Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03026/09
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:05/19/2009
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:IVA.- DIREITO À DEDUÇÃO DO IVA. -OPERAÇÕES SIMULADAS.
REQUISITOS DA EMISSÃO DE FACTURAS ESTABELECIDOS NO ARTº 35º DO CIVA
Sumário:I) -Nos casos em que esteja em causa a desconsideração do direito à dedução do IVA, no pressuposto de que as operações tituladas pelas facturas não têm aderência á realidade, não é a AT que tem de demonstrar a inexistência das operações tituladas pelas facturas, antes e ao invés, é o contribuinte, que pretende fazer valer esse invocado direito á dedução, que se impõe provar a aderência á realidade de tais operações.
II) -A lei estabeleceu, determinadas exigências relativas à emissão de facturas com o objectivo claro de evitar a fuga e evasão fiscais e daí ter estabelecido requisitos vários e pormenorizados quanto ao preenchimento das facturas que devem ser cumpridos pelos operadores económicos sob pena de não ser possível a dedução do IVA liquidado em tais documentos. Desta forma se acautela o interesse da Fazenda Pública e se previne a fraude fiscal.
III) -Nesse sentido o artigo 35º do CIVA estabelece determinados requisitos na emissão de facturas ou documentos equivalentes que são condição para a dedução do imposto por parte do sujeito passivo adquirente nos termos do artº 19º nº 2 do mesmo Código.
IV) -Não tem direito à dedução do IVA no caso das facturas supra referidas em virtude de nos ditos documentos, que a Administração Fiscal não considerou para efeitos de dedução do imposto, apenas é referido "prestação de Serviços".
V) -Cabendo à administração fiscal demonstrar a existência da declaração formal fundamentadora do seu juízo subjectivo quanto à existência de operações e provar a pertinência desse juízo, pela enunciação de elementos fáctico - jurídicos convincentes da adequação e correcção desse juízo, o que se alcança através da enunciação de indícios sérios (que traduzam uma probabilidade elevada) de que as operações referidas nas facturas são simuladas e logrando a AT fazer a prova do bem fundado da formação do seu juízo, isso tem de ser valorado contra a recorrente que, tratando-se de dedução do IVA, teria de provar, em tribunal, a existência dos factos tributários que subjazem à dedução de imposto que efectuou.
Aditamento:
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Decisão Texto Integral:ACORDA-SE, EM CONFERÊNCIA, NA 2ª SECÇÃO DESTE TRIBUNAL:

1. -Inconformada com a sentença proferida pela Srª. Juíza do TAF de Lisboa que julgou improcedente a presente impugnação deduzida por E......- C..................., Ldª., contra a liquidação de IVA referente ao ano de 1997, veio aquela recorrer concluindo as suas alegações como segue:
A). As facturas contêm todos os elementos exigidos pelo art. 35 n° 5 do CIVA.
B). As facturas foram impressas por tipografia devidamente identificada e autorizada pelo Ministério das Finanças.
C). A rasura constante da factura n° 244 de J................, não afecta a sua credibilidade, nem impede uma leitura e compreensão clara da mesma.
D). Os elementos de identificação, eventualmente falsos, constantes das facturas não afectam a sua credibilidade formal nem podem ser imputadas à Impugnante, muito menos penalizá-la.
E). A descrição dos serviços está correctamente efectuada atentas as especificidades da empreitada, em que não são debitadas consumíveis (pregos e madeiras).
F). A mera apreciação crítica das facturas, enquanto documentos formais, impõem uma resposta diversa os pontos da matéria de facto sob os n° 5, 6, 8, 10, 19, 20, 23 a 25.
G). Não resulta dos autos quaisquer indícios que as operações económicas reproduzidas nas facturas sejam simuladas.
H). A douta sentença, ao não aceitar a dedução do IVA titulado nas facturas, violou o disposto nos art. 19, nº 1 e art. 35 n° 5 do CIVA
Pelo que, Venerados Juízes Desembargadores, alterando -se a decisão quanto à matéria de facto, nos termos supra identificados, e considerando-se procedente a impugnação, ou em alternativa, se considere deficiente a decisão sobre a matéria de facto e se ordene a competente produção de prova, se fará Habitual Justiça.
Não houve contra-alegações.
A EPGA emitiu a fls. 112 o seguinte douto parecer:
“I - "E...... – C..................., Lda." vem interpor recurso da sentença do Mmo Juiz do TT de Lisboa que julgou improcedente a impugnação deduzida contra a liquidação de IVA de 1996 e respectivos juros compensatórios, invocando nas conclusões de recurso a violação dos art. 19° n° 1 e 35° n° 5 do CIVA.
A sentença recorrida fixou a fls. 54/58 dos autos, os factos que dá como provados.
II - Dos documentos juntos aos autos, nomeadamente do relatório da inspecção tributária (PAT em apenso),resulta que a impugnante apresentou quantias tituladas por facturas que não mereceram credibilidade à inspecção tributária, pelas razões que vêm apontadas no respectivo relatório e que se dão por reproduzidas.
Deve ser realçado que a impugnante não fez chegar aos autos quaisquer provas que abalassem a convicção de se estar perante fortes indícios de ilegalidade e simulação na apresentação das facturas que titulam tais despesas. Cabe à AF, fazendo cumprir a lei, solicitar a confirmação da veracidade dos elementos contidos nas facturas ou outros elementos da contabilidade do sujeito passivo, e cabe a este, fazer a prova de que os documentos que estão na sua contabilidade e sobre os quais recai a responsabilidade de justificar proveitos ou custos, são verídicos apresentando toda a documentação e prova suficiente para tal prova.
A recorrente não fez qualquer prova nos autos, através de documentação credível e justificativa dos movimentos contabilísticos que suportaram as deduções de IVA, sendo certo que a AT apresentou justificação bem fundamentada nos documentos juntos, para a liquidação adicional efectuada.
III - O art. 35° do CIVA é um preceito legal que impõe aos contribuintes um rigor no preenchimento das facturas, com vista a evitar comportamentos que levem à evasão fiscal, sendo penalizados os que aceitem facturas onde não são descriminados os elementos referidos no n° 5, como se mostra ter sido o caso sob apreço.
Ao nível da liquidação do IVA o nosso sistema jurídico é particularmente exigente no que se refere aos elementos que devem conter as facturas para poder ser exercido o direito à dedução do IVA nelas mencionado, só se conferindo tal direito quando os documentos em causa contêm os requisitos previstos no art. 35° n° 5 do CIVA, o que não se mostra verificado nos documentos referidos nos autos.
Tal como foi decidido no douto acórdão do STA de 10.10.2007 rec. 0487/07 cujo sumário se transcreve com a devida vénia:
I -A factura ou documento equivalente passado em forma legal exigida pelo artigo 19.°, n.° 2 do CIVA para a dedução do imposto é a que respeite todas as exigências do artigo 35°, n° 5 do mesmo Código.
II -A exigência desse formalismo constitui um verdadeiro requisito substancial do direito à dedução do imposto.
Pelo exposto e porque se entende que a sentença recorrida fez uma correcta apreciação da prova existente nos autos e uma correcta integração da mesma nos preceitos legais em apreço, emite-se parecer no sentido do não provimento do recurso.”
Os autos vêm à conferência após recolha dos vistos legais.
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2. -Na sentença recorrida deram-se como provados os factos constantes do respectivo probatório e que são os relevantes para a questão a decidir, a saber:
1) Ao abrigo das ordens de serviço n° 9........ e 9........ de 15/01/02, para os exercícios de 1996 e 1997 foi efectuada uma acção inspectiva no âmbito das empresas intervenientes nos grandes projecto de investimento, dado que foram detectadas divergências no cruzamento de informação fornecida pela Impugnante com os dados disponíveis nos serviços da administração tributária e relativos aos clientes C..... – C............... Lda. NIPC ................ e M...... – M...................... S.A NIPC ..........(fl. 19 e 20 do processo administrativo).
2) A actividade exercida pela Impugnante consiste essencialmente, na realização de trabalhos de construção civil, no regime de empreitadas à "M........", nomeadamente na abertura e fechos das valas necessárias para a instalação de tubos de gás natural (fl. 21 do processo administrativo)
3) Exerce uma actividade tributável à taxa normal, liquidando o Imposto Sobre o Valor Acrescentado nas facturas a clientes e deduzindo o Imposto Sobre o Valor Acrescentado das facturas emitidas por terceiros - fornecedores e outros credores (fl. 21 do processo administrativo)
4) No 2° trimestre de 1996 o valor da base tributável de Imposto Sobre o Valor Acrescentado indicado na declaração periódica do mesmo período é inferior ao somatório dos montantes facturados aos clientes atrás indicados, existindo uma diferença de 1.483.108300, €7.397,71 (fl. 21 do processo administrativo).
5) No decurso da análise efectuada à contabilidade a administração tributária constatou a existência de facturas emitidas por fornecedores, que no seu entender "devido ao montante e o seu descritivo genérico das mesmas, permite-nos concluir, que estamos perante documentos não passados na foram legal" (fl. 22 do processo administrativo)
6) A administração tributária desconsiderou essas facturas como custos, "porque os mesmos não estão devidamente justificados e, não existem provas do seu pagamento" (fl.22 do processo administrativo)
7) Em causa o fornecedor "V...................... com o NIPC ............... /NIPS ................ que liquidou Iva na sua factura n° 244 de 20/12/96 no valor de 1.150.000$00 €5.736,18 +195.500$00 €975,15= 6.711,33, com o descritivo genérico "trabalhos de carpintaria nas valas para o gás na obra de Odivelas" (importância e extenso rasurados) (fl. 22 do processo administrativo).
8) A administração tributária entendeu que o "correcto é apresentar o descritivo quantificado e devidamente discriminado por tipos de serviços, materiais e mão-de-obra com referência aos autos de medição" (fl. 22 do processo administrativo).
9) A administração tributária constatou que o referido fornecedor, está colectado como empresário em nome individual na Categoria C e para efeitos de IVA está enquadrado no regime de isenção e, não entregou no SAIVA o Iva liquidado, nem entregou a declaração de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares do ano de 1996 (fl. 22 do processo administrativo).
10) A administração tributária constatou que também o fornecedor Jo........................ com o NIPC .............. emite facturas de montante superior a nove mil contos com descritivos genéricos (fl. 22 do processo administrativo).
11) Na análise à conta corrente deste fornecedor a administração tributária verificou a existências de facturas, as quais, não têm correspondência em termos de numeração e datas" (fl. 22 do processo administrativo).
12) Analisado o cadastro do mesmo a administração tributária constatou que o n° de contribuinte indicado nas facturas é inválido e quanto ao cadastro de IR não foi possível detectar o respectivo número fiscal, "dado não existir nenhum nome exactamente igual ao indicado nas facturas" (fl. 22 do processo administrativo)
13) O Sr. Jo....................... não é conhecido na morada indicada nas facturas (fl. 22 do processo administrativo).
14) Quanto à tipografia indicada nas mesmas existe em termos fiscais, mas em termos físicos não existe na morada indicada (casa da porteira), na data era arrecadação do r/c - salão de cabeleireira (fl. 22 do processo administrativo).
15) Em face das dúvidas suscitadas foi notificada a Impugnante para apresentar os justificativos que comprovem que efectivamente houve pagamentos das facturas dos seguintes fornecedores:
a. Jo............... contribuinte n° ................
FACTURA n° DATA VALOR EM ESCUDOS
243 30/10/97 2.687.256
244 30/10/97 1.853.280
269 28/11/97 5.112.900
256 30/12/97 9.126.000
245 30/12/97 1.806.948
TOTAL 20.586.384
b. V........................ factura n° 244 de 20/12/96
16) No âmbito da acção inspectiva foi ouvido em auto de declarações o sócio gerente da Impugnante, que instado pela administração tributária declarou o seguinte:
a. Não tem contratos de subempreitadas subjacentes às facturas referidas nos n°s anteriores
b. Não tem documentos comprovativos do pagamento das referidas facturas
c. Não tem o endereço, morada ou n° de telefone utilizados nos contactos com o fornecedor Jo................................ (cf. fl. 24 e termo de declarações a fl. 46 a 48 do processo administrativo)
17) A administração tributária apurou ainda que V..................., não habita (casa da mãe) na morada indicada no cadastro da DGCI, há mais de 12 anos e a mão há muito que não tem contactos com o filho (fl. 25 do processo administrativo).
18) Jo................. (não identificado fiscalmente) é desconhecido na morada indicada nas facturas, bem como na vizinhança, não tendo habitado na referida morada (fl. 25 do processo administrativo).
19) A administração tributária considerou que a Impugnante deduziu indevidamente o Imposto Sobre o Valor Acrescentado na factura n° 244 de 20/12/96, emitida em 20/12/96 no valor de 1.345.500$00 €6.711,33 tendo deduzido indevidamente o IVA no valor de 195.500$00, €975,15 (fl, 25 do processo administrativo)
20) A administração tributária fundamentou a referida correcção nos seguintes termos "a factura em referência está rasurada na importância e no valor por extenso, além de não apresentar o descritivo quantificado e devidamente discriminado por tipo de serviços, materiais e mão de obra, horas gastas, auto de medição, etc. (fl. 25 do processo administrativo)
21) A administração tributária também considerou que a Impugnante deduziu o indevidamente o Imposto Sobre o Valor Acrescentado referente às facturas emitidas por Jo....................... com o n° de contribuinte ...........
FACTURA n° DATA Valor da factura Iva constante na factura VALOR total da factura
243 30/10/97 2.296.800$00 390.456$00 2.687.256$00
244 30/10/97 1.584.000$00 269.280$00 1.853.280$00
269 28/1 1/97 4.370.000$00 742.900$00 5.112.900$00
256 30/12/97 1.544.400$00 262.548$00 9.126.000$00
245 30/12/97 7.800.000$00 1.326.000$00 1.806.948$00
TOTAL 17.595.200$00 2.991. 184$00 20.586.384$00
22) No caso desconsiderou o IVA dedutível no valor de 2.991.184$00 €14.919,96 (fl. 26 do processo administrativo)
23) Para o efeito fundamentou a correcção nos seguintes termos como, não apresentam o descritivo devidamente quantificado e discriminado por tipo de serviços, materiais e mão de obra, horas gastas, auto de medição etc. estamos perante documentos não passados em foram lega, o Iva não é dedutível" (fl. 26 do processo administrativo)
24) A cópia da factura n° 244 emitida por V................... foi junta ao relatório (fl. 63) e tem no descritivo "trabalho de carpinteiro nas valas para o gás na obra de Odivelas"e está rasurada.
25) As facturas emitidas por Jo.................. foram juntas ao relatório como anexo 7 e no descritivo, consta, nomeadamente, trabalhos diversos nas valas de gás incluindo cofragens nas obras, indicando as localidades, C.........., Quinta .............., (fl. 64 a 68 do processo administrativo).
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Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade, nomeadamente não se provou que o documento identificado como factura n° 44, reunia os requisitos do art° 35° n° 5 do CIVA.
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A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
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3. -Fixada a factualidade relevante e atentas as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, decorre que as questões que se impõe conhecer são as de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, de facto e de direito, enquanto que decidiu não considerar para efeitos de dedução do I.V.A. facturas não preenchidas segundo os requisitos legais, devendo, por isso, ser revogada ou anulada.
No essencial, a sentença recorrida partindo do princípio de que as facturas assumem relevo determinante no funcionamento do IVA como imposto formal que opera pelo método do crédito do imposto ou "das facturas" e de que, por isso, se exige que elas respeitem os requisitos formais enunciados no art. 35°, n° 5, do CIVA, veio a entender que do probatório resulta que os documentos em causa não reúnem os referidos requisitos, e, não dispondo a impugnante do competente suporte documental, não podia exercer o direito a tal dedução do imposto ainda que suportado em aquisições de bens e serviços.
Concluiu, por isso, tratar-se de dedução indevida de IVA, ao abrigo do artigo 19°, n° 2 do respectivo Código e da própria Sexta Directiva, nos seus artigos 17.° e 18.° e que, na situação vertente, se comprovaram os pressupostos factuais do acto tributário posto em crise: inexistência de documentos de suporte emitidos sob forma legal, que mencionassem o IVA.
Com tal fundamentação considerou o acto impugnado legal e devido o imposto, bem como os respectivos juros compensatórios, nos termos do art° 83° do Código de Processo Tributário, porquanto o atraso na liquidação se ficou a dever a facto imputável ao contribuinte.
O recorrente invoca a seu favor nas conclusões do recurso o erro de julgamento sobre a matéria de facto, quando é certo que a sentença recorrida dá por provados os factos em que assentará a decisão e que têm por suporte os documentos constantes dos autos.
O recorrente insurge-se contra a decisão recorrida por entender que esta se baseou em elementos insuficientes por ter valorado mal a prova fornecida aos autos.
Ora, o que se demonstra e decorre da própria fundamentação da sentença, é que esta se baseou nos elementos disponíveis nos autos, sendo que não lhes deu a relevância que a recorrente pretendia, isto é, conferindo-lhes certa importância que não aquela que a recorrente pretende que tenham a seu favor.
Do probatório ressalta também o acolhimento na sentença recorrida do relatório da fiscalização à contabilidade da recorrente, cujo valor como prova não podia ser abalado nem posto em causa pelos depoimentos das testemunhas ouvidas nem tão pouco dos documentos juntos, atento o objecto do litígio.
Destarte, em face de tais elementos, bem traduzidos na matéria factual dada por provada, concorda-se com a Mª Juíza no sentido de que as facturas não contêm todos os elementos exigidos pelo art. 35 n° 5 do CIVA.
A recorrente não concorda com esse julgamento sustentando que as facturas foram impressas por tipografia devidamente identificada e autorizada pelo Ministério das Finanças, a rasura constante da factura n° 244 de J..............., não afecta a sua credibilidade, nem impede uma leitura e compreensão clara da mesma, os elementos de identificação, eventualmente falsos, constantes das facturas não afectam a sua credibilidade formal nem podem ser imputadas à Impugnante, muito menos penalizá-la, a descrição dos serviços está correctamente efectuada atentas as especificidades da empreitada, em que não são debitadas consumíveis (pregos e madeiras), sendo que a mera apreciação crítica das facturas, enquanto documentos formais, impõem uma resposta diversa os pontos da matéria de facto sob os n° 5, 6, 8, 10, 19, 20, 23 a 25, não resultando dos autos quaisquer indícios que as operações económicas reproduzidas nas facturas sejam simuladas.
Quid juris?
Ante omnia, importa analisar a substância das correcções efectuadas, começando por tecer algumas considerações sobre o regime jurídico aplicável.
Assim e como é sobejamente sabido, o nosso ordenamento jurídico consagra o princípio do sistema declarativo, como meio de apuramento da matéria colectável, surgindo as outras vias da sua determinação, da iniciativa da AF, como meios subsidiários ou residuais.
Como é bem de ver, o sistema jurídico tinha necessariamente de prever meios alternativos ao apuramento da matéria colectável dos impostos no caso daquele princípio não operar por motivos imputáveis ao contribuinte, como ser(ia)á , além do mais e designadamente, o caso de não disponibilizar os elementos necessários ao controlo da sua situação tributária, por parte da AT , no exercício do poder vinculado que a esta está conferido por lei.
Tudo isso para se alcançar a tributação dos rendimentos reais, por via do aludido sistema declarativo o que pressupõe que os contribuintes disponibilizem à AT todos e quaisquer elementos, que lhes sejam exigíveis e que se apresentem como indispensáveis ao correcto apuramento dos mesmos.
E só quando ocorra a quebra daquele dever de colaboração designadamente pela não apresentação daqueles referidos elementos, cujo ónus impende sobre o contribuinte como meio de assegurar a presunção de aderência á realidade da sua contabilidade, inviabilizando a concretização, por parte da AT, do dever estritamente vinculado a que esta, por seu turno, está obrigada pelo princípio da legalidade, do controle e apuramento do efectivo lucro tributável, é que a AF ficará legitimada ao recurso a meio alternativo de tributação por correcções técnicas ou por métodos indiciários.
Na verdade, nos termos do art.º 78.º do revogado CPT (no caso os factos tributários reportam-se a 1996 e 1997), organizada a escrita nos termos da lei comercial e fiscal, salvo a existência de erros, inexactidões ou outros indícios fundados resultantes da mesma de que não reflecte a real matéria tributável do contribuinte, havia que presumir a sua veracidade, presunção esta de natureza legal, ainda que “iuris tantum ”, exigia que a parte a quem seja oposta para a ilidir fizesse a prova do contrário como se expende no Ac. deste Tribunal tirado no Rec. nº 1.292/03, em 9 de Maio de 1006 “(...) como quem tem a seu favor uma presunção estabelecida na lei está dispensado da prova do facto presumido (...), o contribuinte, se tiver a sua escrita organizada conforme as exigências legais, não precisa de provar que são verdadeiros os factos delas decorrentes. Só assim não será no caso de, (...), se verificarem erros, inexactidões ou outros indícios fundados de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva: neste caso, cessa a presunção, mesmo que a escrita esteja organizada de acordo com a lei. E isso é o que se verifica quando a contabilidade, apesar de estar formalmente organizada, for avaliada do ponto de vista técnico -contabilístico e se verificar então que omite operações efectuadas ou inclui operações não efectuadas.”
Por outro lado, no que concerne à organização da contabilidade e à sua relevância, para os aludidos efeitos do artigo 78.º já referido, dir-se-á, na senda do Ac. deste Tribunal Rec. 2597/99, que «...a fiabilidade do registo contabilístico dos factos patrimoniais fundamenta-se na chamada escrituração comercial, constituída pelos livros e registos obrigatórios e submetidos a formalidades legais, pelos livros facultativos ou a estes equiparados (folhas soltas, volantes ou avulsas, v.g. folhas de caixa, artºs. 31º a 37º do C. Com.) e, ainda, pelos documentos justificativos, não sendo de esquecer que , de acordo com a lei , a escrituração comercial é , não só , o meio descritivo dos factos patrimoniais como , também , o modo formal da respectiva comprovação.».
Acresce ainda que importa não olvidar que nos movemos no âmbito tributário em que imperam os princípios do inquisitório e, por consequência, o da oficialidade na investigação, tendo por desiderato último a descoberta da verdade material o que, em termos de ónus de prova, acarreta a inexistência de uma particular incumbência de provar, por parte de quem quer que seja.
Seja como for, isso não significa que neste contencioso não exista um direito probatório que regulamente quem tem que provar o quê , para que se alcance uma qualquer pretensão formulada. É por isso que a questão que se controverte não pode deixar de ser objecto de definição, se os factos relevantes se não provarem, seja por iniciativa das partes, seja por iniciativa do Tribunal, ela não possa deixar de ser decidida de forma que seja desfavorável àquele sobre quem impender, nos termos legais, o respectivo ónus probatório –cfr. neste sentido, entre muitos outros e a título meramente exemplificativo, o Ac. deste Tribunal de 99.12.14 , Rec. nº. 2.467/99.
Deste modo, por princípio e sempre que a conduta da AT se consubstancie na prática de actos positivos e constitutivos do direito a que se arrogue com consequências negativas na esfera dos direitos dos contribuintes, é a ela que cabe a obrigação de demonstrar da factualidade relevante ou dito de outra forma é à AT que cabe fazer a “...prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável)...” pertencendo, por contrapartida, “...ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto , quando se mostrem verificados esses pressupostos ...” Cfr. Ac. deste Tribunal, de 02.06.04, tirado no Rec. 3.279/00.
Contudo e como é entendimento jurisprudencial pacífico do STA, nos casos como o vertente, em que esteja em causa a desconsideração do direito á dedução do IVA, no pressuposto de que as operações tituladas pelas facturas não têm aderência á realidade, não é a AT que se socorre de qualquer factualidade positiva, agressiva e desfavorável ao contribuinte, enquanto constitutiva de um qualquer direito que se (não) arroga, antes e ao invés é o contribuinte que pretende fazer valer esse invocado direito á dedução, o que vale por dizer que não é a AT que tem de demonstrar a inexistência das operações tituladas pelas facturas, antes e ao invés, é àquele que se impõe provar a aderência á realidade de tais operações. Nessas situações, à AF apenas se impõe atestar a ocorrência de factualidade que, com foros de seriedade, razoabilidade e normalidade, crie uma dúvida sustentada da aderência á realidade daquelas referidas operações, ou como lapidarmente se escreve no Ac. do STA de 03MAI07 , tirado no Proc. n.º 1026/02 Que aqui , de entre outros , se cita a título exemplificativo. “(...) à administração cabe o ónus de prova da verificação dos requisitos estabelecidos no art.º 82º n.º 1 do CIVA para que possa liquidar adicionalmente o IVA respeitante a deduções indevidas, mas já não a existência dos factos contra ela afirmados pelo contribuinte, traduzidos na existência dos factos tributários e sua expressão quantitativa”.
Postos estes considerandos cabe então determinar se a AT coligiu, do ponto de visto substancial, elementos legitimadores da conclusão de que as facturas em causa não titularam operações reais, nos termos nelas descritos e, nessa medida, a concluir pela inexistência do direito à dedução do IVA correspondente.
Ora, como resulta dos elementos de prova coligidos para os autos, particularmente do relatório da acção inspectiva a que foi sujeita a recorrente, crê-se que, tal como o entendeu a decisão recorrida, as circunstâncias apuradas justificam que se tenha consubstanciado a suspeita de que, no caso, as facturas em questão não titularam operações reais.
Com efeito, no essencial e à luz do dito relatório, subscreve-se o que se diz na sentença recorrida, por cotejo com a apreciação da prova produzida, que a AT reuniu indícios bastantes e suficientemente sérios de que os emitentes das facturas não eram prestadores de serviços da impugnante e de que as facturas em questão não reflectem a realidade negocial relativa às relações nelas referidas, sendo que a recorrente não logrou demonstrar a aderência à realidade das referidas facturas.
O certo é que, com relevo para a decisão, volveu provado nos autos que a recorrente estava colectada por actividade de realização de trabalhos de construção civil, no regime de empreitadas à "M.......", nomeadamente na abertura e fechos das valas necessárias para a instalação de tubos de gás natural, actividade tributável à taxa normal, liquidando o Imposto Sobre o Valor Acrescentado nas facturas a clientes e deduzindo o Imposto Sobre o Valor Acrescentado das facturas emitidas por terceiros - fornecedores e outros credores.
No decurso da análise efectuada à contabilidade a administração tributária constatou a existência de facturas emitidas por fornecedores, que no seu entender "devido ao montante e o seu descritivo genérico das mesmas, permite-nos concluir, que estamos perante documentos não passados na foram legal".
Assim, a administração tributária desconsiderou essas facturas como custos, "porque os mesmos não estão devidamente justificados e, não existem provas do seu pagamento".
Isso porque estava em causa o fornecedor "V.................. com o NIPC ............. /NIPS ......... que liquidou Iva na sua factura n° 244 de 20/12/96 no valor de 1.150.000$00 €5.736,18 +195.500$00 €975,15= 6.711,33, com o descritivo genérico "trabalhos de carpintaria nas valas para o gás na obra de Odivelas" (importância e extenso rasurados).
A administração tributária entendeu que o "correcto é apresentar o descritivo quantificado e devidamente discriminado por tipos de serviços, materiais e mão-de-obra com referência aos autos de medição" e constatou que o referido fornecedor, está colectado como empresário em nome individual na Categoria C e para efeitos de IVA está enquadrado no regime de isenção e, não entregou no SAIVA o Iva liquidado, nem entregou a declaração de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares do ano de 1996.
Mais constatou a administração tributária que também o fornecedor Jo................... com o NIPC .............. emite facturas de montante superior a nove mil contos com descritivos genéricos e, mediante análise à conta corrente deste fornecedor a administração tributária verificou a existências de facturas, as quais, não têm correspondência em termos de numeração e datas".
Seguidamente, a AT constatou a partir da análise do cadastro do mesmo que o n° de contribuinte indicado nas facturas é inválido não sendo possível, quanto ao cadastro de IR, detectar o respectivo número fiscal, "dado não existir nenhum nome exactamente igual ao indicado nas facturas". Ainda constatou a AT que o Sr. Jo................... não é conhecido na morada indicada nas facturas.
Quanto à tipografia indicada nas mesmas existe em termos fiscais, mas em termos físicos não existe na morada indicada (casa da porteira), na data era arrecadação do r/c - salão de cabeleireira.
Perante todas estas dúvidas, foi notificada a Impugnante para apresentar os justificativos que comprovem que efectivamente houve pagamentos das facturas dos tais fornecedores, tendo sido ouvido em auto de declarações o sócio gerente da Impugnante, que instado pela administração tributária declarou que não tinha contratos de subempreitadas subjacentes às facturas referidas nos n°s anteriores; não tem documentos comprovativos do pagamento das referidas facturas e não tem o endereço, morada ou n° de telefone utilizados nos contactos com o fornecedor Jo........................
A administração tributária veio a apurar ainda que V........................, não habita (casa da mãe) na morada indicada no cadastro da DGCI, há mais de 12 anos e a mão há muito que não tem contactos com o filho e que J.............. (não identificado fiscalmente) é desconhecido na morada indicada nas facturas, bem como na vizinhança, não tendo habitado na referida morada.
Foi perante tais elementos que a administração tributária considerou que a Impugnante deduziu indevidamente o Imposto Sobre o Valor Acrescentado na factura n° 244 de 20/12/96, emitida em 20/12/96 no valor de 1.345.500$00 €6.711,33 tendo deduzido indevidamente o IVA no valor de 195.500$00, €975,15, fundamentando a referida correcção em que "a factura em referência está rasurada na importância e no valor por extenso, além de não apresentar o descritivo quantificado e devidamente discriminado por tipo de serviços, materiais e mão de obra, horas gastas, auto de medição, etc.”.
A administração tributária também considerou que a Impugnante deduziu o indevidamente o Imposto Sobre o Valor Acrescentado referente às facturas emitidas por J............... com o n° de contribuinte ................, desconsiderando o IVA dedutível no valor de 2.991.184$00 €14.919,96 com fundamento em que, como, não apresentam o descritivo devidamente quantificado e discriminado por tipo de serviços, materiais e mão de obra, horas gastas, auto de medição etc. estamos perante documentos não passados em foram lega, o Iva não é dedutível".
Ainda se apurou que a cópia da factura n° 244 emitida por V................. foi junta ao relatório (fl. 63) e tem no descritivo "trabalho de carpinteiro nas valas para o gás na obra de Odivelas"e está rasurada e que as facturas emitidas por J...................... foram juntas ao relatório como anexo 7 e no descritivo, consta, nomeadamente, trabalhos diversos nas valas de gás incluindo cofragens nas obras, indicando as localidades, C........., Quinta ..............
Assim, a AT no exercício dos poderes que lhe competem de controlo da veracidade dos elementos declarados, concluiu seguramente, com base nos factos - índice que apurou, que às facturas em causa não correspondem serviços realmente prestados.
A única forma de o contribuinte conseguir a anulação deste acto com base em violação de lei por erro nos pressupostos de facto é fazer prova de factualidade que permita por em causa aquela conclusão.
Como antes se demonstrou, cabia à administração fiscal demonstrar a existência da declaração formal fundamentadora do seu juízo subjectivo quanto à existência de operações e provar a pertinência desse juízo, pela enunciação de elementos fáctico - jurídicos convincentes da adequação e correcção desse juízo, o que se alcança através da enunciação de indícios sérios (que traduzam uma probabilidade elevada) de que as operações referidas nas facturas são simuladas.
Logrando a AT fazer a prova do bem fundado da formação do seu juízo, isso tem de ser valorado contra a recorrente que, tratando-se de dedução do IVA, teria de provar, em tribunal, a existência dos factos tributários que subjazem à dedução de imposto que efectuou.
E, perante o quadro fáctico –conclusivo acabado de expor, pode considerar-se que a AT recolheu indícios suficientes de que os serviços titulados por facturas emitidas não foram efectivamente prestados, pois nas relatadas situações se deve concluir pela simulação pois, por se tratar de prestação de serviços dificulta a comprovação do negócio.
Tais circunstâncias podem haver-se como indícios suficientes para suportar a conclusão retirada pela administração já que a AT cumpriu o dever que sobre si impendia de recolher indícios sérios e credíveis de que os serviços em questão não foram prestados existindo fundamento minimamente aceitável para as correcções levadas a cabo.
Por outro lado, tal como a AT, a Mª Juíza também entendeu inexistir ilegalidade na não aceitação de facturas que não especificam o serviço prestado contra a exigência ínsita na al. b) do n° 5 do art° 35 CIVA de que as facturas têm de conter a denominação usual dos serviços prestados.
Também nesta vertente estamos de acordo com o julgado pois daquele regime legal decorre que não basta indicar na factura que a mesma se refere à prestação de serviços, havendo que especificar qual o serviço que foi efectivamente prestado, embora pela mera indicação da sua denominação usual, sem necessidade de mais especificações. É, pois, certo que a mera referência nas facturas em causa a 'prestação de serviços' ou às apuradas denominações constantes das questionadas facturas não satisfaz, manifestamente, a exigência legal; pelo que não se tratando de factura passadas em cumprimento dos ditames do referido art° 35 elas não podem dar direito a dedução, conforme o estabelecido no art° 19, n° 2 do IVA.
É para nós válido e legal o princípio de que o contribuinte, adquirente de bens ou serviços, apenas pode efectuar a dedução do imposto suportado na medida em que o mesmo se encontre mencionado em facturas emitidas pelos fornecedores pela aquisição de bens e serviços, ou seja, de a factura constitui, o documento com base no qual o sujeito passivo procede à dedução do IVA desde que tenham sido emitidas na forma legal - n° 2 do art.° 19° do CIVA-.
«In casu» a A.F. entendeu não aceitar as sobreditas deduções por se considerar que as facturas correspondentes, ao referirem apenas “prestação de serviços” ou denominações similares, não obedeciam aos requisitos do art° 35, n° 5, CIVA.
Neste contexto, resultam justificadas as correcções feitas pelos serviços de fiscalização e que tiveram como base a não aceitação das correspondentes deduções de I.V.A., relativas às facturas encontradas sem suporte legal, ou seja, com inobservância do disposto no já citado art.° 35°, n° 5.
Atendendo ao especial regime de liquidação e cobrança do IVA (o Estado comete a liquidação aos intervenientes nas operações sujeitas e a entrega final impende sobre o sujeito passivo), para que haja direito à dedução do IVA mencionado nas facturas e documentos equivalentes, é necessário que estes estejam passados em forma legal - art. 35º do CIVA.
Por um lado, aquela exigência de observância da forma legal prescrita no CIVA para conferir o direito à dedução do imposto (citado artº 35° n° 5) justifica-se dentro da lógica interna do regime de um imposto plurifásico, que incide sobre cada fase da transacção dos bens ou serviços, por ser necessário o cumprimento rigoroso das regras legais, de forma a facilitar o controlo da fiscalização e evitar a fuga à tributação.
Mas porque a AF, no exercício da sua competência fiscalizadora da conformidade da actuação dos contribuintes com a lei (arts. 76º do CIVA e 107º do CIRC) actua no uso de poderes vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabe-lhe o ónus de prova da verificação dos pressupostos que a determinaram a efectuar as correcções técnicas ou, porventura, a fixar o imposto por métodos indirectos, cumprindo-lhe demonstrar a factualidade que a leva a considerar determinada factura, quer como não preenchendo os requisitos formais contidos na lei.
No caso dos autos a liquidação reporta-se à reposição de IVA que a AF considerou como indevidamente deduzido relativamente a diversas prestações de serviços suportadas pela impugnante.
Todavia, para proceder à liquidação impugnada, a AF fundamentou-se em que as facturas não obedecem aos requisitos previstos no art. 35º do CIVA e o preenchimento dos requisitos legais exigidos é necessário para que as facturas possam conferir à impugnante o direito à dedução do IVA nelas liquidado. Com efeito, está demonstrado que as facturas emitidas não contêm os elementos impostos pelo art. 35º do CIVA. Dispõe o art. 35º do mesmo CIVA, também no que agora interessa, o seguinte:
«5 - As facturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter os seguintes elementos:
a) Os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como os correspondentes números de identificação fiscal dos sujeitos passivos de imposto;
b) A quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; as embalagens não efectivamente transaccionadas deverão ser objecto de indicação separada e com menção expressa de que foi acordada a sua devolução;
c) O preço, líquido de imposto, e os outros elementos incluídos no valor tributável;
d) As taxas aplicáveis e o montante de imposto devido;»
No caso vertente, a AF refere, a este respeito, que as ditas facturas não reúnem todos os requisitos referidos no art. 35° do CIVA, pois não identificam concretamente que tipo de serviços teria efectuado.
Ora, as facturas aqui em questão apesar de conterem, inegavelmente, os elementos referidos nas alíneas a) e d) deste citado nº 5 do art. 35º, já, quanto à denominação usual dos serviços prestados, a indicação delas constante não é, manifestamente, a que a lei exige para que o imposto nelas mencionado confira direito a dedução. Na verdade, nelas consta apenas uma indicação vaga e imprecisa que não preenche os requisitos legais a que se referem as als. b) e c) do referido nº 5 do art. 35º do CIVA, pois não estão discriminados nem os serviços (nem a sua natureza) que em concreto foram prestados e a que se referem aquelas facturas, nem as quantidades unitárias ou totais dos mesmos.
Como se refere no Ac. de 17/2/99, do STA, Rec. 20593, «Embora a expressão "factura" surja com frequência nos textos legais, ao menos desde 1888, quando o Código Comercial incluiu um artigo (476°) sob a epígrafe "Factura e recibo", não existe na lei definição do que seja uma factura.
Mas a arrumação do artigo 476° do Código Comercial no título consagrado à compra e venda, e o teor da sua letra - "o vendedor não pode recusar ao comprador a factura das cousas vendidas e entregues" - logo permite concluir que se trata de um documento emitido pelo vendedor, destinado ao adquirente, que deve, ao menos, identificar os intervenientes e as mercadorias objecto de transacção».
É então bom de ver que, conforme o fim a que a destina o comprador, será necessário que a factura contenha mais ou menos elementos; na maioria dos casos, o preço das mercadorias será imprescindível; em muitos casos, não poderão faltar as condições de entrega e pagamento - etc., etc..
No caso concreto, a factura não se destina, só, ao uso do comprador, mas constitui um elemento essencial, também, para o fisco, pois é o documento demonstrativo das operações sobre que incide o imposto. Assim, fácil é entender que a factura válida para efeito de IVA terá de identificar do modo mais completo possível os comprador e vendedor, as mercadorias, o preço, e a data da transacção. Trata-se de elementos todos eles relevantes para permitir identificar a operação de modo bastante para que possam extrair-se as devidas consequências quanto ao imposto (sua incidência, sujeitos, taxa, cobrança, reembolsos, etc.). A falta de algum destes elementos pode por em risco o mecanismo concebido com o objectivo de arrecadar o imposto.
Natural é, pois, que o legislador tenha entendido que, para que o sistema, aliás, complexo, do IVA, possa funcionar, para facilitar o controlo das operações sujeitas e isentas, e para obstar à evasão fiscal, se tomava necessária, não apenas a emissão de facturas ou documentos equivalentes, na forma que entendesse cada um dos intervenientes, mas a sua emissão com um conteúdo e rigor definidos pela lei. Daí a exigência de uma forma legal.»
O diploma diz-nos, adiante, nas várias alíneas do n° 5 do artigo 35°, que as facturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como os correspondentes números de identificação fiscal dos sujeitos passivos de imposto; conter a quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; conter o preço, líquido de imposto, e os outros elementos incluídos no valor tributável; e conter as taxas aplicáveis e o montante de imposto devido.
Daqui resulta, pois, que, para o CIVA, uma factura passada em forma legal é a que respeite o estatuído no seu artigo 35°, ou seja, que para tal efeito, a factura que não respeite todas estas exigências não é uma factura passada em forma legal.
Neste conspecto, nem pode dizer-se que este art. 35º permite distinguir entre falta de forma legal e falta de elementos meramente acessórios, não essenciais, que só podem levar ao suprimento da falta.
É que, a forma legal, já se viu, é a do artigo 35° n° 5. Como também se expende no citado acórdão acima «Não se vêm elementos que permitam ao interprete separar, de entre as exigências da norma, as essenciais das acessórios. A "forma legal" é a que satisfaça todas as imposições da norma legal que as indica».
Assim sendo, a factura ou documento equivalente que não respeite integralmente o artigo 35° n° 5 do CIVA não está passada "em forma legal" e, consequentemente, não permite deduzir o respectivo imposto.
No caso que nos ocupa, nas facturas em causa não se mostram cumpridas as exigências formais contidas nas als. b) e c) do citado nº 5 do art. 35º do CIVA, pois não estão discriminados nem os serviços (nem a sua natureza) que em concreto foram prestados e a que se referem aquelas facturas, nem as quantidades unitárias ou totais dos mesmos.
Refira-se, ainda, que nem sequer estamos perante caso a que seja aplicável o regime do art. 38º do CIVA, nem perante caso em que o contribuinte possa processar facturas globais, comunicando previamente o facto á DGCI.
Acresce que, não obstante o recorrente pudesse querer produzir prova testemunhal sobre os discriminados trabalhos, tal prova não era idónea como não seria a feita por documentos internos que não podem substituir as indicações que a lei impõe sejam discriminadas na própria factura: para efeitos de IVA só confere direito a dedução o imposto mencionado em facturas e documentos equivalentes passados em forma legal e, como assim, por mais apropriados que sejam outros método, dado que o legislador só conferiu o direito à dedução do imposto mencionado em facturas e documentos equivalentes, estes têm que ser necessariamente os processados pelos vendedores (cfr. Ac. de 20/1/93, da 2ª Secção do STA, in RLJurisprudência nº 3835, p. 291).
E a expressão "quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos bens necessários à determinação da taxa aplicável" tem como finalidade permitir quer ao cliente quer à AF controlarem se a taxa incidente sobre o valor tributável é a correcta. Por isso, porque a exigência de tais documentos assim apercebidos tem também esta finalidade de apetrechar a entidade pública (AF) do controlo da situação tributária, e não somente a de obter prova segura dos factos a controlar, os mesmos são formalidades substanciais, que não meramente probatórias, e, como tal, insubstituíveis por qualquer outro género de prova, como decorre do art. 364º do C. Civil (cfr. ac. do STA, de 27/9/2000, rec. 25033).
Como bem se refere na sentença recorrida evocando pertinente e autorizada jurisprudência, a exigência da observância desses requisitos nos referidos documentos " facturas " tem como escopo permitir à Administração tributária o controlo da situação tributária, e não apenas obter prova dos factos a controlar, motivo por que as facturas, emitidas de acordo com os termos da lei, constituem formalidade ad substantiam, insusceptível de substituição por um qualquer outro meio de prova.
A factura que não respeita os requisitos legais de forma prescritos no art. 35°, n° 5, do CIVA, não confere direito à dedução do IVA nela mencionado, independentemente da efectiva realização da operação a que a mesma se refere (cf. art. 19°, n° 2, do CIVA), estando nessas condições a factura que, apresentando conteúdo não processado através de mecanismos de saída de computador, não continha, impressa, qualquer referência numérica, nem a identificação da tipografia que a imprimiu, nem a pertinente autorização ministerial (cf. arts. 3°, n.° 3, 4° e 7° a 11 ° do DL n ° 45/89, de 11 de Fevereiro, aplicável ex vi do art. 5° do DL n.° 198/90, de 19 de Junho)" haverá de apoiar-se em documento que titule tal crédito de forma apropriada, em consonância com princípio da segurança jurídica, quer para a Administração Tributária, de molde a controlar o declarado quer para o contribuinte de molde a provar o direito que se arroga.
Deve, também, salientar-se que o estabelecimento das sobreditas exigências formais especiais atinentes às facturas ou documentos de débito, como condição para a dedução do IVA, exige a factura, ou documento de débito equivalente, cumprindo com os requisitos legais, em formalidade “ad substantiam”.
O que significa que, para a prova dos correspondentes factos, não podem ser dispensados tais documentos, sob forma legal, nem substituídos por outros meios de prova, atento o disposto no artigo 655.°, n.° 2 do Código de Processo Civil.
Concluindo-se, pois, que as facturas questionadas (e por cuja não aceitação - por parte da AF - da dedução do IVA nelas mencionado foram feitas as liquidações adicionais impugnadas) não estão passadas na forma legal, tal como a impõe o art. 35º do CIVA e sendo certo que as ditas liquidações foram feitas também porque a AF apurou este facto (como consta do respectivo relatório da fiscalização), a sentença recorrida decidiu de acordo com a lei ao não aceitar a regularidade de tais facturas e a legalidade da dedução do imposto nelas mencionado.
Improcedem, por isso, as Conclusões do recurso sob análise, o que o mesmo é dizer que não se verifica a falta de julgamento e de fixação de matéria de facto pois ao probatório da sentença foi lavada a matéria de facto indispensável à decisão.
*
4. - Nestes termos, acordam os juízes da secção de contencioso tributário do TCAS, em negar provimento ao recurso assim se confirmando a decisão recorrida que nessa medida se mantém na ordem jurídica.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em cinco (5) UC’s.
LISBOA, 19/05/2009
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Rogério Martins)