Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2840/17.2BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:05/23/2019
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:PROCEDIMENTOS DE MASSA
CITAÇÃO
COMPETÊNCIA
CONCURSO
PSP
INTERPRETAÇÃO JURÍDICA
Sumário:i) De acordo com o art. 81.º, nº 6, do CPTA “[q]uando esteja em causa a impugnação de um ato administrativo que tenha sido publicado, a publicação do anúncio mencionado no número anterior faz-se, sem prejuízo de outros meios de publicitação, pelo meio e no local utilizados para dar publicidade ao ato impugnado, e, se o ato não tiver sido objeto de publicação, o anúncio é publicado em dois jornais diários de circulação nacional ou local, dependendo do âmbito da matéria em causa”.

ii) Ao realizar a citação mediante a publicação de anúncio na 2.ª série do Diário da República, o tribunal a quo adoptou o mesmo meio e local utilizados para publicitar o acto impugnado - despacho de nomeação publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 201, de 18 de Outubro de 2017, posteriormente rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 776/2017, publicada no Diário da República, 2.ª Série, n.º 216, de 9 de Novembro de 2017 -, dando assim cumprimento ao disposto nos n.ºs. 5 e 6 do artigo 81.º do CPTA.

iii) A cláusula de salvaguarda prevista no art. 148.º do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de Outubro, alterado pela Lei n.º 114/2017, de 29 de Dezembro (aprova o estatuto profissional do pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública), constitui um limite de garantia de acesso por parte dos mesmos, significando que a este pessoal – os oficiais de carreira - corresponde um contingente de um terço das vagas colocadas a concurso de promoção para as categorias de comissário e subintendente. Os restantes dois terços ficam consignados aos Oficiais titulares do CFOP (Curso de Licenciatura ou Mestrado em Ciências Policiais).
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

Bruno ..............., contra-interessado nos autos, e Ministério da Administração Interna, demandado nos autos, interpuseram recurso jurisdicional da sentença de 14.05.2018 do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que julgou procedente a acção administrativa urgente de contencioso de procedimentos de massa intentada pelos AA., melhor identificados nos autos, contra o Ministério da Administração Interna e contra-interessados, pugnando os AA. pelo reconhecimento dos seus direitos de promoção e nomeação na categoria de comissário da carreira especial de oficial de polícia.

Por decisão do Tribunal a quo, determinou-se:

(i) Reconhecer o direito de promoção e nomeação dos AA. António ..............., Manuel ..............., Manuel ..............., Jacinto ..............., Eduardo ..............., Abel ..............., Joaquina ..............., José ..............., Francisco ..............., Luís ..............., António ..............., Fernando ..............., José ..............., João ..............., Jorge ..............., João ..............., Manuel ..............., José ..............., António ..............., Luís ..............., Adão ..............., Armindo ..............., Francisco ..............., Carlos ..............., António ..............., Agostinho ..............., António ..............., Luís ..............., Jorge ..............., António ..............., Luís ..............., Manuel ............... e Justino ............... na categoria de comissário da carreira especial de oficial de polícia, em face do desfecho do procedimento concursal n.º 03/2016 aberto pelo R. Ministério da Administração Interna;

(ii) Anular o despacho proferido pelo Senhor Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, em 02.10.2017, na parte em que nomeou na categoria de comissários os profissionais de polícia elencados na lista de nomeações entre os 61.º e 179.º lugares; e

(iii) Condenar o R. Ministério da Administração Interna à prática dos actos que se mostrem devidos por força das decisões que antecedem, com efeitos retroagidos à data em que os AA. deveriam ter sido promovidos e nomeados.

Bruno ..............., na qualidade de contra-interessado, notificado da douta sentença, apresentou requerimento arguindo a nulidade da citação realizada no âmbito dos presentes autos. Por despacho de 14.06.2018 foi indeferida a nulidade processual arguida, considerando que a citação havia sido regularmente efectuada, inexistindo a omissão de qualquer formalidade imposta por lei aquando da prática de tal acto, nomeadamente a citação ser efectuada através de aviso publicado em Ordem de Serviço, nos termos conjugados do art. 81º, nº 6 do CPTA e do art. 22º da Portaria nº 1522-A/2002, de 20.12, aplicável ex vi artigo 26º deste mesmo normativo.

Inconformado com a decisão de 14.06.2018, veio recorrer apresentando alegações que culminam com as seguintes conclusões:

1. Vem o presente recurso interposto do douto despacho proferido em 14/06/2018, na parte em que indeferiu a nulidade arguida pelo Recorrente, em requerimento apresentado em 22/05/2018.

2. A presente acção foi instaurada com vista à impugnação do despacho proferido pelo Senhor Director-Nacional da Polícia de Segurança Pública, através do qual nomeou 179 Subcomissários na categoria de Comissário, na parte relativa aos Subcomissários colocados entre o 61.º e 179.º lugares.

3. O acto de promoção visado por esta acção foi praticado na sequência de procedimento concursal destinado precisamente ao preenchimento de tais lugares do quadro do pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública.

4. Não se integrando, é certo, no procedimento concursal propriamente dito, o acto de promoção tem aquele como seu pressuposto prévio e necessário.

5. Estando em causa a impugnação de um acto que teve como pressuposto prévio e indissociável um procedimento concursal em que todas as notificações foram feitas através de publicação em Ordem de Serviço, afigura-se ao Recorrente que, estando em causa uma acção judicial que, na prática, conduzirá à destruição de alguns dos efeitos desse procedimento, não poderia deixar de se observar, na citação dos Contra-interessados, a forma de publicidade utilizada no âmbito de tal Concurso – publicação em Ordem de Serviço.

6. Uma tal conclusão não é minimamente beliscada pela ratio legis subjacente à previsão dos n.º 5 e 6 do art. 81.º do Cód. Proc. Tribunais Administrativos, que foi a de dar resposta a exigências de celeridade processual.

7. A acrescer ao exposto, notórias e fundadas razões de efectiva tutela jurisdicional dos interesses dos administrados sempre levariam a igual conclusão. Na realidade, não pode deixar de se recordar que o fim último da citação é dar a conhecer aos interessados num processo judicial a pendência do mesmo, de modo a que nele possam intervir, exercendo cabalmente o seu direito de defesa.

8. A interpretação das normas do art. 81.º, n.º 5 e 6 do Cód. Proc. Tribunais Administrativos contida na douta decisão recorrida sempre seria materialmente inconstitucional, por contender frontalmente com o direito constitucional à tutela jurisdicional efectivo, previsto no art. 20.º, n.º 1, 2, 3, 4 e 5 da Constituição da República Portuguesa.

9. Invoca-se expressamente essa inconstitucionalidade, para os devidos efeitos.

10. Em jeito de conclusão, dir-se-á que o Tribunal recorrido procedeu a uma interpretação excessivamente literal do texto das normas dos n.º 5 e 6 do art. 81.º do Cód. Proc. Tribunais Administrativos.

11. A interpretação jurídica, contudo, deve considerar não só o elemento literal mas, sobretudo (e entre outros), o elemento teleológico, tal como recorrentemente afirmou Castanheira Neves, nas suas Lições de Introdução ao Direito na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, como o fez o Supremo Tribunal Administrativo, no seu Douto Acórdão de 29/11/2011 (www.dgsi.pt, proc. 0701/10).

12. A a teleologia subjacente à previsão das normas dos n.º 5 e 6 do art. 81.º do Cód. Proc. Tribunais Administrativos é permitir uma efectiva divulgação da pendência de um processo judicial, de molde a permitir aos administrados que nele tenham qualquer interesse intervir no mesmo, salvaguardando os seus direitos.

13. Considerando a forma de publicação utilizada no âmbito do procedimento concursal que foi pressuposto prévio e necessário do acto impugnado (publicação em Ordem de Serviço), o douto despacho recorrido, ao julgar improcedente a nulidade invocada pelo Recorrente, com fundamento na suficiência da publicação na 2.ª Série do Diário da República, violou as disposições dos n.º 5 e 6 do art 81.º do Cód. Proc. Tribunais Administrativos.

14. Deve, pois, revogar-se o douto despacho recorrido, proferindo-se, em sua substituição, Douto Acórdão que julgue procedente a nulidade invocada pelo Recorrente, com a consequente (i) anulação de todos os actos processuais processuais praticados nos autos, salvando-se apenas a petição inicial e (ii) realização de citação dos contra-interessados, através de publicação em Ordem de Serviço Interna da Polícia de Segurança Pública.

Pelos recorridos Agostinho ............... e outros foram apresentadas contra-alegações neste recurso, com as seguintes conclusões:

(A) As exigências que a citação dos Contrainteressados tem de observar, neste e em qualquer outro processo administrativo, qualquer que seja a natureza do ato impugnado e do procedimento administrativo prévio a que respeite, são, apenas e só, as previstas nos n.ºs 5 e 6 do artigo 81.º do CPTA.

(B) O Tribunal, em face de tais preceitos, não estava obrigado a realizar a citação dos Contrainteressados mediante publicitação em Ordem de Serviço da PSP.

(C) Ao realizar tal citação mediante a publicação de anúncio na 2.ª série do Diário da República, o Tribunal utilizou e seguiu o mesmo meio e local utilizados para publicitar o ato impugnado.

Ou seja,

(D) Deu cumprimento ao disposto nos n.ºs. 5 e 6 do artigo 81.º do CPTA, nos seus exatos e precisos termos.

(E) Bem andou, pois, o despacho recorrido ao negar provimento à nulidade arguida pelo Recorrente, alegadamente decorrente da falta de publicação da citação dos Contrainteressados em Ordem de Serviço da Polícia de Segurança Pública (PSP).

(F) A referida citação dos Contrainteressados, por anúncio publicado na 2.ª série do Diário da República, garante o efetivo conhecimento de tal ato pelos respetivos destinatários.

(G) E não viola, consequentemente, o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º da CRP.

(H) A decisão recorrida não enferma, pois, de tal vício, nem de qualquer outro suscetível de determinar a sua invalidade.

O mesmo Bruno ............... apresentou alegações de recurso no que concerne à sentença proferida nos presentes autos, as quais culminam com as seguintes conclusões:

1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos, na parte em que, julgando procedente a acção, reconheceu o direito à promoção e nomeação dos Autores, anulou o despacho de 02/10/2017, do Senhor Director-Nacional da PSP, identificado nos autos, e condenou o Réu MAI na prática dos actos devidos por força dessas decisões.

2. Para uma cabal compreensão e interpretação da disposição do n.º 1 do art. 148.º do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de Outubro, não poderá deixar de ser feito um breve enquadramento a respeito das razões que estiveram por detrás da sua previsão, nomeadamente, ao nível histórico, através de análise às disposições legais que a precederam, e ao nível teleológico, procurando-se aferir as razões que estiveram na génese da previsão de tal solução legal.

3. No caso dos autos está em causa um concurso para colocação no posto de Comissário, da carreira de Oficial de Polícia, o que significa que está em causa o preenchimento de lugares no quadro das estruturas de direcção, coordenação e comando da Polícia de Segurança Pública.

4. Foi intenção do legislador dos Estatutos da PSP de 1999, 2009 e 2015 assegurar uma maior preparação, instrução e, por inerência, qualidade no serviço prestado por Oficiais de Polícia.

5. Essa intenção foi corporizada pela instituição como requisito de acesso à carreira de oficial de polícia da titularidade de curso superior (licenciatura) em Ciências Policiais, ministrado pelo Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna.

6. O legislador quis assegurar que os postos de direcção e comando da estrutura da PSP são ocupados por oficiais com formação superior, na medida em que, teoricamente, conseguir-se-á melhorar a prestação das estruturas de direcção e comando e assegurar a prestação de um serviço melhor aos cidadãos.

7. Com a criação dessa solução legal, contudo, o legislador procurou acautelar a posição de todos os profissionais que, não sendo titulares de curso superior, já estavam integrados na carreira de oficial de polícia – o que foi prosseguido através da previsão de “cláusulas de salvaguarda”, nos diversos Estatutos da PSP.

8. No Estatuto de 1999, o o legislador não visou introduzir limites mínimos para Oficiais de carreira, nos concursos de pessoal, mas reservar, dentre as vagas existentes, no quadro de pessoal da PSP, para a carreira de Subintendente, uma terça parte era reservada aos Oficiais de Carreira e duas terças partes eram atribuídas aos Oficiais titulares de licenciatura em Ciências Policiais (O chamado CFOP – Curso de Formação de Oficiais de Polícia).

9. O Estatuto de 2009 manteve-se fiel a esse propósito, com uma única alteração: alargou a cláusula de salvaguarda de um terço dos postos de trabalho do mapa de pessoal ao posto de comissário, da carreira de Oficial de Polícia.

10. Perante a redacção do art. 115.º do Estatuto da PSP aprovado pelo Decreto-Lei n.º 299/2009, de 14 de Outubro – que obteve consagração no actual Estatuto da PSP aprovado pelo Decreto-Lei n.º 243/2015, de 20 de Outubro -, é legítimo concluir que a PSP, em cada concurso pessoal, deveria abrir vagas de modo a assegurar que um terço dos postos existentes no seu mapa de pessoal a cada momento, nas categorias de comissário e subintendente, eram ocupados por oficiais de carreira; mas também de modo a assegurar que os restantes dois terços dos postos existentes no seu mapa de pessoal, nas categorias de comissário e subintendente, eram ocupados por oficiais com licenciatura/mestrado em Ciências Policiais (CFOP) ministrado pelo Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna (ISCPSI).

11. O Estatuto de 2015 manteve o propósito de melhorar o serviço prestado pela PSP e, por outro lado, procurou salvaguardar o direito à progressão na carreira dos Oficiais que não contribuíam de forma tão relevante para esse objectivo (os Oficiais de carreira).

12. A acrescer, procurou-se simplificar o método de cômputo dos lugares destinados a Oficiais de carreira, já que a anterior redacção, ao referir-se ao número de lugares no quadro de pessoal, obrigaria, numa interpretação rigorosa, a apurar o número de lugares já ocupados por esses oficiais e a atribuir aos Oficiais de carreira, em sede concursal, o número de lugares necessários para atingir esse limite (que poderiam ser todos, alguns ou até nenhum).

13. A actual redacção, ao referir-se ao número de vagas postas as concurso, veio simplificar claramente esse procedimento de cálculo e reduzir a burocracia que decorreria de uma interpretação rigorosa da lei – indo, além do mais, ao encontro daquela que já era a prática adoptada pela Direcção-Nacional da PSP, mesmo na vigência dos anteriores Estatutos.

14. É perante este quadro histórico e teleológico que se terá de escrutinar a douta sentença recorrida, de modo aferir se a interpretação nela contida se mantém fiel ao propósito do legislador de aumentar o nível de formação das estruturas dirigentes da PSP e de, nesse contexto, salvaguardar os direitos dos mais “desprotegidos” (no caso, os Oficiais de carreira).

15. E a resposta a tal questão não poderá deixar de ser negativa, ou seja, a decisão recorrida distorceu e subverteu o propósito do legislador, desvirtuando o texto da lei.

16. Basta pensar que, caso se aderisse à tese da decisão recorrida, estar-se-ia a originar que os Oficiais de carreira tivessem uma posição de privilégio, face aos Oficiais titulares do CFOP, na ocupação de lugares no posto de Comissário. Com efeito, caso se aderisse a tal tese, os Oficiais de carreira teriam salvaguardado um terço das vagas postas a concurso, ao passo que os Oficiais de carreira concorreriam, em igualdade de circunstâncias com os Oficiais titulares do CFOP, no preenchimento dos restantes dois terços das vagas.

17. Assim, em lugar de se prosseguir com o propósito visado pelo legislador de atribuir predominância a Oficiais titulares do CFOP no preenchimento de vagas nos cargos dirigentes da PSP – melhorando-se o grau de qualidade do serviço prestado -, estar- se-ia a prosseguir um efeito contrário.

18. A interpretação contida na decisão recorrida abre a porta a que a maioria dos lugares nos postos de comissário da carreira de Oficial de Polícia fossem ocupados por Oficiais de carreira, em lugar da sua ocupação por Oficiais titulares de CFOP (que são cientificamente melhor preparados).

19. Como resulta da resenha histórica feita em parte prévia desta alegação, esse resultado foi tudo o que o legislador quis evitar com a sucessiva previsão de cláusulas de salvaguarda para Oficiais de carreira, nos Estatutos da PSP de 1999, 2009 e 2015.

20. Assim, a interpretação que melhor se coaduna com tais objectivos é a de que a cláusula de salvaguarda visou reservar (como resulta cristalinamente do texto da lei) um terço dos lugares postos a concurso a Oficiais de carreira e os restantes dois terços a Oficiais titulares do CFOP.

21. Os “Oficiais de carreira” estão já duplamente protegidos, no Estatuto de 2015, seja pela reserva de um terço de lugares postos a concurso, previstos no art. 148.º, n.º 1, seja pela possibilidade de promoção automática, pela antiguidade, prevista no n.º 2 dessa norma.

22. Ao decidir como decidiu, a douta sentença recorrida violou, além de outras, a disposição do art. 148.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de Outubro.

23. Deve, pois, ser revogada e substituída por Douto Acórdão que julgue a acção totalmente improcedente, por não provada, absolvendo o Réu dos pedidos contra eles formulados.

O Ministério da Administração Interna recorre da sentença, apresentando as alegações de recurso que culminam com as seguintes conclusões:

I. A douta sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa enferma de erro de direito, porquanto contém errada interpretação do n.º 1 do artigo 148.º do Estatuto do Pessoal com Funções Policiais da PSP (EPPSP), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro.

II. Para análise da questão sub judicio e que se resume à interpretação da referida norma, importa observar a evolução dos diplomas de que foi objeto.

III. Assim, até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 511/99, de 24 de novembro, o acesso à carreira de Oficiais de Polícia podia fazer-se por simples progressão na carreira e mediante a frequência de Curso de Preparação, não equiparável a licenciatura.

IV. Do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 511/99, de 24 de novembro que aprovou um novo Estatuto do Pessoal com Funções Policiais constava: "É, portanto, considerando o quadro constitucional e legal vigente e no cumprimento do Programa do XI// Governo Constitucional -onde, no que releva para este efeito, consta a prossecução do objetivo de modernização dos estatutos das forças de segurança, como forma de prosseguir a melhoria dos serviços de segurança a proporcionar aos cidadãos-, que se dá, agora, outro importante impulso na modernização da Polícia de Segurança Pública, através do presente diploma, que vem aprovar, para o pessoal com funções policiais, um novo estatuto, regime de carreiras e sistema retributivo."

V. No seu artigo 22.º, este último diploma, sem o referir de forma expressa, veio extinguir a carreira do pessoal oriundo do curso de promoção a chefe de esquadra, ainda existente no Estatuto aprovado pelo Decreto- Lei n.º 321/94, de 29 de dezembro (artigo 67.º, n.º 2), passando a exigir, para o efeito, licenciatura adequada ministrada no Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna, na senda do "impulso na modernização da Polícia de Segurança Pública" referido no respetivo preâmbulo.

VI. No entanto, de forma transitória (artigo 7.º preambular ao Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n.º 511/99, de 24 de novembro), veio permitir a existência de cursos de formação para aqueles oficiais durante o período de cinco anos, bem como a salvaguarda da normal progressão na carreira dos oficiais de polícia não possuidores de licenciatura ministrada pelo Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna, reservando-lhe um terço das vagas existentes no posto de subintendente.

VII. Essa norma só poderia significar que um terço das vagas era destinada a Oficiais de Carreira e dois terços das vagas eram atribuídas aos Oficiais titulares do CFOP - Curso de Formação de Oficiais de Polícia, apostando o legislador na melhor formação para cumprir o objetivo de melhoria dos serviços de segurança.

VIII. Constatando-se a existência de lacuna quanto ao posto de comissário, veio o Decreto-Lei n.º 173/2000, de 9 de agosto, estabelecer, por remissão, igual reserva para os comissários.

IX. Posteriormente, o Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n.º 299/2009, de 14 de outubro, continuou a condicionar o acesso à carreira de Oficial de Polícia aos titulares de curso de mestrado ou licenciatura em Ciências Policiais, reservando, porém, um terço dos postos de trabalho existentes a cada momento, nos postos de comissário e subintendente.

X. O Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro) refere no preâmbulo que "(...) salvaguardando-se na íntegra as exigências de ingresso na carreira de oficial de polícia (2) permite-se que os oficiais não habilitados com o curso de formação de oficiais de polícia, que constituem atualmente um grupo reduzido e perfeitamente delimitado, possam progredir normalmente na carreira." [(2) Sublinhado da nossa responsabilidade.]

XI. Ou seja, o legislador prosseguiu na intenção de dotar a Polícia de Segurança Pública de Oficiais mais qualificados, visando a melhoria da qualidade de serviço, reportando, no entanto, a regra do terço de vagas destinadas aos Oficiais de carreira às vagas a colocadas a concurso em vez das vagas do quadro de pessoal, simplificando deste modo os cálculos a efetuar.

XII. Feita a análise histórica da norma sob escrutínio na presente ação, há que concluir que o legislador pretendeu salvaguardar a possibilidade de aqueles que não estivessem habilitados com o CGOP - que passou a ser exigida para ingresso na carreira, nos termos do artigo 85.º do Estatuto do Pessoal da PSP - pudessem ainda progredir na carreira.

XIII. Ao assim consagrar, não podia o legislador inverter totalmente o regime geral, ao ponto de coartar o direito de progressão na carreira dos profissionais de polícia que frequentaram o CFOP e ingressaram diretamente na carreira de Oficial de Polícia como Subcomissários.

XIV. O entendimento da douta sentença recorrida conduz a que a cláusula de salvaguarda se transforme em regime regra, criando uma situação em que o regime regra é que necessita proteção, invertendo os termos da equação.

XV. De facto, a ser como decidido, os Oficiais de carreira concorreriam em igualdade de condições com os Oficiais titulares de CFOP, ocupando a maioria dos lugares de Comissário da carreira de Oficial de Polícia.

XVI. Coartando, também o objetivo reiterado nos sucessivos Estatutos de modernização e melhora da qualidade do serviço prestado pela PSP.

XVII. Pelo que a cláusula de salvaguarda constante do n.º 1 do artigo 148.º do EPPSP tem que ser lida como reservando um terço das vagas postas a concurso para Subcomissários não detentores de CFOP e dois terços das vagas para Oficiais titulares dessa habilitação, porquanto,

XVIII. De outro modo estariam a ser privilegiados os primeiros de forma não justificável, tanto mais quanto os mesmos têm ainda ao seu dispor a possibilidade de serem promovidos por antiguidade, desde que detenham mais se 12 anos de antiguidade, nos termos do n.º 2 do artigo 148.º do EPPSP, possibilidade que não se verifica relativamente aos Oficiais titulares de CFOP.

XIX. Nestas condições, a douta sentença recorrida padece de erro de julgamento.

XX. Nessa medida deve ser anulada a douta sentença proferida nos autos pelo Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa.

Os recorridos Agostinho ............... e Outros apresentaram contra-alegações que, pugnando pela manutenção da sentença, culminam com as seguintes conclusões:

(A) O preceito constante do n.º 1 do artigo 148.º do EPPSP, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro, é uma norma transitória que visa salvaguardar a normal progressão na carreira dos polícias, integrados na carreira de oficial de polícia, não habilitados com o CFOP.

(B) Tal salvaguarda, para efeitos de promoção à categoria de comissário, é efetivada pela reserva de um terço das vagas colocadas a concurso para acesso àquela categoria profissional.

(C) Tal reserva, de um terço, constitui um limite mínimo, e não máximo, das promoções a efetuar para a referida categoria profissional, tendo por base a lista unitária de ordenação final, devidamente homologada, do respetivo procedimento concursal.

(D) Esta interpretação, acolhida pela sentença recorrida, é a única que se mostra conforme às regras consagradas no artigo 9.º do CC.

(E) Pelo que a decisão recorrida só poderia deferir, como deferiu, os pedidos deduzidos na presente ação, a saber:

a) O reconhecimento dos direitos de promoção e nomeação dos Recorridos – subcomissários não habilitados com o CFOP posicionados, na lista de ordenação final do procedimento concursal n.º 03/2016, entre os 61.º e 179.º lugares - na categoria de comissário da carreira especial de oficial de polícia;

b) A anulação do despacho do Diretor Nacional da PSP, de 2 de outubro de 2017, na parte em que nomeou, na referida categoria de comissário, os profissionais de polícia elencados, na lista de nomeações, entre os 61.º e 179.º lugares;

c) A condenação do MAI à prática dos atos que se mostrem devidos por força das decisões antecedentes, com efeitos retroagidos à data em que os Recorridos deveriam ter sido promovidos e nomeados na categoria de comissário da carreira especial de oficial de polícia.

(F) A sentença recorrida não enferma, assim, de qualquer erro de julgamento.



Neste Tribunal Central Administrativo, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 146.º do CPTA, pronunciou-se no sentido de ser negado provimento aos recursos.


Com dispensa dos vistos legais, atento o carácter urgente, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Administrativo para decisão.


I. 1. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pelos Recorrentes, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em saber:

- Se o tribunal a quo errou ao julgar regularmente citado o ora Contra-interessado recorrente;

- Se o tribunal a quo errou no julgamento de direito na interpretação que fez do n.º 1 do artigo 148.º do EPPSP, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de Outubro.



II. Fundamentação

II.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a qual se reproduz ipsis verbis:

1. Em 25.11.2016, foi proferido despacho conjunto pelos Senhores Ministro das Finanças e Ministra da Administração Interna, autorizando a promoção de 1050 elementos policiais da PSP, com um limite de 204 vagas para a categoria de comissário (cf. cópia do despacho n.º 14841/2016 publicado em Diário da República, 2.ª Série, de 09.12.2016, constante do processo administrativo apenso, documento que se dá por integralmente reproduzido).

2. Em 31.20.2016, a Direcção Nacional da PSP emitiu um aviso com referência ao procedimento concursal n.º 03/2016, publicitando a abertura de “concurso interno de acesso para preenchimento de 179 lugares na carreira de oficial da PSP e da categoria de comissário do mapa do pessoal com funções policiais da PSP, um terço dos quais reservados a subcomissários não habilitados com o Curso de Formação de Oficiais de Polícia (CFOP) (art.º 148.º, n.º 1 do EPPSP, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 243/2015 de 19 de outubro), autorizado por despacho n.º 14841/2016” (cf. cópia do aviso constante do processo administrativo apenso, documento que se dá por integralmente reproduzido).

3. Em 02.10.2017, o Senhor Director Nacional da PSP proferiu despacho homologatório da lista de ordenação final dos candidatos aprovados no âmbito do procedimento concursal referido no ponto anterior, no âmbito da qual os ora AA. foram ordenados entre os 61.º e o 175.º lugares (cf. lista de ordenação final constante do processo administrativo apenso, bem como o despacho aí exarado, documento que se dá por integralmente reproduzido).

4. Em 02.10.2017, o Senhor Director Nacional da PSP proferiu despacho a determinar a nomeação de 179 subcomissários na categoria de comissários, entre os quais não constam os AA. (cf. informação junta enquanto “doc. 7” ao processo administrativo apenso, bem como o despacho aí exarado, documento que se dá por integralmente reproduzido).

5. Em 18.10.2017, a nomeação a que se alude no ponto anterior foi publicada em Diário da República, 2.ª série (cf. cópia do Despacho (extracto) n.º 9163/2017 junta enquanto “doc. 4” ao processo administrativo apenso, documento que se dá por integralmente reproduzido).

6. Os primeiros 60 classificados constantes da lista referida em 3. não se encontram habilitados com Curso de Formação de Oficiais de Polícia (facto admitido por acordo, cf. artigo 83.º da p.i. e artigos 25.º e 26.º da contestação).

7. Os candidatos referidos no ponto anterior foram nomeados na categoria de comissário da carreira especial de oficial de polícia (facto admitido por acordo, cf. artigo 83.º da p.i. e artigos 25.º e 26.º da contestação).

8. Os restantes 119 candidatos nomeados na categoria de comissário da carreira especial de oficial de polícia encontram-se habilitados com Curso de Formação de Oficiais de Polícia (facto admitido por acordo, cf. artigo 83.º da p.i. e artigo 25.º da contestação).

9. Nenhum dos AA. se encontra habilitado com Curso de Formação de Oficiais de Polícia (facto admitido por acordo, cf. artigo 83.º da p.i. e artigo 27.º da contestação).

A prova dos factos fixados supra assenta nas alegações produzidas pelas partes, bem como no teor dos documentos juntos aos autos, conforme referido a respeito de cada facto.

Nada mais foi provado com interesse para a decisão da causa.



II.2. De direito

II.2.1. Do mérito do recurso do despacho interlocutório

Bruno ..............., contra-interessado nos autos, veio recorrer do despacho do TAC de Lisboa que o julgou devidamente citado, indeferindo a arguida nulidade da sua citação.

Alega o aqui Recorrente que o Tribunal recorrido procedeu a uma interpretação excessivamente literal do texto das normas dos n.º 5 e 6 do art. 81.º do CPTA, sendo essa interpretação materialmente inconstitucional por contender frontalmente com o direito constitucional à tutela jurisdicional efectivo, previsto no art. 20.º, da Constituição da República Portuguesa.

Comece por se referir que as nulidades de processo, importando a anulação do processado, são desvios do formalismo processual: prática de um acto proibido, omissão de um acto prescrito na lei e a realização de um acto imposto ou permitido por lei, mas sem o formalismo requerido. Sendo que a não citação do réu implica a nulidade do processado posterior (art. 187.º do CPC), desde que a falta não se encontre sanada. A situações de falta de citação vêm previstas nas diversas alíneas do nº 1 do art. 188.º do CPC.

A nulidade derivada da falta da citação (nulidade principal) deve ser arguida com a primeira intervenção no processo, em qualquer estado do processo, enquanto não deva considerar-se sanada (art.s 189.º e 198.º do CPC). Como dispõe o art. 189º do CPC: “[s]e o réu ou o Ministério Público intervier no processo sem arguir logo a falta da sua citação, considera-se sanada a nulidade".

Ora, compulsados os autos verifica-se que o ora Recorrente não teve anterior intervenção no processo, tendo a arguição da nulidade em causa sido efectuada junto do TCA de Lisboa precisamente na primeira intervenção processual (e em que, subsidiariamente, logo interpôs recurso da sentença).

Assim, nada impede o conhecimento por este tribunal ad quem do presente recurso.

Vejamos o despacho do Mmo. juiz a quo na sua parte aqui relevante:

“(…) indica que terá tomado agora conhecimento de que a citação dos contra-interessados foi feita mediante publicação em Diário da República mas que, contudo, a referida citação deveria também ter sido efectuada através de aviso publicado em Ordem de Serviço, nos termos conjugados do artigo 81.º, n.º 6, do CPTA e do artigo 22.º da Portaria n.º 1522-A/2002, de 20.12, aplicável ex vi artigo 26.º deste mesmo normativo.

Entende, assim, que no acto de citação foi omitida uma formalidade cuja observância era imposta por lei, a qual se revela passível de influir na decisão da causa, circunstância que dá, então, corpo a uma nulidade processual, com a consequente nulidade de todo o processado, nos termos conjugados dos artigos 187.º, alínea a), e 195.º, n.º 1, ambos do CPC.

Pugna, a final, pela procedência da nulidade invocada, com a anulação de todos os actos processuais praticados após a apresentação da petição inicial e a citação dos contra-interessados através de publicação em Ordem de Serviço Interna da Polícia de Segurança Pública (“PSP”).

Instados os AA. a, querendo, pronunciarem-se sobre a nulidade processual invocada, vêm estes sustentar que, essencialmente, a acção proposta não tem por objecto a impugnação do acto do Director Nacional da PSP que homologou a lista de classificação final, mas antes a impugnação da decisão através da qual se procedeu à nomeação de 179 subcomissários na categoria de comissário da carreira especial de oficial de polícia, a qual foi publicada em Diário da República, tendo, assim, sido observado o n.º 6 do artigo 81.º do CPTA.

(…)

1. Em 21.12.2017, os AA. apresentaram a juízo a petição inicial dos presentes autos de acção administrativa urgente de contencioso de procedimentos de massa, demandando o Ministério da Administração Interna (“R.”), bem como um conjunto de contra-interessados nos quais se inclui o ora Requerente, e aí pugnando, a final, (i) pelo reconhecimento do direito de promoção e de nomeação de cada um dos AA. na categoria de comissário da carreira especial de oficial de polícia; (ii) pela anulação do despacho proferido pelo Director Nacional da PSP, em 02.10.2017, através do qual nomeou 179 subcomissários na categoria de comissário, na parte relativa aos subcomissários aí posicionados entre os 61.º e 179.º lugares; e (iii) pela condenação do R. à prática dos actos que se mostrem devidos, com efeitos retroagidos à data em que os AA. deveriam ter sido promovidos e nomeados (cf. petição inicial junta entre fls. 1 e 31 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

2. Em 10.01.2018, foi proferido despacho a determinar a notificação do R. para “vir informar se, e em que moldes, é que o acto aqui impugnado foi publicado (cf. artigo 81.º, n.º 6, do CPTA)” (cf. despacho junto a fls. 105 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

3. Em 31.01.2018, o R. apresentou um requerimento, aí dando conta de que “A lista de candidatos nomeados foi publicada pelo Despacho (extrato) n.º 9163/2017, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 201, de 18 de outubro de 2017, posteriormente retificado pela Declaração de Retificação n.º 776/2017 publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 216, de 9 de novembro de 2017” (cf. requerimento junto entre 120 e 122 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

4. Em 27.03.2018, foi publicado no Diário da República, 2.ª Série, o anúncio n.º 41/2018 deste Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, através do qual se fazia saber “que nos autos de ação administrativa urgente de contencioso de procedimento de massas acima identificados, que se encontram pendentes neste tribunal, são os subcomissários constantes da lista de nomeações que se encontram posicionados entre os 61º e 179º lugares, relativa à promoção à categoria de comissário da carreira especial de Oficial de Polícia, despacho do Director Nacional da Polícia de Segurança Pública de 2 de outubro de 2017, procedimento concursal nº 3/2016, citados, para no prazo de dez dias se constituírem como contrainteressados no processo acima indicado, nos termos do n.º 5 do art.º 81.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. // O objeto da ação consiste na anulação do despacho de 2 de outubro de 2017, do Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, que na sequência do procedimento Concursal nº 3/2016, nomeou 179 subcomissários na categoria de comissário da carreira especial de polícia, na parte relativa aos subcomissários que, na lista de nomeações, se encontram posicionados entre o 61º e 179 lugares” (cf. cópia do anúncio junta a fls. 181 e 182 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

5. Em 14.05.2018, foi proferida sentença julgando a acção procedente e, em consequência, (i) reconhecendo o direito de promoção e nomeação dos AA. na categoria de comissário da carreira especial de oficial de polícia, em face do desfecho do procedimento concursal n.º 03/2016 aberto pelo R., (ii) anulando o despacho proferido pelo Senhor Director Nacional da PSP, em 02.10.2017, na parte em que nomeou na categoria de comissários os profissionais de polícia elencados na lista de nomeações entre os 61.º e 179.º lugares, e (iii) condenando o R. à prática dos actos que se mostrem devidos por força das decisões que antecedem, com efeitos retroagidos à data em que os AA. deveriam ter sido promovidos e nomeados (cf. sentença junta entre fls. 236 e 248 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

6. Em 22.05.2018, o Requerente apresentou um requerimento a arguir a nulidade da citação (cf. requerimento junto entre fls. 256 e 260 dos autos no SITAF, documento que se dá por integralmente reproduzido).

(…)

no que respeita à nulidade processual suscitada, também aqui se constata a falta de fundamento para o peticionado pelo Requerente.

Vejamos:

De acordo com o n.º 5 do artigo 81.º do CPTA, “Nos processos em que haja contrainteressados em número superior a 10, o juiz, sem prejuízo de outros meios de publicitação, pode promover a respetiva citação mediante a publicação de anúncio, com a advertência de que os interessados dispõem do prazo de 15 dias para se constituírem como contrainteressados no processo”.

Em complemento do que antecede, estatui o n.º 6 daquele mesmo artigo 81.º que “Quando esteja em causa a impugnação de um ato administrativo que tenha sido publicado, a publicação do anúncio mencionado no número anterior faz-se, sem prejuízo de outros meios de publicitação, pelo meio e no local utilizados para dar publicidade ao ato impugnado, e, se o ato não tiver sido objeto de publicação, o anúncio é publicado em dois jornais diários de circulação nacional ou local, dependendo do âmbito da matéria em causa”.

Sustenta o Requerente que, em obediência aos preceitos legais transcritos, conjugadamente com o artigo 22.º da Portaria n.º 1522-A/2002, de 20.12, o anúncio de citação dos contra-interessados nos presentes autos de acção administrativa urgente deveria ter sido publicado em Ordem de Serviço da PSP – mas sem razão.

Com efeito, o artigo 22.º daquele normativo determina, efectivamente, que “A lista de classificação final é notificada aos candidatos através de aviso publicado na

Ordem de Serviço, contendo a lista da graduação dos candidatos e, em anotação sucinta, os motivos de não aprovação, se for caso disso, bem como do prazo de interposição de recurso hierárquico para o Ministro da Administração Interna”.

Sucede, porém, que, como assinalam os AA., estes não vieram, em momento algum, colocar em causa a lista de classificação final do procedimento concursal ou, sequer, o respectivo acto homologatório da mesma, mas antes peticionar a anulação do despacho proferido pelo Director Nacional da PSP, em 02.10.2017, através do qual nomeou 179 subcomissários na categoria de comissário, na parte relativa aos subcomissários aí posicionados entre os 61.º e 179.º lugares (cf. facto 1. firmado supra), com o qual aquela lista (ou o respectivo acto homologatório) não se confunde.

Evidenciando a inequívoca distinção entre ambos, estabelece, assim, o artigo 23.º da própria Portaria n.º 1522-A/2002 que “Os candidatos aprovados [id est, na lista de classificação final] são nomeados segundo a ordenação das respectivas listas de classificação final” e que “Não podem ser efectuadas nomeações antes de decorrido o prazo de interposição do recurso hierárquico da homologação da lista de classificação final ou, sendo interposto, da sua decisão expressa ou tácita” (sublinhado nosso).

Tendo o acto impugnado sido publicado em Diário da República, conforme dá conta o R., e tendo o anúncio de citação dos contra-interessados sido igualmente publicado em Diário da República (cf. factos 2., 3. e 4. firmados supra), sem que o artigo 22.º da Portaria n.º 1522-A/2002, de 20.12, seja aplicável ao caso, pelos motivos que acima se expenderam, há que concluir que a citação foi regularmente efectuada, na situação sub judice, inexistindo, assim, a omissão de uma qualquer formalidade imposta por lei quando da prática de tal acto.

Motivo pelo que se indefere a nulidade processual arguida.

O assim decidido é de manter.

Dispõe o art. 81.º do CPTA, sob a epígrafe “citação dos demandados”:

1 – Recebida a petição, incumbe à secretaria promover oficiosamente a citação dos demandados.

2 – (…)

3 - Nos processos que tenham por objeto a impugnação de norma, o juiz manda publicar anúncio da propositura da ação, pelo meio e no local utilizados para dar publicidade à norma, a fim de permitir a intervenção no processo de eventuais contrainteressados, que é admissível até ao termo da fase dos articulados.

4 - [Revogado].

5 - Nos processos em que haja contrainteressados em número superior a 10, o juiz, sem prejuízo de outros meios de publicitação, pode promover a respetiva citação mediante a publicação de anúncio, com a advertência de que os interessados dispõem do prazo de 15 dias para se constituírem como contrainteressados no processo.

6 - Quando esteja em causa a impugnação de um ato administrativo que tenha sido publicado, a publicação do anúncio mencionado no número anterior faz-se, sem prejuízo de outros meios de publicitação, pelo meio e no local utilizados para dar publicidade ao ato impugnado, e, se o ato não tiver sido objeto de publicação, o anúncio é publicado em dois jornais diários de circulação nacional ou local, dependendo do âmbito da matéria em causa.

Está em impugnação no processo o despacho de 2.10.2017, do Director Nacional da Polícia de Segurança Pública que nomeou 179 subcomissários na categoria de comissário da carreira especial de oficial de polícia, na parte em que, na lista de nomeações, os subcomissários posicionados entre o 61.º e o 179.º lugar, tal como peticionado (v. p.i.).

Tal acto - o despacho com a lista de candidatos nomeados - foi, como provado, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 201, de 18 de Outubro de 2017, posteriormente rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 776/2017, publicada no Diário da República, 2.ª Série, n.º 216, de 9 de Novembro de 2017.

Ora, as exigências que a citação dos Contra-interessados tem de observar são as previstas no art. 81.º, nºs 5 e 6, do CPTA. E, de acordo com tais preceitos, o tribunal a quo não estava obrigado a realizar a citação dos Contra-interessados mediante publicitação em Ordem de Serviço da PSP.

Com efeito, ao realizar a citação mediante a publicação de anúncio na 2.ª série do Diário da República, o tribunal a quo adoptou o mesmo meio e local utilizados para publicitar o acto impugnado, dando cumprimento ao disposto nos referidos n.ºs. 5 e 6 do artigo 81.º do CPTA.

E não se vislumbra que daí possa ocorrer a inconstitucionalidade que vem apenas genérica e conclusivamente invocada pelo Recorrente com fundamento na ofensa do direito à tutela jurisdicional efectiva, previsto no art. 20.º da CRP. Aliás, terá que dizer-se, o Recorrente nem sequer substancia o juízo de inconstitucionalidade formulado a propósito do art. 81.º, nº 5, do CPTA.

Não só o legislador ordinário tem margem de concretização do direito de acesso aos tribunais – estabelecimento de requisitos tidos por adequados -, como o núcleo essencial desse direito fundamental não se encontra postergado (sendo este processo disso mesmo exemplo). Com efeito, o direito à tutela jurisdicional efectiva por banda do ora Recorrente encontra-se tutelado e devidamente garantido, tendo aquele intervindo processualmente em 1.ª instância (onde arguiu precisamente a nulidade da citação) e agora em 2.ª instância por via do exercício do direito ao recurso (da decisão interlocutória e da sentença).

Improcede, pois, este recurso.



II.2.2. Do mérito do recurso da sentença


Bruno ............... e Ministério da Administração Interna, não se conformando com a sentença proferida nos autos, vieram da mesma recorrer imputando, em síntese, erro na aplicação do Direito, concretamente a interpretação feita da norma contida no nº 1 do artigo 148.º do EPPSP. Entendem ambos os recorrentes que a dita cláusula de salvaguarda constante desse n.º 1 do artigo 148.º do EPPSP tem que ser lida como reservando um terço das vagas postas a concurso para Subcomissários não detentores de CFOP e dois terços das vagas para Oficiais titulares dessa habilitação, porquanto a assim não ser estariam a ser privilegiados os primeiros de forma não justificável.

Face à identidade de questões trazidas aos recursos jurisdicionais por ambos os Recorrentes, proceder-se-á à sua apreciação conjunta.

A sentença recorrida julgou procedente o pedido, com base na seguinte fundamentação:

“ (…)

Tal como é dada conta pelas partes, o referido Decreto-Lei n.º 243/2015 veio aprovar o estatuto profissional do pessoal com funções policiais da PSP, o qual prevê a existência de três carreiras: a de agente de polícia, a de chefe de polícia e, com relevo para o caso dos autos, a de oficial de polícia, na qual se incluem, entre outras, as categorias de subcomissário e comissário (cf. artigo 62.º, n.os 1 e 2, do referido diploma).

Por seu turno, o artigo 74.º do antedito Decreto-Lei, sob a epígrafe “Condições de promoção”, estabelece inequivocamente que “A promoção consiste no acesso a categoria superior dentro da mesma carreira” e que, em regra, “depende da existência de posto de trabalho no mapa de pessoal, da aprovação em procedimento concursal pelo método de avaliação curricular ou em curso específico e da verificação dos pré- requisitos previstos no presente decreto-lei”, como sejam a experiência, o desempenho ou a competência técnica, entre outros (cf. n.os 1, 2 e 3 do referido preceito).

Em complemento do que antecede, e concretamente no que tange à promoção à categoria de comissário, estatuem os n.os 1, 3 e 4 do artigo 84.º do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19.10, que “A promoção a comissário é feita mediante procedimento concursal, de entre subcomissários, pelo método de avaliação curricular da categoria, ponderados os parâmetros de avaliação previstos no n.º 1 do artigo 75.º”, sendo que “A ordenação final do procedimento concursal resulta da classificação do CFOP, com a ponderação de 40 %, e da classificação da avaliação curricular, com a ponderação de 60 %” e que “Os subcomissários não habilitados com o CFOP ministrado no ISCPSI são ordenados de acordo com a classificação da avaliação curricular, com a ponderação de 100 %”.

Aqui chegados, é possível extrair, desde logo, um corolário intercalar com relevo para a situação dos autos: os subcomissários candidatos à promoção à categoria de comissário podem encontrar-se, ou não, habilitados com o CFOP, caso em que a classificação que tenha sido obtida pelo candidato nesse curso será levada em conta para efeitos da sua ordenação final no procedimento concursal.

Neste contexto, importa agora compulsar o disposto no artigo 148.º do referido Decreto-Lei n.º 243/2015, o qual, sob a epígrafe “Salvaguarda de regimes”, determina, no seu n.º 1, que “Para salvaguarda do desenvolvimento da carreira dos polícias integrados na carreira de oficial de polícia não habilitado com o CFOP ministrado no ISCPSI, é reservado um terço das vagas colocadas a concurso de promoção para as categorias de comissário e subintendente”.

Conforme teve já oportunidade de se referir, é precisamente neste preceito que radica o dissídio que importa dirimir e em relação ao qual as partes sustentam entendimentos diametralmente opostos.

Assim, sufragam os AA. que o “terço das vagas” que ali se refere deve ser entendida como uma garantia do direito à promoção na carreira dos subcomissários não habilitados com CFOP, e não como uma sua restrição, fixando, assim, uma quota mínima de acesso daqueles profissionais à categoria superior, circunstância que, em face dos pontos 3. a 9. da matéria de facto que acima se deu por assente, carrearia ao direito dos mesmos a serem nomeados naquela categoria, na medida em ficaram ordenados entre o 61.º e o 175.º lugares da lista de ordenação final dos candidatos aprovados, id est, ainda no limite das 179 vagas postas a concurso.

Já o R., por seu turno, argui que os profissionais de polícia não habilitados com o CFOP são hoje a excepção, prefigurando aquele curso condição de acesso à carreira, pelo que a cláusula de salvaguarda ora em crise deveria ser entendida como um limite máximo à promoção de subcomissários que não detenham o referido CFOP, sob pena de subversão do regime geral hoje consignado na lei.

Compulsados os autos, considera este Tribunal que a razão está inequivocamente do lado dos AA.

Tal entendimento radica, desde logo, no teor do n.º 1 do artigo 148.º do Decreto- Lei n.º 243/2015, de 19.10 – o qual, como é sabido, consubstancia o ponto de partida do intérprete e aplicador da lei, nos termos do artigo 9.º do Código Civil – e, em concreto, no trecho “ (…) é reservado um terço das vagas colocadas a concurso” ali vertido.

Assim, prima facie, sempre se dirá que o emprego de tal expressão dificilmente se compagina com a instituição de um limite máximo de vagas, como é defendido pelo R..

Com efeito, o vocábulo “reservado” é definido, entre outras formas, como “guardado”, “garantido”, apalavrado” ou “destinado a” (reservado in Dicionário infopédia da Língua Portuguesa [em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2018. [consult. 2018-05-14 18:48:23].

Disponível na Internet:https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/reservado).

De nenhuma das significâncias com pertinência para o caso dos autos é possível extrair uma qualquer ideia de limite, como preconiza o R., mas antes de garantia, como é ensaiado pelos AA.

Assim, e tendo em conta que, de acordo com o n.º 3 do artigo 9.º do CC, o intérprete deve presumir que o legislador “soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”, considera-se que, ao estatuir que “é reservado um terço das vagas”, o legislador pretendeu implementar um limite mínimo de candidatos não habilitados com CFOP a serem providos em procedimentos concursais para a categoria de comissário – caso assim não fosse, sempre teria o legislador definido expressamente que tal “reserva” antes deveria ser perspectivada em termos limitativos, o que não sucedeu.

Mas o vencimento da tese sufragada pelos AA. não se circunscreve ao emprego da expressão “é reservado um terço das vagas”.

Com efeito, importa ter presente que, com a formulação da prescrição legal em referência, o legislador pretendeu, nas suas próprias palavras, salvaguardar o desenvolvimento da carreira dos polícias integrados na carreira de oficial de polícia não habilitado com o CFOP (e não o contrário, id est, defender o direito de promoção dos profissionais habilitados com o referido curso, como sindica o R.) – é o que decorre textualmente do n.º 1 do artigo 148.º do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19.10.

Ora, não se compreende em que medida é que a instituição de um limite máximo de um terço das vagas a prover pelos candidatos não habilitados com o CFOP, como é preconizado pelo R., poderá ser apta a salvaguardar o desenvolvimento das respectivas carreiras: na verdade, tal limiar antes daria corpo à restrição do direito de promoção de tais candidatos, tal como, de resto, acabaria por vir a suceder in casu, já que os AA., graduados entre os 61.º e o 175.º lugares, acabariam por não ser nomeados, ao abrigo da leitura que o R. faz do comando legal que, repete-se, visa, nas suas próprias palavras, salvaguardar os seus direitos de promoção.

É, assim, patente a incoerência da orientação que é aventada pelo R. nestes autos, em face do texto da lei e, bem assim, da própria teleologia que terá norteado o legislador.

É que, tal como decorre da nota preambular do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19.10, ainda que “salvaguardando-se na íntegra as exigências de ingresso na carreira de oficial de polícia, permite-se que os oficiais não habilitados com o curso de formação de oficiais de polícia, que constituem atualmente um grupo reduzido e perfeitamente delimitado, possam progredir normalmente na carreira” (sublinhado nosso).

Similarmente ao que acima se expendeu, também não se concebe aqui em que termos é que a interpretação do artigo 148.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 243/2015, que é alvitrada pelo R. contribui para que os oficiais não habilitados com o CFOP progridam normalmente na carreira: ao invés, tais candidatos encontrar-se-iam, na verdade, inequívoca e inelutavelmente constrangidos nesse mesmo direito.

Em face do que antecede, e considerando que:

(i) No âmbito do procedimento concursal n.º 03/2016 – o qual, recorde-se, visava o preenchimento de 179 lugares na carreira de oficial da PSP e da categoria de comissário do mapa do pessoal com funções policiais da PSP –, os AA. foram ordenados entre o 61.º e o 175.º lugares da lista de ordenação final dos candidatos aprovados, homologada pelo Senhor Director Nacional da PSP (cf. facto 3. firmado supra);

(ii) Nos termos do artigo 18.º, n.os 1 e 2, da Portaria n.º 330-A/2016, de 20.12 (a qual regulamenta a tramitação do procedimento concursal pelo método de avaliação curricular para promoção do pessoal com funções policiais da PSP), a “ordenação final dos candidatos que completem o procedimento é efetuada de acordo com a escala classificativa de 0 a 20 valores, considerada até às milésimas, em resultado da média aritmética ponderada das classificações quantitativas obtidas na avaliação curricular e da classificação final do respetivo curso quando constitua condição de acesso, nos termos previstos no Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro”, sendo a lista de ordenação final dos candidatos aprovados “unitária, ainda que no mesmo procedimento, lhes tenham sido aplicados diferentes métodos de seleção”; e

(iii) Conforme se expendeu, o Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19.10, não contém qualquer prescrição que habilite o R., como este fez no procedimento ora em crise e aqui reitera, a circunscrever as vagas a prover no procedimento concursal aberto pelos subcomissários não habilitados com o CFOP a um terço do seu total,

não restam alternativas a este Tribunal que não concluir pela procedência dos pedidos formulados pelos AA., o que se julga de seguida, sem necessidade de mais desenvolvimentos. (…)”.

Vejamos se este entendimento é de subscrever.

Em sentido concordante vai a pronúncia do Ministério Público:

O AA, apesar de graduados entre os 61.º e o 175.º lugares, devido ao entendimento do MAI, não foram promovidos, não obstante a cláusula de salvaguarda, tendo sido preteridos relativamente aos oficiais detentores das mencionadas habilitações, pela nomeação de oficiais de polícia que se encontravam abaixo dos lugares em que aqueles foram graduados, na referida lista unitária de classificação final.

O Recorrente faz uma análise da evolução histórica dos vários diplomas legais reguladores da questão em apreço (DL n.º 511/99, de 24/11, e seus art.ºs 7.º, n.º 3, e 22.º, n.º 3, al. a), DL n.º 173/2000, de 9/08 e DL n.º 299/2009, de 14/10), dos quais retira a conclusão, da análise de tais diplomas que sucessivamente regularam o Estatuto da PSP, de que a norma em apreço na ação, constante do n.º 1 do artigo 148.º do citado Decreto-Lei n.º 243/2015, resulta que do total das vagas colocadas a concurso, para promoção à categoria de comissário da carreira especial de oficial de polícia, um terço são destinadas, obrigatoriamente, aos subcomissários não habilitados com o Curso de Formação de Oficiais de Polícia (CFOP), e dois terços são reservadas, obrigatoriamente, aos subcomissários habilitados com o mencionado curso de formação. Salvaguarda que se mantém até ao presente.

Entende que o ingresso na carreira de oficial de polícia exige a habilitação com o CFOP – sendo, portanto, os oficiais que já se encontravam na carreira a excepção – e que a cláusula de salvaguarda vertida no n.º 1 do artigo 148.º do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19.10, não pode ser entendida de molde a inverter o regime geral, coarctando o direito de progressão na carreira dos profissionais de polícia que frequentaram o CFOP.

Alega ainda que a sentença converteu em regra a referida cláusula de salvaguarda, invertendo os termos da equação, ao privilegiar os oficiais de carreira, não habilitados com o referido curso, relativamente aos oficiais detentores de licenciatura ou mestrado em Ciências Políticas, cuja proporção de colocação no concurso deve ser entendida como sendo de dois terços.

E que os primeiros têm ainda a possibilidade de serem promovidos por antiguidade, nos termos do n.º 2, do referido art.º 148.º do EPPSP, o que não se verifica relativamente aos outros.

Mais invoca que a lei, assim interpretada, tem em vista apresentar uma melhor formação dos seus funcionários para cumprir o objectivo de melhoria dos serviços de segurança, alegando que “(…) o legislador prosseguiu na intenção de dotar a Polícia de Segurança Pública de Oficiais mais qualificados, visando a melhoria da qualidade de serviço, reportando, no entanto, a regra do terço de vagas destinadas aos Oficiais de carreira às vagas colocadas a concurso em vez das vagas do quadro de pessoal, simplificando deste modo os cálculos a efetuar”.

A questão a colocar, tal como mencionado na douta sentença em apreço, consiste em “(…) determinar se o referido artigo 148.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19.10, institui uma quota mínima ou máxima de subcomissários não habilitados com o CFOP a prover na categoria de comissário da PSP, em caso de procedimento concursal tendente a esse efeito (…).

O art.º 148.º do referido DL n.º 243/2015, o qual, sob a epígrafe “Salvaguarda de regimes”, dispõe, no seu n.º 1: “Para salvaguarda do desenvolvimento da carreira dos polícias integrados na carreira de oficial de polícia não habilitados com o CFOP ministrado no ISCPSI, é reservado um terço das vagas colocadas a concurso de promoção para as categorias de comissário e subintendente”.

O já citado DL n.º 243/2015, de 19/10, que aprovou o estatuto profissional do pessoal com funções policiais da PSP, prevê a existência de três carreiras: a de agente de polícia, a de chefe de polícia e, com relevo para o caso dos autos, a de oficial de polícia, na qual se incluem, entre outras, as categorias de subcomissário e comissário (cf. art.º 62.º, n.ºs 1 e 2, do referido diploma).

No seu art.º 74.º, sob a epígrafe “Condições de promoção”, estabelece o referido diploma legal que “A promoção consiste no acesso a categoria superior dentro da mesma carreira”, dependendo “da existência de posto de trabalho no mapa de pessoal, da aprovação em procedimento concursal pelo método de avaliação curricular ou em curso específico e da verificação dos pré-requisitos previstos no presente decreto-lei”, entre os quais se valorizam a experiência, o desempenho ou a competência técnica (cf. n.ºs 1, 2 e 3 do referido preceito).

O art.º 84.º, n.ºs 1, 3 e 4, do mesmo DL estipula que “A promoção a comissário é feita mediante procedimento concursal, de entre subcomissários, pelo método de avaliação curricular da categoria, ponderados os parâmetros de avaliação previstos no n.º 1 do artigo 75.º”, (…) “A ordenação final do procedimento concursal resulta da classificação do CFOP, com a ponderação de 40 %, e da classificação da avaliação curricular, com a ponderação de 60 %”, e que “Os subcomissários não habilitados com o CFOP ministrado no ISCPSI são ordenados de acordo com a classificação da avaliação curricular, com a ponderação de 100 %”.

Estas normas, conjugadas com a redacção do art.º 148.º, do mesmo diploma legal, atrás transcrito, permitem concluir, tal como o faz a douta sentença sob recurso, a cuja argumentação aqui se adere, que os subcomissários candidatos à promoção à categoria de comissário podem encontrar-se, ou não, habilitados com o CFOP, caso em que a classificação que tenha sido obtida pelo candidato nesse curso será levada em conta para efeitos da sua ordenação final no procedimento concursal.

A cláusula de salvaguarda (entendida como instituindo uma quota destinada a tais oficiais, conforme explicitado na sentença) não pode, assim, ser interpretada como uma restrição de acesso dos oficiais na situação dos AA, constituindo antes um limite mínimo, de garantia de acesso por parte dos mesmos, neste caso, independente da graduação previamente realizada – art.º 9.º do Código Civil.

Para o tribunal recorrido, em tese que é sustentada igualmente pelo Ministério Público, a previsão da reserva, a favor de Oficiais não habilitados com o CFOP, de um terço das vagas colocadas a concurso corresponde tão-somente à fixação de um limite mínimo ao número de vagas para esses Oficiais. O que significa que, ao restringir as promoções de tais Oficiais ao limite de um terço previsto naquela disposição legal, o acto impugnado restringiu o direito daqueles Oficiais à progressão na carreira.

Todavia, não parece que a intenção legislativa permita a conclusão de que a reserva para os polícias integrados na carreira de oficial de polícia não habilitados com o CFOP ministrado no ISCPSI de um terço das vagas colocadas a concurso de promoção para as categorias de comissário e subintendente constitua um limite mínimo de garantia, podendo ser assim em número superior.

O novo Estatuto para a PSP, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de Outubro, alterado pela Lei n.º 114/2017, de 29 de Dezembro, prevê duas normas de salvaguarda: por um lado, a promoção por antiguidade dos subcomissários não CFOP que em 1.12.2015 tivessem mais de 12 anos na categoria; e por outro lado, a reserva de um terço das vagas postos a concurso aos polícias que foram integrados na carreira de oficial de polícia não habilitados com o CFOP (ou que acederam ao posto de subcomissário ao abrigo o artigo 7.º, n.º 1 do Decreto-Lei nº 511/99) - cfr. o n.º 1 do art.º 148.º do Estatuto.

Dispõe o art. 148.º do Estatuto em questão:


Artigo 148.º

Salvaguarda de regimes


1 - Para salvaguarda do desenvolvimento da carreira dos polícias integrados na carreira de oficial de polícia não habilitado com o CFOP ministrado no ISCPSI, é reservado um terço das vagas colocadas a concurso de promoção para as categorias de comissário e subintendente. [sublinhado e carregado nosso]

2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, aos subcomissários não habilitados com o CFOP ministrado no ISCPSI, que tenham mais de 12 anos de tempo de serviço na categoria à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, é aplicável, até 2019, um regime transitório de promoção à categoria de comissário, nos seguintes termos:

a) A promoção tem lugar por antiguidade;

b) O número de vagas é fixado anualmente e está limitada a 45.

3 - Para cumprimento do disposto no número anterior são criados os lugares necessários na categoria de comissário, a extinguir quando vagarem.

4 - Aos polícias que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, reúnam os requisitos de tempo mínimo de serviço para promoção à categoria imediatamente superior, previstos no Decreto-Lei n.º 299/2009, de 14 de outubro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 46/2014, de 24 de março, é reconhecida a condição de acesso «tempo mínimo de serviço efetivo», prevista para o respetivo procedimento concursal.

5 - Mantêm-se em vigor os tempos mínimos de antiguidade previstos no Decreto-Lei n.º 299/2009, de 14 de outubro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 46/2014, de 24 de março, nas categorias em que estes tempos foram aumentados.

6 - O disposto no número anterior cessa após a primeira promoção do polícia ocorrida na vigência do presente decreto-lei.

Na interpretação da norma em que assenta o dissidio impor a relembrar a intenção do legislador, plasmada no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de Outubro, que aprova o estatuto profissional do pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública. Neste assinalou-se o seguinte desiderato:

“(…) foi assumido como propósito do presente decreto-lei proceder à valorização da carreira dos polícias e à salvaguarda das suas especificidades, acautelando a sua compatibilização com o atual contexto legal. Assim, são criadas duas novas categorias, uma na carreira de agente de polícia e outra na carreira de chefe de polícia, permitindo que os polícias com mais experiência possam desempenhar funções de supervisão e assessoria. Procede-se, igualmente, à alteração dos tempos mínimos de antiguidade como condição de promoção, tendo em vista prever uma adequada projeção da carreira dos polícias.

Por outro lado, e salvaguardando -se na íntegra as exigências de ingresso na carreira de oficial de polícia, permite-se que os oficiais não habilitados com o curso de formação de oficiais de polícia, que constituem atualmente um grupo reduzido e perfeitamente delimitado, possam progredir normalmente na carreira.

O que induz desde logo o seguinte raciocínio: com o actual Estatuto, o procedimento concursal terá que “reservar” um terço das vagas aos Oficiais de carreira e, por maioria de razão ou exclusão de partes, os restantes dois terços aos Oficiais titulares do CFOP. Por essa via se assegurando o desiderato de “os oficiais não habilitados com o curso de formação de oficiais de polícia, que constituem atualmente um grupo reduzido e perfeitamente delimitado, possam progredir normalmente na carreira”, uma vez que a titularidade do CFOP (Curso de Licenciatura ou Mestrado em Ciências Policiais) passou a ser, a partir do Decreto-Lei n.º 511/99, de 24 de Novembro (Estatuto da PSP de 1999), requisito de acesso à carreira.

O que o legislador não deixou transparecer, de nenhum passo do diploma, foi que os Oficiais de carreira tivessem uma posição de privilégio face aos Oficiais titulares do CFOP, na ocupação de lugares no posto de Comissário. Se assim o pretendesse, o legislador tê-lo-ia dito expressamente, redigindo norma nesse sentido; bastaria incluir norma jurídica que estabelecesse esse critério ordenador para a nomeação. O que não fez, nem se retira da leitura do diploma essa directriz interpretativa.

A solução interpretativa ora pugnada é também aquela que melhor se adequa à Lei Orgânica da Polícia de Segurança Pública, aprovada pela Lei n.º 53/2007, de 31 de Agosto, que dispõe no n.º 1 do artigo 50.º que “o Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna (ISCPSI) é um instituto policial de ensino superior universitário que tem por missão formar oficiais de polícia, promover o seu aperfeiçoamento permanente e realizar, coordenar ou colaborar em projectos de investigação e desenvolvimento no domínio das ciências policiais”. Sendo que o Decreto-Lei n.º 511/99, de 24 de Novembro (Estatuto da PSP de 1999), veio estabelecer como requisito de acesso à carreira de oficial de polícia a titularidade de curso superior (licenciatura/mestrado) em Ciências Policiais, ministrado pelo Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna.

Ou seja, temos que a regra é a do acesso à carreira de oficial de polícia exigir a titularidade de curso superior em Ciências Policiais, ministrado pelo Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna. Porém, ciente de que os oficiais não habilitados com o curso de formação de oficiais de polícia detêm igualmente o direito a progredir na carreira, o legislador, de modo precisamente a garantir esse direito, assegurou/reservou um contingente de um terço das vagas colocadas a concurso, ficando os outros dois terços consignados aos Oficiais titulares do CFOP (Curso de Licenciatura ou Mestrado em Ciências Policiais).

Tanto assim é, ciente da necessidade em assegurar a referida progressão face ao regime geral prevalente que exige o dito curso superior, que o legislador redobrou cuidados na tutela das posições subjectivas preexistentes daqueles oficiais não habilitados com o curso de formação de oficiais de polícia, como decorre do nº 2 do artigo em causa, em que estabelece um regime transitório de promoção à categoria de comissário em que esta tem lugar por antiguidade (estando anualmente limitada ao máximo de 45 vagas).

Como alega proficuamente o Recorrente: “o legislador quis assegurar que os postos de direcção e comando da estrutura da PSP eram ocupados por oficiais com formação superior, na medida em que, teoricamente, conseguir-se-ia melhorar a prestação das estruturas de direcção e comando e assegurar a prestação de um serviço melhor aos cidadãos. // Com a criação dessa solução legal, contudo, o legislador procurou acautelar a posição de todos os profissionais que, não sendo titulares de curso superior, já estavam integrados na carreira de oficial de polícia – os chamados “Oficiais de carreira”. // E foi prosseguindo esse desiderato que o legislador começou por prever, no n.º 3 do art. 7.º do Decreto-Lei n.º 511/99, de 24 de Novembro, que “Para salvaguarda da normal progressão na carreira dos oficiais de polícia não possuidores de licenciatura ministrada pelo Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna, é-lhes reservado um terço das vagas existentes no posto de subintendente. // É fácil compreender o porquê de tal solução: se a ideia era modernizar a Polícia e investir na melhoria da formação de base dos seus órgãos dirigentes, com o propósito de assegurar uma maior racionalidade na gestão de meios e qualidade ao serviço prestado, é evidente que tal desiderato só seria prosseguido com a atribuição de prevalência, na ocupação dos cargos dirigentes, a Oficiais titulares do CFOP (porque titulares de uma formação científica superior – mestrado ou licenciatura). //Ademais, a previsão de uma terça parte das vagas no quadro de pessoal da carreira de Subintendente para Oficiais de carreira mais não era - como o seu próprio nome indica - do que uma cláusula de salvaguarda, ou seja, uma forma de acautelar que, apesar da atribuição dessa preferência aos Oficiais titulares de CFOP, os Oficiais de carreira não eram discriminados – mantendo-se um terço das vagas do quadro de pessoal para eles.

Acresce que a solução preconizada pelo tribunal a quo subverte a lógica subjacente à cláusula de salvaguarda – salvaguarda de regimes - como tal criada pelo legislador no citado art. 148.º, nº 1, antes resultando que os polícias integrados na carreira de oficial de polícia não habilitado com o CFOP ministrado no ISCPSI, concorreriam afinal em igualdade de circunstâncias com os Oficiais titulares do CFOP no preenchimento das vagas postas a concurso.

Pelo exposto, incorrendo o tribunal a quo no erro de julgamento de direito que lhe vem apontado, na procedência dos recursos tem a sentença recorrida que ser revogada.

E na sequência do se vem de dizer, terá que julgar-se improcedente a acção com a absolvição da Demandada dos pedidos.



III. Conclusões

Sumariando:

i) De acordo com o art. 81.º, nº 6, do CPTA “[q]uando esteja em causa a impugnação de um ato administrativo que tenha sido publicado, a publicação do anúncio mencionado no número anterior faz-se, sem prejuízo de outros meios de publicitação, pelo meio e no local utilizados para dar publicidade ao ato impugnado, e, se o ato não tiver sido objeto de publicação, o anúncio é publicado em dois jornais diários de circulação nacional ou local, dependendo do âmbito da matéria em causa

ii) Ao realizar a citação mediante a publicação de anúncio na 2.ª série do Diário da República, o tribunal a quo adoptou o mesmo meio e local utilizados para publicitar o acto impugnado - despacho de nomeação publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 201, de 18 de Outubro de 2017, posteriormente rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 776/2017, publicada no Diário da República, 2.ª Série, n.º 216, de 9 de Novembro de 2017 -, dando assim cumprimento ao disposto nos n.ºs. 5 e 6 do artigo 81.º do CPTA.

iii) A cláusula de salvaguarda prevista no art. 148.º do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de Outubro, alterado pela Lei n.º 114/2017, de 29 de Dezembro (aprova o estatuto profissional do pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública), constitui um limite de garantia de acesso por parte dos mesmos, significando que a este pessoal – os oficiais de carreira - corresponde um contingente de um terço das vagas colocadas a concurso de promoção para as categorias de comissário e subintendente. Os restantes dois terços ficam consignados aos Oficiais titulares do CFOP (Curso de Licenciatura ou Mestrado em Ciências Policiais).



IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

- Negar provimento ao recurso interposto por Bruno ............... do despacho de 14.06.2018 que indeferiu a nulidade da citação requerida; no mais,

- Conceder provimento aos recursos e revogar a sentença recorrida; e

- Julgar a acção improcedente, absolvendo o Ministério da Administração Interna dos pedidos.

Custas em ambas as instâncias pelos Autores, sendo devidas custas pelo Contra-Interessado Recorrente, no recurso interposto do despacho interlocutório.

Lisboa, 23 de Maio de 2019



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Pedro Marchão Marques


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Alda Nunes


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José Gomes Correia