Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:558/18.8 BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:10/28/2021
Relator:LUÍSA SOARES
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO; NULIDADE INSUPRÍVEL; DESCRIÇÃO SUMÁRIA DOS FACTOS
Sumário: O requisito da decisão administrativa de aplicação de coima “descrição sumária dos factos” (cfr. art. 79.º, n.º 1, alínea b), primeira parte, do RGIT) tem de ser interpretado em correlação necessária com o tipo legal no qual se prevê e pune a infracção imputada ao arguido, pelo que os factos que importa descrever sumariamente na decisão de aplicação da coima não são senão os factos essenciais que integram o tipo de ilícito em causa.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL


I – RELATÓRIO

Vem a AT – Autoridade Tributária e Aduaneira apresentar recurso contra a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou procedente o recurso de contra-ordenação e anulou a decisão de aplicação de coima à sociedade E., Lda., no montante de € 2.532,60, por nulidade insuprível prevista no art. 63º, nºs 1, alínea d), 3 e 5 do RGIT.
A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

I- Sem quebra do devido respeito, não pode a Fazenda Pública concordar com o decidido no Douto Despacho, ora recorrido, que julgou nula a decisão de aplicação de coima da Autoridade Tributária e Aduaneira por não satisfazer as exigências previstas nas alíneas b) do n.º 1 do artigo 79.º do RGIT, por força do prescrito na alínea d) do n.º 1 do artigo 63.º do mesmo diploma, assim como por ter sido completamente omitida a notificação da arguida para efeitos de apresentação de defesa;

II. Como referido no ponto 3 dos factos provados, da decisão de fixação da coima, sob o título “Descrição sumária dos factos”, constam os factos pelos quais foi levantado o Auto de Notícia, nomeadamente o Tributo em causa: Taxa de portagem, as datas, horas e locais das infrações, a identificação das viaturas e montantes das taxas de portagem;

III. Seguidamente são indicadas, por infração, as normas infringidas, o Art.º 5º nº 1 a) e punitivas, o Art.º 7º, ambos da Lei nº 25/06 de 30.06, o período de tributação, data da infração e coima fixada para cada uma das datas em que foram praticadas as infrações; bem como constam da referida decisão os elementos que contribuíram para a sua fixação, nomeadamente a inexistência de atos de ocultação e de benefício económico para o agente, o carácter frequente da prática, o ter sido cometida por negligência simples, a situação económica e financeira do agente baixa e terem decorrido mais de seis meses desde a prática da infração, em conformidade com o disposto no artigo 27.º do RGIT;

IV. É ainda referido terem sido respeitados os limites do art.º 26.º do RGIT quanto ao montante das coimas;

V. Salvo melhor opinião, foi, desta forma, devidamente cumprido o disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 79.º do RGIT, que o Douto Despacho considera violada;

VI. Sobre matéria idêntica à dos presentes Autos, o Supremo Tribunal Administrativo (STA) no Acórdão de 17.10.2018, proferido no Processo n.º 01004/17.0BEPRT, entre outros, concluiu «(…) I - O requisito da decisão administrativa de aplicação de coima “descrição sumária dos factos” [cfr. art. 79.º, n.º 1, alínea b), primeira parte, do RGIT] tem de ser interpretado em correlação necessária com o tipo legal no qual se prevê e pune a infracção imputada ao arguido, pelos que os factos que importa descrever sumariamente na decisão de aplicação da coima não são senão os factos essenciais que integram o tipo de ilícito em causa; II - Não é nula por violação do disposto na segunda parte da alínea b) do n.º 1 do art. 79.º do RGIT – que impõe à decisão de aplicação da coima a «indicação das normas violadas e punitivas» – a decisão que, fazendo a indicação daquelas normas, não menciona a moldura abstracta da coima; III - O requisito da decisão administrativa de aplicação de coima “indicação dos elementos que contribuíram para a […] fixação” da coima [cfr. art. 79.º, n.º 1, alínea c), do RGIT] deve ter-se por cumprido se, embora de forma sintética e padronizada, refere os elementos que contribuíram para a fixação da coima.»;

VII. No mesmo sentido se pronunciou o STA no Acórdão de 23.01.2019, proferido no Processo n.º 0207/17.1BEVIS e no Acórdão de 08.01.2020, proferido no Processo n.º 0422/19.3 BEPNF; bem como o TCA Norte, por Acórdão de 15.11.2018, proferido no Processo n.º 02187/17.4 BEBRG e por Acórdão de 23.05.2019, proferido no Processo n.º 01218/18.5;

VIII. Ao concluir pela nulidade processual por completa omissão de notificação ao Arguido para defesa, desinteressando-se de saber se tal notificação existiu, violou o princípio da descoberta da verdade material;

IX. Ao decidir como decidiu, o Douto Despacho violou também o disposto nas alíneas b) do n.º 1 do art.º 79.º e alínea d) do n.º 1 do art.º 63.º, todos do RGIT.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a Vossas Excelências se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e, em consequência, ser a decisão judicial ora recorrida declarada nula, ou revogada, e substituída por douto Acórdão que julgue o recurso judicial de aplicação de coima totalmente improcedente, mantendo válida a decisão de aplicação de coima que foi julgada nula em primeira instância.”.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, pronunciou-se no sentido de ser concedido provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.
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II- OBJECTO DO RECURSO

A questão invocada pela Recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir, assenta no alegado erro de julgamento quanto à nulidade insuprível na decisão de aplicação da coima.
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III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“Com interesse para a decisão da causa, de acordo com as diversas soluções plausíveis de direito, julgam-se provados os seguintes factos, com atinência aos meios de prova respectivos:
1.
No Serviço de Finanças do Seixal 2 foi autuado contra “E., Lda.” o processo de contra-ordenação n.º 3697-2018/060000058051, por infracção ao artigo 5.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 25/06, de 30 de Junho (falta de pagamento de taxa de portagem), punida pelo artigo 7.º do mesmo diploma legal – cfr. fls. 3 dos autos;
2.
No dia 1 de Maio de 2018, a Chefe do Serviço de Finanças do Seixal 2 proferiu, no processo de contra-ordenação n.º 3697-2018/060000058051, decisão de aplicação de coima à Arguida – a qual se dá aqui por integramente reproduzida -, e na qual consta, designadamente, o seguinte:

Imagens: Originais nos autos






- cfr. fls. 11 a 13 dos autos;
3.
Com data de 7 de Maio de 2018 foi enviada, à Arguida, notificação da decisão de aplicação da coima, melhor identificada no ponto anterior, da qual se extrai o seguinte extracto:
Imagem. Original nos autos
- cfr. fls. 28 dos autos.
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Inexistem quaisquer factos, com interesse para a decisão da causa, que importe dar como não provados.

II-B. FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
O Tribunal considera provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base nos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados pelas partes, nem existem indícios que ponham em causa a sua genuinidade.”.
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IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Por despacho proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada foi anulada a decisão de aplicação da coima à sociedade E., Lda., no montante de € 2.532,60, por nulidade insuprível prevista no art. 63º, nºs 1, alínea d), 3 e 5 do RGIT.

O Tribunal a quo atendeu, em sede factual, à instauração do processo de contra-ordenação contra a arguida por falta de pagamento de taxas de portagem, no qual foi aplicada a coima única no valor de € 2.532,60, pela prática de infracções previstas e puníveis nos termos das disposições conjugadas dos artigos 5º, nº 2, 7º e 10º da Lei nº 25/2006, de 30 de Junho, bem como ao teor da notificação da decisão de aplicação da coima (cfr. pontos 2 e 3 do probatório). E, com base nessa factualidade, conclui pela existência de nulidade insuprível com a seguinte fundamentação:
Na situação em discussão nos presentes autos, e em conformidade com a matéria de facto dada como assente, verifica-se que em nome da Recorrente foi instaurado procedimento contra-ordenacional, com fundamento em infracção ao artigo 5.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 25/2006, de 30 de Junho, punida pelo artigo 7.º do mesmo diploma legal – cfr. ponto 1 do probatório.
Da decisão de aplicação de coima enviada à Arguida – cfr. ponto 3 do probatório -, resulta que os factos apurados, bem como as normas punitivas, podem ser consultados [pelo Arguido] no endereço electrónico http.//www.portaldasfinancas.gov.pt.
Ou seja, nada é comunicado à Arguida, na decisão de aplicação de coima que lhe foi transmitida, que preencha, ainda que remotamente, a necessária descrição sumária dos factos, como impõe a alínea b) do n.º 1 do artigo 79.º do Regime Geral das Infracções Tributárias.
O que traduz, inapelavelmente, uma compressão inaceitável dos direitos da Arguida, num procedimento de cariz sancionatório, impondo-lhe, caso queira saber quais os factos que consubstanciam infracções que lhe são imputados -, que diligencie nesse sentido.
A decisão recorrida, nos moldes em que foi levada ao conhecimento da Recorrente, não descreve absolutamente nada, nenhum facto, para preenchimento do requisito legal da decisão de aplicação de coima no que à descrição dos factos se refere, impondo-lhe ao invés, à Arguida, caso queira, porventura, tomar conhecimento dos factos que sustentam a coima aplicada, que assuma uma atitude “pró-activa”, para tal.
Assim, e porque com tal “descrição” a Arguida, ora Recorrente, não foi, de todo, informada da conduta que lhe é imputada, não pode ter-se por preenchido o requisito essencial da decisão de aplicação da coima relativo, precisamente, à descrição sumária dos factos, na decisão recorrida.
Em face do que precedentemente resulta expendido, a decisão administrativa de aplicação de coima em discussão nos presentes autos viola o disposto no artigo 79.º, n.º 1, alínea b), do Regime Geral das Infracções Tributárias, consubstanciando uma nulidade insuprível consagrada no artigo 63.º, n.ºs 1, alínea d), 3 e 5, do mesmo diploma, o que impõe a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente, o que equivale a dizer que deve ser julgada nula a decisão sob recurso, bem como anulados os seus termos posteriores”.

Insurgindo-se com o assim decidido veio a AT- Autoridade Tributária e Aduaneira interpor o presente recurso defendendo ter sido cumprido o disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 79.º do RGIT. Alega para o efeito que, como decorre do ponto 3 dos factos provados, da decisão de fixação da coima, sob o título “Descrição sumária dos factos”, constam os factos pelos quais foi levantado o Auto de Notícia, nomeadamente o Tributo em causa: Taxa de portagem, as datas, horas e locais das infrações, a identificação das viaturas e montantes das taxas de portagem, tendo ainda sido indicadas, por infração, as normas infringidas, o Art.º 5º nº 1 a) e punitivas, o Art.º 7º, ambos da Lei nº 25/06 de 30.06, o período de tributação, data da infração e coima fixada para cada uma das datas em que foram praticadas as infrações; bem como constam da referida decisão os elementos que contribuíram para a sua fixação, nomeadamente a inexistência de atos de ocultação e de benefício económico para o agente, o carácter frequente da prática, o ter sido cometida por negligência simples, a situação económica e financeira do agente baixa e terem decorrido mais de seis meses desde a prática da infração, em conformidade com o disposto no artigo 27.º do RGIT, sendo ainda referido terem sido respeitados os limites do art.º 26.º do RGIT quanto ao montante das coimas (cfr. conclusões II a V das alegações de recurso).

Em abono da sua tese a Recorrente apoiou-se em jurisprudência do STA para sustentar que no caso em apreço, a descrição sumária dos factos permite à arguida perceber que não pagou as taxas de portagem devidas pela utilização de estruturas rodoviárias, com a discriminação do local, período e viatura utilizada e, ainda, que as decisões contêm todos os elementos exigidos pelo artigo 27º do RGIT para a fixação da coima, pelo que pede a anulação da decisão recorrida, mantendo válida a decisão de aplicação da coima.

Assim, a questão a decidir é a de saber se o tribunal a quo fez correcto julgamento ao anular a decisão administrativa de aplicação da coima pela nulidade insuprível prevista no art. 63.º, n.ºs 1, alínea d), 3 e 5, do RGIT («falta dos requisitos legais da decisão de aplicação das coimas», a determinar «a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente»), por violação do disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 79.º do mesmo Regime por desrespeito da exigência da «descrição sumária dos factos».

Tem sido entendido em diversos Acórdãos do STA que “A «descrição sumária dos factos» imposta pela alínea b) do n.º 1 do art. 79.º do RGIT e, bem assim, os demais requisitos da decisão de aplicação da coima enumerados nesse número «devem ser entendidos como visando assegurar ao arguido a possibilidade de exercício efectivo dos seus direitos de defesa, que só poderá existir com um conhecimento perfeito dos factos que lhe são imputados, das normas legais em que se enquadram e condições em que pode impugnar judicialmente aquela decisão» (JORGE LOPES DE SOUSA e MANUEL SIMAS SANTOS, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, Áreas Editora, 2010, 4.ª edição, anotação 1 ao art. 79.º, pág. 517. ). Por isso, essas exigências «deverão considerar-se satisfeitas quando as indicações contidas na decisão sejam suficientes para permitir ao arguido o exercício desses direitos» (Ibidem.), assim assegurando o direito de defesa ao arguido [cfr. art. 32.º, n.º 10, da Constituição da República Portuguesa].

Quanto à descrição sumária dos factos na decisão administrativa, disse GERMANO MARQUES DA SILVA, em intervenção no Centro de Estudos Judiciários: «em resposta à questão de «qual o limite para a descrição sumária dos factos enquanto garantia de defesa» a minha resposta é também sumária: deve descrever o facto nos seus elementos essenciais para que o destinatário possa saber o que lhe é imputado e de que é que tem de se defender sem necessidade de consultar outros elementos em posse da administração» ( Cfr. Contra-ordenações Tributárias 2016 [Em linha], Centro de Estudos Judiciários, 2016, pág. 20, (…) bastando-se a lei como uma descrição sumária dos factos, afigura-se-nos que esta exigência se há-de considerar satisfeita quando, como no caso sub judice, o elemento essencial do tipo – a falta de pagamento da taxa de portagem pela circulação de veículo automóvel em infra-estruturas rodoviárias, designadamente auto-estradas e pontes – está descrito na decisão administrativa; e está, não apenas por referência à norma que prevê a contra-ordenação, o que não seria suficiente, mas mediante a descrição detalhada do comportamento: falta de pagamento de taxas de portagem referente ao veículo identificado pela respectiva matrícula e com referência aos trajectos expressamente indicados, com indicação dos locais, datas e horas a que se verificaram as infracções e aos montantes das respectivas taxas.

É certo que a “Falta de pagamento da taxa de portagem” não está referida na parte da decisão administrativa que tem como epígrafe “Descrição Sumária dos Factos”, mas na parte intitulada “Normas Infringidas e Punitivas”, sob a indicação das dessas normas. Mas essa menção, apesar de fora do lugar adequado na decisão administrativa condenatória, constitui uma efectiva descrição da factualidade que integra o tipo contra-ordenacional (Vide o comentário de JORGE LOPES DE SOUSA e MANUEL SIMAS SANTOS, ob. cit, na nota de rodapé com o n.º 153, pág. 425, a propósito de uma situação paralela, objecto do acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de Junho de 2007, proferido no processo n.º 353/07, (…) e, conjugada com a demais, aduzida no lugar próprio, não deixa à Arguida qualquer dúvida sobre a factualidade que lhe foi imputada. Essa factualidade, conjugada com a indicação das normas que prevêem e punem a infracção, permite à Arguida exercer plenamente o seu direito de defesa relativamente à decisão de aplicação da coima.

Como, lapidarmente, ficou dito no acórdão de 7 de Outubro de 2015 desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 218/15, «O requisito da decisão administrativa de aplicação da coima “descrição sumária dos factos”, constante da primeira parte da alínea b) do n.º 1 do artigo 79.º, do RGIT, há-de interpretar-se em correlação necessária com o tipo legal de infracção no qual se prevê e pune a contra-ordenação imputada à arguida, pois que os factos que importa descrever, embora sumariamente, na decisão de aplicação da coima não são outros senão os factos tipicamente ilícitos declarados puníveis pela norma fiscal punitiva aplicada” (cfr. entre outros o Acórdão do STA de 17/10/2018 no processo nº 1004/17.0BEPRT, de 16/09/2020 - proc 470/18.0BEALM, de 14/10/2020 – proc. 0645/17.0BELLE e de 28/10/2020 -proc. 1959/17.4BEBRG).

O despacho recorrido considerou que a decisão administrativa que aplicou a coima única não respeitou a exigência quanto à descrição sumária dos factos como acima transcrito. Desde já se afirma que não sufragamos tal entendimento porquanto , bastando-se a lei com uma descrição sumária dos factos, afigura-se-nos que esta exigência se há-de considerar satisfeita quando, como no caso sub judice, o elemento essencial do tipo – a falta de pagamento da taxa de portagem pela circulação de veículo automóvel em infra-estruturas rodoviárias, designadamente auto-estradas e pontes – está descrito na decisão administrativa; e está, não apenas por referência à norma que prevê a contra-ordenação, mas mediante a descrição detalhada do comportamento: falta de pagamento de taxas de portagem referente ao veículo identificado pela respectiva matrícula e com referência aos trajectos expressamente indicados, com indicação dos locais, datas e horas a que se verificaram as infracções e aos montantes das respectivas taxas.

Em suma, a descrição sumária da factualidade constante da decisão administrativa que aplicou a coima permite à arguida o exercício cabal do seu direito de defesa, não subsistindo dúvida alguma quanto aos factos que lhe são imputados, motivo por que não concordamos com a sentença quando considera que essa decisão enferma de nulidade por inobservância do requisito constante da primeira parte da alínea b) do n.º 1 do art. 79.º do RGIT

Atento o entendimento jurisprudencial acima transcrito, conclui-se não existir nulidade insuprível na decisão de aplicação da coima ora recorrida, pelo que julga-se procedente o recurso e em consequência anula-se a decisão recorrida.

Cumpre agora conhecer dos demais fundamentos invocados pela arguida, em concreto quanto à alegada isenção do pagamento das portagens em virtude de o veículo automóvel ser uma ambulância ao serviço de transporte de doentes, pelo que nos termos da alínea a) do art. 431º do Código de Processo Penal aplicável ex vi do art. 3º, alínea b) do RGIT e art. 41º, nº 1 do RGCO, por estarem documentalmente provados e serem pertinentes para a boa decisão, acorda-se em aditar ao probatório os seguintes factos:


4

A sociedade denominada E., Lda, é uma sociedade comercial que tem como objecto social principal o transporte de doentes (cfr. documento de fls. 31 do processo físico).

5

A sociedade mencionada no número anterior é detentora do alvará nº 219 emitido pelo Instituto Nacional de Emergência Médica para a actividade de transporte de doentes (cfr. documento de fls. 34 do processo físico).

6

Os veículos automóveis com as matrículas 1.-Q.-4. da marca R. e 6.-R.-2. da marca M. são ambulâncias equipadas para o transporte de doentes (cfr. documentos de fls.35 a 40).

Atentos os factos ora aditados e tomando em consideração que as contra-ordenações em questão foram alegadamente praticadas por passagens sem pagamento de portagens na auto-estrada - A16 - cuja concessionária era a A. (cfr. ponto 2 do probatório) importa ter presente o disposto no Decreto-Lei nº 112/2015 de 19/06/2015, mais concretamente o disposto na Base LXVI quanto às isenções de pagamento de taxas de portagem, que na sua alínea g), consagra expressamente a isenção para os veículos de protecção civil, bombeiros, ambulâncias e outros veículos de emergência e estes equiparáveis, quando devidamente identificados.

Tendo presente a referida isenção, conclui-se que decisão de aplicação da coima à arguida deve ser anulada, sendo de julgar procedente o recurso de contra-ordenação com a fundamentação vertida no presente Acórdão.

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V- DECISÃO

Nos termos expostos, acordam os juízes da 2ª Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, anular a decisão recorrida, e em substituição, julgar procedente o recurso de contra-ordenação e em consequência absolvendo-se a arguida da prática da contra-ordenação imputada, com os fundamentos vertidos no presente Acórdão.

Sem custas.
Lisboa, 28/10/2021
Luisa Soares
Vital Lopes
Susana Barreto