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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1114/16.0BELSB
Secção:CA - 2º JUÍZO
Data do Acordão:04/05/2018
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:RECLAMAÇÃO
PRAZO DE IMPUGNAÇÃO
CONTAGEM
INTEMPESTIVIDADE
Sumário:i) Na nova redacção dada pela revisão de 2015 ao artigo 58.º, n.º 2, do CPTA, a contagem do prazo de impugnação é feita nos termos do artigo 279.º do Código Civil, substituindo o critério constante da versão primitiva do Código que remetia para o “regime aplicável aos prazos para a propositura de acções que se encontram previstos no Código de Processo Civil”;
ii) Considerando que o prazo de impugnação é de três meses ou de um ano (art. 58.º, n.º 1 do CPTA), tem aplicação a regra de cálculo prevista na alínea c) do artigo 279.º do Código Civil, pela qual o prazo se conta de data a data, terminando no dia que corresponda no terceiro mês ou no ano seguinte à data do termo inicial do prazo, salvo se no último mês não existir dia correspondente, caso em que o prazo termina no último dia desse mês. Por efeito da mesma remissão para o artigo 279.º do Código Civil, o termo do prazo transfere-se para o primeiro dia útil seguinte, quando aquele coincida com domingo, dia feriado ou férias judiciais (artigo 279.º, alínea e)).
iii) A intempestividade da prática do acto processual constitui excepção dilatória (art. 89.º, n.º 4, al. k) do CPTA) e obsta ao conhecimento do mérito da causa, dando lugar à absolvição da instância (n.º 2).
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

1. Rodolfo ..... reclama para a conferência, após convolação operada pelo despacho de fls. 131-132 do recurso para o STA por si interposto, da decisão sumária do relator que julgou improcedente o seu recurso e manteve a decisão recorrida que considerou procedente a excepção dilatória insuprível de intempestividade da prática do acto processual, por ultrapassagem do prazo de 3 meses previsto no art. 58.º, nº 1, al. b), do CPTA. Concluiu a sua alegação do seguinte modo:

O Recorrido, Ministério da Administração Interna, nada disse.



Com dispensa de vistos, vem o processo agora à conferência para apreciação da reclamação deduzida.


2. Apreciando, temos que o ora Reclamante vem reclamar da decisão sumária do relator de 20.12.2017 que negou provimento ao recurso interposto da decisão do TAC de Lisboa que julgou procedente a excepção dilatória insuprível de intempestividade da prática do acto processual, por ultrapassagem do prazo de 3 meses previsto no art. 58.º, nº 1, al. b), do CPTA, e absolveu a Entidade demandada da instância.

O despacho em causa, na parte relevante, é do seguinte teor, do mesmo constando a factualidade apurada e que aqui basta para decidir a reclamação:

(…)

2. Constitui objecto do recurso apreciar se a decisão recorrida é nula por falta de fundamentação e se errou ao ter julgado procedente a excepção dilatória insuprível de intempestividade da prática do acto processual, por ultrapassagem do prazo de 3 meses previsto no art. 58.º, nº 1, al. b) do CPTA.

3. Da apreciação do mérito do recurso:

3.1. Da nulidade sentença recorrida por falta de fundamentação

Alega o Recorrente que a sentença recorrida não se monstra devidamente fundamentada.

Porém, é por demais manifesto que não tem razão.

Com efeito, não só nada vem concretizado no recurso que seja susceptível de sustentar minimamente o alegado vício, como consta da sentença recorrida a factualidade relevante, aliás em corpo autónomo, para a decisão proferida e os respectivos fundamentos. Decisão que o ora Recorrente bem compreendeu, no seu sentido e na sua motivação, como demonstra o teor da sua alegação recursória.

Donde, constando da sentença quer os fundamentos de facto, quer a motivação dos fundamentos de direito que justificam a decisão de mérito, não ocorreu a violação do disposto na al. b) do nº 1 do artigo 615.º do CPC, ex vi do artigo 1º do CPTA.

3.2. Da intempestividade da prática do acto processual

3.2.1. Dos factos

(…) consignou-se como provado o seguinte quadro factual, o qual não é sujeito a impugnação:

1. Por despacho do Director Nacional Adjunto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, de 12/08/2015, foi determinada a expulsão do autor do território nacional, bem como a sua interdição de entrada por um período de oito anos, com fundamento no facto de o mesmo se encontrar irregular em território nacional [documento de fls. 156 do processo administrativo apenso].

2. Em 29/10/2015, o autor foi notificado do despacho referido em a) [documento de fls. 158 do processo administrativo apenso].

3. A presente acção deu entrada no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa no dia 12/05/2016 [informação disponível no SITAF].

3.2.2. Do direito

Na sentença recorrida, para fundamentar a procedência da excepção, escreveu-se o seguinte:

«(…)

Nos termos do artigo 58.º, n.ºs 1 e 2, do CPTA, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n.º214-G/2015, de 2 de Outubro, “1. Salvo disposição legal em contrário, a impugnação de actos nulos não está sujeita a prazo e a de actos anuláveis tem lugar no prazo de: a) Um ano, se promovida pelo Ministério Público; b) Três meses, nos restantes casos. 2. Sem prejuízo do disposto no n.º4 do artigo 59.º, os prazos estabelecidos no número anterior contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil”.

Atenta a remissão operada pelo n.º2 do artigo 58.º do CPTA, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n.º214-G/2015, de 2 de Outubro, para a norma do artigo 279.º do Código Civil, conclui-se que o prazo de impugnação dos actos administrativos não se suspende durante as férias judiciais, ao contrário do que sucedia antes das alterações introduzidas ao CPTA pelo referido diploma legal.

Relativamente ao início dos prazos de impugnação, o artigo 59.º, n.º3, do CPTA, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n.º214-G/2015, de 2 de Outubro, estabelece o seguinte: “O prazo para a impugnação pelos destinatários a quem o acto administrativo deva ser notificado só corre a partir da data da notificação ao interessado ou ao seu mandatário, quando este tenha sido como tal constituído no procedimento, ou da data da notificação efectuada em último lugar caso ambos tenham sido notificados, ainda que o acto tenha sido objecto de publicação, mesmo que obrigatória”.

Ora, analisada a petição inicial, verifica-se que o autor não imputa ao acto impugnado qualquer vício susceptível de determinar a sua nulidade, pelo que o prazo aplicável à presente acção é o prazo de 3 meses previsto no artigo 58.º, n.º1, alínea b), do CPTA, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º214-G/2015, de 2 de Outubro.

Da factualidade provada resulta que o autor foi notificado do acto impugnado em 29/10/2015, pelo que o prazo de três meses previsto no artigo 58.º, n,º1, alínea b), do CPTA, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n.º214-G/2015, de 2 de Outubro, terminou no dia 30/01/2016.

Assim, considerando que a presente acção deu entrada no dia 12/05/2016, ou seja, quando já tinha terminado o prazo de impugnação previsto no artigo 58.º, n.º1, alínea b) do CPTA, verifica-se a excepção dilatória de intempestividade da prática do acto processual, o que obsta ao conhecimento do mérito da causa e determina a absolvição da entidade demandada da instância [artigo 89.º, n.º4, alínea k), do CPTA, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n.º214-G/2015, de 2 de Outubro, e 278.º, n.º1, alínea e) do CPC, aprovado pela Lei n.º41/2013, de 26 de Junho]».

Estatui o 58.º do CPTA, a propósito dos prazos de impugnação, o seguinte:

1 - Salvo disposição legal em contrário, a impugnação de atos nulos não está sujeita a prazo e a de atos anuláveis tem lugar no prazo de:

a) Um ano, se promovida pelo Ministério Público;

b) Três meses, nos restantes casos.

2 - Sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 59.º, os prazos estabelecidos no número anterior contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil.

3 - A impugnação é admitida, para além do prazo previsto na alínea b) do n.º 1:

a) Nas situações em que ocorra justo impedimento, nos termos previstos na lei processual civil;

b) No prazo de três meses, contado da data da cessação do erro, quando se demonstre, com respeito pelo contraditório, que, no caso concreto, a tempestiva apresentação da petição não era exigível a um cidadão normalmente diligente, em virtude de a conduta da Administração ter induzido o interessado em erro; ou

c) Quando, não tendo ainda decorrido um ano sobre a data da prática do ato ou da sua publicação, quando obrigatória, o atraso deva ser considerado desculpável, atendendo à ambiguidade do quadro normativo aplicável ou às dificuldades que, no caso concreto, se colocavam quanto à identificação do ato impugnável, ou à sua qualificação como ato administrativo ou como norma.

Deste normativo legal resulta que o prazo dentro do qual a anulação pode ser pedida no âmbito das acções comuns de impugnação de actos administrativos é de três meses, estabelecendo-se o prazo de um ano quando a impugnação é deduzida pelo Ministério Público.

E o dito prazo de 3 meses encontra-se largamente transcorrido.

O equívoco do Recorrente assenta nisto: na nova redacção dada pela revisão de 2015, o n.º 2 manda contar o prazo de impugnação nos termos do artigo 279.º do Código Civil, substituindo o critério que provinha da versão primitiva do Código, que remetia para o "regime aplicável aos·prazos para a propositura de acções que se encontram previstos no Código de Processo Civil". Então, a remissão para o CPC era entendida como sendo feita para o artigo 144.º, n.º 4, do CPC, a que corresponde o actual artigo 138.º, n.º 4, e dela resultava a sujeição à regra da continuidade dos prazos e à sua suspensão em férias judiciais (“salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de actos a praticarem processo que a lei considere urgentes”). A suspensão do prazo nas férias judiciais era, assim, aplicável ao prazo geral de impugnação, de três meses, e só o prazo mais longo, de um ano, se contava continuamente. No novo regime do n.º 2, ambos os prazos se contam de forma contínua, sem suspensão em férias judiciais.

Considerando que o prazo de impugnação é de três meses ou de um ano, tem aplicação a regra de cálculo prevista na alínea c) do artigo 279.º do Código Civil, pela qual o prazo se conta de data a data, terminando no dia que corresponda no terceiro mês ou no ano seguinte à data do termo inicial do prazo, salvo se no último mês não existir dia correspondente, caso em que o prazo termina no último dia desse mês.

Por efeito da mesma remissão para o artigo 279.º do Código Civil, o termo do prazo transfere-se para o primeiro dia útil seguinte, quando aquele coincida com domingo, dia feriado ou férias judiciais (artigo 279.º, alínea e)).

Pelo que, considerando a explicitação efectuada, facilmente se alcança, tendo presente o probatório fixado, que a acção foi proposta extemporaneamente.

Assim sendo, deverá ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional e confirmada a decisão recorrida, a qual não padece do erro de julgamento que lhe vem apontado.”

O assim decidido é de manter.

Com efeito, da factualidade provada resulta que o autor foi notificado do acto impugnado em 29.10.2015, pelo que o prazo de três meses previsto no artigo 58.º, n.º 1, alínea b), do CPTA, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n.º 214-G/2015, de 2 de Outubro, terminou no dia 30.01.2016.

Assim, considerando que a presente acção deu entrada no dia 12.05.2016, ou seja, quando já tinha terminado o prazo de impugnação previsto no artigo 58.º, n.º 1, alínea b) do CPTA, verifica-se a excepção dilatória de intempestividade da prática do acto processual, o que obsta ao conhecimento do mérito da causa e determina a absolvição da entidade demandada da instância (artigo 89.º, n.º 4, alínea k), do CPTA, com as alterações introduzidas pelo Decreto-lei n.º 214-G/2015, de 2 de Outubro, e 278.º, n.º1, alínea e) do CPC, aprovado pela Lei n.º41/2013, de 26 de Junho). Sendo que, como assinalado na decisão reclamada, na nova redacção dada pela revisão de 2015 ao art. 58.º, n.º 2, do CPTA, a contagem do prazo de impugnação é feita nos termos do artigo 279.º do Código Civil, substituindo o critério que provinha da versão primitiva do Código que remetia para o “regime aplicável aos prazos para a propositura de acções que se encontram previstos no Código de Processo Civil” (a remissão para o CPC era entendida como sendo feita para o artigo 144.º, n.º 4, do CPC, a que corresponde o actual artigo 138.º, n.º 4). Donde, perante o prazo de impugnação de três meses (ou de um ano), aplica-se a regra de cálculo prevista na alínea c) do artigo 279.º do Código Civil, pela qual o prazo se conta de data a data, terminando no dia que corresponda no terceiro mês ou no ano seguinte à data do termo inicial do prazo, salvo se no último mês não existir dia correspondente, caso em que o prazo termina no último dia desse mês.

Perante este quadro legal, tendo presente o probatório fixado, é incontornável que a acção foi proposta extemporaneamente.

E procedendo a aludida excepção não haveria, como não há, que entrar no conhecimento do mérito da causa.

Pelo que, nada mais importando apreciar, na improcedência da presente reclamação, terá que manter-se a decisão do relator.



3. Sumariando:

i) Na nova redacção dada pela revisão de 2015 ao artigo 58.º, n.º 2, do CPTA, a contagem do prazo de impugnação é feita nos termos do artigo 279.º do Código Civil, substituindo o critério constante da versão primitiva do Código que remetia para o “regime aplicável aos prazos para a propositura de acções que se encontram previstos no Código de Processo Civil”;

ii) Considerando que o prazo de impugnação é de três meses ou de um ano (art. 58.º, n.º 1 do CPTA), tem aplicação a regra de cálculo prevista na alínea c) do artigo 279.º do Código Civil, pela qual o prazo se conta de data a data, terminando no dia que corresponda no terceiro mês ou no ano seguinte à data do termo inicial do prazo, salvo se no último mês não existir dia correspondente, caso em que o prazo termina no último dia desse mês. Por efeito da mesma remissão para o artigo 279.º do Código Civil, o termo do prazo transfere-se para o primeiro dia útil seguinte, quando aquele coincida com domingo, dia feriado ou férias judiciais (artigo 279.º, alínea e)).

iii) A intempestividade da prática do acto processual constitui excepção dilatória (art. 89.º, n.º 4, al. k) do CPTA) e obsta ao conhecimento do mérito da causa, dando lugar à absolvição da instância (n.º 2).



4. Face ao exposto, acorda-se em indeferir a reclamação, confirmando-se a decisão sumária do relator.

Custas a cargo do Reclamante, fixando-se a taxa de justiça devida em 2 UC (art. 7.º e Tabela II, A, do RCP), sem prejuízo do benefício de apoio judiciário concedido.

Lisboa, 5 de Abril de 2018



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Pedro Marchão Marques


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Maria Helena Canelas


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Cristina Santos