Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:299/03.0BTLRS
Secção:CT
Data do Acordão:03/02/2023
Relator:LUÍSA SOARES- relatora por vencimento
Descritores:IRC
EXCESSO DE REINTEGRAÇÕES NA SUCURSAL;
PROVISÕES PARA RISCO PAÍS;
ABATE DO ACTIVO IMOBILIZADO INCORPÓREO;
DONATIVOS.
Sumário:1. As sucursais, sendo tributadas em imposto sobre o rendimento no Estado onde estão localizadas, têm de determinar nesse país o seu lucro tributável (calculado com base no resultado líquido apurado à luz da contabilidade organizada segundo as regras desse Estado e observando as regras contabilísticas e fiscais nele vigentes, que estão obrigadas a cumprir), aí podendo deduzir todas as despesas que a legislação desse Estado aceite como dedutíveis para o apuramento do lucro tributável que aí é sujeito a tributação.
2. No entanto, todos os rendimentos obtidos por essas sucursais têm também de ser reflectidos na contabilidade da empresa sede e, nesta fase, todas as regras contabilísticas e fiscais a observar são as vigentes em Portugal para o apuramento do lucro tributável da empresa sede residente neste país. Razão por que os gastos (da empresa sede e suas sucursais) são dedutíveis em Portugal apenas na medida em que estejam previstos na legislação fiscal nacional e com os limites que essa lei impõe a tais deduções.
3. O abate em imobilizado, decorrente da dedução como custo de benfeitorias efectuadas em imóvel arrendado, em montante superior ao que resultaria das quotas do artigo 4.º do DR 2/90, de 12 de Janeiro, por não renovação do contrato, deve ser considerado como desvalorização excepcional para efeitos do artigo 10.º deste DR, e, como tal, dependente de prévia aceitação por parte da DGCI, o que não tendo acontecido determina a sua não aceitação como custo.
4. A lei, nos termos do disposto no art. 33º nº 1 al. d) do CIRC (na redacção à data), delegou numa entidade não tributária (o Banco de Portugal) os poderes de definição e limite das provisões aceites relativamente às empresas sujeitas à sua fiscalização (sector bancário).
5. O Banco de Portugal emitiu diversos Avisos, nomeadamente o Aviso nº 3/95 que consagra quer os casos de constituição obrigatória de provisões quer de carácter facultativo, estas sujeitas a autorização expressa, caso a caso. Desta forma as provisões fiscalmente dedutíveis tanto podem resultar de uma disposição de carácter genérico como de um acto administrativo individual e concreto do Banco de Portugal, de acordo com o nº 18 do Aviso nº 3/95.
6. Se o benefício fiscal foi conferido ao abrigo do despacho conjunto nº 469/98, de 6 de Julho, apenas poderia ser revogado com os fundamentos e nos termos do disposto no art. 13º nº 4 do EBF e apenas pela entidade que o concedeu, in casu, os Ministros das Finanças e da Cultura.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I – RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA vem interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida pela C....., S.A., contra a liquidação de IRC do exercício de 1998 na parte relativa a correcções por “excesso de reintegrações na sucursal de Paris”; “abate por inutilização do activo imobilizado”; “abate do activo imobilizado incorpóreo (rescisões de arrendamentos)”; “provisões para risco país”; “imputação de lucros”; e “donativos para além do limite”.

A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos:

“A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou parcialmente procedente a Impugnação da liquidação adicional de IRC, relativa ao ano de 1998, emitida na sequência de procedimento inspetivo, na parte correspondente às seguintes correções:
i) Excesso de reintegrações na sucursal de Paris - Acréscimo à matéria colectável do valor 56.107.000$00 (€279.860,53), por terem sido efetuadas reintegrações nas sucursais a taxas superiores às permitidas no Decreto Regulamentar n.º 2/90;
ii) Abate do activo imobilizado incorpóreo (rescisões de arrendamentos) – Acréscimo ao lucro tributável do valor de 90.533.750$00 (€451.580,44), em virtude do abate do ativo imobilizado, decorrente da dedução como custo de obras efetuadas em imóvel arrendado, em montante superior ao que resultaria das quotas do artigo 4.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, por não renovação do contrato, ser considerado desvalorização excecional e, como tal, dependente de prévia aceitação da, então, DGCI, o que não aconteceu ;
iii) Provisões para Risco País – Acréscimo ao lucro tributável do valor de €40.000.000$00 (€199.519,15), resultante do excesso de provisão constituída para a dívida da República Popular de Angola, face aos limites legalmente admissíveis;
iv) Imputação de lucros – Acréscimo ao lucro tributável do valor de €14.783.213$00 (€73.738,35), por não se ter verificado distribuição efetiva de lucros pela sociedade participada;
v) Donativos para além do limite – Acréscimo à matéria tributável do valor de €67.500.000$00 (€336.688,58), em virtude da não aceitação, para efeitos fiscais, da majoração em 115% das importâncias desembolsadas a favor da Sociedade P....., SA.

B. Não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido, considerando existir erro de julgamento, uma vez que da prova produzida e levada aos autos da presente impugnação, não se podem extrair as conclusões em que se alicerça a decisão proferida, impondo-se antes decisão diversa da adotada;

C. Começando pela correção relativa a “Excesso de reintegrações na sucursal de Paris”, entendeu o Tribunal a quo, que a mesma padecia de ilegalidade, porquanto “Não podem ser corrigidas as amortizações efetuadas nas sucursais, por não ser aplicável na Sucursal de Paris, o disposto na alínea l), do n.º1 do artigo 32.°do CIRC, sob pena de violação do artigo 10.°, n.º1, da Convenção sobre Dupla Tributação Internacional com a França, como fez o acto impugnado.”;

D. Da leitura conjugada dos artigos 5.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b), artigo 7.º e artigo 10.º da Convenção entre Portugal e a França para Evitar a Dupla Tributação e Estabelecer Regras de Assistência Administrativa Recíproca em Matéria de Impostos sobre o Rendimento resulta, indubitavelmente, que as sucursais sendo objeto de tributação, em imposto sobre o rendimento, no Estado onde se encontram localizadas, o respetivo lucro tributável há de ser determinado nesse país, o mesmo é dizer, de acordo com as regras contabilísticas e fiscais nele vigente;

E. Contudo, considerando o princípio da universalidade, previsto no artigo 4.º, n.º 1 do CIRC, os rendimentos obtidos pelas sucursais localizadas no estrangeiro tem de ser refletidos na contabilidade da empresa sede, sendo que, nesta fase, as regras contabilísticas e fiscais a observar são as vigentes em Portugal, Estado onde se encontra localizada a empresa sede;

F. Deste modo, os gastos, quer da empresa sede, quer das sucursais, serão dedutíveis em Portugal apenas na medida em que os mesmos se encontrem previstos na legislação portuguesa e com os limites dai resultantes. Vide, neste sentido, a doutrina que dimana do acórdão do STA, de 11.05.2016, p. 0351/14, em cujo sumário se pode ler o seguinte:
“IX - As sucursais, sendo tributadas em imposto sobre o rendimento no Estado onde estão localizadas, têm de determinar nesse país o seu lucro tributável (calculado com base no resultado líquido apurado à luz da contabilidade organizada segundo as regras desse Estado e com observância das regras contabilísticas e fiscais nele vigentes, que estão obrigadas a cumprir), aí podendo deduzir todas as despesas que a legislação desse Estado aceite como dedutíveis para o apuramento do lucro tributável que aí é sujeito a tributação.
X - Todavia, todos os rendimentos obtidos por essas sucursais têm também de ser refletidos na contabilidade da empresa sede e, nesta fase, todas as regras contabilísticas e fiscais a observar são as vigentes em Portugal para o apuramento do lucro tributável da empresa sede residente neste país. Razão por que os gastos (da empresa sede e suas sucursais) são dedutíveis em Portugal apenas na medida em que estejam previstos na legislação fiscal nacional e com os limites que essa lei impõe a tais deduções.”

G. O disposto no artigo 10.º da Convenção entre Portugal e a França para Evitar a Dupla Tributação e Estabelecer Regras de Assistência Administrativa Recíproca em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, em nada colide com o acabado de expor;

H. Tendo sido efetuadas reintegrações, na sucursal de Paris, a taxas superiores às permitidas pelo Decreto-Regulamentar n.º 2/90, impunha-se efetuar correção à matéria coletável, pelo que tal correção, ao contrário do decidido, não enferma de qualquer vício. Ao não ter decidido desta forma, incorreu o douto tribunal a quo em erro de julgamento, por violação do disposto nos artigos 3.º, n.º 1, 4.º, n.º 1, 17.º, 29.º e 32.º, n.º 1, alínea c) do CIRC e, bem assim, do Decreto Regulamentar 2/90, de 12 de janeiro;

I. No que concerne à correção atinente a “Abate do activo imobilizado incorpóreo (rescisões de arrendamentos)”, estava em causa nos autos a questão de saber se, verificando-se a rescisão de contratos de arrendamento, seria dedutível fiscalmente o custo atinente ao valor ainda não amortizado de obras efetuadas pela Impugnante, ora Recorrida, em edifícios alheios;

J. O aviso n.º 9/94 do Banco de Portugal remete para as disposições do Decreto Regulamentar n.º 2/90, no que concerne o cálculo das reintegrações e amortizações de cada exercício, respetivos métodos e prazos. Acresce que, da conjugação do preceituado nos artigos 27.º e 32.º do CIRC com o referido Decreto Regulamentar, resulta a definição das amortizações que são aceites como custo e qual o seu limite anual, calculado, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 29.º do CIRC, em função das taxas constantes das tabelas anexas ao aludido Decreto Regulamentar, com base nas quais se deduz o período mínimo de vida útil dos elementos do ativo imobilizado (artigo 3.º do Decreto Regulamentar);

K. Verificando-se que o valor líquido das obras realizadas nos espaços arrendados excede as amortizações legalmente permitidas e não tendo o respetivo abate contabilístico sido comunicado à AT, nos termos do artigo 10.º do referido Decreto Regulamentar, certo se tornava concluir que o acréscimo ao lucro tributável se mostrava em conformidade com os normativos legais aplicáveis;

L. Mais se diga que não vislumbram razões para a consideração do Tribunal a quo de que o regime de reintegrações e amortizações dos artigos 9.º e 10.º do aludido Decreto Regulamentar está somente dirigido a desvalorizações causadas por desgaste físico, não compreendendo as situações de abate;

M. Com efeito, sobre esta questão já se pronunciou o STA, no acórdão de 02.11.2011, p. 0719/11, em cujo sumário se pode ler o seguinte:
“O abate em imobilizado, decorrente da dedução como custo de benfeitorias efectuadas em imóvel arrendado, em montante superior ao que resultaria das quotas do artigo 4.º do DR 2/90, de 12 de Janeiro, por não renovação do contrato, deve ser considerado como desvalorização excepcional para efeitos do artigo 10.º deste DR, e, como tal, dependente de prévia aceitação por parte da DGCI, o que não tendo acontecido determina a sua não aceitação como custo.”

N. Ao decidir pela ilegalidade da correção em causa, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento, por errónea interpretação e aplicação do disposto nos artigos 29.º, n.º 1 e
32.º, n.º 1, alínea c) do CIRC, bem como, dos artigos 4.º, 7.º e 10.º, n.º 1 e 2 do Decreto Regulamentar 2/90, de 12/01;

O. Quanto à correção relativa a “Provisões para Risco País”, decorria do artigo 33.º, n.º 1, al. d) do CIRC, na redação vigente à data dos factos, que apenas podiam ser dedutíveis fiscalmente as provisões constituídas de harmonia com a disciplina imposta pelo Banco de Portugal, sendo que esta disciplina é a que consta do Aviso 3/95, publicado no Diário da República, II série, de 30 de Junho, no qual está definido um nível de provisão, nos casos como o dos autos, correspondente a 50% dos créditos;

P. Deste modo, tendo a Impugnante constituído a provisão a 100%, quando da disciplina imposta pelo Banco de Portugal, resultante quer do Aviso 3/95, quer da Instrução n.º 27/97 que lhe está associada, resultaria a sua constituição apenas em 50%, o montante excedente não pode ser aceite, nos termos do citado artigo 33.º, n.º 1, al. d) do CIRC;

Q. A Informação prestada pelo Banco de Portugal, nos termos da qual esta instituição se limita a confirmar a política de provisionamento proposta pela C....., não constitui qualquer “disciplina imposta”, sendo que o caráter de imposição da disciplina do Banco de Portugal, i.e. a respetiva obrigatoriedade, e não a mera concordância, constitui o requisito exigido pelo legislador para a dedutibilidade fiscal das provisões, nos termos do referido artigo 33.º, n.º 1, alínea d) do CIRC;

R. Em face do exposto, ao invés do decidido, impunha-se ao tribunal a quo, s.m.o,. a consideração de que a provisão havia sido constituída sem observância da disciplina imposta pelo Banco de Portugal, pelo que ao não ter assim decidido, incorreu aquele douto tribunal em erro de julgamento, por errónea apreciação da matéria de facto provada e errónea interpretação e aplicação do disposto no artigo 33.º, n.º 1, alínea d) do CIRC, no Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal e na Instrução n.º 27/97 que lhe está associada;

S. No que diz respeito à correção relativa a “Imputação de Lucros”, a Mma. Juiz não cuidou, salvo o devido respeito, de constatar que a referida correção havia sido objeto de revogação, por parte da AT. Revogação levada ao conhecimento do douto tribunal a quo, aquando da apresentação da contestação;

T. Com efeito, em 09.09.2003, foi proferido, pelo Senhor Diretor de Finanças Adjunto, por delegação, despacho com o seguinte teor:
“Concordo, pelo que com os fundamentos constantes da presente Informação e respetivo parecer, revogo parcialmente o acto impugnado, nos exactos termos em que vem proposto.
Remetam-se os autos ao Digno Representante da Fazenda Pública, mediante a prévia efectivação da notificação prevista no n.º 3 do artigo 112.º do CPPT”

U. O aludido despacho foi exarado na Informação prestada pela Equipa III (Contenciosa e Administrativa), da Direção de Finanças de Lisboa, junta aos autos, na qual se refere, entre o mais, o seguinte:
“(…)
77.º
Assim, agiu corretamente a ora impugnante ao ter procedido à imputação no quadro 06 do anexo 22-A da declaração modelo 22 unicamente do valor de 778.064$00 correspondente a 5% de 17.100.304$00.
78.º
Deste modo, somos de parecer que merece acolhimento a interpretação da ora Impugnante devendo a correção fiscal no valor de 14.783.213$00 (€73.738,36) ser anulada.”

V. Salvo melhor opinião, entende a Fazenda Pública que tal factualidade deveria ter sido levada ao probatório, pelo que requer o respetivo aditamento;

W. Caso tal factualidade fosse tida em conta na decisão a proferir nos autos, a Mma. Juiz, ao invés de ter determinado a anulação da correção em causa, deveria, s.m.o., ter decretado a extinção parcial da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos do art.º 277.º, alínea e), do Código Processo Civil (CPC) aplicável ex vi do artigo 2.º, alínea e), do CPPT;

X. Quanto à correção respeitante a “Donativos para além do limite”, a questão em causa nos autos traduzia-se em saber qual a natureza das importâncias desembolsadas pela Impugnante, ora Recorrida, a favor da Sociedade P....., S.A;

Y. Nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 39.º do CIRC, na redação vigente à data dos factos, “Os donativos referidos nos nºs 1 e 3 são levados a custos em valor correspondente a 120% do total, salvo nos casos de donativos inseridos em contratos plurianuais celebrados pelos contribuintes e entidades beneficiárias onde se fixem os objectivos e o valor das contribuições, caso em que cada unidade monetária poderá ser majorada até 130%, por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Cultura”;

Z. Por seu turno, do Despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Cultura n.º 469/98, de 6 de Julho constava o seguinte: “(…) para efeitos do n.º 4 do artigo 39,º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 65/93, de 10 de Março, reconhece-se que os donativos concedidos, no âmbito de contratos plurianuais pela (…) C..... (…) às entidades E. M. 1998 e Sociedade P.. 98, S.A., que foram consideradas de superior interesse cultural, serão majoradas em 115%” ;

AA. A Impugnante, ora Recorrida, procedeu à contabilização das importâncias desembolsadas a favor da sociedade P....., S.A., ao abrigo de um contrato celebrado com aquela entidade, com o n.º 970208, tendo majorado as referidas importâncias em 115%;

BB. Da análise ao clausulado contratual, devidamente descrito no RIT, constataram os serviços da Inspecção que existia um nexo de causalidade entre as importâncias dispendidas pela C..... à P....., S.A. e as contrapartidas concedidas por esta entidade à Impugnante, ou seja, estamos perante um contrato que implica a prestação de contrapartidas por ambas as partes, as quais não foram postas em causa pela Impugnante;

CC. Tendo a Impugnante obtido várias contrapartidas ao abrigo do contrato celebrado, nomeadamente, publicidade, bilhetes de entrada gratuitos, exclusividade no tocante à venda de bilhetes e relógios “Expo Swatch Access” e às operações bancárias no recinto da Exposição, ter um espaço no recinto destinado apenas a exposição do grupo económico por ela liderado, facilmente se conclui que não está a dispor gratuitamente do seu património, pelo que estamos perante um contrato de patrocínio e não de donativo, como bem consideraram os SIT;

DD. No sentido de que não estamos perante a concessão de donativos, é também a cláusula de atribuição de indemnização no caso de alguma das partes não cumprir o estipulado no Contrato;

EE. Entendeu, contudo, o Tribunal a quo que o Ministério das Finanças e o Ministério da Cultura tiveram pleno conhecimento do teor do contrato, tendo considerado que as contrapartidas seriam irrelevantes para efeitos de consideração como donativo majorável;

FF. A Fazenda Pública desconhece as razões que levaram o Tribunal a concluir dessa forma, pois não resultam dos autos evidências da referida tomada de conhecimento do teor do contrato em causa, por parte dos senhores Ministros. Para além disso, o despacho conjunto n.º 469/98, de 6 de Julho, não se refere expressamente ao contrato em causa, dispondo apenas que reconhece que os donativos concedidos à Sociedade P....., SA serão majorados em 115%;

GG. Do artigo 6.º do EBF, na redação vigente à data, resulta que, apesar de concedidos benefícios fiscais, automáticos ou dependentes de reconhecimento, as entidades beneficiárias ficam sujeitas a fiscalização, por parte da AT, para controlo da verificação dos pressupostos dos benefícios fiscais;

HH. Foi precisamente no âmbito do poder de fiscalização atribuído à AT, nos termos do citado normativo, que os SIT verificaram que não se encontravam verificados os pressupostos relativos à majoração prevista no n.º 4 do artigo 39.º do CIRC;

II. Não se trata da revogação de um benefício, uma vez que se mantém o reconhecimento da majoração dos donativos que sejam concedidos pela Impugnante à Sociedade P....., S.A., tendo, apenas, sido verificado que, no caso do contrato em causa, não se estava perante a concessão de qualquer donativo, uma vez que, considerando as contrapartidas estipuladas, ficou afastada a intenção da Impugnante beneficiar economicamente a P..... S.A. sem qualquer contrapartida patrimonial, inexistindo, portanto, “animus donandi”. Estamos perante um patrocínio que é aceite como custo, mas não majorável.;

JJ. Entende a Fazenda Pública que deveria o tribunal a quo ter considerado que a correção em causa não padecia de qualquer vício, pelo que, ao não ter decidido desta forma, incorreu em erro de julgamento por errónea apreciação e valoração da prova produzida e errónea interpretação e aplicação do disposto nos artigos 39.º, n.º 4 do CIRC e artigo 6.º do EBF;

KK. Tendo as correções em causa nos autos sido efetuadas no estrito cumprimento das disposições legais aplicáveis, inexiste qualquer erro imputável aos serviços, não se verificando, por isso, os requisitos previstos no artigo 43.º da LGT;

LL. No que concerne à correção que foi objeto de revogação, também não se verifica qualquer erro imputável aos serviços, pois como resulta da Informação sobre a qual foi exarado o despacho de revogação parcial, “não existem indícios de que a Impugnante tivesse dado conhecimento aos serviços da informação vinculativa junta ao processo a fls. 43 e 44”;

MM. Não deveria, o douto tribunal a quo, ter reconhecido o direito a juros indemnizatórios uma vez que não se verificam os requisitos previstos no artigo 43.º da LGT, pelo que ao não ter decidido desta forma, incorreu o tribunal em erro de julgamento por errónea interpretação e aplicação do artigo 43.º da LGT;

NN. Em face de todo o exposto, deve a douta sentença ser revogada e substituída por acórdão que determine a inutilidade superveniente parcial da lide, no que concerne ao pedido de anulação da correção atinente a “Imputação de Lucros” e a total improcedência quanto ao demais peticionado, com as legais consequências.

Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, consequentemente, ser revogada a douta decisão, na parte recorrida, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”.
* *
A Recorrida apresentou contra-alegações tendo formulado conclusões nos seguintes termos:

“ a) Não merece a decisão recorrida a censura que lhe é apontada pela Recorrente no que respeita à aceitação como custo para efeitos de IRC dos custos incorridos relativamente a obras em imóveis utilizados pela Recorrida objecto de contrato de arrendamento quando o mesmo deixa de vigorar antes de decorrido o prazo contratualmente previsto e que não tenham sido ainda integralmente deduzidos.

b) E não merece censura porque, se o custo com as obras foi efectivamente suportado, se no momento em que o foi havia a expectativa de o imóvel locado ser utilizado durante o número de anos de vigência do contrato de locação e foi esse o número de anos considerado para efeitos de determinação das taxas de amortização utilizadas, uma ocorrência posterior não pode traduzir-se na irrelevância para efeitos fiscais de parte do custo suportado pela Recorrida.

c) E facilmente se conclui que a tese sustentada pela Recorrente não pode proceder, já que assenta desde logo no pressuposto incorrecto de que o regime de reintegrações e amortizações dos artigos 9º e 10º do Decreto Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro, não estava somente dirigido a desvalorizações causadas por desgaste físico, compreendendo as situações de abate no âmbito de direitos, como sejam contratos de arrendamento, dada a natureza não taxativa das referidas normas.

d) A Recorrida concede quanto ao carácter exemplificativo das situações enunciadas no número 2 do artigo 10º do Decreto-Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro, mas há que estabelecer a que “conjunto”, ou seja, a que “colecção de objectos com uma característica ou função comum” (cfr. Dicionário Priberam da Língua Portuguesa 2021, https://dicionario.priberam.org/conjunto) pretendeu o legislador referir-se, para se concluir se faz ou não “sentido” o que é propugnado pela Recorrente.

e) Eram naquela norma referidas as “desvalorizações excepcionais provocadas por desastres, fenómenos naturais e inovações técnicas excepcionalmente rápidas”, pelo que as demais situações aí enquadráveis – ou seja, enquadráveis no conjunto de elementos de que o legislador apenas mencionou alguns na enumeração exemplificativa a que procede – terão de ter natureza e características semelhantes aos indicados como exemplo. Se assim não for, não se poderá já falar em conjunto.

f) Ora, facilmente se conclui que a rescisão antecipada de contratos de arrendamento não pertence ao conjunto composto por “desastres, fenómenos naturais e inovações excepcionalmente rápidas” a que o legislador se refere, já que de nenhumas características comuns relevantes aquela comunga com estes.

g) Deste modo, e ao invés do que sustenta a Recorrente não resultava do carácter exemplificativo da enumeração efectuada no artigo 10º do Decreto Regulamentar em análise que qualquer situação que ponha termo à vida útil de um activo tivesse de ser necessariamente tratada ao abrigo do disposto nesta disposição.

h) Errado é também o pressuposto da Recorrente de que a comunicação prevista no número 3 do artigo 10º do Decreto Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro, era condição sine qua non da consideração da desvalorização como dedutível fiscalmente.

i) É que a transformação da apresentação daquela comunicação em condição essencial de atendibilidade do custo era injusta, devendo, antes, ser tratada como um formalismo cujo incumprimento não devia levar à sua não aceitação.

j) Deste modo, não só uma situação de rescisão contratual antecipada não cabia no escopo do artigo 10º do Decreto Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro, por não ser uma situação que comungue das características relevantes dos exemplos enunciados pelo legislador, como, ainda que coubesse, sempre se teria de considerar que a não apresentação da comunicação à administração fiscal não tem como efeito automático e absoluto a não aceitação do custo.

k) Deve, por isso, manter-se também nesta parte a sentença recorrida.

l) Alega a Recorrente que a Recorrida incorreu em “excesso de provisionamento”, violando o disposto na Instrução do Banco de Portugal nº 27/97, que estabelecia uma taxa de provisionamento de 50%, relativamente à constituição de uma provisão para risco-país a 100%, constituição esta sancionada pelo Banco de Portugal, chamando à colação o disposto, à data, na alínea d) do número 1 do art. 33º do Código do IRC e concluindo que “a disciplina imposta pelo Banco de Portugal” relevante era apenas a constante do Aviso nº 3/95, de 30 de Junho, e na referida Instrução nº 27/97.

m) A Recorrente desconsidera o acto dirigido pelo Banco de Portugal à Recorrida, embora reconheça que, através do mesmo, esta instituição confirma a política de provisionamento da Recorrida.

n) A incongruência da posição da Recorrente é evidente: qual o sentido de dizer que o Banco de Portugal, confrontado com uma proposta de constituição de provisões, a confirmaria se a mesma não estivesse em conformidade com a disciplina resultante da lei e das suas instruções?

o) É que as provisões adequadas (e a preocupação do Banco de Portugal, enquanto supervisor prudencial das instituições de crédito, como a Recorrida, é que as provisões sejam adequadas) são as que se mostrem devidas em cada caso concreto, sem mais, nem menos. E, ao sancionar a proposta da Recorrida, o Banco de Portugal praticou, dentro dos seus poderes, um acto administrativo dotado de presunção de legalidade, como bem refere o Tribunal a quo.

p) E em abundante jurisprudência sobre o tema os tribunais superiores têm sufragado a posição do Tribunal a quo.

q) Face ao exposto, não pode proceder a pretensão da Recorrente, sendo de manter a sentença recorrida.

r) Como não pode proceder a pretensão da Recorrente, sendo de manter a sentença recorrida, relativamente à não aceitação da majoração para efeitos de determinação do lucro tributável da Recorrida do custo incorrido com donativos concedidos à Sociedade P....., S.A., objecto do Despacho Conjunto do Ministro das Finanças e do Ministro da Cultura nº 469/98, de 6 de Julho.

s) Com efeito, não tendo o despacho antes referido sido revogado pelos Ministros das Finanças e da Cultura, continuou a vigorar, o que significa que a correcção efectuada pela administração fiscal, e independentemente da designação que se lhe queria dar, foi, em substância, uma “revogação tácita” do acto administrativo de reconhecimento do benefício fiscal.

t) Tal “revogação tácita” foi efectuada por entidade sem legitimidade para tanto e em qualquer hipótese fora do prazo previsto no Código do Procedimento Administrativo na redação em vigor à data dos factos.

u) E de nada vale à Recorrente invocar os poderes de fiscalização atribuídos pelo então artigo 6º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, pois estes não podem traduzir-se, na prática, numa apreciação do correcto ou incorrecto reconhecimento do benefício.

v) A intervenção da administração fiscal neste âmbito é ao nível da execução do benefício e não, como pretendido pela Recorrente, ao nível do mérito do benefício reconhecido por outra entidade.

w) Esteve por isso bem o Tribunal a quo, que distinguiu os poderes de concessão e revogação do benefício e os poderes de fiscalização da respectiva aplicação, sendo que apenas estes últimos assistem à administração fiscal em situações como a em análise.

x) E, por isso, no exercício dos seus poderes de fiscalização a administração fiscal apenas pode praticar actos que não firam a atribuição do benefício, que não lhe compete, sob pena de estarmos perante uma verdadeira usurpação de poderes.

y) E não lhe assiste razão também porque, mesmo que tivesse existido qualquer ilegalidade (e não existiu), ela “[estaria] localizada nos pressupostos de facto do acto de reconhecimento, a forma de a remediar só poderia ser a revogação anulatória, com fundamento nessa ilegalidade.” – cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 23 de Novembro de 2011, proferido no processo nº 0590/11, disponível em www.dgsi.pt.

z) Em consequência, também neste caso a pretensão da Recorrente não pode proceder.

Nestes termos, e nos demais de Direito que Vossas Excelências suprirão, há que concluir que não procedem as conclusões da Recorrente, devendo, no que ao presente recurso respeita, a procedência parcial da impugnação decidida pelo Tribunal a quo manter-se na ordem jurídica, com as legais consequências.”
* *
O Exmº. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, sendo de manter a sentença recorrida.

* *
Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II – DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635°, n.° 4 e artigo 639°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objecto dos recursos pelas conclusões das alegações ora apresentadas, importa decidir se a sentença enferma de erro de julgamento relativamente às seguintes questões:
i) Excesso de reintegrações na sucursal de Paris;
ii) Abate do activo imobilizado incorpóreo (rescisões de arrendamentos);
iii) Provisões constituídas para Risco País;
iv) Imputação de lucros, sendo que, quanto a esta questão, importa decidir se ocorreu inutilidade superveniente da lide como defende a Recorrente;
v) Donativos para além do limite.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“Com relevância para a decisão da presente ação de impugnação, de acordo com as diversas soluções plausíveis de direito, considero provados os seguintes factos:

1) Na sequência da Ordem de Serviço nº20/2000 de 21/01/2000, a Direção de Serviços de Prevenção e Inspeção Tributária (DSPIT) procedeu a uma acção inspetiva de carácter geral à ora Impugnante, que teve início em 07.02.2000 e foi concluída em 26.06.2000 - cfr. fls.22 do Processo Administrativo (PA) apenso, correspondente a fls.6 do Relatório de Inspecção Tributária (RIT);

2) A Impugnante encontra-se registada para efeitos de IRC, no 5º Bairro Fiscal de Lisboa, pelo exercício da sua actividade (CAE…..), estando sujeito ao regime geral de tributação e regime de isenção temporária relativamente à actividade desenvolvida pela sucursal financeira exterior (SFE), nos termos do artigo 41.º do CIRC - cfr. fls.22 do PA apenso, correspondente a fls.6 do RIT;

3) 3.2. EXERCÍCIO DE 1998
3.2.1. IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTO DAS PESSOAS COLECTIVAS
3.2.1.1. Reintegrações e amortizações (artº 32º, nº1)
Total – Esc.202.687.404
Excesso de reintegrações nas sucursais – Esc.56.107.000
Verificou-se existirem diferenças entre os valores das amortizações do exercício, inscritos nos balancetes e os constantes dos mapas de reintegrações e amortizações que acompanharam a declaração de rendimentos mod.22, as quais se reportam ao activo imobilizado da Sucursal de Paris.
Nos termos dos n.ºs 1 e 4 do artº 22º do Decreto-Regulamentar nº2/90, de 12 de Janeiro, a C..... está obrigada a apresentar mapas de reintegrações e amortizações, de modo a demonstrar que foram cumpridos todos os requisitos legais necessários para a sua aceitação como custo.
Só são aceites para efeitos fiscais as reintegrações e amortizações que resultem da aplicação das taxas máximas legalmente estabelecidas naquele Decreto-Regulamentar, conforme dispõe o artº 29º do CIRC, e desde que devidamente demonstradas nos mapas de amortizações e reintegrações, os quais fazem parte integrante da declaração de rendimentos mod.22, nos termos do preceito legal citado. Estes requisitos são extensíveis ao imobilizado das sucursais, conforme decorre da conjugação dos artºs 3º, nº1, alínea a), 4º, nº1 e 17º do CIRC.
Da análise dos mapas da sucursal, elaborados de acordo com o mod.32.1, apresentados pela C..... após nossa solicitação, foi constatada uma divergência no montante de Esc. 56.107.000, que ficou a dever-se a diferenças entre as taxas utilizadas e as máximas definidas no Decreto-Regulamentar nº2/90.
Face ao exposto, constata-se que foram efectuadas reintegrações nas sucursais, a taxas superiores às permitidas pelo Decreto-Regulamentar nº2/90, pelo que foi infringido o nº1, do artº29º do CIRC. Assim sendo, foram efectuadas as seguintes correcções (em milhares de escudos):
Balancete………………………………………………………..292.182
Mapas…………… …………………………………………….236.075
Correcção Fiscal………………………………………………………..56.107
Inutilizações – Esc.56.046.654
O sujeito passivo procedeu ao abate, por inutilização, de alguns elementos do activo imobilizado dentro do seu período de vida útil, definido nos termos do nº1 do artº 3º do Dec. Reg nº2/90.
Dos abates efectuados decorreu a prática de reintegrações de valor superior ao que resultaria das taxas máximas legalmente estabelecidas, as quais, por definição, já contemplam o desgaste dos bens em condições normais de funcionamento.
Assim sendo, a perda respectiva terá de ser tratada como excepcional e a sua consideração para efeitos de apuramento da matéria colectável depende de comunicação à DGCI até ao fim do mês seguinte ao do termo da ocorrência, conforme disposto no artº 10º da norma citada.
O incumprimento daquele requisito conjugado com o disposto no nº1 do artº29º e alínea c) do nº1 do artº 32º, ambos do CIRC, fundamentam a não aceitação como custo do exercício do valor líquido dos bens na importância de Esc.56.046.654.
Rescisões de arrendamento – Esc. 90.533.750
As rescisões de arrendamento concretizadas dentro do seu período de vida útil implicaram também a prática de reintegrações, no que respeita às obras efectuadas nos edifícios arrendados, que excedem as legalmente permitidas (nº1 do artº 29º e alínea c) do nº1 do artº 32º, ambos do CIRC), pelo que ao abate contabilístico destes elementos do activo imobilizado incorpóreo será igualmente de aplicar o regime das desvalorizações excepcionais expressamente definido no artº 10º do Dec. Reg. Nº2/90, o que implica a comunicação à DGCI para efeitos de obtenção da aceitação como custo do respectivo valor líquido.
O desrespeito das normas legais mencionadas justificam um acréscimo ao lucro tributável no valor de Esc.90.533.750, referente ao valor líquido do imobilizado.
3.2.1.2. Provisões não dedutíveis (artº33º)
Total – Esc.1.008.368.814
(…)
Provisões para risco-país
- Esc.40.000.000
Da análise da base de incidência da provisão para risco-país, constatou-se existir um excesso da provisão constituída para a dívida da República Popular de Angola, conforme se demonstra na seguinte tabela:
A provisão para risco-país excedeu em 50% o factor de risco definido para Angola, previsto na Instrução nº27/97 do Banco de Portugal, no seguimento do pedido de autorização àquela instituição
(Ref: 486/98 – DPC, de 22/01/98). Em resposta àquele pedido, o B.P., limitou-se a confirmar a política de provisionamento proposta pela C....., a qual excede os limites mínimos referenciados para os activos em questão.
Assim sendo, e uma vez que a provisão não foi determinada pelo Banco de Portugal, conforme estabelecido na alínea d) do n.º1 do artº 33º do CIRC, mas apenas mereceu a sua concordância, a mesma não terá enquadramento nesta norma legal, sendo aceites para efeitos fiscais apenas as provisões constituídas pelos limites mínimos obrigatórios previstos no Aviso 3/95.
Face ao exposto, foi efectuada uma correcção ao excesso, por acréscimo ao lucro tributável, no montante em que ultrapassa a correcção proposta para o exercício de 1997 (452.000.000 – 412.000.000), ou seja de Esc.40.000.000.
3.2.1.5. Imputação de lucros (artº 57º-B)
- Esc. 14.783.213
A C..... acresceu, na linha 36 do quadro 06 do anexo 22-A da declaração mod.22, o montante de Esc.251.940.291, referente à imputação de lucros de sociedades residentes em países com regime fiscal privilegiado, nos termos do artº 57º-B do CIRC.
Aquele valor inclui uma parcela de Esc. 778.064, correspondente a 5% do lucro líquido, respeitante à participação social da C..... no B....., S.A., depois de deduzido o imposto sobre o rendimento a que houve lugar, de acordo com o regime fiscal francês. Em esquema, temos:
Lucros líquidos de 1998: Esc.17.100.304
Participação directa = 91% 17.100.304=Esc.15.561.277
Lucros imputados = 5% 15.561.277 = Esc.778.064
Deste modo, o lucro a imputar ao sócio residente, na proporção da sua participação social, nos termos do nº1 do artº57º-B do CIRC, foi reduzido em 95%, por a C..... ter entendido que, tratando-se de uma entidade participada residente num Estado Membro da União Europeia, seria de aplicar o estabelecido nos nºs 1 e 5 do artº 45º do mesmo código.
Ora, o mecanismo previsto pelo legislador no artº 45º do CIRC, para efeitos de eliminação da dupla tributação económica de lucros distribuídos, será de aplicar quando haja distribuição efectiva de lucros pelas sociedades participadas e estes estejam incluídos na base tributável
Assim, e uma vez que não houve distribuição dos lucros, a C..... não teria direito a efectuar esta dedução, pelo que foi acrescido ao lucro tributável, o montante de Esc. 14.783.213 (15.561.277-778.064).
(…)
3.2.1.7. Donativos além dos limites (artº 39º)
- Esc.67.500.000
Da análise a alguns documentos de suporte da conta 770 – Donativos, verificou-se que a C..... contabilizou importâncias desembolsadas a favor da sociedade P.....-S.A., no valor de Esc. 450.000.000, ao abrigo de um contrato celebrado com aquela entidade, com o nº970208.
Além disso, a C..... majorou aquelas contribuições em 115%, tendo como base o despacho conjunto nº469/98, de 6 de Julho, dos Ministros das Finanças e da Cultura, que reconhece que os donativos concedidos, no âmbito de contratos plurianuais, por várias entidades, entre as quais a C....., “…às entidades E. M. 1998 e Sociedade P..... 98, S.A., que foram consideradas de superior interesse cultural, serão majorados em 115%.”, deduzindo o valor de Esc. 67.500.000 (450.000.000 15%) na linha 48 do quadro 06 do anexo 22-A da declaração mod.22.
Analisado o referido contrato verificou-se que o mesmo ter por objecto o patrocínio, pela C....., da E. M. 1998 a realizar pelo P..... S.A., no período de Maio a Setembro de 1998 (cláusula 1ª).
O mesmo contrato estipula um conjunto de contrapartidas, nomeadamente publicidade, bilhetes de entrada gratuitos, exclusividade no que toca à venda de bilhetes e relógios “Expo Swatch Access”, e às operações bancárias no recinto da Exposição, ter um espaço no recinto destinado apenas a exposição do grupo económico por ela liderado, e outras também mencionadas na cláusula quarta do referido contrato. Em termos de obrigações, e de acordo com a cláusula quinta, a C..... obriga-se a pagar, a título de patrocínio, a quantia de Esc. 750.000.000 de forma escalonada, nos exercícios de 1997 e 1998.
No caso do não cumprimento das obrigações estabelecidas qualquer das partes tem o direito de ser indemnizada (cláusula 9ª).
Face ao clausulado do contrato, facilmente se constata a existência de um nexo ou relação de correspectividade entre o citado valor atribuído pela C..... à P....., S.A. e as referidas contrapartidas concedidas por esta sociedade àquela instituição de crédito, o que implica que o dispêndio desse valor se tenha operado a título oneroso e não meramente gratuito, porquanto existiu em troca do mesmo uma contraprestação que consistiu na atribuição pela P....., S.A., de um conjunto de direitos já anteriormente explanados.
Por conseguinte, assumindo o valor atribuído pela C..... um carácter oneroso em resultado da existência de uma contraprestação efectuada pela P....., S.A. nos termos acima expostos, fica por este facto afastada a intenção de a C..... beneficiar economicamente a P....., S.A. sem qualquer contrapartida patrimonial (doutrinariamente denominado de “animus donandi”) que, impreterivelmente, terá que estar subjacente à concessão de uma liberalidade como a dos donativos previstos no artº 39º do CIRC, prejudicando desse modo o enquadramento do valor despendido pela C..... no mencionado Despacho Conjunto nº469/98, com a consequente não aceitação para efeitos fiscais da majoração prevista no nº4 da disposição legal atrás referida.
Face ao exposto foi acrescido ao lucro tributável, o montante de Esc.67.5000.000. - cfr. fls.41 a 51 do PA apenso, correspondente a fls.27 a 37 do RIT;

4) A ora Impugnante apresentou reclamação graciosa da liquidação objecto dos presentes autos - cfr. Processo de Reclamação Graciosa (PRG) ínsito no PA apenso.

5) Por despacho de 13.03.2003 foi a mesma indeferida - cfr. fls.125 do PRG apenso;

6) A Impugnante efetuou o pagamento do imposto dentro do prazo de pagamento voluntário - cfr. doc. n.º 5, anexo à petição inicial;


7) Na sequência do que foi apresentada a presente impugnação judicial em 1 de Abril de 2003 - cfr. carimbo aposto a fls.1 do processo físico.
*
Não existem quaisquer outros factos com relevância para a apreciação da questão em apreço.
*
Motivação do julgamento da matéria de facto
O julgamento da matéria de facto fundou-se nos meios de prova indicados a propósito de cada facto provado.
Quanto à demais matéria alegada, a mesma não carece de ser aqui tida em conta por se tratar de alegações conclusivas, de direito ou impertinentes.».
**
Nos termos e ao abrigo do preceituado no artigo 662.º do Código de Processo Civil, por estarem documentalmente provados e serem pertinentes para a boa decisão da causa e das questões colocadas em recurso, acorda-se em aditar ao probatório os seguintes factos:

8) Em 08/09/2003 foi elaborada informação nos termos do art. 102º do CPPT na qual consta a seguinte proposta de decisão:
Em face do exposto, somos de parecer que deverá o acto tributário de liquidação objecto da presente impugnação judicial ser parcialemente revogado, tão-só, na parte correspondente à correcção fiscal efectuada a título de imputação de lucros, no valor de 14.783.213$00 (€ 73.738,36), mantendo-se quanto à restante matéria impugnada” (cfr. fls. 142/158 do processo administrativo em apenso).

9) Em 09/09/2003 foi proferido despacho pelo Director de Finanças Adjunto, por delegação, e exarado na informação mencionada no número anterior com o seguinte teor:
Concordo, pelo que com os fundamentos da presente informação e respectivo parecer, revogo parcialmente o acto impugnado, nos exactos termos em que vem proposto. Remetam-se os autos ao Digno Representante da Fazenda Pública, mediante prévia efectivação da notificação prevista no nº 3 do art. 112º do CPPT” (cfr. fls. 142 do processo administrativo em apenso).

10) Em 11/09/2003 foi emitido o ofício nº 10488 para efeitos de notificação da impugnante “para se pronunciar no prazo de 10 dias nos termos do nº 3 do art. 112º do CPPT (…) uma vez que o acto foi considerado parcialmente revogado por despacho de 2003/09/09, conforme fundamentação que se junta” (cfr. teor de fls. 159 do p.a. apenso).

11) Em 23/09/2003 deu entrada na 2ª Direcção de Lisboa requerimento em nome da impugnante na qual declara “que pretende manter a impugnação antes referida, uma vez que não aceita a revogação parcial do acto tributário” (cfr. fls. 162 do processo administrativo em apenso).


12) Com data de 10/04/2019 foi enviada pelo Serviço de Finanças de Lisboa 1 ao Tribunal Tributário de Lisboa informação com o seguinte teor:
“(texto integral no original; msgem)”
(cfr. doc. nº 004231142 10-04-2019 11:27:25 numeração SITAF)

* * *

IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Atentas as conclusões formuladas pela Recorrente e delimitado o objecto do presente recurso, importa decidir se o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quanto às questões supra identificadas.

Está em causa a liquidação adicional de IRC do exercício de 1998 decorrente do procedimento inspectivo mediante o qual a administração tributária efectuou diversas correcções às componentes negativas do lucro tributável declarado pela impugnante e que de seguida se concretizam.

i) Excesso de reintegrações na sucursal de Paris

Os serviços de inspeção tributária acresceram à matéria colectável o montante de 56.107.000$00 (€ 279.860,53) decorrente de reintegrações nas sucursais a taxas superiores às consagradas no Decreto Regulamentar nº 2/90.

Quanto a esta correcção o tribunal a quo considerou a mesma ilegal porquanto entendeu que “não podem ser corrigidas as amortizações efectuadas nas sucursais, por não ser aplicável na sucursal de Paris, o disposto na alínea l) do n.º 1 do art.º 32.º do CIRC, sob pena de violação do art.º 10.º n.º 1, da Convenção sobre Dupla Tributação Internacional com a França, como fez o acto impugnado”.

Desde já manifestamos a nossa discordância com o decidido, concretamente com a interpretação feita relativamente às normas da Convenção.

Consagra o art.º 5.º n.º 1 e 2, alínea b) da “Convenção entre Portugal e a França para Evitar a Dupla Tributação e Estabelecer Regras de Assistência Administrativa Recíproca em Matéria de Impostos sobre o Rendimento”, aprovada pelo Decreto-Lei nº 105/71 e publicada no Diário da República I Série, nº 72, de 26/03/1971, que para efeitos da Convenção, as sucursais consideram-se estabelecimentos estáveis.

E o art. 7º da referida Convenção estabelece, na parte ora relevante, o seguinte:

Artigo 7.º

1. Os lucros de uma empresa de um Estado Contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a empresa exerça a sua actividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento estável aí situado. Se a empresa exercer a sua actividade deste modo, os seus lucros podem ser tributados no outro Estado, mas unicamente na medida em que forem imputáveis a esse estabelecimento estável.

2. Quando uma empresa de um Estado Contratante exercer a sua actividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento estável aí situado, serão imputados, em cada Estado Contratante, a esse estabelecimento estável os lucros que este obteria se fosse uma empresa distinta e separada que exercesse as mesmas actividades ou actividades similares, nas mesmas condições ou em condições similares e tratasse com absoluta independência com a empresa de que é estabelecimento estável.

3. (…)”.

Por sua vez o art. 4.º, n.º 1 do Código do IRC determina que relativamente às pessoas colectivas e outras entidades com sede ou direcção efectiva em território português, o IRC incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território.

Atento o enquadramento jurídico supra, verifica-se que a norma do art.º 10.º, n.º 1 da Convenção, aplicada pela sentença recorrida, ao estabelecer que, “Uma sociedade residente de um Estado Contratante que tenha um estabelecimento estável no outro Estado Contratante poderá ser submetida ao imposto exigido pelas distribuições de lucros, previsto pela legislação interna desse outro Estado, sendo aplicável a taxa que resultar da aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 11.º.

Todavia, a fracção das distribuições de lucros efectivamente passível do imposto acima mencionado não poderá exceder o montante dos lucros industriais e comerciais que forem realizados pelo estabelecimento estável, calculada nas condições estabelecidas pelas disposições desta Convenção e após dedução do imposto que tiver incidido sobre esses lucros”, é uma norma que se aplica à tributação pelo Estado da fonte das transferências efectuadas, a título de lucros, para a sede (Estado da residência).

Contudo, e tal como referido supra, o lucro do estabelecimento estável estrangeiro (sucursal) é tributado em Portugal na pessoa da entidade residente a que pertence, ao abrigo do princípio da universalidade constante do citado art.º 4.º, n.º 1 do Código do IRC, segundo o qual o IRC incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território.

E embora o art.º 7.º da Convenção consagre que o lucro dos estabelecimentos estáveis deve ser apurado no Estado da fonte de acordo com o princípio da tributação autónoma ou separada, considerando-se tais estabelecimentos um património autónomo equiparado a uma empresa independente, não significa que a administração tributária não possa proceder a correcções no apuramento do lucro tributável da empresa sede residente em Portugal sempre que o lucro tributável das sucursais estrangeiras ali reflectido e apurado à luz da contabilidade organizada segundo as regras do Estado da fonte e respeitando as regras contabilísticas e fiscais nele vigentes, se afaste daquele que se apuraria segundo as regras contabilísticas e fiscais vigentes em Portugal (Estado da residência).

Neste sentido veja-se o Acórdão do STA de 05/11/2016 – proc.0351/14 ao afirmar que “Como já vimos, as entidades residentes, bem como as entidades não residentes com estabelecimento estável em território português, estão sujeitas a tributação em sede de IRC sobre os rendimentos obtidos a nível mundial, sendo o imposto apurado com base no lucro contabilístico, após aplicação das correcções decorrentes das normas fiscais. Pelo que, mantendo todos os estabelecimentos a mesma unidade jurídica, mesmo quando a maior parte das funções seja desempenhada num só, todos estão debaixo do controlo da empresa que os criou.

E ainda que implantados fora do território nacional e de estarem obrigados a cumprir a legislação fiscal do país onde estão localizadas quanto a obrigações contabilísticas e fiscais, o certo é que todas as operações efectuadas pelas sucursais (estabelecimentos estáveis) devem ser integradas na contabilidade da empresa que representam.

Deste modo, apesar de a sucursal ser obrigada a ter a sua contabilidade organizada de acordo com as regras onde se localiza geograficamente, estando, por isso, obrigada a cumprir todas as regras nacionais do Estado da sua localização relativas à contabilidade, apuramentos de resultados, correções para efeitos fiscais e pagamento de impostos, o certo é que esta contabilidade tem de ser, depois, integrada na contabilidade nacional segundo as regras estabelecidas pelo Plano Oficial de Contabilidade vigente em Portugal.

Por conseguinte, as sucursais, sendo tributadas em imposto sobre o rendimento no Estado onde estão localizadas, têm de determinar nesse país o seu lucro tributável (calculado com base no resultado líquido apurado à luz da contabilidade organizada segundo as regras desse Estado e com observância das regras contabilísticas e fiscais nele vigentes, que estão obrigadas a cumprir), aí podendo deduzir todas as despesas que a legislação desse Estado aceite como dedutíveis para o apuramento do lucro tributável que aí é sujeito a tributação.

Ou seja, nesse Estado, as sucursais têm de observar as regras de determinação do rendimento coletável aí vigentes, designadamente no que toca à natureza e âmbito dos gastos dedutíveis, não lhes sendo aplicáveis as regras (contabilísticas e fiscais) vigentes no Estado da residência da empresa sede. E é dessa forma que é apurado o imposto que aí é devido e pago, e que virá a constituir o referido crédito de imposto.

Todavia, dado o supra citado princípio da universalidade – que determina que as entidades residentes são tributadas pela totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora do território nacional – e visto que a sucursal está sob controlo da empresa que a criou, todos os rendimentos obtidos pela sucursal têm também de ser refletidos na contabilidade da empresa sede, aí sendo englobados pelo seu montante ilíquido para apuramento do resultado da actividade global da empresa e determinação do seu lucro tributável para efeitos do IRC devido no Estado da residência desta.

Porém, nesta fase, todas as regras contabilísticas e fiscais a observar são as vigentes em Portugal para o apuramento do lucro tributável da empresa sede residente neste país.”.

Ora no caso em apreço foi o que se verificou, na medida em que a administração tributária aceitou que na determinação do lucro tributável da impugnante se devia considerar a totalidade dos rendimentos ilíquidos, incluindo os obtidos pelas sucursais, bem como dedutíveis todos os gastos incorridos pela empresa e sucursais para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC em Portugal, desde que previstos na legislação fiscal nacional e com os limites legais previstos para tais deduções.

Desta forma se conclui que, quanto a esta correcção, referente a excesso de reintegrações na sucursal de Paris, assiste razão à Recorrente, tendo o tribunal a quo incorrido em erro de julgamento, pelo que julga-se procedente este fundamento do recurso e em consequência mantem-se a correcção efectuada pela administração tributária referente a excesso de reintegrações na sucursal de Paris.

ii) Abate do activo imobilizado incorpóreo (rescisões de arrendamentos)

Os serviços de inspecção tributária procederam ainda ao acréscimo ao lucro tributável do valor de Esc. 90.533.750$00 (451.580,44€), por abate do activo imobilizado decorrente da dedução como custo, de obras realizadas em imóvel arrendado, em montante superior ao que resultaria das quotas previstas no artigo 4.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, por não renovação do contrato, ser considerado desvalorização excepcional e, como tal, dependente de prévia aceitação da, então DGCI, o que não sucedeu.

A sentença recorrida considerou o seguinte:

As importâncias referentes às rescisões de arrendamento devem ser consideradas como custo, nos termos do artigo 23.° do CIRC, na medida em que tais obras são comprovadamente indispensáveis para a realização de proveitos.

De facto, ao estarem aquelas obras a ser amortizadas durante um período de 10 anos, de acordo com o Aviso n° 9/94 do Banco de Portugal, e tendo ocorrido o termo dos respetivos contratos de arrendamento mais cedo do que seria normalmente previsível, entende a ora Impugnante que, no exercício em que cessam os arrendamentos, deve ser considerado como custo dedutível o valor ainda não amortizado das obras realizadas, ou seja, o valor residual das instalações, como aliás, deve ser o critério aplicável ao activo imobilizado abatido em geral.

Acresce que, o regime de reintegrações e amortizações dos artigos 9.° e 10.° do Decreto Regulamentar n.°2/90 está dirigido a desvalorizações causadas por desgaste físico.

Não compreende os casos, não de desgaste, mas de abate dos bens, por motivo de qualquer causa extintiva da sua vida útil.

Caso em que, partilhando da posição defendida pela Impugnante, a amortização ou reintegração se deve efetuar na totalidade, no momento em que essa causa ocorrer”.

Vejamos o enquadramento jurídico da questão.

As reintegrações e amortizações estão genericamente previstas como custo dedutível no art.º 23.º, n.º 1 alínea g) do CIRC, desde que tenham uma relação de indispensabilidade com os ganhos obtidos sujeitos a imposto ou com a manutenção da fonte produtora.

E o art.º 27º, nº 1 do CIRC consagra que “São aceites como custos as reintegrações e amortizações de elementos do activo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais os elementos do activo imobilizado que, com carácter repetitivo, sofrerem perdas de valor resultantes da sua utilização, do decurso do tempo, do progresso tecnológico ou de quaisquer outras causas”.

Ora o nº 1 do art. 29º do mesmo Código estabelece que “O cálculo das reintegrações e amortizações do exercício deve fazer-se, em regra, pelo método das quotas constantes”.

As reintegrações e amortizações estão ainda regulamentadas em diploma próprio, o Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, estabelecendo o seu art.º 5.º, n.º 1 que “no caso de utilização do método das quotas constantes, a quota anual de reintegração e amortização que pode ser aceite como custo do exercício determina-se aplicando aos valores mencionados no n.º 1 do artigo 2.º, as taxas fixadas nas tabelas anexas ao presente diploma…”.

De salientar ainda que a quota anual de reintegração (calculada de acordo com as taxas constantes da tabela anexa) no período de entrada em funcionamento do bem, implica a não aceitação de qualquer dedução no ano do abate, dispondo o art.º 32.º, n.º 1 alínea c) do CIRC que não são aceites como custos do exercício as reintegrações e amortizações que excedam os limites estabelecidos.

A única excepção a esta regra está contemplada no art.º 10.º do citado Decreto Regulamentar n.º 2/90, admitindo-se valores mais elevados, fazendo-se depender no entanto, de comunicação atempada à administração fiscal das desvalorizações ocorridas.

Embora seja discutível que as situações de desvalorização excepcional contempladas no art.º 10.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto Regulamentar n.º 2/90 compreendam na sua previsão a consideração de valores mais elevados de reintegração/amortização de benfeitorias efectuadas em imóvel, em caso de cessação antecipada do contrato de arrendamento, na medida em que o n.º 2 descreve situações reportadas ao próprio bem (desastres/ fenómenos naturais/ inovações técnicas excepcionalmente rápidas) e não a vicissitudes ocorridas no âmbito de direitos sobre o bem, no entanto o Supremo Tribunal Administrativo, já se pronunciou no Acórdão de 11/02/2011- proc.º 0719/11, no sentido de que “o abate em imobilizado, decorrente da dedução como custo de benfeitorias efectuadas em imóvel arrendado, em montante superior ao que resultaria das quotas do artigo 4.º do DR 2/90, de 12 de Janeiro, por não renovação do contrato, deve ser considerado como desvalorização excepcional para efeitos do artigo 10.º deste DR, e, como tal, dependente de prévia aceitação por parte da DGCI, o que não tendo acontecido determina a sua não aceitação como custo”.

Atento este entendimento e ao facto de, a não aplicação do regime das desvalorizações excepcionais previsto no art.º 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, às situações de ocorrências nos direitos sobre o bem, fica sem suporte normativo a consideração, nesses casos, de valores superiores ao que resultam da aplicação linear das tabelas anexas a esse diploma.

Considerando que o âmbito da previsão do art.º 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90 abrange a situação em apreço, a aceitação fiscal da dedutibilidade das reintegrações e amortizações determinadas por desvalorização excepcional (no caso, a rescisão do contrato de arrendamento), fica dependente de comunicação atempada à administração tributária das desvalorizações ocorridas, como decorre do seu n.º 3. Ora não tendo ocorrido essa comunicação, tal ausência implica a não aceitação como custo do valor em questão, pelo que a correcção efectuada não padece da ilegalidade referida na sentença recorrida, assistindo razão à Recorrente e mantendo-se a correcção relativa a abate do activo imobilizado incorpóreo (rescisões de arrendamentos).

iii) Provisões para risco-país

O art.º 33.º, n.º 1 do CIRC (na redação à data) estabelecia que “Podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes provisões:

(…)

d) As que tiverem sido constituídas de harmonia com a disciplina imposta pelo Banco de Portugal e pelo Instituto de Seguros de Portugal às empresas submetidas à sua fiscalização, incluindo as provisões técnicas que as empresas seguradoras se encontram legalmente obrigadas a constituir”.

E o Aviso n.º 3/95, publicado no Diário da República, II Série, de 30 de Junho (n.º 12.º), e da Instrução do Banco de Portugal n.º 27/97, estabelecia para a situação em causa (dívida da República Popular de Angola não garantida pela C) um nível de provisionamento mínimo de 50%, e, perante a constituição da provisão a 100% por parte da impugnante (Esc. 824.000.000$00), a administração tributária procedeu ao acréscimo ao lucro tributável do excesso de provisionamento.

A sentença recorrida considerou, na parte que ora interessa, que “Sobre as provisões para risco-país a AF concluiu por um excesso de provisão constituída para a dívida da República de Angola perante os limites legalmente admissíveis.

Tal provisão teria ultrapassado em 50% o limite permitido, ou seja, o fator de risco definido para Angola previsto na lnstrução n.º 27/97 do Banco de Portugal, aplicável à data dos factos.

Assim, considerou a AF, que a provisão em causa não foi determinada por providência geral e abstrata do Banco de Portugal, conforme estabelece no seu entendimento a alínea d), do n.°1 do artigo 33.º, do CIRC, mas apenas mereceu a sua concordância, após pedido de enquadramento dirigido pela C......

Na sequência do que foi acrescido ao lucro tributável a quantia de 40.000.000$00 (€ 199.519,15). (…) É de salientar que, no momento da ocorrência dos factos, as provisões para riscos gerais de crédito eram admissíveis como custos de exercício, dado estar em causa exercício anterior ao da entrada em vigor da Lei n° 30-G/2000.

A provisão em causa foi, pois, constituída de acordo com um acto administrativo do Banco de Portugal dotado de presunção de legalidade.

Não podendo a AF recusar, seja com que fundamento for, a dedutibilidade da provisão para efeitos fiscais, sob pena de se imiscuir nas competências específicas do Banco de Portugal.

A AF não justificou a sua posição de discordância de alguns provisionamentos efetuados na disciplina do Aviso n° 3/95, limita-se a afirmar a inexistência desses requisitos, por falta dos pressupostos por a provisão ter sido constituída por montante superior ao máximo, sem justificar as razões.”.

Discordando do assim decidido vem a Fazenda Pública alegar que , tendo a Impugnante constituído a provisão a 100% (quando da disciplina imposta pelo Banco de Portugal, resultante quer do Aviso 3/95, quer da Instrução n.º 27/97 que lhe está associada, resultaria a sua constituição apenas em 50%), o montante excedente não pode ser aceite, nos termos do citado artigo 33.º, n.º 1, al. d) do CIRC.

Mais afirma que a informação prestada pelo Banco de Portugal, nos termos da qual esta instituição se limita a confirmar a política de provisionamento proposta pela C....., não constitui qualquer “disciplina imposta”, sendo que o caráter de imposição da disciplina do Banco de Portugal (a respetiva obrigatoriedade e não a mera concordância), constitui o requisito exigido pelo legislador para a dedutibilidade fiscal das provisões, nos termos do referido artigo 33.º, n.º 1, alínea d) do CIRC (cfr. conclusões P a R das alegações de recurso).

Vejamos então.

A constituição de provisões tem como finalidade essencial incluir em custos ou perdas de certo exercício uma dotação que de outro modo nele não figuraria, por lhe faltar justificação documental para a respectiva movimentação – falta de justificação que a constituição da provisão vem justamente suprir.

Nesta conformidade, diremos que as contas de provisões são aquelas onde se inscrevem as verbas destinadas a contrabalançar os encargos ou prejuízos estimados e actuais, de provável processamento futuro, ou, sendo certa a sua ocorrência futura, apenas o seu montante é actualmente incerto.

Constituindo a provisão um custo do exercício e de constituição obrigatória para efeitos fiscais, como acima se disse, não pode a sua constituição fazer-se a belo prazer do contribuinte e desta forma permitir-se manipular os resultados do exercício, tendo a sua constituição de cingir-se também, a entre outras, às regras da especialização dos exercícios, como os demais custos, nos termos do disposto nos art.ºs 17.º e 18.º do CIRC.

No caso de provisões permitidas para o sector bancário, o legislador - citada alínea d) do n.º1 do art.º 33.º - através de lei formal, estabeleceu uma verdadeira delegação de competências em entidade não tributária – o Banco de Portugal – para definir, ele próprio, os fins e limites da constituição das provisões, apenas podendo ser consideradas verdadeiras provisões aquelas que sejam subsumíveis às normas para o efeito criadas pelo Banco de Portugal, ou que este, venha a aceitar, por posterior acto individual. …” (cfr. Acórdão do TCA Sul de 06/11/2012 proferido no proc. 05751/12 referente à mesma impugnante, com similitude de correcções mas relativas ao IRC de 1997).

Embora o Aviso n.º 3/95 consagre, de modo geral e abstracto e em função do risco associado ao crédito concedido, a obrigatoriedade de constituição de provisões, a disciplina do Banco de Portugal, contudo, pode ser imposta através de instrumentos distintos da emanação de avisos, sendo que o próprio Aviso n.º 3/95 prevê, nos seus arts. 18º e 19º, que o Banco de Portugal, casuisticamente, determine ou autorize a constituição de provisões em moldes distintos dos que resultam da aplicação linear das tabelas de classes de crédito.

No caso em apreço foi o que efectivamente ocorreu porquanto, embora o Aviso nº 3/95 consagre a percentagem de dedução de 50% face ao factor de risco definido para Angola previsto na Instrução nº 27/97 do Banco de Portugal, no entanto o Banco de Portugal concordou com a constituição de uma provisão de 100% e a questão que se coloca é a de saber se as provisões cuja constituição não é imposta mas apenas autorizada ou ratificada pelo Banco de Portugal devem ser aceites como custos fiscais.

A resposta a tal questão foi já decidida no Acórdão do STA de 26/04/2007, proc. nº 0127/07, ao sumariar que “I- Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 33.º do CIRC, na redacção anterior à Lei 30-G/2000, são fiscalmente dedutíveis as provisões constituídas de harmonia com a disciplina imposta pelo Banco de Portugal às empresas submetidas à sua fiscalização.

II - As provisões fiscalmente dedutíveis tanto podem resultar de uma disposição de carácter genérico como de um acto administrativo individual e concreto do Banco de Portugal, de acordo com o n.º 18 do Aviso 3/95.

III - Sendo irrelevante para efeitos de consideração como custo fiscal que a constituição duma provisão que se mostre adequada, do ponto de vista prudencial, resulte de uma prévia determinação do Banco de Portugal ou de uma sua posterior ratificação.”

Acrescentando-se ainda no mesmo Aresto que: “(…) A Administração Tributária não aceitou esta provisão como custo fiscal, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 33.º (actual 34.º) do CIRC, por ter considerado que a provisão ultrapassava o limite estabelecido no n.º 3 do n.º 7 do Aviso 3/95, de 30/6, do Banco de Portugal e a sua constituição não ter resultado de imposição prévia desta entidade, não se enquadrando, por isso, no n.º 18 do citado Aviso.

O impugnante sustenta, por seu turno, que a provisão em causa deve ser aceite como custo fiscal, uma vez que a sua constituição foi autorizada pelo Banco de Portugal.

Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 33.º do CIRC, na redacção vigente à data a que se reportam os presentes autos – exercício de 1996, são fiscalmente dedutíveis as provisões específicas constituídas de harmonia com a disciplina imposta pelo Banco de Portugal às empresas submetidas à sua fiscalização.

Através do Aviso n.º 3/95, de 30/6, o Banco de Portugal definiu as regras e os termos em que as instituições de crédito e as sociedades financeiras estão obrigadas a respeitar na constituição de tais provisões.

A constituição de provisões para riscos gerais de crédito está incluída entre as provisões de constituição obrigatória previstas no referido Aviso (alínea b) do n.º 1).

Mas respeitando a provisão em causa a riscos específicos dos créditos detidos pelo impugnante sobre as sociedades, para que possa ser fiscalmente dedutível, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 33.º CIRC, o seu montante devia corresponder a 1% dos valores que constituem a sua base de incidência, conforme estabelece o ponto 3 do n.º 7 do Aviso 3/95 do Banco de Portugal.

Como no caso em apreço o montante da provisão ultrapassava esse limite, o impugnante solicitou autorização ao Banco de Portugal para a sua constituição, o qual considerou adequada, do ponto de vista prudencial, a constituição da provisão para os créditos em questão, no montante de 412.781.999$00.

Coloca-se, então, a questão de saber se as provisões cuja constituição não é imposta mas apenas autorizada ou ratificada pelo Banco de Portugal devem ser aceites como custos fiscais.

Já vimos que a alínea d) do n.º 1 do artigo 33.º CIRC fala em provisões específicas constituídas de harmonia com a disciplina imposta pelo Banco de Portugal.

Ao contrário de outras provisões em que o legislador enunciou logo o seu critério definidor e respectivos limites, aqui delegou no Banco de Portugal o exercício desse poder tributário.

Como se refere no acórdão do STA proferido no processo 16745 em 18/3/98, “Estamos perante um caso nítido de delegação de poder administrativo próprio de certa administração directa do Estado (a administração fiscal) numa outra administração não fiscal do Estado exercida por forma indirecta, numa administração levada a cabo através de institutos públicos, como é o caso do Banco de Portugal, cuja explicação se prende com o facto deste se encontrar melhor posicionado para surpreender e dar satisfação ao interesse público que aqui se resolve numa certa conciliação entre os interesses da obtenção de receitas fiscais com os de execução de uma correcta política monetária e financeira a ser concretizada por todos os agentes financeiros e que constitui uma específica atribuição do Banco de Portugal”.

A disciplina da matéria cuja competência se reservou para o Banco de Portugal deve ser efectuada pela via de normas gerais e abstractas mas nada impede que o seja também pela prática de actos administrativos individuais e concretos.

Situação que se veio a alterar, contudo, através da Lei 30-G/2000, a qual veio limitar as provisões fiscalmente dedutíveis como custos fiscais às que, por força de imposição de carácter genérico e abstracto, tiverem sido obrigatoriamente constituídas pelas entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, mas que não tem reflexo no caso em apreço na medida em que tal alteração só é aplicável a partir do exercício de 2001 e não a exercícios anteriores como é o caso (n.º 6 do artigo 7.º da citada Lei).

É neste contexto que deve ser visto o n.º 18 do Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal, segundo o qual este poderá determinar, caso a caso, que uma instituição reforce a sua política de provisionamento, quando considere que, designadamente face à situação dos mercados ou dos sectores de actividade em que ela seja mais activa, as provisões constituídas se mostrem insuficientes.

Sendo, a nosso ver, irrelevante para efeitos de consideração como custo fiscal que a constituição duma provisão que se mostre adequada, do ponto de vista prudencial, resulte de uma prévia determinação do Banco de Portugal ou de uma sua posterior ratificação.

O que importa é que ela seja determinada por razões de uma gestão sã e de prudência e seja supervisionada pelo Banco de Portugal.”. (sublinhado nosso)

Considerando o entendimento jurisprudencial acima transcrito, conclui-se que a provisão constituída pela Recorrente a 100% poderia ser aceite como custo, pelo que, nesta parte, o recurso da Fazenda Pública não terá provimento.

(iv) Imputação de lucros

Com referência a esta correcção no montante de Esc. 14.783.213$00 (73.738,36€), alega a Recorrente que a mesma foi anulada por despacho do Sr. Director de Finanças Adjunto de 09/09/2003, tendo tal revogação sido levada ao conhecimento do tribunal recorrido aquando da apresentação da contestação (cfr. conclusão S das alegações de recurso), solicitando o aditamento ao probatório de tal facto e defendendo que o tribunal a quo, ao invés de ter anulado a correcção em causa deveria ter decretado a extinção parcial da instância, por inutilidade superveniente da lide (cfr. conclusões T a W das alegações de recurso).

Vejamos então.

Compulsados os presentes autos verifica-se que não foi apresentada qualquer contestação pelo Representante da Fazenda Pública tendo este procedido apenas à junção do processo administrativo bem como do processo de reclamação graciosa.

Ora dos elementos constantes do processo administrativo em apenso resulta factualidade, por nós aditada, que permite concluir que, efectivamente foi proferido despacho em 09/09/2003 no sentido de deferimento parcial da impugnação e de anular apenas a correcção referente à imputação de lucros. No entanto, após a notificação a que alude o nº 3 do art. 112º do CPPT, a impugnante veio manifestar expressamente que não aceitava tal revogação parcial, pretendendo o prosseguimento da impugnação judicial.

Destarte resulta evidente que não ocorreu extinção parcial da instância por inutilidade superveniente da lide porquanto não ocorreu a anulação que a Recorrente defende. Na verdade, tendo a impugnação prosseguido seus termos, o tribunal conheceu da questão alegada pela impugnante relativamente à imputação de lucros.

Não tendo a Recorrente imputado qualquer erro de julgamento relativamente à apreciação feita pelo tribunal a quo sobre tal questão, transitou o julgado quanto a esta matéria.

Em face do exposto improcede a alegada extinção parcial da instância por inutilidade superveniente da lide, quanto à correcção da imputação de lucros, mantendo-se a sentença recorrida nesta parte.

(v) Donativos para além do limite

Quanto a esta correcção resulta do ponto 3 do probatório a seguinte factualidade “3.2.1.7. Donativos para além dos limites (art.º 39.º)” – constatou a AT que a impugnante contabilizou importâncias desembolsadas a favor da sociedade P....., S.A., no valor de Esc. 450.000.000$00, ao abrigo de um contrato celebrado com aquela entidade, com o n.º 970208.

Majorou aquelas contribuições em 115% ao abrigo do despacho conjunto n.º 469/98, de 17/07/1998, dos Ministros das Finanças e da Cultura, que confere uma majoração de 115% aos donativos concedidos no âmbito de contratos plurianuais às entidades E. M. 1998 e Sociedade P....., S.A.

Considerando a AT que o referido contrato com o n.º 970208 configura uma situação de patrocínio e não de donativo, uma vez que implicava uma série de contrapartidas, o que retira o carácter gratuito da operação que caracteriza os donativos, procedeu à correcção da majoração, nos termos do art.º 39.º, n.º 4 do CIRC, que à data determinava: “Os donativos referidos no n.º 1 são levados a custos em valor correspondente a 105% do total, salvo nos casos de donativos inseridos em contratos plurianuais celebrados pelos contribuintes e entidades beneficiárias onde se fixem os objectivos e o valor das contribuições, caso em que cada unidade monetária poderá ser majorada até 130%, por despacho conjunto do Ministro das Finanças e do membro do Governo responsável pelo sector da cultura.”

O tribunal a quo considerou ser de anular a mencionada correcção tendo para o efeito vertido o seguinte discurso fundamentador:

«Sempre considerou a C..... que a correção no montante de 67.500.000$00, correspondente à majoração de 115% do donativo concedido à Sociedade P....., S.A., no montante de 450.000.000$00, não deverá ser efetuada pelas seguintes ordens de razões.

Defende a AF que o contrato apresentado pela Impugnante, configura uma situação de patrocínio, pois o valor de 450.000.000$00, concedido à Sociedade P....., SA, implica uma série de contrapartidas, o que releva o seu carácter oneroso.

Efetivamente, quando a Sociedade P....., S.A., a pedido da C....., solicitou despacho de majoração conjunto ao Ministério das Finanças e ao Ministério da Cultura para o contrato plurianual celebrado entre a C..... e aquela entidade, juntou, para o efeito, cópia do contrato n° 970208, como era obrigatório para efeitos de instrução de processos de majoração de donativos concedidos ao abrigo de contratos plurianuais.

Ao juntar cópia do referido contrato, o Ministério das Finanças e o Ministério da Cultura tiveram pleno conhecimento do teor do mesmo, designadamente das pretensas contrapartidas concedidas pela Sociedade P....., S.A., à C....., considerando, ainda assim, estas como irrelevantes para efeitos de consideração como donativo majorável, não sendo suficiente para a caracterização do contrato em causa como oneroso.

Caso assim não entendessem aquelas entidades, não teriam proferido o despacho conjunto n° 469/98, de 6 de Julho, no qual reconheceram que o donativo concedido no âmbito do contrato plurianual em epígrafe deverá ser majorado em valor correspondente a 115%.

Por outro lado, as pretensas contrapartidas oferecidas pela Sociedade P....., S.A., não justificavam o valor do donativo atribuído, razão pela qual foi, segundo entendemos, por despacho conjunto atribuído ao montante pago pela C..... um carácter de liberalidade e como tal enquadrável no âmbito do artigo 39° do CIRC.

A AF entendeu não aceitar a dedutibilidade dos donativos, ignorando o despacho de concessão dos benefícios fiscais, e a presunção de legalidade que lhe está associada.

Esse Despacho não foi revogado, continuando a produzir a plenitude dos seus efeitos jurídicos.

Nos termos do artigo 2°, n.°1 do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo artigo 1.° do Decreto-Lei n.°215/89, de 1 de Julho, consideram-se benefícios fiscais as medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extra-fiscais relevantes que sejam superiores ao da própria tributação que impedem.

A existência, pois, de acto administrativo de concessão de benefício fiscal não permite a tributação antes da revogação do benefício.

Não pode repor-se automaticamente a tributação regra sem a revogação do benefício, com base na inobservância culposa das condições postas ao tributar no disposto da concessão (artigo 12°, n°. 4 do EBF).

Essa revogação é da exclusiva competência da entidade concedente do benefício fiscal.

Foi essa competência dos Ministros das Finanças e da Cultura que a AF violou ao proceder à tributação regra sem que o benefício tivesse sido revogado.

A aplicação do regime regra não se baseou no incumprimento das condições impostas ao beneficiário do despacho de concessão.

As pretensas contrapartidas figuravam no contrato homologado pelos Ministros das Finanças e da Cultura para efeitos do reconhecimento do benefício fiscal.

Por violação dos artigos 12.°, n.º4 e 39.° do EBF, na numeração seguida aquando dos factos, terá de ser anulada a correção de 67.500.000$00 (€ 336.688,58).

Pelo que, também relativamente a este fundamento terá de proceder a impugnação.».

Dissente do assim decidido vem a Recorrente alegar que não existem evidências da tomada de conhecimento por parte dos Ministros das Finanças e da Cultura do teor do contrato nº 970208, que o despacho conjunto n.º 469/98, de 6 de Julho, não se refere expressamente àquele contrato dispondo apenas que reconhece que os donativos concedidos à Sociedade P....., SA serão majorados em 115% e que no contrato em causa, atentas as contrapartidas estipuladas, não se estava perante a concessão de qualquer donativo mas sim de um patrocínio, este, aceite como custo, mas não majorável.

Dada a similitude da correcção, em que as partes são as mesmas, tendo por base o mesmo contrato nº 970208 e o mesmo despacho conjunto nº 469/98, tendo em vista uma interpretação e aplicação uniformes do direito (cfr. artigo 8.º, n.º 3, do C.Civil), seguiremos de perto o entendimento vertido no já mencionado Acórdão do TCA Sul de 06/11/2012 – processo nº. 05751/12, (transponível para os presentes autos), ao mencionar o seguinte:

Como já ficou dito, o artigo 39.º, n.º 4 do CIRC, na redacção conferida pelo DL 65/93, dispunha que “os donativos referidos no n.º 1 são levados a custos em valor correspondente a 105% do total, salvo nos casos de donativos inseridos em contratos plurianuais celebrados pelos contribuintes e entidades beneficiárias onde se fixem os objectivos e o valor das contribuições, caso em que cada unidade monetária poderá ser majorada até 115%, por despacho conjunto do Ministro das Finanças e do membro do Governo responsável pelo sector da cultura”.

Nesta medida, e considerando os elementos presentes nos autos, revela-se certeira a decisão recorrida, quando aponta que tendo o benefício fiscal sido conferido ao abrigo do despacho conjunto n.º 469/98, de 6 de Julho, apenas poderia ser revogado com os fundamentos e nos termos do disposto no citado art. 13.º, n.º 4 do EBF, ou seja, no caso em apreço, por se considerar que o benefício fora indevidamente concedido (por se ter entendido que o contrato em causa não respeitava o disposto no art. 39.º, do CIRC, uma vez que o mesmo foi abrangido no âmbito do despacho, aspecto que a AT não põe em causa no RI) e apenas tendo competência para o efeito a entidade que o concedeu, no caso, os Ministros das Finanças e da Cultura (cf. art. 142.º, n.º 1, do CPA, aprovado pelo DL n.º 6/96, de 31/01).

Com efeito, a proposta de análise da Recorrente assenta apenas na tentativa de inverter a análise dos dados da questão, referindo de forma inaceitável que ainda que a AT não tenha posto em causa o referido Contrato nem que o mesmo tenha sido abrangido pelo Despacho Conjunto, consideramos que tal também não releva, pois o Contrato refere-se a patrocínio e o Despacho Conjunto a donativos, o que constituem conceitos completamente distintos e que não se confundem entre si.

Com efeito, se não está em causa o contrato nem que o mesmo tenha sido abrangido pelo Despacho Conjunto, então tem de entender-se que tal Despacho foi emitido no pressuposto de que os autores do Despacho tinham pleno conhecimento da realidade em apreço e sabiam o que estavam a apreciar, valorando nos termos do seu teor a matéria em apreço e que envolve, além do mais, os conceitos que a Recorrente pretende agora discutir.

Assim sendo, a AT tem de aceitar tal valoração, até porque, como se aponta, com total acerto na decisão recorrida, tendo o benefício fiscal sido conferido ao abrigo do despacho conjunto n.º 469/98, de 6 de Julho, apenas poderia ser revogado com os fundamentos e nos termos do disposto no citado art. 13.º, n.º 4 do EBF e apenas tendo competência para o efeito a entidade que o concedeu, no caso, os Ministros das Finanças e da Cultura (cf. art. 142.º, n.º 1, do CPA, aprovado pelo DL n.º 6/96, de 31/01).

Desta forma não merece censura o entendimento vertido na sentença recorrida quanto à correcção efectuada pelos serviços de inspecção tributária relativa a “donativos destinados a outros fins” no sentido de a mesma ter de ser anulada, negando-se nesta parte provimento ao recurso.

Por tudo o que vem exposto julgamos ser de conceder parcial provimento ao recurso como será determinado infra.

Da condenação em custas

Nas causas de valor superior a € 275.000,00 a regra continua a ser o pagamento integral da taxa de justiça resultante da aplicação dos critérios legais, assumindo natureza excepcional a dispensa, pelo juiz, de pagamento do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais.

Como o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar em diversos arestos, a dispensa do remanescente da taxa de justiça tem natureza excepcional, pressupõe uma menor complexidade da causa e uma simplificação da tramitação processual aferida pela especificidade da situação processual e pela conduta das partes.

O presente recurso revestiu uma complexidade factual e jurídica acima da média, demandando resposta a várias questões, nem todas tratadas na jurisprudência deste Tribunal.

Porém, tendo presente o valor da causa, haverá desproporção entre o serviço de justiça prestado e o montante que seria devido a título de taxa de justiça, pela diferença entre 275.000 € e o valor da causa (596.589,40 €), susceptível até de ofender os princípios constitucionais do direito de acesso aos tribunais e da proporcionalidade decorrentes do estatuído nos artigos 20.º, n.º 2.º e 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

E como tem sido afirmado pelo Supremo Tribunal Administrativo, não se pode perder de vista que a taxa de justiça, como todas as taxas, assume natureza bilateral ou correspectiva (cf. artigos 3.º, n.º 2, e 4.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária), constituindo a contrapartida devida pela utilização do serviço público da justiça por parte do sujeito passivo – cf. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 16/09/2020, proferido no processo 0249/14.9BESNT. Por outro lado, a conduta processual das partes no recurso não merece censura que obste a essa dispensa.

Destarte consideramos justo, adequado e equilibrado, nos termos e para os efeitos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, dispensar ambas as partes da obrigação do respectivo pagamento, em 50% do seu total.

Importa ainda salientar que sendo o presente processo anterior a 2004, a Recorrente goza de isenção legal das custas.

V- DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em:
i) Conceder parcial provimento ao recurso, relativamente às correcções “Excesso de reintegrações na sucursal de Paris” e “Abate do activo imobilizado incorpóreo (rescisões de arrendamentos)”, revogar a sentença recorrida nessa parte, e consequentemente julgar a impugnação judicial improcedente quanto a essas correcções;
ii) Negar parcial provimento ao recurso relativamente às correcções “Provisões para Risco País”, “Imputação de Lucros” e “Donativos para além do limite”, mantendo a sentença recorrida nessa parte e, consequentemente julgar a impugnação judicial procedente quanto a essas correcções;
iii) Dispensar as partes do pagamento da taxa de justiça na parte excedente do montante de € 275.000, em 50%.

Custas por ambas as partes na proporção do decaimento que, face ao valor das correcções em questão, se fixa em 45% a cargo da Recorrente (que delas está legalmente isenta) e 55% a cargo da Recorrida, sem prejuízo da dispensa do pagamento do remanescente acima decidido.

Lisboa, 2 de Março de 2023
Luisa Soares (Relatora por vencimento)

Vital Lopes (com declaração de voto infra)

Tânia Cunha




Voto de Vencido
Voto vencido pelas razões aduzidas no projecto que não fez vencimento e que abaixo deixo reproduzidas, adiantando apenas que os presentes autos não possuem elementos fácticos que possibilitem a convergência de soluções preconizadas no ac. deste TCAS de 06/11/2012, tirado no proc.º 05751/12, que foi seguido, no que respeita aos fundamentos da impugnação assentes em provisões para risco-país e donativos para além do limite.
Provisões para risco-país

De acordo como o que (à data) dispunha o art.º 33.º, n.º 1 do CIRC, “Podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes provisões:
(…)
d) As que tiverem sido constituídas de harmonia com a disciplina imposta pelo Banco de Portugal e pelo Instituto de Seguros de Portugal às empresas submetidas à sua fiscalização, incluindo as provisões técnicas que as empresas seguradoras se encontram legalmente obrigadas a constituir”.

Essa disciplina é a que consta do Aviso n.º 3/95, publicado no Diário da República, II Série, de 30 de Junho (n.º 12.º), e da Instrução do Banco de Portugal n.º 27/97, que estabelecia para a situação em causa (dívida da República Popular de Angola não garantida pela C.) um nível de provisionamento mínimo de 50%, sendo que a impugnante constituiu provisão a 100% (Esc. 824.000.000$00), tendo a AT acrescido ao lucro tributável o excesso de provisionamento.

É certo que um excesso do nível de provisionamento para risco país face ao mínimo estabelecido pelo regulador não é criticável se visto na óptica do princípio contabilístico da prudência (de que cuida o supervisor), no entanto, esta é uma das situações em que o balanço fiscal não acompanha o balanço comercial. E compreende-se porquê, pois a aceitarem-se irrestritamente as provisões constituídas, a Fazenda Pública correria o risco de ver minguado excessivamente os lucros tributáveis das empresas unicamente por via de opções gestionárias cuja bondade não poderia sindicar.

Não olvidamos que de acordo com o n.º 18 do citado Aviso 3/95, “O Banco de Portugal poderá determinar, caso a caso, que uma instituição reforce a sua política de provisionamento, quando considere que, designadamente, face à situação dos mercados ou dos sectores de actividade em que ela seja mais activa, as provisões constituídas se mostrem insuficientes”.

No entanto, não resulta dos autos qualquer determinação do Banco de Portugal no sentido do reforço da provisão constituída, antes que o supervisor autorizou o reforço da provisão que lhe foi apresentado pela C....., o que pode explicar-se por razões de rigor e prudência da entidade supervisionada, da concreta avaliação que esta fez do risco de default da contraparte, que não encontram abrigo no regime fiscal de dedutibilidade destas provisões.

Neste modo de ver, atendendo a que a provisão para crédito vencido resultante de dívidas da República Popular de Angola à C..... foi constituída acima dos limites mínimos obrigatórios, não decorrendo de qualquer imposição do Banco de Portugal, o montante de Esc. 412.000.000$00, provisionado em excesso, não é de aceitar como custo fiscal.

Também neste segmento decisório, a sentença incorreu em erro de julgamento ao concluir pela ilegalidade da correcção, não podendo manter-se o decidido na ordem jurídica, sendo de julgar procedente este trecho do recurso.

Donativos para além do limite

Como se apreende do ponto 3. do probatório, que procede à transcrição do relatório de inspecção tributária na parte que agora interessa - “3.2.1.7. Donativos para além dos limites (art.º 39.º)” – constatou a AT que a impugnante contabilizou importâncias desembolsadas a favor da sociedade P....., S.A., no valor de Esc. 450.000.000$00, ao abrigo de um contrato celebrado com aquela entidade, com o n.º 970208.

Majorou aquelas contribuições em 115% ao abrigo do despacho conjunto n.º 469/98, de 17/07/1998, dos Ministros das Finanças e da Cultura, que confere uma majoração de 115% aos donativos concedidos no âmbito de contratos plurianuais às entidades E. M. 1998 e Sociedade P....., S.A.

Considerando a AT que o referido contrato com o n.º 970208 configura uma situação de patrocínio e não de donativo, uma vez que implicava uma série de contrapartidas, o que retira o carácter gratuito da operação que caracteriza os donativos, procedeu à correcção da majoração, nos termos do art.º 39.º, n.º 4 do CIRC, que à data determinava: “Os donativos referidos no n.º 1 são levados a custos em valor correspondente a 105% do total, salvo nos casos de donativos inseridos em contratos plurianuais celebrados pelos contribuintes e entidades beneficiárias onde se fixem os objectivos e o valor das contribuições, caso em que cada unidade monetária poderá ser majorada até 130%, por despacho conjunto do Ministro das Finanças e do membro do Governo responsável pelo sector da cultura.”

A sentença não validou a correcção, tendo para tanto ponderado o seguinte:

«Sempre considerou a C..... que a correção no montante de 67.500.000$00, correspondente à majoração de 115% do donativo concedido à Sociedade P....., S.A., no montante de 450.000.000$00, não deverá ser efetuada pelas seguintes ordens de razões.

Defende a AF que o contrato apresentado pela Impugnante, configura uma situação de patrocínio, pois o valor de 450.000.000$00, concedido à Sociedade P....., SA, implica uma série de contrapartidas, o que releva o seu carácter oneroso.

Efetivamente, quando a Sociedade P....., S.A., a pedido da C....., solicitou despacho de majoração conjunto ao Ministério das Finanças e ao Ministério da Cultura para o contrato plurianual celebrado entre a C..... e aquela entidade, juntou, para o efeito, cópia do contrato n° 970208, como era obrigatório para efeitos de instrução de processos de majoração de donativos concedidos ao abrigo de contratos plurianuais.

Ao juntar cópia do referido contrato, o Ministério das Finanças e o Ministério da Cultura tiveram pleno conhecimento do teor do mesmo, designadamente das pretensas contrapartidas concedidas pela Sociedade P....., S.A., à C....., considerando, ainda assim, estas como irrelevantes para efeitos de consideração como donativo majorável, não sendo suficiente para a caracterização do contrato em causa como oneroso.

Caso assim não entendessem aquelas entidades, não teriam proferido o despacho conjunto n° 469/98, de 6 de Julho, no qual reconheceram que o donativo concedido no âmbito do contrato plurianual em epígrafe deverá ser majorado em valor correspondente a 115%.

Por outro lado, as pretensas contrapartidas oferecidas pela Sociedade P....., S.A., não justificavam o valor do donativo atribuído, razão pela qual foi, segundo entendemos, por despacho conjunto atribuído ao montante pago pela C..... um carácter de liberalidade e como tal enquadrável no âmbito do artigo 39° do CIRC.

A AF entendeu não aceitar a dedutibilidade dos donativos, ignorando o despacho de concessão dos benefícios fiscais, e a presunção de legalidade que lhe está associada.

Esse Despacho não foi revogado, continuando a produzir a plenitude dos seus efeitos jurídicos.

Nos termos do artigo 2°, n.°1 do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo artigo 1.° do Decreto-Lei n.°215/89, de 1 de Julho, consideram-se benefícios fiscais as medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extra-fiscais relevantes que sejam superiores ao da própria tributação que impedem.

A existência, pois, de acto administrativo de concessão de benefício fiscal não permite a tributação antes da revogação do benefício.

Não pode repor-se automaticamente a tributação regra sem a revogação do benefício, com base na inobservância culposa das condições postas ao tributar no disposto da concessão (artigo 12°, n°. 4 do EBF).

Essa revogação é da exclusiva competência da entidade concedente do benefício fiscal.

Foi essa competência dos Ministros das Finanças e da Cultura que a AF violou ao proceder à tributação regra sem que o benefício tivesse sido revogado.

A aplicação do regime regra não se baseou no incumprimento das condições impostas ao beneficiário do despacho de concessão.

As pretensas contrapartidas figuravam no contrato homologado pelos Ministros das Finanças e da Cultura para efeitos do reconhecimento do benefício fiscal.

Por violação dos artigos 12.°, n.º4 e 39.° do EBF, na numeração seguida aquando dos factos, terá de ser anulada a correção de 67.500.000$00 (€ 336.688,58).

Pelo que, também relativamente a este fundamento terá de proceder a impugnação.».

O raciocínio seguido pela Mmª. Juiz a quo estaria correcto se houvesse prova nos autos da realidade que a impugnante alega, ou seja, que “quando a Sociedade P....., S.A., a pedido da C....., solicitou despacho de majoração conjunto ao Ministério das Finanças e ao Ministério da Cultura para o contrato plurianual celebrado entre a C..... e aquela entidade, juntou, para o efeito, cópia do contrato n.º 970208”.

Ora, consta do relatório final de inspecção (fls.63 do apenso administrativo), relativamente a esta correcção, que a C..... não apresentou prova dos factos por si alegados em sede de direito de audição e tal prova também não consta dos autos de impugnação.
E sendo este um facto controvertido, a sentença não o podia assumir como certo na ausência de prova. O que significa que a sentença errou no julgamento que fez.

Constata-se, por outro lado, que a Recorrida, nas contra-alegações não requer a ampliação do âmbito do recurso (art.º 636/2 do CPC), concretamente, não impugna a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pela recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas (e, no caso, a Recorrente, alegava justamente falta de prova de que os autores do despacho conjunto tinham pleno conhecimento prévio do teor do contrato 970208).

Concluindo-se pela ausência dessa prova, tendo em conta que o despacho ministerial conjunto referencia a majoração em 115% aos donativos concedidos e o contrato com o n.º 970208 que a impugnante celebrou com a P....., S.A., prevê contrapartidas estipuladas pelas partes, nomeadamente, publicidade, bilhetes de entrada gratuitos, exclusividade no tocante à venda de bilhetes e relógios “Expo Swatch Access” e às operações bancárias no recinto da Exposição, ter um espaço no recinto destinado apenas a exposição do grupo económico liderado pela impugnante, vantagens que a impugnante/ Recorrida não questiona, o que lhe retira o carácter de liberalidade que caracteriza os donativos, fica arredado o entendimento de que a AT desconsiderou indevidamente o beneficio fiscal concedido por aquele despacho.

Com efeito, donativo significa oferta, presente, dádiva, ou seja, doação de algo a outrem efectuada com espírito de liberalidade, o que tem implícito o não recebimento de qualquer contrapartida, ditando o art.º 940.º do Cód. Civil que: “Doação é o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou direito, ou assume uma obrigação, em benefício do outro contraente”.

Por outro lado, de acordo com o art.º 24.º do Código de Publicidade, aprovado pelo D.L. n.º 330/90, de 23/10, o patrocínio consiste na: “(…) participação de pessoas singulares ou colectivas no financiamento de quaisquer obras audiovisuais, programas, reportagens, edições, rubricas ou secções (…) independente do meio utilizado para a sua difusão, com vista à promoção do seu nome, marca ou imagem, bem como das suas actividades bens ou serviços (…)”.

Daqui resulta que enquanto o patrocínio se caracteriza pela atribuição ao patrocinador de um conjunto de contrapartidas de carácter comercial constantes de um contrato, tendo por finalidade transmitir o seu nome e a imagem e dos respectivos bens ou serviços, mediante a sua associação a eventos ou entidades com carácter desportivo ou cultural, já o donativo consiste em prestações em dinheiro ou espécie concedidas sem contrapartidas, a entidades públicas ou privadas que têm por fim principal a realização de iniciativas sociais, culturais, desportivas, etc., sendo que a impugnante obteve várias contrapartidas ao abrigo do questionado contrato, o que significa que não está a dispor gratuitamente do seu património, pelo que estamos perante um contrato de patrocínio e não de donativo, como bem o caracterizou a Administração tributária.

Não estando o contrato com o n.º 970208 celebrado pela impugnante com a sociedade P....., S.A., abrangido pelo despacho conjunto que vimos referindo (porque nele se referem donativos e o contrato se reporta materialmente a patrocínios), fica sem suporte normativo a majoração em 115% do montante das prestações/ atribuições efectuadas pela impugnante no âmbito daquele contrato, o que significa que esta correcção também não merece a censura que a sentença lhe aponta, sendo de julgar também procedente este último fundamento do recurso.

Assim,
Concederia provimento ao recurso, revogaria a sentença recorrida e julgaria a impugnação improcedente (também) quanto às correcções assentes em “provisões para risco país” e “donativos para além do limite”.