Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:09095/15
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:12/16/2015
Relator:CATRINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:REVERSÃO/ AUDIÇÃO PRÉVIA/ INDICAÇÃO DE MUDANÇA DE DOMICÍLIO
Sumário:1 – Nos termos do disposto no artigo 23.º, n.º 4 da LGT, há lugar à audiência prévia do visado antes da reversão, devendo a notificação para o exercício do direito de participação ser concretizada por correio postal registado, de acordo com o artigo 60º, nº 4, da LGT.

2 – Não obstante a AT ter dado cumprimento à lei no que respeita à elaboração do projecto de decisão e, bem assim, à sua remessa através de carta registada para o domicílio fiscal que constava do seu sistema cadastral, não pode, in casu, como pretende a Fazenda Pública, e apesar da indicação “mudou-se”, considerar-se notificado o seu destinatário, com invocação do disposto no artigo 43º, nº2 da LGT.

3 – Com efeito, em face dos elementos constantes dos autos, resulta que no momento em que foi tentada a notificação do despacho de reversão, a revertida não havia mudado o seu domicílio fiscal, pelo que a circunstância de a carta registada, a que corresponde o nº de registo …, ter sido devolvida com a indicação “mudou-se” não lhe pode ser imputada.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1 – RELATÓRIO

A Fazenda Pública, inconformada com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que, na oposição deduzida por Ana …………….., revertida na execução fiscal nº ………… e ap., inicialmente instaurada contra a devedora originária MA ………………….., Ldª, no Serviço de Finanças de Lisboa 4, para cobrança de dívidas de IRC dos anos de 2007 e 2008, no valor de Euros 19.459,59, declarou nulo o despacho de reversão e determinou a extinção da execução contra a oponente, com fundamento na sua ilegitimidade, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional.

Formulou, para tanto, as seguintes conclusões:

“4.1 - Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a presente oposição, determinando a extinção da execução contra a oponente, por ilegitimidade desta.

4.2 - A fundamentação da sentença recorrida assenta, em síntese, no entendimento de que a oponente não teve conhecimento do projecto de despacho de reversão nem foi ouvida antes de, contra si, o mesmo ter sido proferido.

4.3 - Destarte, salvo o devido respeito, somos de opinião em que a Douta sentença, procedeu à errónea interpretação dos preceitos legais aplicáveis, bem como não analisou a matéria de facto carreada pela AT.

4.4 - A questão a decidir nos presentes autos traduz-se em saber se se considera, para os devidos e legais efeitos, notificada a oponente para o exercício do direito de audição.

4.5 - No caso dos autos, foi expedida notificação, através de carta registada para a morada que constava no cadastro como sendo a da oponente, Largo ……………….., n° 6 - R/C, Lisboa, dando conta do teor do despacho de reversão e prazo para, querendo, exercer o direito de audição prévia. Tal ofício foi devolvido ao Serviço de Finanças com a indicação aposta pelos serviços postais - CTT - "Mudou-se". Nesta sequência foi proferido despacho de reversão.

4.6 - É entendimento da Administração Tributária que se deve considerar que a notificação foi bem realizada, pois, ao ter ocorrido mudança de domicílio o mesmo não é oponível à Administração Tributária, nos termos do n°2 do art.43° do CPPT, uma vez que essa alteração não foi comunicada à AT.

4.7 - Acrescenta-se ainda o facto de, mesmo que a recorrida tivesse exercido o direito de audição em nada alteraria a posição da Administração Tributária, pelo que não se verifica qualquer ilegalidade cometida pela Autoridade Tributária.

4.8 - Decorre do exposto que a decisão recorrida, ao julgar procedente a presente oposição faz uma inadequada interpretação do disposto nos artigos 23°, n° 4 e 60° da LGT, bem como dos artigos 38°, 39° e 43° do CPPT.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação improcedente, quanto à matéria aqui discutida.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A

COSTUMADA JUSTIÇA».


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A Recorrido apresentou contra-alegações, onde conclui:

«1. O recurso interposto pela Exma. representante da Fazenda Pública não merece provimento.

2. Com efeito, a ora recorrida nunca alterou a sua residência e, portanto, não tendo sido notificada da reversão, a respectiva ilegalidade do processo é manifesta.

3. Só por lapso dos CTT, de que a recorrida não tem qualquer culpa e que, por isso, não pode produzir para ela quaisquer consequências, se pode considerar que a recorrida foi notificada da reversão.

4. De qualquer modo, em termos substantivos, a recorrida demonstrou claramente que no caso não há fundamento para, quanto a ela, se operar a reversão.

ASSIM SE FARÁ JUSTIÇA»


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A Exma. Magistrada do Ministério Público (EMMP) junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Com dispensa dos vistos legais, vêm os autos à conferência.

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2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida:

“1. O processo executivo n° …..……………… foi instaurado no Serviço de Finanças de Lisboa 4, em 05/02/2009, contra a sociedade M………. ………….. -Carpintaria ……….Lda., para cobrança coerciva de dívidas de IRC do ano de 2007 (e não de 2009, como consta da sentença) no valor global de € 9.459,59 - cfr. consta de cópia do PEF aqui em anexo.

2. A estes autos foi apensado o processo número ………………………, instaurado por dívidas de IRC do ano de 2008, ficando a quantia exequenda a valer por € 19.232,19 - cfr. consta de cópia do PEF aqui em anexo.

3. Em 17/06/2010 foi proferido projecto de reversão da dívida com o texto que a seguir parcialmente se transcreve:

“(...)

Em face das diligências de fls. 3 e seguintes, determino a preparação do processo para efeitos da reversão da(s)execução(ões) contra ANA ………………… contribuinte n°………………., morador em LG ……………… 6 R/C - LISBOA - 1700-187 LISBOA, na qualidade de Responsável Subsidiário, pela divida abaixo discriminada.

Face ao disposto nos normativos do n°4 do Art.23° e do Art.60° da Lei Geral Tributária, proceda-se à notificação do(s) interessado(s), para efeitos do exercício de audiência prévia, fixando-se o prazo de 15 dias a contar da notificação, podendo aquela ser exercida por escrito /.

(...)

Tudo conforme consta de cópia do PEF aqui em anexo, que aqui se dá por integralmente reproduzido

4. Na mesma data o Serviço de Finanças de Lisboa 4, dirigiu carta à Oponente (Ana ……………………………..), carta registada -RC ………………. PT-, para a morada supra indicada dando-lhe conta do teor do despacho supra e prazo para, querendo, exercer o direito de audição prévia - cfr. consta de cópia do PEF aqui em anexo.

5. Em 02/09/2010, foi proferido despacho de reversão contra a Oponente com a fundamentação que, parcialmente, a seguir se transcrevem:
DESPACHO
Face às diligências de fls. 3 e seguintes e estando concretizada a audiência do(s) responsável(eis) subsidiário(s) prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra ANA …………………….., contribuinte n°…………………., morador em LG ………………………… 6 R/C - LISBOA - 1700-187 LISBOA, na qualidade de Responsável Subsidiário, pela divida abaixo discriminada.

(...)
FUNDAMENTOS DA REVERSÃO
Dos Administradores, directores, ou gerentes e outra pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo (art. 24°/n° 1/b) LGT).

(…)”.

Tudo conforme consta da cópia do respectivos PEF aqui em anexo.

6. A Oponente tomou conhecimento do teor deste despacho em 10/09/2010 - cfr. consta da cópia do respectivo PEF aqui em anexo”.


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DOS FACTOS NÃO PROVADOS

«Dos autos não resulta provado que a Oponente tenha tido conhecimento do teor do projecto de despacho de reversão enunciado no ponto 3., do probatório, nem chegado ao seu conhecimento a carta a que se refere o ponto 4. do mesmo. Também não resulta provado que a mesma tenha exercido as funções administração ou gestão da sociedade devedora originária e/ou que tenha tido culpa na frustração do património da mesma para fazer face aos créditos tributários.

Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados».


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MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

«No tocante aos factos provados, a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental constante dos autos, em concreto, no teor dos documentos indicados em cada um dos pontos supra.

Quanto aos factos não provados resultam o primeiro, ou seja a falta de conhecimento do teor do despacho de reversão e consequentemente a falta de notificação para o exercício do direito de audição, da falta de prova de que a carta referida no ponto 4., do probatório tenha sido recebida pela destinatária conforme consta do registo dos CTT correspondente ao RC ……………………. PT (fls. 31 e 33 dos autos.

Quanto à falta de prova do exercício pela Oponente das funções de gestão na sociedade devedora originária resulta da inexistência da falta de elementos que comprovem material e objectivamente o exercício das funções e bem assim da prova testemunhal produzida em audiência de inquirição que não obstante tratar-se de dois filhos e uma amiga da Oponente foram unanimes e coerentes nos depoimentos, todos referindo que a Oponente não se deslocava às instalações da sociedade e que nada sabia a seu respeito limitando-se a assinar papeis quando o marido (Sr. Domingos ………….) lhe pedia.

Disseram ainda que a Oponente tinha, à data dos factos, outro tipo de ocupações, nomeadamente tomava conta de uma pessoa idosa e fazia limpezas».




Ao abrigo do artigo 662º do CPC, adita-se ao probatório a seguinte factualidade:

7 – O expediente postal registado a que alude o ponto 4 supra foi devolvido ao Serviço de Finanças de Lisboa 4 com a indicação “mudou-se”, aposta no verso do sobrescrito (cfr. fls. 27 e 28 do PEF);

8 – O despacho a que alude o ponto 5 supra foi comunicado à Oponente, incluído na carta/ citação, através de correio registado, com AR, remetido para o LG ………………………… 6 R/C - LISBOA - ……………. LISBOA (cfr. fls. 29 a 33 do PEF);

9 – O AR a que alude o ponto anterior foi assinado, em 10/09/10, por Ana …………………… (cfr. fls. 33 do PPEF).


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2.2. De direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer. Assim sendo, lidas as conclusões da alegação recursória, dúvidas não restam que a única questão a apreciar e decidir é a de saber se o Tribunal a quo errou ao considerar que, no caso, foi preterido o direito de audição prévia à reversão da execução fiscal contra a responsável subsidiária, ora Recorrida.

Vejamos, então.

A sentença recorrida considerou verificar-se a ilegalidade do despacho de reversão por violação do direito de audição (art. 24º e 60º da LGT). Com efeito, para assim concluir, a Mma. Juíza a quo alinhou, no que para aqui releva, o seguinte discurso argumentativo:

“(…)

Da matéria fáctica consta que a Oponente não teve conhecimento do projecto de despacho de reversão nem foi ouvida antes de, contra si, o mesmo ter sido proferido (Factos não provados), donde se conclui ter ocorrido ofensa ao disposto no art. 23.° n.° 4 da LGT e ao direito da Oponente de se pronunciar sobre uma decisão que lhe é manifestamente desfavorável o que viola também o direito fundamental que lhe é constitucionalmente reconhecido”

Discorda a Recorrente, Fazenda Pública, por entender, no essencial, que: “no caso dos autos, foi expedida notificação, através de carta registada para a morada que constava no cadastro como sendo a da oponente, Largo …………………., n° 6 - R/C, Lisboa, dando conta do teor do despacho de reversão e prazo para, querendo, exercer o direito de audição prévia. Tal ofício foi devolvido ao Serviço de Finanças com a indicação aposta pelos serviços postais - CTT - "Mudou-se". Nesta sequência foi proferido despacho de reversão”; assim, deve considerar-se que “a notificação foi bem realizada, pois, ao ter ocorrido mudança de domicílio o mesmo não é oponível à Administração Tributária, nos termos do n°2 do art.43° do CPPT, uma vez que essa alteração não foi comunicada à AT”; mais acrescenta a Recorrente que “mesmo que a recorrida tivesse exercido o direito de audição em nada alteraria a posição da Administração Tributária, pelo que não se verifica qualquer ilegalidade cometida pela Autoridade Tributária”.

Vejamos.

Deve lembrar-se que a Recorrente não impugna a matéria de facto, pelo que, sem prejuízo da factualidade por nós aditada, mantém-se o quadro factual que vem fixado da 1ª instância.

Temos, pois, que previamente à prolação do despacho de reversão da execução fiscal contra a ora Recorrida, o Serviço de Finanças elaborou um projecto de reversão com vista a assegurar à visada a possibilidade de se pronunciar sobre a pretendida reversão. Tal projecto foi remetido através de correio registado, dirigido à ora Recorrida, para a morada correspondente ao LG ………………………. 6 R/C - LISBOA - ………….. LISBOA, endereço este que é o que consta do PEF apenso. Tal expediente postal registado foi devolvido ao remetente – Serviço de Finanças de Lisboa 4 – com a indicação de “mudou-se”, indicação esta aposta no verso do sobrescrito pelo distribuidor postal.

É, pois, perante este circunstancialismo que os entendimentos divergem, porquanto, perante a informação “mudou-se”, ou seja, perante a alegada mudança de domicílio fiscal, não comunicada à AT, entende a Fazenda Pública que a mesma não é oponível àquela, nos termos do disposto no artigo 43º, nº2 da LGT; contrariamente, a Recorrida argumenta no sentido de que jamais foi notificada para exercer o direito de audição, acrescentando que não mudou de domicílio fiscal, razão pela qual não pode considerar-se que a notificação do projecto de reversão (devolvida ao remetente) produziu os seus efeitos.

A sentença, como se viu, acolheu as razões da Recorrida. E bem, deve dizer-se.

Vejamos.

Como resulta directa e inequivocamente da lei há lugar à audiência prévia do visado antes da reversão – cfr. artigo 23.º, n.º 4 da LGT, nos termos do qual “a reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação”. Por seu turno, estabelece o artigo 60º, nº 4, da LGT, que tal notificação para o exercício do direito de participação deve ser concretizada por correio postal registado – “o direito de audição deve ser exercido no prazo a fixar pela administração tributária em carta registada a enviar para esse efeito para o domicílio fiscal do contribuinte”.

Ora, a AT deu cumprimento à lei no que respeita à elaboração do projecto de decisão e, bem assim, à sua remessa através de carta registada para o domicílio fiscal que constava do seu sistema cadastral, ou seja, para a morada que consta, sem alterações, no PEF apenso. Em concreto, tal expediente postal foi remetido para o LG ………………….. 6 R/C - LISBOA - …………….. LISBOA.

Sucede que, por razões não apuradas, tal objecto postal foi devolvido ao SF remetente com a indicação “mudou-se”. E dizemos razões não apuradas porque, confrontada com tal devolução e indicação de mudança de domicílio, a Recorrida argumenta que jamais mudou a sua residência, a qual, segundo refere, permanece a correspondente ao LG …………………… 6 R/C - LISBOA - ……………. LISBOA.

E, na verdade, a análise dos autos permite-nos dizer que em várias intervenções nos autos, posteriores ao envio do projecto de reversão (datado de Junho de 2010), a executada, ora Recorrida, indicou como sua morada o já referido LG ……………. 6 R/C - LISBOA - …………… LISBOA. Com efeito, foi assim na apresentação da p.i (em Outubro de 2010) e no requerimento de protecção jurídica, dirigido à Segurança Social (em Outubro de 2010) – cfr. fls. 4 e 18 a 21 dos autos. Mas mais: a oponente, aqui Recorrida, juntou aos autos o ofício que recaiu sobre o requerimento de protecção jurídica, que lhe foi enviado pela Segurança Social, em Outubro de 2010, o qual foi remetido para o LG ……………. 6 R/C - LISBOA - ……………… LISBOA (cfr. fls. 65 e 66 dos autos). Por último, deve notar-se, com decisivo relevo, que a citação da revertida, que teve lugar em 10/09/10, foi concretizada através da assinatura (pela revertida, ora Recorrida) do o aviso de recepção que acompanhou o envio da carta/citação, na morada correspondente ao LG ……………….. 6 R/C - LISBOA - ……………. LISBOA.

Portanto, temos para nós, face aos elementos constantes dos autos, que em Junho de 2010, a executada, Ana ………….., não havia mudado o seu domicílio fiscal, pelo que a circunstância de a carta registada, a que corresponde o nº de registo RC …………….. PT, ter sido devolvida com a indicação “mudou-se” não lhe pode ser imputada. E não pode a AT pretender defender a produção de efeitos da notificação apoiando-se no disposto no artigo 43º, nº2 da LGT - A falta de recebimento de qualquer aviso ou comunicação expedidos nos termos dos artigos anteriores, devido ao não cumprimento do disposto no n.º 1, não é oponível à administração tributária, sem prejuízo do que a lei dispõe quanto à obrigatoriedade da citação e da notificação e dos termos por que devem ser efectuadas por uma simples e elementar razão, a saber: em Junho de 2010 a revertida mantinha a sua residência no referido LG ……………. 6 R/C - LISBOA - …………… LISBOA, o que equivale a dizer que não teve lugar a mudança de domicílio.

Como é evidente, a argumentação da Fazenda Pública, aqui Recorrente, tem pressuposta a presunção de notificação a que alude o nº 1 do artigo 39º do CPPT, ou seja, de que as notificações efectuadas por carta registada se presumem feitas no 3º dia posterior ao do registo ou no 1º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil. Porém, como é evidente, esta presunção não tem aqui aplicação, desde logo porque a mesma só pode valer nos casos em que a carta não seja devolvida, como decorre do nº2 do mesmo preceito, em que apenas se admite a possibilidade de ilidir a presunção demonstrando que a notificação ocorreu em data posterior à presumida e já não quando a notificação não tiver ocorrido – cfr. Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado e Comentado, Vol. I; 6ª edição, 2011, Áreas Editora, pág. 382. Ora, no caso, o objecto postal foi devolvido, com a indicação “mudou-se” e, repete-se, indicação esta sem qualquer aderência à realidade.

Por conseguinte, e como é evidente, a revertida não foi notificada para exercer o direito de audição e não o foi por razões que não lhe são imputáveis, isto é, contrariamente ao que sustenta a Fazenda Pública – e insiste-se – não se pode aqui falar em mudança de domicílio não comunicada à AT, para efeitos de accionar o disposto no artigo 43º, nºs 1 e 2 do CPPT.

Deve dizer-se, aliás, que, no caso concreto, a invocação, por parte da Fazenda Pública, de uma alegada mudança de domicílio (não comunicada à AT) para daí pretender retirar a sua não oponibilidade à AT é, no mínimo, temerária. É que, no âmbito do PEF, a AT, apesar de confrontada com devolução do expediente postal contendo o projecto de reversão, com a indicação “mudou-se”, insistiu no envio do despacho de reversão e da carta/ citação para a mesma morada - LG ………………….. 6 R/C - LISBOA - ……………. LISBOA. E no que respeita a esta comunicação, efectuada cerca de três meses mais tarde em relação à que foi devolvida, a AT pôde verificar que não apenas a comunicação foi recebida nesse endereço, como inclusivamente o AR respectivo foi assinado pela própria revertida, destinatária da correspondência. Por conseguinte, em Setembro de 2010, quando o AR assinado foi devolvido ao remetente, o SF estava em condições de saber – e sabia – que a Ana de Jesus Barbosa mantinha o domicílio no LG …………….. 6 R/C – LISBOA, pois aí continuou a receber a correspondência oriunda do SF.

Assim sendo, há que concluir que a revertida efectivamente não foi notificada para exercer o direito de audição prévia à reversão, nos termos exigidos pelo já referido 23º, nº4 da LGT, o que constitui ilegalidade susceptível de determinar a anulação do despacho de reversão.

Aqui chegados, importa considerar a alegação da Recorrente segundo a qual “mesmo que a recorrida tivesse exercido o direito de audição em nada alteraria a posição da Administração Tributária, pelo que não se verifica qualquer ilegalidade cometida pela Autoridade Tributária”. Nesta asserção pretende a Fazenda Pública fazer valer o princípio do aproveitamento do acto, ou seja, evidenciando que nem sempre a preterição da audiência prévia conduz à anulação do acto, pois que, aparentemente, estaríamos perante uma situação em que, mesmo perante o exercício do direito de audição, nenhuns elementos podiam ser carreados para o processo que levassem a uma decisão final de conteúdo diverso. Ou seja, no entendimento da AT, independentemente do conteúdo do exercício do direito de audição, o despacho de reversão em nada seria diferente.

Como é evidente, não desconhecendo este Tribunal o alcance do apontado princípio do aproveitamento do acto, a tese da Fazenda, ora Recorrente, não é aceitável.

Como se vê, a reversão em causa assenta no disposto artigo 24º, nº1, al. b) da LGT e no exercício de facto da gerência por banda da executada, ora Recorrida. É manifesto, pela posição assumida nos autos pela Oponente, que o exercício de facto da gerência da responsável subsidiária é controvertida, pelo que é evidente que a participação da potencial revertida previamente à reversão, com a junção de elementos de prova e até requerendo a produção de diligências instrutórias, é susceptível de modificar a decisão (projectada) em sede de procedimento de reversão. E, assim sendo, não se pode assegurar antecipadamente que, qualquer que fosse o conteúdo do exercício do direito de audição, ele era incapaz de modificar a (projectada) decisão de reversão.

Por conseguinte, a falta de notificação para o exercício do direito de audição gera, no caso, a invalidade do despacho de reversão proferido (invalidade, porém, que se traduz na anulabilidade do despacho e não na sua nulidade, como erradamente foi considerado pela sentença recorrida).

Ora, anulado o despacho de reversão por preterição de formalidade essencial, fica, ao menos por agora, sem título, a execução movida contra o ora recorrida. E porque assim é, verifica-se a excepção dilatória de ilegitimidade passiva da executada quanto à pretensão executiva, determinante da absolvição da instância executiva relativamente à oponente, absolvição da instância que (contrariamente à extinção da execução fiscal, que constitui uma verdadeira absolvição da pretensão executiva) não impede o órgão da execução fiscal de proferir novo despacho de reversão em que sane o vício que determinou a anulação.

Em suma, face a tudo o que vem de dizer-se, há que concluir pela improcedência da totalidade das conclusões da alegação de recurso e, como tal, pelo não provimento do recurso. A sentença recorrida, nos termos em que decidiu, fê-lo com acerto, devendo ser mantida.


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3 - DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 16/12/15


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(Catarina Almeida e Sousa)

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(Bárbara Tavares Teles)

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(Pereira Gameiro)