Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2672/16.5BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:02/24/2022
Relator:MARIA CARDOSO
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
NULIDADE POR EXCESSO DE PRONUNCIA
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO FORMAL DESPACHO DE REVERSÃO
Sumário:1. A nulidade da citação, porque não determina a extinção da execução fiscal, mas apenas a repetição do acto com cumprimento das formalidades omitidas, não constitui fundamento de oposição, antes deve ser conhecida, em primeira linha, mediante arguição pelos interessados dentro do prazo da oposição, na execução fiscal (com eventual reclamação da decisão para o tribunal, nos termos do artigo 276.º do CPPT), se puder prejudicar a defesa do citado (cfr. artigos 191.º, n.º 4 do CPC e 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT).

2. A exigência da fundamentação dos actos tributários constitui uma garantia constitucional dos administrados e destina-se a dar a conhecer aos interessados as razões determinantes da decisão proferida, em termos de poderem tomar uma posição esclarecida de conformação, ou reacção através dos meios impugnatórios facultados pela lei (cfr. artigos 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa).

3. O despacho de reversão observa as exigências de fundamentação (formal), que não são rígidas, no quadro previsto nos artigos 23.º, n.º 4 e 77.º da LGT, quando dá a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua origem, de modo a permitir ao interessado aceitar o acto ou reagir através dos meios legais ao seu dispor, sem, contudo, impor que do mesmo constem os factos concretos nos quais a Administração Tributária fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido e aos demais pressupostos.

Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a 1.ª Subsecção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

1. A Fazenda Pública veio recorrer da sentença proferida no Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a oposição à execução fiscal (PEF) n.º 33012….. instaurada no Serviço de Finanças (SF) de Lisboa-4, deduzida por P......, para cobrança coerciva de dívida proveniente de dívidas de IRC, relativa ao ano de 2009, e IVA dos meses de agosto e setembro de 2013, das quais foi devedora originária “M......, S.A.”, no valor de €18.979,51.

2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«I - Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou procedente a oposição judicial, intentada por P......, já devidamente identificado nos autos e que, em consequência, ordenou a extinção do PEF n.° 3301…… e apensos quanto ao Oponente. Entende a Fazenda Pública que mal esteve o Tribunal a quo na douta sentença proferida porquanto, tendo sido alegado pelo oponente/Recorrido que a AT não alegou nem provou o exercício da gerência de facto por parte do Oponente, não cumprindo assim o dever de fundamentação exigível, afigura-se que o acolhimento desta tese pelo Tribunal a quo vai contra o direito constituído e contra a melhor jurisprudência dos nossos tribunais superiores. Ao perfilhar aquela tese, a sentença ora recorrida ostenta não só um manifesto erro de julgamento de direito, como também se afigura nula por conhecer de matéria que não lhe é lícita conhecer; não devendo subsistir na ordem jurídica por não ser congruente com os elementos constantes dos autos, impondo-se, salvo melhor opinião, a revogação/anulação da sentença recorrida

II - A sentença prolatada pelo Tribunal a quo enferma de nulidade por excesso de pronúncia na medida em que refere que a Administração Fiscal deveria ter "apurado e demonstrado a administração de facto do Oponente”, o que, não ocorrendo, ”impõe-se concluir pela ilegitimidade do Oponente para a execução fiscal”.

III - Como dispõe o artigo 125.°, n.° 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, é nula a sentença quando ocorra "a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”. Ora, não tendo o Oponente na fase de articulados negado a gerência/administração de facto, mas tão somente a falta de fundamentação formal do despacho de reversão, não podia o Tribunal a quo exigir o apuramento e a demonstração daquela por parte da Administração Fiscal.

IV - Assim, os termos em que a sentença ora recorrida foi elaborada ostentam uma nulidade que ora se argui e que impõe a sua substituição por outra sentença que, expurgada de tal nulidade, venha a conhecer das questões que podem e devem ser conhecidas pelo Tribunal a quo.

V - Por outro lado, a Fazenda Pública não se conforma com a sentença recorrida porquanto a mesma acolhe um deficiente entendimento em matéria de requisitos de fundamentação do despacho de reversão.

VI - Conforme se constata na alínea F) dos factos dados como provados na sentença, o despacho de reversão dirigido ao Recorrido/Oponente dispõe de uma secção na qual se vislumbra claramente a fundamentação da reversão quanto aos pressupostos, donde se extrai a alegação da gerência de facto. Decorre das palavras ínsitas no despacho de reversão ( "Fundamentos da Reversão") a expressa alegação que o Tribunal a quo e o Oponente defendem não existir ("que exerçam, ainda que somente de facto"); não sendo exigível que esta alegação seja acompanhada de mais pormenorização factual, já que se afigura suficiente para esclarecer o Oponente das circunstâncias que estiveram na base da reversão, acrescendo ainda ser inexigível qualquer prova desta gerência de facto em fase de procedimento de reversão.

VII - Dispõe o n.° 4 do art.° 23° da LGT que a reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, "é precedida (...) da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação". Sendo este preceito determinante para aquilatar da legalidade do despacho de reversão em matéria de reversão, uma leitura atenta do mesmo permite concluir que a sua legalidade não depende da alegação de factos concretos que consubstancie a gerência de facto nem da concomitante prova da gerência de facto por parte do órgão de execução fiscal.

VIII - Neste sentido, veja-se o acórdão no Processo n.° 0925/13, de 29-10-2014 do STA, em que se refere: "II - A fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (n° 4 do art. 23° da LGT) não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido."

IX - Tal como determina o n.° 4, do artigo 23.° da LGT, conjugado com o artigo 77.° do mesmo diploma legal, o Serviço de Finanças produziu e fez acompanhar a citação pessoal do oponente com a declaração fundamentada dos pressupostos da reversão e extensão, apontando as razões de facto e de direito de forma sucinta, mostrando-se devidamente fundamentado, permitindo, inquestionavelmente, a um normal destinatário conhecer as razões de facto e de direito do acto de reversão. E assim, o despacho de reversão proferido nos presentes autos contém a fundamentação legalmente exigida pelo n.° 1, do artigo 77.° da LGT, permitindo ao oponente perceber as razões de facto e de direito que levaram ao órgão de execução fiscal a decidir nos moldes em que decidiu, o que lhe permitiu defender de forma cabal os seus direitos e interesses, como resulta, de forma clara, da simples leitura da petição de oposição..

X - Tendo presente tudo o que acima se expôs, é imperioso concluir que mal esteve o Tribunal a quo na douta sentença proferida porquanto, em clara e frontal violação do disposto no n.° 4 do art.° 23.° da LGT, entendeu que a validade formal do despacho de reversão depende da alegação de factos concretos que consubstancie a gerência de facto e da concomitante prova da gerência de facto por parte do órgão de execução fiscal; e por esta razão não deve subsistir na ordem jurídica, o que deve determinar, salvo melhor opinião, a revogação da sentença sub judice.

Termos em que, e com o douto suprimento de vossas excelências, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser anulada/revogada a sentença ora recorrida, com as demais e devidas consequências legais, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!»

3. O recorrido, P......, não apresentou contra-alegações.

4. Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, e dada vista ao Exmo. Magistrado do Ministério Público, emitiu parecer, no sentido de negar provimento ao recurso.

5. Colhidos os vistos legais, vem o processo à Conferência para julgamento.


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II – QUESTÕES A DECIDIR:

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença enferma de nulidade por excesso de pronuncia e de erro de julgamento ao considerar que a validade formal do despacho de reversão depende da alegação de factos concretos que consubstancia a gerência de facto


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III - FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

A sentença recorrida proferiu a seguinte decisão relativa à matéria de facto:

«A) Em 23/06/2014, foi emitida certidão de dívida, que deu origem à autuação do PEF n.° 3301……, pelo Serviço de Finanças de Lisboa-4, contra M......, S.A., para cobrança da dívida de €6.143,69, referente a IVA do ano de 2013 - cf. certidão a fls. 2 da cópia do PEF apensa aos autos;

B) Em 09/07/2014 foi enviada comunicação ao Serviço de Finanças de Lisboa-10, pelo 3.° Juízo, do Tribunal do Comércio de Lisboa, da sentença proferida no Processo de Insolvência n.° 968/14.0TYLSB, de declaração da insolvência da sociedade M......, S. A. - cf. ofício e cópia da sentença a fls. 6-13 da cópia do PEF apensa aos autos;

C) Em 04/08/2014 foi proferido despacho pelo Chefe de Finanças de Lisboa-4, de intenção de reversão contra o Oponente do PEF n.° 3301…… e apensos, para cobrança da dívida de €18.979,51 - cf. Despacho a fls. 25 da cópia do PEF apensa aos autos;

D) No despacho referido na alínea anterior pode ler-se: "PROJETO DE REVERSÃO 1) Insuficiência de bens da devedora originária (artigos 23°/1 a 3 e 7 da LGT e 153°/1/2/b do CPPT), decorrente de situação líquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) e/ou em face de insolvência declarada pelo Tribunal" - cf. Despacho a fls. 25 da cópia do PEF apensa aos autos;

E) Em 08/08/2014 foi realizada a assembleia de credores, referente ao insolvente M......, S.A., podendo ler-se, na respetiva ata, o seguinte: "Seguidamente, foi pedida a palavra sucessivamente pelos fls. representantes dos credores que a seguir se identificam, tendo no seu uso reclamado para efeitos de participação na Assembleia, nos termos do disposto no art° 73° n° i al. a) do CIRE, os seguintes créditos: "Estado -A.T.A."-541.540,556 (...)


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Seguidamente, pelo Sr. Administrador da Insolvência, insolvente e credores presentes não foi deduzida qualquer impugnação de créditos, nos termos do art° 73 n° 1 al. b) do CIRE.

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Neste momento, pela Mm'. Juíza foi proferido o seguinte:

DESPACHO

"Declaro constituída a assembleia de credores com os credores presentes que aqui reclamaram créditos e pelos montantes em que o fizeram, para efeito de participação na

assembleia nos termos do disposto no art. ° 73°n° 1 alínea a) e b) do CIRE."


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Seguidamente, foi dada a palavra ao Sr. Administrador da Insolvência para expor sumariamente as conclusões do seu relatório elaborado nos termos do disposto no art° 155° do CIRE, propondo apresentar um plano de insolvência a ser elaborado por ele e pela insolvente.

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Seguidamente, foi dada a palavra à II. Mandatária da insolvente e credores presentes, para querendo se pronunciarem quanto ao relatório apresentado, ninguém o tendo feito.

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Seguidamente, pela Mm1 Juiz foi perguntado a assembleia de credores se alguém desejava apresentar proposta no sentido da retirada da administração ao devedor, nlo tendo sido apresentada qualquer proposta nesse sentido.

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Seguidamente, foi posta a votação a proposta de manutenção era actividade da Insolvente, tendo-se obtido o seguinte resultado:

Contra: "A......, LDA, "T......, S.A. " e "S….. ".

Abstenção: "M…….. LDA".

A favor; Os demais credores presentes."

(cf. Doc. N.° 1 junto com a petição inicial a fls. 18-19 do SITAF);

F) Em 06/10/2014 foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa-4, contra o Oponente, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e no qual pode ler-se:

"Face às diligências de fls. 6 e seguintes e estando concretizada a audição do (s) responsável (veis) subsidiário (s), prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra P......, contribuinte n.° 16……, (...), na qualidade de Responsável Subsidiário, pela dívida abaixo discriminada. (...) FUNDAMENTOS DA REVERSÃO

Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período do exercício do cargo [art. 24°/n°1/b) LGT].

1) Insuficiência de bens da devedora originária (artigos 23°/1 a 3 e 7 da LGT e 153.°/1/2/b do CPPT), decorrente de situação liquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária na +ultima declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) e/ou em face de insolvência declarada pelo Tribunal. (...)

TOTAL DA QUANTIA EXEQUENDA: 18.979,51 EUR" - cf. despacho a fls. 29 da cópia do PEF apensa aos autos;

G) Em 06/10/2014 foi dirigida citação ao Oponente, no âmbito do PEF n.°

3301….. e apensos n.° 3301….. e n.° 3301….., pelo Serviço de Finanças de Lisboa-4, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e na qual pode ler-se: "Pelo presente fica citado (a) de que é EXECUTADO (A) POR REVERSÃO nos termos do Art.° 160 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), na qualidade de Responsável Subsidiário para, no prazo de 30 (trinta) dias a contar desta citação, PAGAR a quantia exequenda de 18.979,51 EUR de que era devedor (a) o (a) executado (a) infra indicado (a), ficando ciente de que nos termos do n.° 5 do artigo 23.° da Lei Geral Tributária (LGT), se o pagamento se verificar no prazo acima referido, não lhe serão exigidos juros de mora nem custas." - cf. citação a fls. 30 da cópia do PEF apensa aos autos;

H) A citação referida na alínea anterior foi enviada ao Oponente através dos CTT, por correio registado (registo n.° RD475193929PT), com aviso de receção, o qual foi assinado por P......, em 21/10/2014 - cf. registo e aviso de receção a fls. 49 da cópia do PEF apensa aos autos;

I) Em 31/10/2014, foi enviado ofício pelo Serviço de Finanças de Lisboa- 4 ao Oponente cujo teor se dá por integralmente reproduzido e no qual pode ler-se: "Nos termos do disposto no artigo 233.° do Código de Processo Civil, fica V. Ex.a notificado de que se considera citado como executado por reversão nos termos do artigo 160.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) na pessoa de P......, que recebeu a citação e duplicados legais e na data da assinatura do Aviso de Recepção (21/10/2014) de que se junta cópia." - cf. Ofício a fls. 48 da cópia do PEF apensa aos autos;

J) Em 07/11/2014, foi proferido despacho pela Chefe do Serviço do Serviço de Finanças de Lisboa-4, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e no qual pode ler-se: "Cumprindo o disposto no n.° 7 do artigo 23.° da Lei Geral Tributária, nos termos do n.° 1 do artigo 180.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) sustem-se os presentes Autos por declaração de insolvência. Nos termos do n.° 2 do artigo 180 do CPPT, proceda-se à avocação dos presentes Autos ao processo 968/14.0TYLSB, que corre termos no 3.° Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa." - cf. Despacho a fls. 49 da cópia do PEF apensa aos autos;

K) Em 11/07/2016, foi elaborada informação pelo Serviço de Finanças de Lisboa-4, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e na qual pode ler-se:

"De acordo com a certidão permanente da sociedade M...... S.A, o responsável subsidiário, foi nomeado administrador em 2009-06-21 e renunciou ao cargo em 2015-05-08.

No despacho de reversão, a Exma. Sra. Chefe de Finanças procedeu ao enquadramento da reversão no âmbito da al. b) do n.° 1 do art. ° 24 da LGT.

Assim, o oponente é subsidiariamente responsável pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não prove que não lhe foi imputável a falta de pagamento, no caso, a falta de entrega de IVA referente aos meses de Agosto e Setembro do ano de 2013 e IRC referente ao ano de 2009. (...)

Refere ainda o oponente que o devedor principal - M...... S.A. - explora uma loja de artigos de luxo nas Galerias Saldanha Residence e que detém património suficiente para garantir a dívida.

No entanto, em 07-07-2014 a sociedade foi declarada insolvente (Processo 968/14.OTYLSB, do 3.° Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa), ficando todos os bens propriedade da mesma afectos à massa insolvente e assim indisponíveis." - cf. informação a fls. 21-27 do SITAF.»


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MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA:

Não se vislumbram outros factos alegados cuja não prova seja relevante para a decisão da causa.


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MOTIVAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO:

A convicção do Tribunal fundou-se no que ora se segue:

«A decisão da matéria de facto provada nas alíneas A) a K) (…) supra, efetuou-se com base no exame dos documentos constantes dos autos e da cópia do PEF n.º 3301…… e apensos, apensa aos autos, não impugnados, referidos a propósito de cada alínea do probatório.»


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2. ADITAMENTO OFICIOSO À MATÉRIA DE FACTO

Por ser relevante para a decisão da causa, ao abrigo do disposto no n.º 1, do artigo 662.º do Código de Processo Civil (CPC), importa aditar ao probatório a seguinte matéria que igualmente se encontra provada nos autos:

L) No ofício referido na alínea B) supra, que remeteu cópia da sentença que declarou a insolvência da sociedade executado, comunicou-se ainda que foram avocados todos os processos de execução fiscal pendentes (cfr. fls. 6 do processo apenso – cópia do PEF);

M) O despacho a que se referem as alíneas C) e D) tem o seguinte teor:

Face às diligências de fls. 6 e seguintes, determino a preparação do processo para efeitos de reversão da(s) execução (ões) contra P......, contribuinte n.° 1…., (...), na qualidade de Responsável Subsidiário, pela dívida abaixo discriminada.

Face ao disposto nos normativos do n.º 4 do Art.º 23º e do Art.º 60.º da Lei Geral Tributária, proceda-se à notificação do(s) interessados, para efeitos de audição prévia, fixando-se o prazo de 15dias a contar da notificação, podendo aquela ser exercida por escrito.» (cfr. fls. 25 do processo apenso – cópia do PEF, que aqui se dá por integralmente reproduzido);

N) Em Setembro de 2014, através de oficio datado de 04/08/2014, com a referência 03986, o Oponente foi notificado pelo Serviço de Finanças de Lisboa-4 para exercício do direito de audição prévia (cfr. fls. 27 do processo apenso – cópia do PEF, que aqui se dá pro integralmente reproduzido);

O) A sentença que declarou a insolvência da devedora originária, referida na alínea B), foi proferia em 07/07/2014, e na mesma foi fixada residência aos administradores da insolvente, Paulo Jorge Nascimento dos Santos e Maria Luísa Seixeira do Nascimento Preguiça (cfr. fls. 10 do processo apenso – cópia do PEF).


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3. DE DIREITO

3.1. Está em causa no presente recurso a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a oposição à execução fiscal supra identificada, com o fundamento de que no despacho que determinou a reversão não constam quaisquer factos relativos à responsabilidade subsidiária que o órgão de execução fiscal imputou ao Oponente, nenhuma diligência foi promovida tendente a apurar a administração de facto por parte do oponente, designadamente, «celebração de contratos, elaboração de orçamentos, apresentação de declarações fiscais, emissão de cheques ou quaisquer outros documentos dos quais resultasse a intervenção do Oponente em representação da executada, e por conseguinte, a administração de facto, impõe-se concluir pela ilegitimidade do Oponente para a execução fiscal.»

A Recorrente arguiu a nulidade da sentença, como se colhe das conclusões I) a IV) supra transcritas, por excesso de pronúncia, por ter entendido que a Administração Tributária deveria ter “apurado e demonstrado a administração de facto do Oponente”, por a gerência/administração de facto não ter sido negada pelo Oponente, que apenas invocou a falta de fundamentação formal do despacho de reversão, pelo que não podia o Tribunal a quo exigir o apuramento e a demonstração daquela por parte da administração fiscal.

Vejamos.

De acordo com o preceituado no n.º 1, do artigo 125º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) constituem causas de nulidade da sentença (…) a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.

Por sua vez, o artigo 615.º, n.º 1, alínea d), in fine, do CPC, aplicável ex vi artigo 2º, alínea e) do CPPT estabelece que é nula a sentença quando o juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.

Esta nulidade está directamente relacionada com o dever que é imposto ao juiz pela segunda parte do n.º 2 do artigo 608.º do Código de Processo Civil (CPC), de que não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

O excesso de pronúncia verifica-se quando o tribunal decide para além do que é pedido e exposto pelas partes.

A sentença recorrida para julgar procedente a oposição expendeu a seguinte:

(..) face ao disposto no artigo 24.°, n.° 1, alínea b), da LGT, os administradores, diretores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.

A expressão contida no artigo 24.°, n.° 1, da LGT, "ainda que somente de facto", pressupõe que, para haver responsabilidade subsidiária, podem coexistir a gerência/administração de facto e de direito ou verificar-se apenas a gerência/administração de facto, mas para que possa operar a responsabilidade subsidiária é crucial que se demonstre a gerência/administração de facto.

Das normas citadas não decorre assim qualquer presunção legal que imponha que, provada a gerência/administração de direito, se dê por provado o efetivo exercício dessa função de gerência/administração.

Assim, se a Fazenda Pública pretender responsabilizar subsidiariamente um gerente/administrador, exigindo-lhe o cumprimento coercivo da obrigação na execução fiscal inicialmente instaurada contra a originária devedora, tem de demonstrar os factos que legitimam tal atuação, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova previstas no artigo 74.°, n.° 1, da LGT e 342.°, n.° 1, do Código Civil.

Efetivamente, tal como se expendeu na fundamentação de direito do acórdão do tribunal Central Administrativo do Norte, de 27/03/2014, proc. n.° 00808/11, disponível em www.dgsi.pt, à qual se adere: "Neste normativo está, assim, prevista a responsabilidade subsidiária dos administradores ou gerentes relativamente a dívidas cujo facto constitutivo tenha ocorrido no período do exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento tenha terminado depois deste exercício [alínea a)] ou vencidas no período do seu mandato [alínea b)]. Resulta deste normativo que a responsabilidade subsidiária é atribuída em função do exercício do cargo de gerente e reportada ao período do respectivo exercício. Ou seja, a gerência de facto constitui requisito da responsabilidade subsidiária dos gerentes, não bastando, portanto, a mera titularidade do cargo, a gerência nominal ou de direito. Ora, é sobre a administração tributária, enquanto exequente e como titular do direito de reversão, que recai o ónus de alegar e provar os pressupostos que lhe permitem reverter a execução fiscal contra o gerente da devedora originária, designadamente os factos integradores do efectivo exercício da gerência de facto [de acordo com a regra geral de quem invoca um direito tem que provar os respectivos factos constitutivos - artigo 342°, n° 1, do CC e artigo 74°, n° 1, da LGT].''

Em sentido similar veja-se ainda o acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 09/11/2017, proc. n.° 00479/14, disponível em www.dgsi.pt, em cujo sumário pode ler-se: "A prova de que o revertido exerceu a gerência de facto recai sobre a AT, como resulta do disposto no art. 74°/1 LGT e 342°/1 do Código Civil. 2. A AT não pode limitar-se a extrair da gerência de direito qualquer presunção de gerência efectiva, pelo menos depois do acórdão do Pleno da Secção do CT do STA n.° 01132/06 de 28-02-2007".

Em suma, e considerando a matéria de facto provada na alínea K) do probatório, o facto de o Oponente constar da certidão permanente emitida pela Conservatória do Registo Comercial como gerente de direito da sociedade originária, desde 21 de junho de 2009 até à data em que se operou a renúncia do cargo, em 8 de maio de 2015, por si só, nada permite concluir quanto à prática efetiva de qualquer ato em representação da sociedade.

E foi apenas com base na certidão permanente emitida pela Conservatória do Registo Comercial, que o órgão de execução fiscal sustentou a gerência de facto do Oponente, sendo elucidativa a informação elaborada pelo Serviço de Finanças de Lisboa-4, elaborada em 11/07/2016, na qual pode ler-se "De acordo com a certidão permanente da sociedade M...... S.A., o responsável subsidiário, foi nomeado administrador em 2009-06-21 e renunciou ao cargo em 2015-05-08. No despacho de reversão, a Exma. Sra. Chefe de Finanças procedeu ao enquadramento da reversão no âmbito da al. b) do n.° 1 do art.° 24 da LGT. Assim, o oponente é subsidiariamente responsável pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo (...)" - cf. facto provado na alínea K) do probatório.

Ora, cingindo-se as diligências promovidas pelo órgão de execução fiscal para apurar a administração do executado, por reversão, no aludido processo de execução fiscal e apensos, a aferir quem figurava à data dos factos constitutivos das dívidas tributárias, como administrador da devedora originária resulta com evidência que apenas se apurou a administração de direito.

Da matéria de facto provada não é possível concluir que o Oponente exerceu, de facto, a administração da sociedade, sendo certo que no despacho que ordenou a reversão contra o Oponente não constam quaisquer factos relativos à responsabilidade subsidiária que o órgão de execução fiscal lhe imputou, cf. facto provado na alínea F), do probatório.

Nenhuma diligência foi promovida pelo órgão de execução fiscal tendente a apurar a administração de facto por parte do Oponente, a qual constitui requisito da responsabilidade subsidiária dos gerentes e administradores, não podendo presumir-se que a mera titularidade do cargo, no caso, a administração nominal ou de direito constitui administração de facto.

Assim, afigura-se irrelevante que o Oponente demonstre ou não a falta de exercício da administração de facto, posto que não recaía sobre ele qualquer ónus nesse sentido.

Deste modo e como é sabido, era à Administração Tributária que invocou, na qualidade de exequente, a responsabilidade subsidiária do Oponente, que cabia o ónus de comprovar que o mesmo exerceu a administração de facto, no período em que se constituíram as dívidas tributárias, na devedora originária M......, S.A., cf. artigos 74.°, n.° 1, da LGT e 342.°, n.° 1, do Código Civil.

E, só mostrando-se cumprido este ónus por parte da Administração Tributária é que poderia então sustentar, à luz do disposto no artigo 24.°, n.° 1, alínea b), da LGT, que era sobre o Oponente que recaía o ónus de demonstrar que não lhe era imputável a falta de pagamento das dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo.

Por conseguinte, não tendo a Administração Tributária apurado e demonstrado a administração de facto do Oponente, pois não apresentou qualquer prova para esse efeito, designadamente, celebração de contratos, elaboração de orçamentos, apresentação de declarações fiscais, emissão de cheques ou quaisquer outros documentos dos quais resultasse a intervenção do Oponente em representação da executada, e por conseguinte, a administração de facto, impõe-se concluir pela ilegitimidade do Oponente para a execução fiscal.

Daqui decorre que a Mma. Juíza a quo julgou a oposição procedente com base na falta de demonstração pela Administração Tributária da gerência de facto da devedora originária por parte do Oponente.

Da leitura da petição inicial da oposição à execução fiscal resulta que o Oponente, aqui Recorrido não alegou quaisquer factos atinentes ao não exercício da gerência efectiva da devedora originária.

Com efeito, não alegou (nem provou) que não praticou actos de gerência ou que não obstante a pratica de tais actos não teve culpa na insuficiência do património da devedora originária, pelo que não lhe é imputável a falta de pagamento da dívida tributária.

Efectivamente, o Oponente invoca que a citação é omissa quanto aos factos que originaram a qualificação do Oponente como devedor subsidiário e para sustentar a insuficiência do património do devedor principal (pontos 1 a 30 da p.i.). Mais invoca que não se mostra provada a fundada insuficiência de bens do devedor principal, por a notificação ser omissa quanto a quaisquer factos relativos a este requisito e por o devedor principal deter património identificado no âmbito do processo de insolvência, que corre termos no Tribunal do Comércio (pontos 31 a 39 da p.i.). Por último alega que, o Serviço de Finanças de Lisboa-4 para aferir a continuidade da reversão proposta deve aguardar pelo desfecho do processo de insolvência, beneficiando da excussão prévia (pontos 40 a 43 da p.i.).

Conclui o Oponente, no ponto 48 da p.i., que a questão da insuficiência de bens se enquadra na alínea i) e, igualmente, na alínea b) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.

Termina pedindo que seja considerada nula a citação e, caso assim não se entenda, deve a oposição à execução ser julgada procede e revogada a reversão em apreço.

O Oponente apresenta como fundamentos na sua oposição a nulidade da citação e a falta de fundamentação (formal) do despacho de reversão no que respeita aos pressupostos da responsabilidade subsidiária.

Portanto, importava conhecer no que respeita à reversão se o despacho que a determinou apresenta fundamentação bastante do ponto de vista formal, de acordo com o disposto nos preceitos legais aplicáveis.

Ora, apesar de o Oponente não ter invocado na petição inicial o não exercício da gerência de facto da devedora originária, o tribunal a quo conheceu esse fundamento e, com base nele, julgou procedente a oposição.

Ao conhecer esse fundamento, a sentença recorrida incorreu em excesso de pronúncia, uma vez que tal fundamento não foi invocado pelo Oponente e não é do conhecimento oficioso por parte do tribunal, pelo que se verifica a invocada nulidade da sentença recorrida.

De referir, por último, que caso o despacho de reversão incorre-se em insuficiência de fundamentação, o mesmo era de anular, não determinando, como decidiu a sentença, a extinção do processo de execução fiscal.

Assim, a sentença incorreu em excesso de pronúncia e, consequentemente, na nulidade a que se reportam os artigos 125.º, n.º 1, in fine do CPPT e 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC.

Pelo exposto, procede o presente fundamento do recurso, e, consequentemente, declarar a nulidade da sentença.


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3.2. Declarada a nulidade da sentença recorrida, há que indagar, sobre a aplicação do disposto no artigo 665.º, n.º 1 do CPC, o qual consagra a regra de substituição do Tribunal ad quem ao tribunal recorrido, uma vez que a anulação da decisão não tem como efeito incontornável a remessa imediata do processo para o Tribunal a quo, devendo o TCA proceder à apreciação do objecto do recurso se dispuser dos elementos necessários para tal, ao abrigo do princípio da economia processual.

Somos do entendimento que, no caso concreto, nada obsta ao conhecimento das questões suscitadas na petição inicial, dispondo os autos dos elementos necessários a tal conhecimento.

Dispensamos ouvir de novo as partes, por constituir a prática de um acto inútil, uma vez que tiveram oportunidade de se pronunciarem ao longo do processo sobre as questões suscitadas.

Desta forma, avançamos para o conhecimento das questões não apreciadas pela primeira instância, relativas à nulidade da citação e à falta de fundamentação do despacho de reversão.


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3.2.1. O Oponente alega a falta de fundamentação e preterição de formalidades legais da citação, pedindo a final que a citação seja considerada nula (pontos 9 a 30 da p.i.).

No caso em apreço, constitui matéria assente que o Oponente foi citado no processo de execução fiscal (cfr. pontos G), H) e I) do probatório).

Ora, a oposição à execução fiscal trata-se de uma forma processual configurada e destinada à apreciação de vícios do processo de execução fiscal que determinem a extinção do processo de execução fiscal.

A jurisprudência uniforme e reiterada do STA vai no sentido que a nulidade/ilegalidade da citação, pela circunstância de a sua procedência não determinar a extinção do processo de execução fiscal, é uma irregularidade processual que deve ser arguida junto do órgão da execução fiscal, cabendo da decisão proferida pelo órgão da execução fiscal, reclamação para o Tribunal nos termos do artigo 276º do CPPT.

Pelo que a arguição da nulidade da citação em sede de oposição à execução fiscal configura uma situação de erro na forma do processo.

Como se deixou expresso no acórdão do STA de 07/05/2014, proferido no processo n.º 0283/14, cujo discurso fundamentador aderimos:

«A oposição, que tem a natureza de uma contestação, visa, em regra, a extinção da execução fiscal, enquanto a nulidade da citação apenas pode determinar a repetição do acto com suprimento das irregularidades que determinaram a anulação e a repetição dos actos subsequentes que, porque dependentes da citação anulada, tenham sido também anulados. Assim, porque a nulidade da citação não tem como efeito a extinção da execução fiscal não pode ser erigida, em circunstância alguma, em fundamento de oposição à execução fiscal.» (vide ainda, entre outros, ac. do STA de 07/05/2014, processo 0198/14, disponíveis em www.dgsi.pt/).

A nulidade da citação, porque não determina a extinção da execução fiscal, mas apenas a repetição do acto com cumprimento das formalidades omitidas, não constitui fundamento de oposição, antes deve ser conhecida, em primeira linha, mediante arguição pelos interessados dentro do prazo da oposição, na execução fiscal (com eventual reclamação da decisão para o tribunal, nos termos do artigo 276.º do CPPT), se puder prejudicar a defesa do citado (cfr. artigos 191.º, n.º 4 do CPC e 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT).

Consideração que o Opoente formula também um pedido (e apresenta causa de pedir) compatível com a oposição à execução fiscal, há erro na forma do processo relativamente ao pedido de declaração de nulidade da citação, que nessa decorrência não será de conhecer nos presentes autos.

Dito por outras palavras, a convolação da oposição em outra forma processual é inviável, uma vez que a petição inicial comporta um pedido compatível com a forma de processo utilizada.

Como refere Jorge Lopes de Sousa:

Em situações deste tipo, havendo cumulação de pedidos e ocorrendo erro na forma do processo quanto a um deles, a solução é considerar sem efeito o pedido para o qual o processo não é adequado, como se infere da solução dada a uma questão paralela no nº 4 do art. 193º do CPC. (…)

No entanto, nesta norma pressupõe-se que a solução legal para a apresentação de um pedido para o qual o processo é inadequado é a de que ele «fique sem efeito», prosseguindo o processo para apreciação do pedido para o qual o processo é adequado.

Por isso, nestes casos, não haverá possibilidade de convolação, por esta pressupor que todo o processo passasse a seguir a tramitação adequada e, nestas situações, tal não poder determinar-se, por o processo de oposição ser o próprio para a apreciação dos fundamentos invocados que devam ser apreciados em processo de oposição.» (in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 2007, Áreas Editora, pág. 116).

Nesta conformidade, não se procede à convolação para a forma de processo adequada ao conhecimento da nulidade de citação, porque há pedido para o qual a presente oposição é a forma processual adequada, pelo que se impõe conhecê-lo.

Termos em que se decide não conhecer da arguida nulidade de citação do Oponente para a execução fiscal.


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3.2.2. O Oponente alega a falta e insuficiente fundamentação da reversão no que se refere à fundada insuficiência de bens do devedor originário e à justificação/qualificação do Oponente como responsável subsidiário.

A Fazenda Pública sustenta, que o Oponente não invoca em qualquer momento na sua petição inicial o não exercício da administração e socorre-se do acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, de 16/10/2013, para defender a sua posição de que a reversão se encontra devidamente fundamentada e quanto ao requisito da inexistência ou fundada insuficiência de bens, o órgão de execução fiscal deu cumprimentos ao disposto no n.º 7, do artigo 23.º da Lei Geral Tributária, que determina a obrigatoriedade de desencadear os procedimentos necessários à verificação ou não dos pressupostos legais de que depende a reversão e, efectivada esta, o processo executivo é sustado, ficando a aguardar o desfecho dos autos de insolvência.

Vejamos.

A exigência da fundamentação dos actos tributários constitui uma garantia constitucional dos administrados e destina-se a dar a conhecer aos interessados as razões determinantes da decisão proferida, em termos de poderem tomar uma posição esclarecida de conformação, ou reacção através dos meios impugnatórios facultados pela lei (cfr. artigos 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa).

Tal princípio constitucional é concretizado no artigo 77.º da LGT que preceitua: A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera concordância com os fundamentos de anteriores pareceres ou propostas, incluindo (…). (cfr. artigos 124.º e 125.º do CPA, na redacção aplicável.).

No que respeita ao acto de reversão da execução fiscal, a lei é expressa a determinar, no n.º 4 do art.º 23. ° da LGT, que: A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação.

Sobre a questão da fundamentação do despacho de reversão, a jurisprudência do STA é pacífica, sendo dela revelador o acórdão de 29/10/2014, proferido no processo n.º 0925/13, citado pela Fazenda Pública, com o qual concordamos e cuja aplicação aqui se justifica inteiramente, e que parcialmente se transcreve:

«(…) não sofre dúvida que a responsabilidade subsidiária se efectiva por reversão do processo de execução fiscal (n.º 1 do art. 23.º da LGT) e que este despacho de reversão, sendo um acto administrativo tributário, está sujeito a fundamentação (art. 268.º n.º 3 da CRP; arts. 23.º n.º 4 e 77.º nº 1, da LGT).

E sendo pressupostos da responsabilidade subsidiária (arts. 23.º n.º 4 e 24.º n.º 1, da LGT) a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (art. 23.º n.º 2 da LGT; art. 153.º n.º 2 do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou da respectiva entrega (art. 24.º n.º 1 da LGT), então o despacho de reversão, enquanto acto administrativo tributário, deve, em termos de fundamentação formal, incluir a indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (nº 1 do art. 77.º da LGT), e deve incluir, igualmente, a declaração daqueles pressupostos e referir a extensão temporal da responsabilidade subsidiária (art. 23º nº 4 LGT). Daí que, em consonância com este normativo, se tenha afirmado, no acórdão do Pleno desta Secção do STA, proferido em 16/10/13, 0458/13, que a fundamentação formal do despacho de reversão se basta com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada, «não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.» (cfr., igualmente, os acórdãos desta Secção do STA, de 31/10/2012, proc. nº 580/12 e de 23/1/2013, proc. nº 953/12).» (disponível em www.dgsi.pt/).

No caso dos autos, tendo presente a doutrina acolhida pela jurisprudência citada, o despacho de reversão tem por pressuposto a comunicação da sentença que declarou a insolvência da devedora originária dada por oficio de 09/07/2014 (alínea B) do probatório), o despacho proferido, pelo Chefe de Finanças de 04/08/2014 (alínea C) , D) e M) do probatório), o ofício para notificação do Recorrente para audição (alínea N) do probatório) e o despacho de reversão proferido pelo Chefe de Finanças de 06/10/2014 (alínea F) do probatório) no qual refere que:

«Face às diligências de fls. 6 e seguintes e estando concretizada a audição do (s) responsável (veis) subsidiário (s), prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra P......, contribuinte n.° 16……, (...), na qualidade de Responsável Subsidiário, pela dívida abaixo discriminada. (...) FUNDAMENTOS DA REVERSÃO

Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período do exercício do cargo [art. 24°/n°1/b) LGT].

1) Insuficiência de bens da devedora originária (artigos 23°/1 a 3 e 7 da LGT e 153.°/1/2/b do CPPT), decorrente de situação liquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) e/ou em face de insolvência declarada pelo Tribunal. (...)

TOTAL DA QUANTIA EXEQUENDA: 18.979,51 EUR" - cf. despacho a fls. 29 da cópia do PEF apensa aos autos;»

Resulta assim, que o despacho de reversão encontra-se minimamente fundamentado, pois, identifica a divida em cobrança coerciva, refere os motivos da insuficiência de bens da devedora originária (decorrentes de situação liquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária e da declaração de insolvência), indicando documentos diversos constantes do processo executivo, e indica as normas legais ao abrigo das quais dos quais fica patente o exercício das funções de gerente/administrador no termo do prazo legal de pagamento da dívida tributária e que determinaram a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido.

Como se escreveu no acórdão do STA de 14/02/2013, proferido no processo n.º 0624/12 «É, porém, também incontroverso que as exigências de fundamentação não são rígidas, variando de acordo com o tipo de acto e as circunstâncias concretas em que este foi proferido. A determinação do âmbito da declaração fundamentadora pressupõe, portanto, a busca de um conteúdo adequado, que há-de ser, num sentido amplo, o suficiente para suportar formalmente a decisão administrativa.» (disponível em www.dgsi.pt/).

Assim, a fundamentação formal do despacho de reversão basta-se com a mera alegação dos pressupostos e extensão temporal da responsabilidade subsidiária, como se concluiu no citado acórdão do STA de 29/10/2014, processo n.º 0925/13.

O despacho de reversão observa as exigências de fundamentação (formal), que não são rígidas, no quadro previsto nos artigos 23.º, n.º 4 e 77.º da LGT, quando dá a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua origem, de modo a permitir ao interessado aceitar o acto ou reagir através dos meios legais ao seu dispor, sem, contudo, impor que do mesmo constem os factos concretos nos quais a Administração Tributária fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido e aos demais pressupostos.

Na situação dos autos, como se viu, do despacho de reversão consta como fundamento de facto do revertido ter exercido a gerência no período a que respeitam as dívidas tributárias identificadas, fazendo-se expressa referência ao artigo 24.º, n.º 1, alínea b) da LGT e à situação liquida negativa e à declaração de insolvência da devedora originária (artigos 23.º, n.º 1 a 3 e 7 da LGT e 153.º, n.ºs 1 e 2, alínea b) do CPPT).

A Jurisprudência dos Tribunais Superiores tem vindo a considerar que a referência à declaração de insolvência em despacho de reversão basta para que a execução fiscal possa ser revertida contra o responsável subsidiário.

Como resulta do probatório, o despacho de reversão foi proferido em 06/10/2014, em processo de execução fiscal instaurado em data anterior à declaração de insolvência.

Mais resulta provado que por despacho de 07/11/2014, o Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa-4 foi determinado a sustação da execução fiscal, subjacente aos presentes autos de oposição, e o seu envio ao processo de insolvência da devedora originária.

Sobre esta matéria, num caso em que o circunstancialismo fáctico é em tudo idêntico ao presente, o STA em acórdão de 20/04/2020, proferido no processo n.º 0362/14.2BEVIS, exarou o seguinte discurso fundamentador:

«O S.T.A. tem também considerado, em circunstâncias semelhantes, que a referência à declaração de insolvência em despacho de reversão basta para que a execução fiscal possa ser revertida contra responsável subsidiário – assim, e para além dos acórdãos citados pelo Exm.º PGA, o decidido recentemente no acórdão proferido a 12-2-2020, no proc. 0105/15.3BESNT, acessível em www.dgsi.pt (que o ora relator subscreveu como adjunto), e de que se transcreve o seguinte passo por elucidativo do demais regime aplicável:

“Quanto à possibilidade de ser praticado o acto de reversão do processo de execução fiscal sobre o revertido em processo de execução fiscal iniciado antes de uma declaração de insolvência do devedor originário, mas sendo este acto praticado após a mesma, rege actualmente (desde a entrada em vigor da alteração introduzida pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro) o disposto o n.º 7 do artigo 23.º da Lei Geral Tributária, onde se afirma expressamente que: “[O] dever de reversão previsto no n.º 3 deste artigo é extensível às situações em que seja solicitada a avocação de processos referida no n.º 2 do artigo 181.º do CPPT, só se procedendo ao envio dos mesmos a tribunal após despacho do órgão da execução fiscal, sem prejuízo da adopção das medidas cautelares aplicáveis”. Segundo esta norma, quando existe uma declaração de insolvência do devedor originário, os processos de execução fiscal pendentes são sustados e avocados pelo Tribunal judicial, para que os créditos tributários possam ser reclamados na insolvência pelo Ministério Público e aí satisfeitos (artigo 180.º, n.ºs 1 e 2 do CPPT), porém, em termos tributários, aquela declaração é também um fundamento válido para que opere a reversão da execução fiscal sobre o responsável subsidiário (artigo 23.º, n.º 7 da LGT)”.

Desta norma resulta, pois, a interpretação de que, pese embora a reversão deva ter lugar com fundamento em declaração de insolvência, a execução tem de ficar sustada após o termo do prazo de oposição, até à completa excussão do património da executada, só podendo prosseguir posteriormente.» (veja-se no mesmo sentido acórdão deste TCAS de 25/02/2021, porc. n.º 848/13.6BELRS, em que a presente relatora teve intervenção como 1.ª Adjunta; disponíveis em www.dgsi.pt/).

Nesta conformidade, o despacho que determinou a reversão da execução fiscal contra o Oponente satisfaz as exigências legais e jurisprudenciais de fundamentação formal, por no mesmo terem sido declarados os pressupostos da responsabilidade subsidiária.

Pelo exposto, concluiu-se que o despacho de reversão dos autos deve ter-se como fundamentado (fundamentação formal).


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Conclusões/Sumário:

1. A nulidade da citação, porque não determina a extinção da execução fiscal, mas apenas a repetição do acto com cumprimento das formalidades omitidas, não constitui fundamento de oposição, antes deve ser conhecida, em primeira linha, mediante arguição pelos interessados dentro do prazo da oposição, na execução fiscal (com eventual reclamação da decisão para o tribunal, nos termos do artigo 276.º do CPPT), se puder prejudicar a defesa do citado (cfr. artigos 191.º, n.º 4 do CPC e 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT).

2. A exigência da fundamentação dos actos tributários constitui uma garantia constitucional dos administrados e destina-se a dar a conhecer aos interessados as razões determinantes da decisão proferida, em termos de poderem tomar uma posição esclarecida de conformação, ou reacção através dos meios impugnatórios facultados pela lei (cfr. artigos 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa).

3. O despacho de reversão observa as exigências de fundamentação (formal), que não são rígidas, no quadro previsto nos artigos 23.º, n.º 4 e 77.º da LGT, quando dá a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua origem, de modo a permitir ao interessado aceitar o acto ou reagir através dos meios legais ao seu dispor, sem, contudo, impor que do mesmo constem os factos concretos nos quais a Administração Tributária fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido e aos demais pressupostos.


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IV – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, declarar nula a sentença por excesso de pronuncia e, em substituição, julgar a oposição improcedente.

Custas pelo Recorrido em ambas as instâncias, não incluindo, nesta instancia, a taxa de justiça, uma vez que não contra-alegou.

Notifique.

Lisboa, 24 de Fevereiro de 2022.



Maria Cardoso - Relatora
Catarina Almeida e Sousa – 1.ª Adjunta
Isabel Fernandes – 2.ª Adjunta

(assinaturas digitais)