Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:02178/07
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:11/09/2011
Relator:MAGDA GERALDES
Descritores:IRC
TRANSMISSIBILIDADE DE PREJUÍZO FISCAL.
CONCEITO VAGO OU INDETERMINADO.
MARGEM DE LIVRE APRECIAÇÃO
Sumário:I – A transmissibilidade dos prejuízos fiscais, prevista no artigo 69.º do CIRC, é um benefício fiscal que carece de reconhecimento e, como tal, está sujeita ao disposto no artigo 11.º-A, n.º 1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

II – “Razões económicas válidas” e “inserção numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva” são conceitos indeterminados cujo preenchimento cabe à Administração e que, ao contrário do poder discricionário verdadeiro e próprio, como poder de eleger uma de entre várias soluções igualmente válidas, só admitem uma solução justa no caso concreto.

III – No preenchimento dos conceitos indeterminados pode existir, ou não, a chamada margem de livre apreciação ou discricionariedade técnica. Tanto a questão de saber se houve “razões económicas válidas” ou se a fusão “se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva” é matéria de discricionariedade técnica, com uma longa margem de livre apreciação da Administração.

IV – Nestes casos, o juízo discricionário da administração não pode ser fiscalizado, no ponto específico, pelos tribunais, salvo erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam no TCAS, Secção Contencioso Tributário, 2º Juízo


A CAIXA ………………………………., identificada nos autos, intentou acção administrativa especial contra o MINISTÉRIO DAS FINANÇAS, tendo formulado o pedido de anulação do despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais nº26/2007 – XVII, de 08.01, que indeferiu o seu pedido de dedução prejuízos fiscais, com a consequente condenação da Administração Fiscal á prática do acto devido.
Imputou ao despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais nº26/2007 – XVII, de 08.01 os seguintes vícios:
- violação de lei, por erro manifesto na interpretação de conceitos legais relativamente indeterminados do artº 69º do CIRC, desvio de poder, violação de lei constitucional.
Juntou 10 (dez ) documentos e arrolou testemunhas.

Na contestação apresentada nos presentes autos, a entidade demandada pediu que fosse julgada improcedente a acção por não provada.
Pediu a correcção do valor da acção para €15.000,00, nos termos do disposto no artº 34º do CPTA.
Juntou o processo administrativo.

Foi proferido despacho saneador, tendo sido dispensada a produção de prova testemunhal, por os autos conterem já todos os elementos necessários à decisão.

A autora nas suas alegações formulou as seguintes conclusões:
“1. A presente acção incide sobre o acto administrativo de indeferimento expresso do pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais deduzido pela Autora ao abrigo do disposto no art. 69º do CIRC.
2. Esse pedido vem agora indeferido com fundamento em ilegalidade, nos termos do Despacho nº26/2007 – XVII, de 8 de Janeiro, proferido pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, por delegação de competências.
3. A Autora não se conforma com os termos e fundamentos do dito despacho.
4. O pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais deduzido pela Autora, no âmbito da operação de fusão com a CCAMM, respeitou todas as exigências legais e foi devidamente fundamentado à luz do nº2 do art. 69º do CIRC.
5. Nos termos do artº69º do CIRC incumbe ao Ministro das Finanças decidir dos pedidos dos contribuintes para a concessão do benefício ali previsto, indicando o nº2 que, para tal, a fusão deve fundar-se em razões económicas válidas e deve estar inserida numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva – verificados tais pressupostos a lei incumbe a Administração no dever de decidir favoravelmente o pedido do contribuinte.
6. Conforme dispõe o Acórdão do STA de 05.07.06, proferido no recurso nº 142/06, “razões económicas válidas” e “inserção numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”, “são conceitos indeterminados cujo preenchimento cabe à Administração e que, ao contrário do poder discricionário verdadeiro e próprio, como poder de eleger uma de entre várias soluções igualmente válidas, só admitem uma solução justa no caso concreto”.
7. Em face dos autos, é manifesta a existência de uma motivação económica válida da fusão em apreço, bem como, a sua inserção numa estratégia de redimensionamento e reestruturação das entidades envolvidas, com claros efeitos positivos na estrutura produtiva.
8. Estes conceitos indeterminados de cujo preenchimento a lei faz depender a concessão do benefício, segundo dispõe o Acórdão do TCA (Sul), de 01.02.05 (processo nº 25/04), “devem ser preenchidos em concordância com o art. 11º da Directiva nº 90/434CEE do Concelho, de 23.07.1990, que dispõe sobre o regime fiscal comum, de modo a evitar a tributação das fusões, no sentido de que tais operações devem ir além da procura de um benefício puramente fiscal como a compensação horizontal de perdas, nos termos interpretados no acórdão C-28/95 do Tribunal de Justiça, de 17.07.1997”.
9. In casu, muito para além do aproveitamento do potencial benefício fiscal atribuído por lei, o que, de facto, se visou com a fusão foi justamente a racionalização dos recursos existentes, lançando-se mão para o efeito do meio reconhecidamente mais válido para atingir esse fim – a fusão.
10. Em face da dissonância entre o disposto no artº 69º do CIRC e a interpretação da Administração fiscal, o Despacho que indefere a pretensão da Autora é manifestamente ilegal, por violação de lei, por erro manifesto na interpretação de conceitos legais relativamente indeterminados e por desvio de poder, devendo ser anulado nos termos do art. 135º do CPA.
11. O acto sub judice extravasa a letra e a ratio do nº2 do artº 69º do CIRC, consubstanciando uma ilegalidade congénita do mesmo.
12. Estamos pois, perante o que a jurisprudência (vide, os acórdãos do STA, de 02.02.88, 10.07.86, 09.06.94 e 17.04.80, proferidos, respectivamente, nos recursos 021666, 020496, 028382, e 013565) denomina por erro manifesto na apreciação dos factos e na interpretação de conceitos legais relativamente indeterminados, erro esse que constitui vício de violação de lei, sindicável por esse Tribunal e susceptível de determinar a anulação do acto em crise.
13. O acto de indeferimento do pedido formulado pala Autora consubstancia um erro grosseiro de interpretação e uma manifesta desadequação ao escopo do art. 69º do CIRC, bem como, da mens legis que o precede.
14. Não se invoque, sequer, a alegada insindicabildade deste tipo de actos (assentes em pretensos juízos técnicos) levados a cabo pela Administração fiscal, sob pena de flagrante violação do princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva, ínsito no nº4 do art. 268º da Constituição da República Portuguesa – tal entendimento vem, aliás, defendido e assente pela Doutrina e pela Jurisprudência do Tribunal Constitucional (vide, por todos, o Acórdão do TC, nº 269/00, de 03/05/2000, proferido no processo nº 598/99).
15. Invoca ainda a Administração fiscal que o plano específico de dedução de prejuízos fiscais transmitidos, que deverá ser efectuado nos termos do Despacho nº 79/2005-XVII, de 2005/04/15, de S. Exa o SEAF e da Circular 7/2005 de 16 de Maio (nº?), não permitia a dedução dos prejuízos.
16. Como o poder decisório da Administração se esgota aqui na densificação dos requisitos do nº2 do art 69º, tal posição representa a criação de um verdadeiro critério decisório ex novo, fora do esquema regular de criação de normas legais impositivas, em violação do princípio da legalidade.
17. A limitação imposta pelo Despacho nº 79/2005-XVII, do SEAF, cria uma efectiva e ilegal restrição do direito à dedução, violando abertamente os limites legalmente impostos no art. 69º do CIRC.
18. Tal viola manifestamente o princípio da legalidade, expresso no art. 103º da CRP e no art. 8º da LGT, bem como o princípio da Tributação pelo rendimento real das empresas, vertido no nº2 do art. 104º da CRP.
19. As circulares não são fonte de direito.
20. Visto que o Despacho nº 79/2005 – XVII, do SEAF, publicitado pela Circular 7/2005, não é lei não pode, como tal, o seu conteúdo ser assumido como critério decisor a ponderar pela Administração fiscal.
21. Sempre seria de refutar a aplicação in casu da circular 7/2005, porquanto, as entidades envolvidas são cooperativas e, objectivamente, aquele normativo está pensado e estruturado para aplicar às sociedades comerciais.
22. A concretização in casu do comando constitucional de apoio à actividade das cooperativas (art. 85º da CRP) é posta em causa pela Administração fiscal.
23. O critério da Administração fiscal para indeferir o pedido da Autora é claramente desfasado desta ponderação e culmina numa decisão mal que viola, de forma flagrante, a ratio do art. 69º do CIRC, bem como, de todo o instituto que potencia a neutralidade das operações de fusão.”
Pediu a procedência total da acção com todas as consequências legais.

A entidade demandada apresentou as suas alegações onde concluiu:
“A) Saber se a operação de fusão realizada foi efectuada por razões económicas válidas, com o a A. invoca que foi, é uma questão que envolve juízos de valor inseridos numa grande margem de liberdade de apreciação da AT, uma vez que estamos no campo da chamada discricionariedade técnica.
B) Deste modo, não só o juízo emitido pela AT, de considerar que a operação não foi efectuada por razões económicas válidas, não é, salvo erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal, sindicável pelo Tribunal, como também, porque o acto que a A. pretende que o Tribunal condene a AT a emitir envolve valorações próprias do exercício da actividade administrativa, não sendo identificável uma única solução como legalmente possível, não pode, salvo o devido respeito, o Tribunal substituir-se à AT e determinar o conteúdo do acto a praticar pela mesma, cfr. art. 71º nº2 e 95º nº3 do CPTA.
C) Não pode, pois, proceder o pedido da A. de condenação da AT à prática de um acto de deferimento, uma vez que tal condenação implicaria o reconhecimento, por parte do Tribunal, que não da AT, de que a fusão foi realizada por razões económicas válidas.
D) O acto de indeferimento do pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais, no caso concreto, não enferma de qualquer erro grosseiro, mostrando-se adequado ao fim legal.
E) De facto, na análise da operação de fusão por incorporação em que a A. é parte e na apreciação do interesse económico da mesma, a AT considerou que o contributo fornecido pela sociedade incorporada no processo de fusão era negativo para a A., que a sobrecarregava no seu objectivo de reorganização e de viragem de resultados futuros, uma vez que a Caixa incorporada apresentava uma situação patrimonial negativa, que estava em situação difícil e que revelava uma degradação da sua situação financeira e dos seus rácios prudenciais.
F) Assim, a operação em causa não tem efeitos positivos a médio e longo prazo, pelo contrário, os resultados positivos ao longo do período projectado decorrem exclusivamente, ou quase exclusivamente, da contribuição da incorporante.
G) O que determina a inexistência de ganhos macro-económicos a obter com a operação de fusão, em concreto.
H) Finalmente, o que levou ao indeferimento do pedido da A. foi a conclusão de que a fusão não se realizou por razões económicas válidas e esta conclusão é prévia e leva, como é lógico, à desnecessidade da consideração da aplicação de um qualquer plano de deduções. O facto de se ter feito referência, na fundamentação do acto impugnado, ao despacho nº 7972005-XVII, de 2005.04.15, apenas foi um mais, desnecessário, é certo, para reafirmar as consequências decorrentes da transmissão do património negativo da incorporada.”
Pediu a improcedência da acção e a sua absolvição dos pedidos.

OS FACTOS

Tendo em atenção a prova documental junto aos autos, o constante do pa (cujas folhas não se mostram numeradas) e as posições assumidas pelas partes, dá-se com assente a seguinte factualidade com interesse para a decisão:
a) – em 2006 a autora - Caixa ………………………..(CCAMINP) - integrou uma operação de fusão através da qual passou a incorporar a ………………………, CRL;
b) – em Maio de 2006 a CCAMINP dirigiu um requerimento ao Ministro das Finanças, apresentado em 31.05.06, no Serviço de Finanças de ………….., onde solicitou autorização para a transmissão, para si, dos prejuízos fiscais acumulados, no valor de global de € 4.015.883,00 apurados nos exercícios de 2004 e 2005, pela Caixa de ……………………, CRL (cfr. fls. 102 a 117 dos autos e fls. do pa apenso);
c) – a CCAMINP instruiu o requerimento referido em b) com os seguintes elementos: cópia do projecto de fusão, estudo demonstrativo das vantagens económicas da operação de fusão, cópia do parecer do revisor oficial de contas independente, escritura pública da fusão, cópia do pedido de registo da operação na conservatória do registo comercial competente, informação sobre os lucros tributáveis previsionais da entidade incorporante para os seis exercícios seguintes ao da operação (2006, 2007, 2008, 2009, 2010 e 2011), cópias dos balanços e das demonstrações de resultados das entidades envolvidas referentes aos três exercícios anteriores ao da fusão (2003, 2004 e 2005), cópias dos balanços e das demonstrações de resultados previsionais da entidade incorporante para os três exercícios seguintes ao da fusão (2007, 2008 e 2009), documento comprovativo da inexistência de dívidas fiscais à segurança social por parte das entidades intervenientes, linhas estratégicas para o sector do crédito agrícola (cfr. fls. …..;
d) – com data de 12.06.06, os serviços da Direcção Geral dos Impostos, enviaram à CCAMINP carta registada para efeitos do cumprimento do direito de audição, onde informaram que “relativamente ao pedido de transmissibilidade de prejuízos, no âmbito de fusão entre a Caixa …………………… e ………… e a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de …………….., foi proposto o indeferimento do mesmo, conforme despacho de 2006/10/17 do Exmo. Sr. Subdirector – Geral do IR por subdelegação (…)” (cfr. fls. 118 a 120 dos autos e fls. do pa);
e) – a autora – CCAMINP – exerceu o direito de audição solicitando que o projecto de indeferimento do seu pedido fosse revogado e fosse dado total provimento ao seu pedido (cfr. fls. 121 a 130 dos autos e fls. do pa);
f) – por despacho do SEAF nº 26/2007 – XVII, datado de 08.01.07, no uso de competência delegada pelo Despacho 17829/2005, publicado no DR, II série, de 19.08.05, foi o pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais referido em b) indeferido (cfr. fls. do pa);.
g) – o despacho do SEAF nº 26/2007 – XVII, datado de 08.01.07, é do seguinte teor: “Concordo” e foi escrito no canto superior direito da Nota Informativa cujo conteúdo é o seguinte:
1 – Considerando que a concessão do benefício fiscal estipulado no artigo 69º, nº1 e 2 do Código do IRC, está subordinada à autorização do Ministro da Finanças e à demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva. E que,
2 – O carácter excepcional próprio dos benefícios fiscais, como resulta do disposto no nº1 do artigo 2º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, traduz a evidente tipificação dos casos que estão subordinados à autorização supra mencionada, como seja, no caso concreto, a necessidade de verificação do interesse económico da operação.
3 – Considerando que, nesta operação, a incorporada legou para a incorporante um património negativo, o que torna inaplicável qualquer dedução, tendo em conta o constante no Despacho nº 79/2005-XVII, de 15 de Abril, desta Secretaria de Estado, posteriormente desenvolvido pela Circular nº 7/2005, de 16 de Maio, em concreto a alínea c) do nº1 e fundamentado pelo Parecer nº 64/2006, do Centro de Estudos Fiscais.
4 – É de determinar, assim, que, pela falta de verificação dos pressupostos quanto à sua concessão, em concreto pela inexistência de razões económicas válidas, determinados pelos nº1 e 2 do artigo 69º do Código do IRC, seja indeferido o pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais formulado pela sociedade “Caixa ……………………. e ………………., CRL”, que assume agora a designação de “Caixa de Crédito………………….. (Sul), CRL”, confirmando, assim a Informação 1261/2006, da DGCI, bem como a sua Adenda posterior ao exercício do direito de audição prévia, quanto ao projecto de decisão da DGCI, pela sociedade requerente. (…)” (cfr. fls. do pa);
h) – a adenda à Informação 1261/2006, da DGCI referida na Nota Informativa transcrita em g) é do seguinte teor:
“ADENDA À INFORMAÇÃO N°1261/2006
1.Nos termos do ofício 26647 de 30/10/06, desta Direcção de Serviços, com base no Despacho de 17/10/2006 do Exmo Sr. Subdirector-Geral do IR por subdelegação (Despacho 22852/2005, DR II Série, n°213, de 7/11/2005), foi o sujeito passivo Caixa de Crédito ……………………………, CRL, NIPC ……….., notificado para exercer o direito de audição, nos termos da alínea b) do n°l do artigo 60° da LGT, sobre o entendimento da Administração Fiscal, que propôs o indeferimento do pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais da entidade incorporada Caixa de Crédito Agrícola Mútuo …………….., CRL, NIPC ……………….
2.A requerente contesta a posição tomada pela Administração Fiscal, apresentando resumidamente os seguintes fundamentos:
FUNDAMENTOS INVOCADOS NO DIREITO DE AUDIÇÃO
3."Contrariando a inexorável motivação económica válida da fusão (devidamente demonstrada e fundamentada no Estudo Demonstrativo das Vantagens Económicas da Fusão, anexo ao requerimento cujo o indeferimento proposto aqui obstamos), a Administração Fiscal avança com uma conclusão precipitada e absolutamente redutora do fenómeno económico em causa, porquanto, desconsidera em absoluto as suas idiossincrasias."
4."Sem prejuízo das demais motivações económicas avançadas...as Caixas só poderem expandir a sua actividade através da fusão com Caixas limítrofes, demonstra de per si que o efeito e o alcance de uma fusão destas vai muito para além da mera soma algébrica dos patrimónios líquidos das entidades envolvidas."
5.Afirma ainda a exponente que "...a nova CCAMINP, por efeito da fusão, quadruplica o seu alcance no mercado, sem que para tal necessite de aumentar proporcionalmente a sua estrutura comercial e organizativa, multiplicando a sua eficiência e aumentando os lucros." "A simples demonstração deste facto deita por terra o primeiro dos argumentos adiantados pela Administração Fiscal - o contributo da CCAMCB para a CCAMINP vai muito para além da entrada com o seu património líquido (independentemente de ser positivo ou negativo como se verifica), fruto das especificidades que rodeiam a actividade económica das Caixas de Crédito Agrícola Mútuo e das sinergias decorrentes da fusão."
6.Quanto à impossibilidade de aplicação do plano específico previsto na Circular 7/2005, a exponente considera tal conclusão "...inverosímil e insustentável em termos de prática negociai - isso impediria, sem mais, a hipótese de reestruturação e recuperação de qualquer grupo empresarial que atravesse uma crise económica e financeira, principalmente se para o efeito recorressem a uma fusão - paradoxalmente (ou não!), como bem se sabe, essa é uma das práticas mais usuais ao nível da praxis empresarial." Refere ainda, que a Circular "...não é aplicável às Cooperativas, mas tão somente, às sociedades comerciais. Em última análise, o limite previsto na alínea c) do n°l da Circular, nem mesmo às sociedades comerciais poderá ser aplicado de forma absoluta e descontextualizada, com a interpretação proposta pelo Fisco; quanto mais, às Cooperativas."
7.Por outro lado, " a interpretação da Administração Fiscal e as respectivas conclusões desprezam por absoluto a diferente consideração que o capital merece nas sociedades comerciais e nas cooperativas.
Ainda que no limite, em relação às sociedades comerciais, se pudesse descortinar qualquer sentido na conclusão avançada pela Administração Fiscal - hipótese na qual não consentimos e que aduzimos por mero dever de patrocínio - ela seria, por evidência, totalmente descabida no que respeita à lógica intrínseca às Cooperativas."
8." Nas palavras de RUI NAMORADO (in, Introdução ao Direito Cooperativo, Almedina, 2000, pág.19), o princípio da não lucratividade das cooperativas, "...que não implica qualquer desvalorização da empresarialidade, situa-se na convergência dos valores de mutualidade e de democraticidade, para cujo conteúdo pleno contribui, significando, no essencial, que o motor de qualquer actividade cooperativa se situa fora do objecto da reprodução do capital. Querendo recorrer-se a uma imagem sugestiva, pode talvez dizer-se: o dinheiro ao serviço do trabalho, nunca o trabalho ao serviço do dinheiro." "
9."Além disso, a própria lei apresenta uma diferença substancial entre a definição e a função do capital nas sociedades comerciais e nas cooperativas: enquanto naquelas o capital é estatutariamente fixado, funcionando como elemento de referência da medida de participação dos sócios e um indicador de garantia perante terceiros; nestas, o capital é de composição variável, com um limite mínimo (cfr. n°l do Art. 2° e n°l do Art. 18° do Código Cooperativo), visando apenas funcionar como "...garantia mínima de estar assegurada a viabilidade do início de actividade das cooperativas" (in, RUI NAMORADO, ob. Cit, pág. 161)."
10."Assim, reafirmamos, com o aquele reconhecido juscooperativista “...a rentabilidade das cooperativas não se pode medir pelos resultados contabilísticos, se estes forem encarados como se fossem resultados de sociedades comerciais" (in, RUI NAMORADO, ob. cit, pág.159)."
11."Concluindo, se partirmos de uma análise mais abrangente do processo que antecede a fusão (processo esse que se insere num movimento mais lato no âmbito das Cooperativas de Crédito Agrícola a nível europeu), facilmente se poderá concluir que o alcance e o sentido da mesma não se encerra numa soma aritmética de patrimónios. É por demais evidente, pelos motivos expostos no Estudo Demonstrativo, nomeadamente pelo significativo aumento da quota de mercado e pelos iminentes ganhos de eficiência decorrentes da fusão, que a CCAMINP, ainda que incorpore em si uma entidade com situação líquida negativa, produzirá lucros tributáveis mais que suficientes quer para neutralizar aquela situação deficitária que agora absorve, quer para cobrir os prejuízos fiscais acumulados, cuja dedução se requer."
ANÁLISE DOS FUNDAMENTOS INVOCADOS NO DIREITO DE AUDIÇÃO
12.Refuta-se as alegações da exponente no exercício do direito de audição, com os mesmos fundamentos que foram invocados na Informação 1261/2006. Esta opinião é reforçada com idêntica interpretação do CEF através do Parecer n°64/06.
13.O n°l do art 69° do CIRC, estabelece a possibilidade de dedução dos prejuízos fiscais das sociedades fundidas aos lucros tributáveis da sociedade incorporante na dependência de prévia autorização concedida pelo Ministro das Finanças, encontrando-se, no entanto, essa concessão subordinada, nos termos do n°2 do mesmo artigo, "à demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva, devendo ser fornecidos, para esse efeito, todos os elementos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos".
14.Além disso, no n°4 do mesmo artigo prevê-se que "no despacho de autorização pode ser fixado um plano específico de dedução dos prejuízos fiscais a estabelecer o escalonamento da dedução durante o período em que pode ser efectuada e os limites que não podem ser excedidos em cada exercício".
15.Por forma a que o exercício desta possibilidade de dedução de prejuízos no âmbito de processos de fusão assentasse em critérios objectivos que permitam a uniformização das decisões sobre os requerimentos submetidos ao abrigo da faculdade prevista no n°l do art 69° do CIRC, evitando situações de arbitrariedade, e, "atendendo à preocupação de compatibilizar os interesses financeiros do Estado com o regime especial de neutralidade fiscal em que se integra o benefício da transmissibilidade dos prejuízos fiscais" , o Exmo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais veio, por Despacho n°79/2005-XVII, de 15 de Abril, divulgado através da Circular n°7/2005, de 16 de Maio, determinar que a dedução dos prejuízos fiscais transmitidos por uma sociedade fundida seja efectuada com determinadas limitações e orientações.
16.Tal como referido na informação 1261/2006, afigura-se que o contributo fornecido pela entidade incorporada no processo de fusão é inteiramente desfavorável para a incorporante, na medida em que a transferência de um património negativo sobrecarrega-a na sua missão de reorganização e de viragem dos resultados futuros. Dito de outra forma, de acordo com os Balanços pré-fusão, o substrato patrimonial da sociedade incorporante formado com a fusão será diminuído em cerca de 50%, sendo nessa medida prejudicial para a incorporante.
17.Com efeito, os elementos constantes do processo não permitem demonstrar que a operação em causa tenha efeitos positivos na estrutura da requerente, parecendo poder inferir-se da informação existente que os resultados positivos ao longo do período projectado decorrem exclusivamente, ou quase exclusivamente, da contribuição da entidade incorporante e que, inclusive, a incorporação da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Castelo Branco, conduziu a uma deterioração evidente da solvabilidade da exponente.
18.Veja-se, aliás, que, tal como consta do Estudo Demonstrativo das Vantagens Económicas da Fusão, a reduzida solvabilidade da incorporada não lhe permitia desenvolver a sua actividade normal e que na ausência da operação estaria em causa a própria continuidade da existência da entidade incorporada, pelo que constitui corolário lógico, dadas as características e objectivos do regime no qual se enquadra o art 69° do CIRC, a não transmissibilidade da dedução dos prejuízos fiscais.
19.E ainda que se entendesse que a fusão tinha sido realizada por razões económicas válidas, o plano específico de dedução dos prejuízos fiscais, a que alude o n°4 do art° 69° do CIRC, iria impedir que a sociedade incorporante deduzisse os prejuízos da sociedade incorporada.
20.Na situação em apreço, o facto do património líquido da incorporada CCAMCB ser negativo torna impossível o cumprimento da alínea c) do n°l da Circular 7/2005. De facto, tal como resulta do Despacho d'0 SEAF referido anteriormente, pretende-se limitar a dedução dos prejuízos em função do contributo da sociedade incorporada para os resultados futuros da sociedade incorporante, considerando-se que o mesmo será proporcional ao peso relativo que o património da sociedade incorporada tem na soma dos patrimónios das entidades envolvidas na operação, sendo que, quando esse peso relativo é próximo do zero, a dedução fica limitada a uma pequeníssima percentagem do acréscimo do lucro tributável da sociedade incorporante. Logo, se o património da incorporada é negativo, isso significa que ela não contribui para os lucros futuros da sociedade incorporante, pelo que não será possível efectuar qualquer dedução dos seus prejuízos aos lucros tributáveis desta última.
21.É, ainda, de salientar, quanto à afirmação feita pela exponente de que a Circular 7/2005 não seria aplicável às Cooperativas, mas tão somente às sociedades comerciais (presumindo-se que essa afirmação resulta do facto de a Circular se referir apenas a "sociedades"), que também o art° 69° do CIRC, ao permitir a dedução dos prejuízos em determinadas condições, só faz referência a sociedades fundidas. E não é por esse facto que alguma vez a Administração Fiscal considerou que o mesmo só seria aplicável a sociedades comerciais. Aliás, decorre do próprio pedido de transmissibilidade de prejuízos efectuado, que a exponente considera igualmente que o art 69° do CIRC lhe é aplicável, não apresentando argumentos que permitam concluir em contrário.
22.Face ao exposto, julga-se que se deverá indeferir a pretensão da exponente apresentada no âmbito do exercício do direito de audição e convolar em definitivo o despacho de 2006/10/17 do Exmo Sr. Subdirector-Geral do IR por subdelegação (Despacho22852/2005, DR II Série, n°213, de 7/11/2005), comunicado através do ofício 26647, de 30 de Outubro de 2006.” (cfr. fls. do pa).

O DIREITO

Na presente acção administrativa especial pretende a A. que se anule o acto administrativo de indeferimento expresso do pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais por si deduzido ao abrigo do disposto no artº 69º do CIRC.
Tal pedido foi indeferido nos termos do Despacho nº26/2007 – XVII, de 8 de Janeiro, proferido pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, por delegação de competências.
Conforme consta da matéria de facto apurada, considerou a entidade demandada, em tal despacho e por concordância com informação e pareceres anteriormente emitidos sobre o pedido da A., designadamente, que “(…) nesta operação, a incorporada legou para a incorporante um património negativo, o que torna inaplicável qualquer dedução, tendo em conta o constante no Despacho nº 79/2005-XVII, de 15 de Abril, desta Secretaria de Estado, posteriormente desenvolvido pela Circular nº 7/2005, de 16 de Maio, em concreto a alínea c) do nº1 e fundamentado pelo Parecer nº 64/2006, do Centro de Estudos Fiscais.
4 – É de determinar, assim, que, pela falta de verificação dos pressupostos quanto à sua concessão, em concreto pela inexistência de razões económicas válidas, determinados pelos nº1 e 2 do artigo 69º do Código do IRC, seja indeferido o pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais formulado pela sociedade “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo …………… e ………….., CRL”, que assume agora a designação de “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo ………… (Sul), CRL”, confirmando, assim a Informação 1261/2006, da DGCI, bem como a sua Adenda posterior ao exercício do direito de audição prévia, quanto ao projecto de decisão da DGCI, pela sociedade requerente.(…)”
Alega a A., em síntese, que “Em face da dissonância entre o disposto no artº 69º do CIRC e a interpretação da Administração fiscal, o Despacho que indefere a pretensão da Autora é manifestamente ilegal, por violação de lei, por erro manifesto na interpretação de conceitos legais relativamente indeterminados e por desvio de poder, devendo ser anulado nos termos do art. 135º do CPA. (…) O acto sub judice extravasa a letra e a ratio do nº2 do artº 69º do CIRC, consubstanciando uma ilegalidade congénita do mesmo.”

Vejamos.
Sobre questão idêntica à ora em apreciação - verificação dos pressupostos para o deferimento do pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais da sociedade incorporada, formulado pela sociedade incorporante - em concreto sobre a (in)existência de razões económicas válidas, determinados pelos nº1 e 2 do artº 69º do Código do IRC, pronunciou-se já o STA em vários acórdãos.
Por todos, seguimos aqui de perto o Ac. do STA de 05-07-2006, in Rec. 0142/06, disponível in www.dgsi.pt, onde se considerou:
“(…)Nos termos do artigo 69.º, n.º 2, do CIRC, “a concessão da autorização está subordinada à demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva, devendo ser fornecidos, para esse efeito, todos os elementos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos”.
A transmissibilidade dos prejuízos fiscais da sociedade fundida carece, pois, da autorização do Ministro das Finanças – cfr. n.º 1 daquele normativo - que só deferirá o pedido se entender “que a fusão é realizada por razões económicas válidas (…) e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”.
“Razões económicas válidas” e “inserção numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”, os dois requisitos cumulativos do artigo 69.º, n.º 2, do CIRC, são conceitos indeterminados cujo preenchimento cabe à Administração e que, ao contrário do poder discricionário verdadeiro e próprio, como poder de eleger uma de entre várias soluções igualmente válidas, só admitem uma solução justa no caso concreto – Cfr. Azevedo Moreira, Conceitos indeterminados, p. 35, citando Tesch. (…)”
Como resulta dos factos apurados, no caso dos autos, o SEAF através do seu despacho nº 26/2007 – XVII, datado de 08.01.07, e por concordância com anterior informação e parecer, concluiu que tais requisitos se não verificavam, fundamentando-se em que,“(…) nesta operação, a incorporada legou para a incorporante um património negativo, o que torna inaplicável qualquer dedução (…).(…) É de determinar, assim, que, pela falta de verificação dos pressupostos quanto à sua concessão, em concreto pela inexistência de razões económicas válidas, determinados pelos nº1 e 2 do artigo 69º do Código do IRC, seja indeferido o pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais formulado pela sociedade “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo ……………. e ………………., CRL”(…).
Como se pode ler no Ac. do STA citado, “Como escreve Freitas do Amaral, “o que importa é saber se a interpretação de conceitos indeterminados é uma actividade vinculada ou discricionária e, por conseguinte, sindicável, ou não, pelos tribunais” – Curso de Direito Administrativo - vol. II, p. 107.
Para este Autor, os conceitos indeterminados “não têm todos a mesma feição, e (…) alguns deles são, claramente, um instrumento de que a lei se serve para atribuir discricionariedade à Administração”.
Assim, por um lado, temos os conceitos descritivos ou conceitos-classificatórios, como “período nocturno”, “funcionário público” ou “casamento”, conceitos indeterminados “cuja concretização envolve apenas operações de interpretação da lei e de subsunção”. Nestes casos é “viável ao tribunal refazer posteriormente a decisão administrativa, ainda que apenas para a anular no caso de não se identificar com aquela que o tribunal tomaria se dispusesse de competência para praticar ou ordenar a prática do acto”.
Por outro, “temos a situação daqueles conceitos indeterminados cuja concretização apela já para ’preenchimentos valorativos’ por parte do órgão administrativo aplicador do direito”. Freitas do Amaral distingue aqui duas hipóteses: os casos em que em que é exigido ao órgão administrativo uma valoração objectiva (ex: saber se os combates de boxe em recintos ao ar livre são compatíveis com os “bons costumes”) e os casos “em que claramente o legislador remete para a Administração ‘a competência de fazer um juízo baseado na sua experiência e nas suas convicções, que não é determinado, mas apenas enquadrado por critérios jurídicos” – “a Administração tem de, considerando as circunstâncias de interesse público, descobrir, segundo o seu critério, a solução mais adequada”.
No primeiro caso é admissível a fiscalização judicial, no segundo já não.
Cfr. ibidem, pp. 108-111.
Ou seja, nos conceitos indeterminados pode existir, ou não, a chamada margem de livre apreciação ou discricionariedade técnica.
Para se determinar a que tipo se reconduzem os conceitos indeterminados em análise, há que interpretar a lei.
Por regra, “os proveitos e os custos, assim como outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que digam respeito, de acordo com o princípio da especialização dos exercícios” - artigo 18.º do CIRC.
Contudo, em alguns casos é possível a dedução de prejuízos fiscais apurados em determinado exercício - artigo 47.º - aos lucros tributáveis de um ou mais dos seis exercícios posteriores.
E, nas circunstâncias do predito artigo 69.º, é mesmo possível transmitir estes prejuízos fiscais.
Ali, o legislador pretendeu contribuir para a saúde financeira do sujeito passivo, abatendo à matéria colectável os prejuízos obtidos há menos de seis exercícios, de maneira a permitir a consolidação da empresa (fenómeno micro-económico);
E aqui, a intenção do legislador foi a mesma: para potenciar a manutenção da estrutura produtiva de uma empresa que, nos últimos exercícios, obteve prejuízos, permite a transmissibilidade dos seus prejuízos fiscais em caso de fusão, desde que verificados os pressupostos respectivos.
Estes pressupostos – que a fusão tenha ocorrido por razões económicas válidas e se insira numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva – visam garantir que este regime excepcional de transmissibilidade de prejuízos fiscais só seja possível quando os interesses sacrificados sejam proporcionais aos salvaguardados, isto é, que a perda de receita fiscal, resultante da subtracção dos prejuízos da empresa fundida ao lucro tributável da sociedade incorporante, seja equivalente aos ganhos obtidos com a fusão (que se aferem pelas razões económicas e pela estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial).
Ponto é, portanto, que se trate de ganhos macro-económicos pois ao sacrifício de um interesse público tem que corresponder a salvaguarda de outro interesse público, que não meramente particular (micro-económico).
Ora, este ganho macro-económico é aferido pelo preenchimento daqueles conceitos indeterminados que, como afirma Engisch, citado por Freitas do Amaral (ibidem, p. 113), “autorizam o órgão aplicador do Direito a considerar como vinculante e “justa” a valoração por ele tida como justa. Nestes termos, cientemente se conformam com uma pluralidade de sentidos. Eles esperam uma tomada de posição individual, confiando em que seguir honestamente uma linha de orientação pessoal [do Ministro das Finanças] é de molde a assegurar melhores decisões do que o tactear inseguro na procura de pontos de vista “’objectivos’”.
Tanto a questão de saber se houve “razões económicas válidas” ou se a fusão “se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva” é matéria de discricionariedade técnica, com uma longa margem de livre apreciação da Administração, que poderá originar soluções diferentes, consoante o interesse que a Administração privilegie: uma fusão pode fundar-se numa razão económica válida para um interesse público de vitalidade da economia nacional, mas tal pode já não ocorrer em face dum interesse público de vitalidade de uma economia sectorial.
Como escreve Freitas do Amaral: “Porque não se lhe pede um trabalho de subsunção, uma tarefa declarativa de coincidência com um esquema dado, mas se exige uma tensão criadora do direito no caso concreto, deve naturalmente entender-se que esta actividade que, por desejo do legislador, sofre um influxo autónomo da vontade do agente administrativo, deve escapar ao controlo do juiz, embora este tenha o dever de verificar se a solução encontrada obedeceu às exigências externas postas pela ordem jurídica”.
Casalta Nabais – cfr. Direito Fiscal, 3.ª edição, pp. 143-144 -, considera, até, que, no caso do dito artigo 69.º do CIRC, se verifica a “concessão de uma margem de livre decisão à administração fiscal (…) através da concessão de verdadeiras faculdades discricionárias” por razões de “praticabilidade das soluções legais”, com as respectivas consequências a nível de impugnação contenciosa, nos preditos termos.(…)”
Á semelhança do caso decidido no Ac. do STA que vimos citando, também no caso presente, o acto do SEAF se fundamentou na inexistência dos requisitos exigidos pela lei para a concessão da autorização para deduzir os prejuízos fiscais acumulados pela sociedade fundida e o seu juízo discricionário não pode ser fiscalizado pelos tribunais, salvo, no ponto, erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal.
Ora, tal erro grosseiro ou a manifesta desadequação ao fim legal visado não se verificam no caso dos autos, estando ambos por demonstrar, e, contrariamente ao alegado pela A., o despacho ora em crise mostra-se adequado ao fim legal da norma em causa, não violando nem extravasando a letra e a ratio do nº2 do artº 69º do CIRC.
O erro grosseiro ou manifesto é o “erro crasso, palmar, ostensivo, que terá necessariamente de reflectir um evidente e grave desajustamento da decisão administrativa perante a situação concreta, em termos de merecer do ordenamento jurídico uma censura particular mesmo em áreas de actuação não vinculadas”, como se refere no Ac. do STA de 11.05.05, in Rec. 330/05, disponível em www.dgsi.pt, o que no caso dos autos não aconteceu, igualmente improcedendo a matéria destas conclusões.
Assim como improcedem as conclusões atinentes à violação do princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva, ínsito no nº4 do artº. 268º da CRP, com a invocação da “insindicabildade deste tipo de actos”, porquanto sempre os mesmos são contenciosamente impugnáveis com fundamento em desvio de poder e erro nos seus pressupostos.
Quanto ao alegado vício de desvio de poder não se mostra tal vício provado, aliás, nem a A. fundamenta em que consiste tal desvio de poder, sendo certo que sobre ela recai o ónus de alegar e provar os factos constitutivos do desvio de poder provando, concretamente, qual o fim ilícito prosseguido diverso do fim legal
Por último, quanto à alegação da A. sobre a referência, por parte da entidade demandada, ao plano específico de dedução de prejuízos fiscais transmitidos, e que devendo “ser efectuado nos termos do Despacho nº 79/2005-XVII, de 2005/04/15, de S. Exa o SEAF e da Circular 7/2005 de 16 de Maio (nº?), não permitia a dedução dos prejuízos”, tal como alega a entidade demandada, “o que levou ao indeferimento do pedido da A. foi a conclusão de que a fusão não se realizou por razões económicas válidas e esta conclusão é prévia e leva, como é lógico, à desnecessidade da consideração da aplicação de um qualquer plano de deduções. O facto de se ter feito referência, na fundamentação do acto impugnado, ao despacho nº 7972005-XVII, de 2005.04.15, apenas foi um mais, desnecessário, é certo, para reafirmar as consequências decorrentes da transmissão do património negativo da incorporada.”, não tendo tal referência sido decisiva na formação do indeferimento da pretensão da A., não tendo a AT criado aqui um qualquer critério decisório, não se mostrando violado o princípio da legalidade previsto no artº 103º da CRP, artº 8º da LGT e artº 104º, nº2 da CRP, nem qualquer restrição do direito à dedução, com violação dos limites legalmente impostos no artº. 69º do CIRC.
O mesmo se diga quanto à invocação da circular 7/2005 de 16 de Maio. É certo que as circulares não são fonte de direito nem os tribunais a elas devem qualquer obediência, todavia, como se disse, a referência a tal circular na fundamentação do despacho em crise não assume qualquer carácter decisório, nem no despacho impugnado tal circular se apresenta como um critério decisor e que a AT tenha ponderado, por si só, na formação da sua decisão.

Não se verifica, pois, qualquer um dos vícios imputados ao despacho impugnado, improcedendo todas as conclusões das alegações formuladas pela A. na presente acção administrativa especial, a qual improcede por não provada.

A entidade demandada, na sua contestação, pediu a correcção do valor da acção para €15.000,00, nos termos do disposto no artº 34º do CPTA.
Sobre tal pedido nada disse a A..
Nos termos do disposto no artº 31º, nº1 do CPTA, “A toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido.”
Tendo em atenção os pedidos formulados nos presentes autos pela A., a utilidade económica imediata destes mostra-se representada pelo valor dos prejuízos fiscais acumulados pela CCAMCB, entidade incorporada na A., para cuja dedução aos seus lucros tributários solicitou autorização à entidade demandada.
Assim sendo, o valor do processo indicado na petição inicial está correcto (aliás, tal como hoje dispõe o artº 97º- A, nº1 –d) do CPPT).

Pelo exposto, acordam os juízes do TCAS, Secção Contencioso Tributário, 2º Juízo, em:
a) – julgar improcedente a presente acção administrativa especial e absolver a entidade demandada dos pedidos formulados;
b) – condenar a A. nas custas.

LISBOA, 09.11.11

Magda Geraldes……………………………..............

José Gomes Correia………………………………….

Joaquim Pereira Gameiro…………………………….