Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1797/14.6BELRS |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 05/21/2020 |
Relator: | ANA PINHOL |
Descritores: | OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL; RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO; ÓNUS DE PROVA; CULPA. |
Sumário: | I. Na previsão da al. a), do nº1 do artigo 24º da L.G.T., pretende-se isolar as situações em que o gerente/administrador culpado pela diminuição do património societário será responsável pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado depois deste, competindo à Administração Fiscal fazer a prova de que foi por culpa sua que o património se tornou insuficiente. II. Tendo ficado provado que o Oponente, gerente da sociedade devedora originária, transferiu das contas bancárias da sociedade executada para a sua conta pessoal, um valor que excede o triplo do montante global da dívida exequenda, tal actuação é quanto basta para concluir que foi por culpa sua que o património societário se tornou insuficiente para satisfação das dívidas tributárias. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | Processo n.º 1797/14.6BELRS ACÓRDÃO I.RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a oposição deduzida por F................ à execução fiscal nº ................, contra si revertida e originariamente instaurada contra a sociedade «D…………., Lda.» por dívidas provenientes de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) (Retenções na Fonte) dos meses Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Maio, Novembro e Dezembro do ano de 2008. Nas suas alegações formula a recorrente as seguintes conclusões: «A.Visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença proferida, na parte em que julgou totalmente procedente a oposição judicial apresentada e, em consequência, condenou a Fazenda Pública no pedido de extinção da execução fiscal n.º ................ e apensos, relativamente ao Oponente. B.O douto Tribunal de primeira instância considerou que dos autos resulta provado que: “D) Em 25/10/2013, foi emitida a liquidação adicional de IRS em nome da D................, Lda., referente a 2008, no valor de 289.136,98 € - cfr. fls. 170 dos Autos; E) Em 26/10/2013, foi criado o documento da liquidação referida na alínea anterior – cfr. fls. 172 e 176 dos Autos; F) O documento referido em E) foi remetido à D................, Lda. através do Via CTT – cfr. fls. 176 dos Autos”. C.Não obstante, com o devido respeito e salvo melhor opinião, a Fazenda Pública entende que foi incorrectamente julgado o ponto de facto que consta dos artigos 22.º e 26.º da contestação apresentada pela Fazenda Pública nos autos, nos termos do disposto no art. 210.º do CPPT, o que consubstancia erro de julgamento. D.No artigo 22.º do articulado de contestação, afirma a Representante da Fazenda Pública que «a referida liquidação [identificada no artigo 21.º do mesmo articulado: liquidação n.º ................] foi notificada à devedora originária através de notificação electrónica, conforme se verifica pelo print obtido a partir do sistema informático da Autoridade Tributária que ora se junta aos presentes autos como doc. n.º 3 e que desde já se dá por integralmente reproduzido”. E.No artigo 26.º do articulado de contestação, afirma a Representante da Fazenda Pública que: “Conforme consta do print junto como doc. n.º 3, a notificação da liquidação foi entregue na caixa postal electrónica da devedora originária em 26/10/2013, presumindo-se notificado no dia 20/11/2013, ou seja, no 25.º dia posterior ao dia 26/10/2013”. F.Do teor do documento n.º 3 junto aos autos de primeira instância com o articulado de contestação pela Fazenda Pública, obtido a partir do sistema informático da Autoridade Tributária consta expressamente que a notificação da liquidação de IRS que serviu de título executivo aos autos executivos n.ºs ................ foi entregue na caixa postal electrónica da devedora originária em 26/10/2013, considerando-se esta notificada no dia 20/11/2013. G.Pelo exposto, com o devido respeito e salvo melhor opinião, face ao meio de prova documental que consta dos autos – print obtido a partir da consulta ao sistema informático da Autoridade Tributária –, deveria ter sido dado como provado os pontos de facto constantes dos artigos 22.º e 26.º do articulado de contestação apresentado pela Representação da Fazenda Pública, ou seja, dever-se-ia ter considerado provado que: a.a liquidação de IRS n.º ................, cuja falta de pagamento originou a instauração do processo de execução fiscal n.º ................ foi notificada à sociedade denominada “D................ Lda.” através de notificação electrónica e que b.a notificação da liquidação supra mencionada foi entregue na caixa postal electrónica da sociedade denominada “D................ ................ Lda.” em 26/10/2013, presumindo-se notificada no dia 20/11/2013, ou seja, no 25.º dia posterior ao dia 26/10/2013. H.Por outro lado, com o devido respeito e salvo melhor entendimento, discordamos da solução jurídica consagrada pelo douto Tribunal “a quo” para o caso concreto, desde logo porquanto a fundamentação de direito expressa na douta sentença prolatada é, no entendimento da Fazenda Pública e salvo melhor opinião, escassa e insuficiente. I.Com efeito, à excepção da norma da alínea a) do n.º 1 do art. 24.º da LGT, que estabelece que o ónus da prova da culpa pela insuficiência patrimonial da sociedade executada originária para pagamento das dívidas tributárias incumbe à Autoridade Tributária (doravante, AT), não resulta da fundamentação de direito qualquer norma jurídica que permita alicerçar as conclusões firmadas pelo Ilustre Tribunal “a quo” no sentido de que: “nada vale à Fazenda Pública em sede de contestação lançar mão de um Relatório da Inspecção para tentar demonstrar a alegada culpa do Oponente”; “O Tribunal até aceitaria esta técnica de fundamentação (por remissão), se no despacho de reversão o órgão de Execução Fiscal tivesse tido o mesmo cuidado que teve para demonstrar a gerência de facto. Porque nessa matéria – na gerência de facto – diz-se no despacho de reversão o seguinte: «… Gerente de facto. Cf provado no relatório de inspecção (…)»”; Era no despacho de reversão que deveriam ter sido apresentados os factos que demonstram a culpa do Oponente”; “E pelo menos, deveria ter sido escrito no despacho de reversão que os factos que demonstravam a culpa estariam reflectidos no Relatório da Inspecção, para o revertido poder tentar refutar os mesmos”. J.Por outro lado, com o devido respeito e salvo melhor opinião, e considerando que o Oponente suscita na p.i. apresentada ambos os fundamentos, a Fazenda Pública não consegue descortinar, do teor da fundamentação de direito expressa, em que medida o Ilustre Tribunal “a quo” considera que existe falta ou insuficiência de fundamentação do despacho de reversão proferido no âmbito dos autos executivos supra mencionados e em que medida considera que existe ilegitimidade do Oponente, ora recorrido, naqueles autos executivos. K.Se bem compreende a Fazenda Pública o teor da douta fundamentação de direito integrante da sentença recorrida, o Ilustre Tribunal ter-se-á pretendido debruçar acerca da suscitada falta ou insuficiência de fundamentação do despacho de reversão, do seu ponto de vista formal. L.Não obstante, e por outro lado, o Ilustre Tribunal “a quo” considera ainda que a Fazenda Pública não alegou e provou no despacho de reversão que a insuficiência do património da sociedade executada para satisfazer as dívidas em causa nos autos se deveu a culpa do Oponente, sendo que esta conclusão se prende com a verificação do pressuposto legal da culpa para efectivação da responsabilidade subsidiária, previsto na alínea a) do n.º 1 do art. 24.º da LGT e, portanto, com a validade substancial do acto praticado pelo órgão de execução fiscal, sindicado em primeira instância. M.Acresce ainda que existe uma manifesta incongruência entre a fundamentação de direito expressa na douta sentença proferida e o dispositivo da mesma, pois que julga o douto Tribunal de primeira instância pela procedência da acção, determinando, em consequência, a “extinção da execução fiscal n.º ................ relativamente ao Oponente”, sendo que grande parte da fundamentação de direito da douta sentença, conforme supra mencionamos, parece incidir sobre a insuficiente fundamentação ou falta de fundamentação do despacho de reversão, o que, a verificar-se, conduziria à anulação do referido acto administrativo, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do art. 133.º, a contrario e art. 135.º, ambos do Código do Procedimento Administrativo (doravante, CPA), na versão conferida pelo DL n.º 442/91, de 15 de Novembro, aplicável ao caso concreto, por força do disposto no n.º 1 do art. 8.º do Decreto-lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, a contrario, permitindo à AT praticar novo acto administrativo, em cumprimento do dever de fundamentação, e não à “extinção da execução fiscal n.º ................ relativamente ao Oponente”, conforme consta do dispositivo da douta sentença. N.No que concerne à fundamentação do despacho de reversão proferido no âmbito dos autos executivos n.ºs ................, impõe-se trazer à colação entendimentos doutrinais e jurisprudenciais em matéria do dever de fundamentação dos actos administrativos que, no entender da Representação da Fazenda Pública, são relevantes para aferir se esse dever foi alcançado no caso concreto do despacho de reversão proferido em relação ao ora recorrido no âmbito do processo de execução fiscal n.º ................, nomeadamente, o teor dos Arestos proferidos pelo TCA Sul, de 25 de Setembro de 2012, referente ao proc. n.º 05370/12, de 13/01/2004, referente ao proc. n.º 03804/00, de 05-06-2012, referente ao Proc. n.º 05431/12, de 19-02-2013, referente ao Proc. n.º 06097/12, de 29-09-2009, referente ao Proc. n.º 03071/09, bem como pelo STA, de 15/02/2012, no âmbito do Proc. n.º 872/11. O.Antes de mais, no caso concreto, não resulta do teor da p.i. em que medida é que a suscitada falta ou insuficiência de fundamentação do despacho de reversão, quanto ao pressuposto legal da reversão supra enunciado, impediu o Oponente e ora recorrido de conhecer porque é que se deu a reversão. P.Por outro lado, consta do teor do Relatório Final de Inspecção, elaborado na sequência do procedimento inspectivo que se fundamentou na Ordem de Serviço OI 201000347, cuja cópia a Fazenda Pública juntou aos autos em primeira instância como documento n.º 1 da contestação apresentada – sendo que o teor do mesmo foi dado por reproduzido na douta sentença proferida (ponto C) dos factos provados) -, que o projecto de Relatório foi notificado ao gerente da sociedade D................ – ................ Lda., F................, Oponente nos autos de primeira instância e ora recorrido, para efeitos do exercício do direito de audição prévia. Q.A sociedade D................ – ................ Lda. não exerceu direito de audição prévia (conforme consta do teor do supra mencionado relatório de inspecção), pelo que as correcções propostas foram efectivadas, tendo originado os actos tributários de liquidação de IRS, cujos valores, em dívida, constituem título executivo no processo de execução fiscal n.º ................. R.Pelo exposto, não se poderá ignorar que o ora recorrido era gerente, de direito e de facto da sociedade D................ – ................ Lda. durante o período de 2008, período a que respeitam os factos tributários em causa no âmbito do procedimento inepsctivo (ponto M) dos factos provados). S.Por outro lado, não se poderá olvidar que, anteriormente ao momento da prática do despacho de reversão no âmbito do processo executivo supra mencionado, já o Oponente, ora recorrido, tinha sido notificado do teor do Relatório Final de Inspecção, sendo este o documento fundamentador do despacho proferido, pois que dos factos provados em primeira instância resulta que o despacho de reversão é fundamentado, por remissão, para o referido Relatório (ponto de facto provado H). T.Pelo exposto, discordamos do entendimento vertido na douta sentença proferida, pois que consideramos que, no caso concreto, perante o teor da declaração fundamentadora (relatório de inspecção), um destinatário normal ou razoável, está em condições de conhecer porque é que se deu a reversão, não só no que concerne ao pressuposto legal do exercício da gerência de facto, mas também no que respeita ao pressuposto da culpa enunciado na alínea a) do n.º 1 do art. 24.º da LGT. U.Ora, se um destinatário normal e razoável estaria na posição de, uma vez tomado conhecimento do relatório de inspecção e dos factos nele descritos expressamente e de forma clara e congruente, conhecer os motivos porque a AT decidiu no sentido da reversão nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 24.º da LGT, tanto mais estaria o Oponente e ora recorrido, pois que era gerente de direito e de facto da referida sociedade por quotas e, mais do que isso, era parte interessada nos factos descritos no referido relatório, pois que, precisamente pela gravidade dos factos que lhe são imputados no mesmo, ultrapassam a sua qualidade de gerente para atingir a sua esfera pessoal. V.Não poderemos olvidar que o Oponente e ora recorrido interveio nos actos inspectivos que integraram o supra mencionado procedimento inspectivo, pois que foi ele quem assinou a Ordem de Serviço que deu início ao referido procedimento - conforme consta do relatório de inspecção junto aos autos em primeira instância e cujo teor foi integralmente reproduzido nos factos provados na douta sentença proferida (ponto C) dos factos provados). W.Fazer depender, como o faz a douta sentença proferida, o juízo de aferição acerca da segurança, do ponto de vista garantístico, dos direitos do Oponente, quando confrontado com o despacho de reversão supra mencionado, do facto de, no teor do mesmo, a remissão para o Relatório de Inspecção ser precedida, de forma imediata, da enunciação do pressuposto da gerência de facto e não do pressuposto da culpa pela insuficiência patrimonial da executada originaria para pagamento das dívidas tributárias constitui, a nosso ver e com o devido respeito, um falso preciosismo. X.Antes de mais, note-se que a remissão para o referido Relatório de Inspecção é feita já depois de enunciados todos os pressupostos legais para a efectivação da responsabilidade subsidiária. Y.Por outro lado, a remissão que é feita para o relatório de inspecção, é feita para este como um todo e não só para os factos referentes ao exercício da gerência de facto da sociedade “D................ – ................, Lda.”. Z.Ora, não se poderá olvidar que grande parte dos factos descritos no referido relatório se traduzem, do ponto de vista dos pressupostos legais da reversão, como elementos de prova da culpa do gerente daquela sociedade, e ora recorrido, pelo facto de o património da mesma se ter tornado insuficiente para satisfazer as dívidas tributárias, raciocínio que a douta sentença não equacionou, não obstante, conforme já tivemos oportunidade de mencionar, dar como provado todo o teor do referido relatório. AA.Com a devida vénia, o Ilustre Tribunal de primeira instância, com a decisão perfilhada, caiu em contradição, na medida em que, por um lado, deu como provados todos os factos expressos no relatório de inspecção supra mencionado, e, por outro lado, ignorou os mesmos para a apreciação da existência de fundamentação do despacho de reversão, pois que não considerou as particularidades do caso concreto na decisão de mérito proferida. BB.Com a decisão prolatada fez-se prevalecer o excessivo rigor formal face à substância dos factos que eram do conhecimento do douto Tribunal “a quo”, entendimento que não se compagina, a nosso ver, com as posições doutrinais e com os Arestos que ora trouxemos à colação. CC.Por outro lado, e ao contrário do que entende o douto Tribunal “a quo”, nunca padecerá a reversão de falta de fundamentação por falta de prova, por parte da Administração Fiscal, da culpa do revertido na insuficiência patrimonial da devedora originária para pagamento das dívidas tributárias, pois que, seguindo o entendimento propugnado pela Jurisprudência dos Tribunais Superiores, estes vícios de falta de prova dos pressupostos da reversão devem ser destacáveis relativamente à alegada falta de fundamentação da reversão. DD.Ora, e no que concerne à prova do pressuposto legal da culpa enunciado na alínea a) do n.º 1 do art. 24.º da LGT, ao contrário do que entende o Ilustre Tribunal de primeira instância, a Fazenda Pública considera que a AT cumpriu este ónus, pois que, à data em que o órgão de execução fiscal proferiu a decisão de reversão, havia sido elaborado (e notificado ao Oponente e ora recorrido) o teor do relatório final de inspecção, do qual integram factos que logram provar a culpa do revertido e ora recorrido na insuficiência patrimonial da sociedade D................ – ................, Lda. para pagamento das dividas tributárias. EE.Assim, o órgão de execução fiscal, tendo conhecimento do teor do referido relatório, porquanto constitui documento que se encontra na posse de todos os órgãos da AT, considerou que se encontrava verificado, por provado, o referido pressuposto legal. FF.Dispõe o art. 72.º da LGT que “O órgão instrutor pode utilizar para o conhecimento dos factos necessários à decisão do procedimento todos os meios de prova admitidos em direito”. GG.Ao abrigo disposto no n.º 1 do art. 76.º da LGT, "As informações prestadas pela inspecção tributária fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objectivos, nos termos da lei”. HH.Pelo exposto, e com base nos fundamentos que supra expomos, consideramos que a decisão dos autos em primeira instância teria que ser, necessariamente, a de improcedência total, pois que não se verifica, por um lado, falta de fundamentação ou insuficiência de fundamentação do despacho de reversão proferido em relação ao Oponente e ora recorrido no âmbito do processo de execução fiscal n.º ................, não se verificando, de igual modo, que o órgão de execução fiscal não tenha feito prova do pressuposto legal enunciado na alínea a) do n.º 1 do art. 24.º da LGT e, portanto, que exista, no caso concreto, ilegitimidade do Oponente e ora recorrido naqueles autos executivos. Pelo que se peticiona o provimento do presente recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, assim se fazendo a devida e acostumada JUSTIÇA!» ** O recorrido apresentou as suas contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões: «1º - A prova documental carreada para os autos de oposição à execução foi clara, inequívoca e plenamente valorada pelo Tribunal, de que a reversão instaurada contra o recorrido não reunia os pressupostos que servem para, neste caso, um gerente ser responsabilizado por uma dívida da sociedade devedora originária, logo, é conclusivo de que a teoria da AT relativamente à reversão ora em crise, caiu pela base. 2º - A matéria de facto dado como provada pelo Tribunal a quo, reforça que o que foi dado como provado, provado está, à luz do princípio basilar da verdade material. 3º - O recorrido reforça que não tem qualquer culpa funcional na insuficiência do património da sociedade originária para saciar a AT, que deveria ter descriminado os actos praticados pelo recorrido passíveis de reverter uma culpa fundada, o que não foi o caso! 4º - E ainda referir qual o nexo de causalidade entre os actos supostamente praticados pelo recorrido e a situação de insuficiência patrimonial da sociedade, isto é, saber se a insuficiência patrimonial da sociedade foi consequência directa dos actos praticados pelo mesmo, o que não foi demonstrado, de forma alguma, pela AT, pelo que no caso da alínea a), o que se verifica nos autos, não se presume, tem que se provar, pelo que, definitivamente, ocorre ilegitimidade do recorrido. 5º - O Tribunal de 1ª instância chamou à colação e bem, a Jurisprudência pacífica do TCAS no que concerne à responsabilidade subsidiária dos gerentes em que a mesma é regulada pela lei em vigor à data do facto tributário originador da dívida exequenda, ou seja, o artigo 24º da Lei Geral Tributária, sendo o artigo aplicável ao caso em apreço e referindo ainda que não se presume a gerência de facto por ter sido exercida gerência de direito. 6º - Reforça a sua fundamentação com base no Acórdão do Tribunal Central Administrativo que sustenta que o ónus da prova recai sobre a AT sobre a culpa do recorrido na insuficiência do património, nos termos do disposto no artigo 342º do Código Civil. 7º - Do citado Acórdão e transpondo para os presentes autos, não havendo razões para discordar, concluiu e muito bem o dito Tribunal de 1ª instância, que a AT alegou teorias de culpa mas que nem sequer provou um único facto passível de reverter contra o recorrido uma culpa fundada! 8º - O que fez? Utilizou um relatório de inspeção tributária que apenas serve para quantificar a matéria coletável com base em itens para depois emitir arbitrariamente liquidações atrás de liquidações sem qualquer tipo de fundamentação e juntou-o na sua contestação colado ao despacho de reversão, este sem qualquer fundamentação! Por todo o exposto, deve Vossa Exa julgar improcedente, por provada, o presente recurso interposto pela recorrente e confirmar a sentença recorrida, com as legais consequências.» ** Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e a Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de que deve ser concedido provimento parcial ao recurso. ** Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. ** O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. Assim, e face ao teor das conclusões formuladas a solução a alcançar pressupõe a análise das seguintes questões: - nulidade da sentença por falta de fundamentação de direito; - nulidade da sentença por manifesta incongruência; - se a factualidade dada como provada, deve ou não ser alterada; - se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito ao ter considerado que à luz do artigo 24.º, n.º 1, al. a) da LGT, o Oponente não podia ser responsabilizado subsidiariamente porquanto a Fazenda Pública não alegou nem provou factos dos quais se pudesse concluir pela sua culpa na insuficiência do património societário para satisfação da dívida exequenda. ** III. FUNDAMENTAÇÃO A.DOS FACTOS Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos: «A) A Impugnante é uma sociedade por quotas que exerce como actividade principal a “Comércio a retalho em ................ ”, inscrita com o CAE 047111 e estando enquadrada em sede de IVA no regime normal de periocidacidade mensal desde 7/01/1998, e em sede de IRC no regime geral de determinação do lucro tributável – cfr. fls. 9 do Processo Administrativo (PA) apenso aos Autos; B) Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI2010000347, os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Setúbal, desencadearam à Impugnante a acção de inspecção externa relativamente aos exercícios de 2007 e 2008, no âmbito da qual apuraram imposto em falta em sede de IRC no montante de 237.890,00€ - cfr. fls. 9 do PA apenso aos Autos; C) Em 7/10/2013, foi elaborado o relatório de fiscalização junto a fls. 7 a 52 do PA apenso aos Autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos, onde consta a fundamentação para as referidas correcções ao ano de 2007 e 2008, e onde consta o seguinte:« (…) III Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas (…) III. 5.1.2 Exercício de 2008 Ao longo do exercício de 2008, o sujeito passivo retirou das contas tituladas pela sociedade, os seguintes valores indicados no quadro seguinte, no montante global de €1.189.450,00. Da conta bancária titulada pela D................ no B............... n.º ................, foram retirados os montantes indicados no quadro seguinte, para a conta bancária do sócio gerente Sr. F................ Quadro 45: Montantes transferidos da conta n.º ................ do BP para a conta do sócio gerente Sr. F..............., em 2008
(…) Da conta bancária titulada pela D................ no B.............. n.º ..............., revelada na sua contabilidade, foram retirados os montantes indicados no quadro seguinte, para a conta bancária do sócio gerente SR. F................ Os documentos de suporte contam no Anexo 49. Quadro 46: Montantes transferidos da conta n.º ............... do B.............. para a conta do sócio gerente Sr. F..............., em 2008
Da conta bancária titulada pela D................ no B............... n.º .............., não revelada na sua contabilidade, foram retirados os montantes indicados no quadro seguinte, para a conta bancária do sócio gerente SR. F................ Os documentos de suporte contam no Anexo 26 Quadro 47: Montantes transferidos da conta n.º .............. do BP para a conta do sócio gerente Sr. F..............., em 2008
D) Em 25/10/2013, foi emitida a liquidação adicional de IRS em nome da D................, Lda., referente a 2008, no valor de 289.136,98€ - cfr. fls. 170 dos Autos; * Em particular foi efectuada a análise ponderada e detalhada do teor da prova documental junta aos autos, designadamente aquela constante de fls. 80 do PEF apenso aos Autos, correspondente ao Despacho de Reversão, de onde se extraiu o facto provado, designadamente, o I), cujo valor não foi abalado por qualquer outra prova. Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.» ** B. DO DIREITO DAS NULIDADES DA SENTENÇA Lisboa, 21 de Maio de 2020. [Ana Pinhol]
[Isabel Fernandes]
[Jorge Cortês] |