legal, desde logo, que um dos requisitos da responsabilidade subsidiária dos membros de corpos sociais é o exercício de facto de funções de administração ou gestão.

Como exemplarmente se deixou consignado no recente Acórdão deste TCA de 12/03/2020 tirado no proc.º2548/14.0BELRS,

«No que diz respeito às regras do ónus da prova relativamente ao exercício de facto de funções de administração ou gestão, importa ter presente que o Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão do Pleno do CT do STA de 28/02/2007, proc. n.º 01132/06, reiterado posteriormente, pelo acórdão do STA de 10/12/2008, proc. n.º 0861/08, e pelo acórdão do Pleno do CT do STA de 21/11/2012, proc. n.º 0474/12) considerou, ainda no âmbito do regime do CPT, que competindo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária, «deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efetivo exercício da gerência».

Entendeu-se no que respeita ao exercício das funções de gerência que «sendo possível ao julgador extrair, do conjunto dos factos provados, esse efetivo exercício, tal só pode resultar da convicção formada a partir do exame crítico das provas, que não da aplicação mecânica de uma inexistente presunção legal».

Com este acórdão, fica assim sem margens para dúvidas, afastado o entendimento segundo o qual, uma vez verificada a gerência nominal ou de direito, se presume a gerência de facto ou efetiva.
Estas regras do ónus da prova aplicam-se, de igual modo, no âmbito do regime do art. 24.º da LGT.

Não obstante, nada impede que o julgador possa valorar criticamente toda a prova que consta do processo de execução fiscal para formar a sua convicção, inclusive a certidão da matrícula da sociedade executada originária e as respetivas inscrições, em particular, aquelas que dizem respeito à existência de um ou mais
gerentes ou administradores nomeados, e a forma como se vincula a sociedade, que poderão constituir factos indiciadores da gerência de facto e que podem e devem ser conjugados com outros meios de prova constantes do processo.

O julgador deve extrair do conjunto dos factos provados o efetivo exercício da gerência, formando a sua convicção pelo exame crítico das provas, mas já não pela “aplicação mecânica de uma inexistente presunção legal.” [acórdão do Pleno do CT do STA de 21/11/2012, proc. n.º 0474/12], e diremos mais, de igual modo, também não poderá o julgador resguardar-se na inexistência de presunção para se eximir do exame crítico da prova (cf. acórdão do TCAS de 11/07/2019, proc. n.º 281/11.4BELRS
).

Com efeito, naquele acórdão do Pleno do CT do STA de 21/11/2012, proc. n.º 0474/12, sumariou-se: “I - No regime do Código de Processo Tributário relativo à
responsabilidade subsidiária do gerente pela dívida fiscal da sociedade, a única presunção legal de que beneficia a Fazenda Pública respeita à culpa pela insuficiência do património social. II - Não existe presunção legal que imponha que, provada a gerência de direito, por provado se dê o efectivo exercício da função, na ausência de contraprova ou de prova em contrário. III - A presunção judicial, diferentemente da legal, não implica a inversão do ónus da prova. IV - Competindo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efectivo exercício da gerência. V - Sendo possível ao julgador extrair, do conjunto dos factos provados, esse efectivo exercício, tal só pode resultar da convicção formada a partir do exame crítico das provas, que não da aplicação mecânica de uma inexistente presunção legal.” (sublinhado nosso).

Como
supra exposto, não existe uma presunção legal segundo a qual o gerente de direito o é, também, de facto, sendo esse um elemento a considerar na decisão de facto.

Em suma, a partir da prova produzida o juiz pode firmar um facto desconhecido, usando as regras da experiência e juízos de probabilidade, através de presunção judicial nos termos do art. 350.º do Código Civil (v. acórdão do STA de 10/12/2008, proc. n.º 0861/08: “(…) IV - No entanto, o facto de não existir uma presunção legal sobre esta matéria, não tem como corolário que o Tribunal com poderes para fixar a matéria de facto, no exercício dos seus poderes de cognição nessa área, não possa utilizar as presunções judiciais que entender, com base nas regras da experiência”). O que não se poderá é inferir a gerência de facto automática e exclusivamente com base na gerência de direito, sob pena de reconduzir a presunção judicial a uma presunção legal, como resulta da jurisprudência fixada pelo STA.

Desta forma, no procedimento de reversão, a AT deve procurar determinar se os
gerentes de direito exerceram de facto essa gerência, e para formar essa convicção, deve juntar ao processo executivo elementos de prova que a corroborem, de modo a satisfazer o seu ónus probatório. Se concluir pelo não exercício de facto da gerência pelos gerentes de direito, deve então apurar quem exerceu a gerência de facto do sujeito passivo, na medida em que tais pessoas são responsáveis subsidiários ainda que a sua atuação seja “somente de facto”, como refere o n.º 1 do art.º 24.º da LGT, pois no preceito legal não se exige a gerência nominal ou de direito, sendo suficiente a mera gerência efetiva ou de facto.» (fim de citação).

Nesta linha de entendimento e descendo aos autos, do probatório não constam quaisquer factos relevantes com base nos quais se possa formar a convicção quanto à efectividade da gerência do oponente, lembrando-se que a dúvida a tal respeito se resolve contra a Fazenda Pública que é a parte onerada com a prova, enquanto titular do direito de reversão.

Com efeito, o que de pertinente e a respeito se colhe dos autos e do probatório é unicamente que a SDO se obrigava, no período das dívidas, com a assinatura de dois gerentes, havendo dois únicos inscritos, o oponente e L… (cf. certidão da CRC de Loulé, a fls.13 do apenso de execução).

Quanto ao facto de a SDO se obrigar com a assinatura de dois gerentes, havendo unicamente dois, o oponente e um outro, tal não é decisivo (sem prejuízo de valer como princípio de prova a complementar com outra factualidade validante), para se poder concluir pela intervenção conjunta de ambos os gerentes na gestão da sociedade, pois não obstante a gerência plural estabelecida no contrato de sociedade, tal nada revela quanto ao modo como, na prática e de facto, se operacionalizava a gestão da sociedade (cf. artigos 259.º a 261.º, do Cód. das Sociedades Comerciais).

Vem a propósito chamar à colação o já distante Acórdão do STJ de 8-6-1999, publicado no BMJ nº 488, págs. 371 e ss., onde se expressou o seguinte entendimento:

«Nos termos do nº 1 do artigo 260.º “os actos praticados pelos gerentes, em nome da sociedade e dentro dos poderes que a lei lhes confere, vinculam-na para com terceiros, não obstante as limitações constantes do contrato social ou resultantes de deliberações dos sócios”.
Quer isto significar que as limitações voluntárias (em especial as constantes do pacto social) dos poderes de representação da sociedade pelos gerentes não retiram validade e eficácia aos actos por eles praticados no exercício desses poderes».

Ainda recentemente tal entendimento foi acolhido no ac. da Relação de Évora de 06/27/2019, tirado no proc.º 722/18.0T8STB.E1.

Assim, se por um lado a sociedade pode vincular-se validamente perante terceiros com a intervenção de um número de gerentes inferior ao previsto no pacto social e assim prosseguir os seus negócios, por outro, constata-se que nenhum acto interno ou externo relacionado com a actividade da sociedade foi sinalizado pela Fazenda Pública como praticado pelo oponente no período das dívidas (ou sequer anterior) e tal era decisivo para se poder afirmar a efectividade da sua gerência.

A sentença recorrida ao assentar o pressuposto da efectividade da gerência apenas na circunstância de o oponente ser sócio e gerente inscrito da sociedade devedora originária, incorreu em erro de julgamento.

Concluindo e, em suma, sendo o exercício efectivo de funções de gerente um dos pressupostos da responsabilidade subsidiária prevista no art.º 24.º da LGT, e cabendo à Fazenda Pública o ónus da prova desse pressuposto da responsabilidade subsidiária, contra si deve ser valorada a falta de prova do efectivo exercício das funções de gerência do oponente na SDO com referência ao período das dívidas.

A sentença recorrida enferma do erro de julgamento que lhe é apontado, sendo de revogar e conceder provimento ao recurso.

Fica prejudicado o conhecimento das restantes questões do recurso.


5 - DECISÃO
Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar procedente a oposição.

Condena-se o Recorrido em custas (que não são devidas nesta instância por não ter contra-alegado).

Lisboa, 12 de Maio de 2022



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Vital Lopes




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Luísa Soares




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Tânia Meireles da Cunha