Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:762/09.0BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:03/02/2023
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IRC.
PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA.
CRÉDITOS INCOBRÁVEIS.
DOCUMENTAÇÃO DE CUSTOS.
Sumário:I. Numa situação de imparidade total comprovada, os créditos provisionados podem ser levados a custos como créditos incobráveis.

II. A correcção da matéria colectável com base em preços de transferência exige a invocação dos termos da operação comparável entre entidades independentes, bem como a justificação dos factores de comparabilidade.

III. A invocação de um custo dedutível exige a demonstração cabal dos fluxos financeiros e económicos associados.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO
I- Relatório
N.............. ………., S.A. deduziu impugnação judicial contra a decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) nº ……………..329, e respectivos juros compensatórios, e a correspondente demonstração de compensação com o nº ………………297, referentes ao exercício de 2004, peticionando a sua anulação, bem como a restituição do reembolso do IRC entregue nos Cofres do Estado, no montante de €347.216,43, acrescido do pagamento de juros indemnizatórios.
O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por sentença proferida a fls. 3247 e ss. (numeração no processo em formato digital-sitaf), datada de 15/11/2021, julgou a impugnação parcialmente procedente, e, em consequência, anulou a liquidação sindicada na parte referente às correções efectuadas pela inspecção tributária em sede de créditos incobráveis e de preços de transferência, mais condenando a Fazenda Pública no pagamento dos juros indemnizatórios.
Inconformadas a Fazenda Pública e a sociedade N.............. P............, S.A., vieram recorrer da sentença, no segmento em que a mesma lhes foi favorável.
A) Recurso interposto pela Fazenda Pública:
Nas alegações de fls. 3328 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), a recorrente formulou as seguintes conclusões: «
A. Vem o presente recurso reagir da douta sentença proferida em 2021-11-15, no processo n.º 762/09.0BESNT, que julgou parcialmente procedente a Impugnação Judicial deduzida por N.............. P............, S.A., NIPC ……………., do indeferimento da reclamação graciosa apresentada sobre a liquidação adicional de IRC n.º 2008 8310033299, relativa ao exercício de 2004, no valor de € 780.760,35 (setecentos e oitenta mil euros, setecentos e sessenta euros e trinta e cinco cêntimos), relativo a imposto e juros compensatórios, na parte em que julgou a anulação das correções efetuadas pelos SIT em sede de créditos incobráveis e de preços de transferência.
B. No presente recurso, pretende-se que seja apreciada a douta sentença recorrida quanto ao erro de julgamento (i) de direito sobre os créditos incobráveis, nos termos dos artigos 35.º e 39.º do Código do IRC, e (ii) de facto e de direito quanto aos preços de transferência, na consideração do rappel para efeito do conceito de net proceed of sales, base de cálculo dos royalties pagos à SPN.
C. Considerou a douta sentença recorrida que a correção dos SIT relativa a créditos incobráveis se reporta a provisões para créditos de cobrança duvidosa, constituídas nos termos do (à data) artigo 35.º do Código do IRC, requalificando o valor contabilístico, e concluindo pela sua aceitação como custo.
D. Ora, para efeitos fiscais, não é indiferente o tratamento contabilístico que o sujeito passivo atribuiu a um determinado custo para aferir se o mesmo é fiscalmente dedutível ou não. Decorre do n.º 1 do artigo 17.º do Código do IRC que o lucro tributável tem origem no resultado líquido do período determinado com base na contabilidade.
E. Ora, tendo a Recorrida considerado na conta 692000 – Dívidas incobráveis o valor de € 946.218,26, (novecentos e quarenta e seis mil, duzentos e dezoito euros e vinte e seis cêntimos), afigura-se à RFP que não compete aos SIT substituírem-se ao sujeito passivo no tratamento contabilístico que deu aos gastos com as “dívidas incobráveis” para requalificar as mesmas como “provisões para créditos de cobrança duvidosa”.
F. O papel dos SIT é aferir se o tratamento contabilístico das dívidas incobráveis se encontra em conformidade com o disposto no (à data) artigo 39.º do Código do IRC para determinar se estes gastos são fiscalmente dedutíveis ou não.
G. Resultou do procedimento inspetivo que não se encontram reunidos os pressupostos do artigo 39.º do Código do IRC para que os gastos considerados na conta 692000 – Dívidas incobráveis no valor de € 946.218,26, (novecentos e quarenta e seis mil, duzentos e dezoito euros e vinte e seis cêntimos) sejam qualificados como dívidas incobráveis e, como tal, fiscalmente dedutíveis, cf. teor do relatório do procedimento inspetivo constante no facto provado em R) a fls. 9 e 10 da douta sentença recorrida.
H. Aliás, o próprio Tribunal a quo, ao concluir que “Assim sendo, não há fundamento para aplicar o regime dos créditos incobráveis regulado no artigo 39.º do CIRC, que implica que os créditos nessas condições sejam levados diretamente a custos, pois, a situação de facto em causa nos autos não se enquadra nesse regime, sendo antes subsumível no artigo 35.º do CIRC.” (sublinhado nosso), cf. fls. 39 da douta sentença recorrida, admite que os SIT não poderiam aceitar os créditos incobráveis no valor de € 946.218,26, (novecentos e quarenta e seis mil, duzentos e dezoito euros e vinte e seis cêntimos) como custo do exercício de 2004.
I. No entanto, entende o Tribunal a quo que poderia substituir-se o tratamento contabilístico efetuado pela Recorrida, considerando como custo do exercício o valor de € 946.218,26, (novecentos e quarenta e seis mil, duzentos e dezoito euros e vinte e seis cêntimos) a título de provisão para créditos de cobrança duvidosa, nos termos do (à data) artigo 35.º do Código do IRC.
J. Afigura-se à RFP que a qualificação do custo como provisão para créditos de cobrança duvidosa dependia, em primeira linha, do tratamento contabilístico do custo de € 946.218,26, (novecentos e quarenta e seis mil, duzentos e dezoito euros e vinte e seis cêntimos) como provisão para créditos de cobrança duvidosa, nos termos do artigo 16.º e do n.º 1 do artigo 17.º ambos do Código do IRC.
K. O controlo de legalidade do ato tributário – na opinião da RFP – incide sobre o teor do ato controvertido, no caso concreto, das correções efetuadas à contabilidade do sujeito passivo, não sobre o potencial tratamento que os custos declarados pela Recorrida pudessem ter em sede de contabilística.
L. É verdade que o contencioso tributário é um contencioso de plena jurisdição; integra o contencioso de plena jurisdição (i) os princípios da oficialidade e da investigação ou inquisitório, que se traduzem no poder de direção do processo ao juiz, (ii) o princípio da tutela jurisdicional efetiva, que permite a natureza condenatória à restituição do imposto pago acrescido de juros, no processo de impugnação, (iii) o princípio da economia processual, pela promoção de decisão judicial que prescinda de nova pronúncia da AT, e (iv) reconhecimento dos limites da jurisdição tributária que afrontem a discricionariedade técnica da AT ou a intangibilidade do caso julgado administrativo, cf. acórdão do TCA Sul proferido no processo n.º 6112/12, de 2017-06-08, disponível em www.dgsi.pt.
M. No entanto, ainda não integra o contencioso de plena jurisdição a faculdade de os doutos tribunais se substituírem aos sujeitos passivos de imposto no tratamento contabilístico (interno) dado aos respetivos custos, nem integra o contencioso de plena jurisdição a possibilidade de sancionar a conduta dos SIT por não enquadrarem de forma distinta o tratamento contabilístico efetuado pelo sujeito passivo.
N. Afigura-se à RFP que se impunha ao Tribunal a quo apreciar se os custos de €946.218,26, (novecentos e quarenta e seis mil, duzentos e dezoito euros e vinte e seis cêntimos) podiam ser fiscalmente dedutíveis como créditos incobráveis, ao abrigo do artigo 39.º do Código do IRC, - o que, aliás, a douta sentença recorrida fez, concluindo negativamente.
O. Caso V. Exas. entendam de forma diferente, apresentamos as nossas reservas quanto ao tratamento dos créditos incobráveis como provisões para créditos de cobrança duvidosa.
P. Recordamos que as demonstrações financeiras têm como uma das suas características qualitativas a fiabilidade, que se traduz na representação fidedigna das transações e outros acontecimentos, isentas de erros materiais e de preconceitos para que os seus utentes possam confiar no que a informação representa ou pode razoavelmente esperar-se que represente (cf. ponto 3.2.2 do Plano Oficial de Contabilidade).
Q. Não é inócua a forma como a Recorrida contabilizou os gastos ora controvertidos, porque além de anular a provisão que havia sido constituída em anos anteriores – conforme lhe bastaria fazer -, a Recorrida anulou os próprios créditos, considerando-os incobráveis.
R. É aqui que reside o pomo da discordância entre a AT e a Recorrida, impondo-se, a nosso ver, distinguir entre a provisão e o crédito propriamente dito, conceitos substancialmente diferentes quer do ponto de vista contabilístico quer do ponto de vista fiscal e que, com a devida vénia, a douta sentença recorrida considerou despicienda para alcançar a solução de mérito no caso concreto.
S. A provisão constituída na contabilidade “tem por objectivo reconhecer as responsabilidades cuja natureza esteja claramente definida e que à data do balanço sejam de ocorrência provável ou certa, mas incertas quanto ao seu valor ou data de ocorrência” (cf. ponto 2.9 das considerações técnicas do POC), mantendo-se a provisão enquanto se mantiver o risco de incobrabilidade e extinguindo-se quando esse risco desaparece (por cumprimento ou impossibilidade reconhecida).
T. O mesmo não é válido quanto à anulação do próprio crédito; na realidade, a anulação do crédito apenas porque foi reconhecida uma provisão é contrária a toda a lógica do reconhecimento dos réditos a receber e da respetiva valoração, nos termos do POC.
U. O facto de um crédito estar em mora há mais de dois anos e de ter sido reconhecida uma provisão a 100% (cem por cento) sobre o valor do crédito não significa que o direito contratual ao recebimento da contraprestação se extinguiu.
V. É, por isso, diferente um crédito que se encontra provisionado e um crédito que, de forma definitiva, se extingue, dado que, neste último caso, os direitos contratuais aos recebimentos se extinguiram juridicamente, gerando a incobrabilidade do crédito.
W. É, por isso, também, evidente que o tratamento contabilístico e fiscal de um crédito provisionado e de um crédito extinto (incobrável) é distinto.
X. O que a Recorrida fez contabilisticamente foi reconhecer um crédito incobrável, desreconhecendo um ativo por contrapartida da conta em que se encontravam contabilizadas as provisões anteriormente reconhecidas.
Y. Por outras palavras, na prática, o sujeito passivo procedeu à requalificação de um custo com provisões para créditos de cobrança duvidosa para um custo com créditos incobráveis cujo regime de aceitação está previsto no artigo 39.º do Código do IRC.
Z. Ora, um crédito não pode ser provisionado para efeitos fiscais, ainda que esteja em mora há mais de 2 (dois) anos e relativamente ao qual tenha sido reconhecida uma provisão de 100% (cem por cento), nas situações em que foi desreconhecido contabilisticamente.
AA. Caso o sujeito passivo proceda ao desreconhecimento de um crédito sem que se verifiquem os requisitos exigidos para que o mesmo possa ser considerado incobrável para efeitos fiscais (como aconteceu no caso concreto), o gasto associado à incobrabilidade desse crédito – que se encontra a influenciar negativamente o resultado líquido do exercício -, terá, necessariamente, que constituir componente positiva do lucro tributável, ou seja, terá que ser, de acordo com o princípio da legalidade, acrescido ao resultado líquido contabilístico, correção realizada pelos SIT no caso concreto.
BB. A pretensa neutralidade no resultado fiscal que a Recorrida invoca e que a douta sentença recorrida acolhe, é meramente aparente pela circunstância de a Recorrida, através da contabilização que efetuou, considerar duas realidades fiscais substancialmente distintas: a anulação de um crédito e anulação de uma provisão.
CC. Acresce ainda que tal neutralidade é falaciosa precisamente porquanto o efeito nulo no resultado fiscal apenas ocorreria se os SIT tivessem considerado o crédito incobrável para efeitos fiscais, podendo, então, ser anulado.
DD. Sendo evidente que foi a Recorrida quem pretendeu conferir um tratamento contabilístico a determinada realidade, conclui-se que não poderiam os SIT ter oferecido outro enquadramento.
EE. Afigura-se, assim, que, na opinião da RFP, a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito ao requalificar os créditos indevidamente contabilizados como incobráveis em provisões para créditos de cobrança duvidosa, em violação do disposto no (à data) artigo 35.º do Código do IRC.
FF. Sobre a matéria atinente aos preços de transferência, entendeu o Tribunal a quo que o rappel se integra nas exceções previstas na cláusula 32 do licence agreement celebrado entre a Recorrida e a SPN, pelo que não integra o conceito (i.e., não se desconta ao valor de) vendas líquidas, base de cálculo da taxa de 5% (cinco por cento) de royalties a pagar à SPN.
GG. Em sede de procedimento inspetivo, cf. teor do relatório do procedimento inspetivo constante do facto provado em R) a fls. 15 a 17 da douta sentença recorrida, entenderam os SIT que o rappel constitui um desconto de natureza comercial, inserindo-se no conceito de rebates para efeitos da cláusula 32 do licence agreement.
HH. Julgou o Tribunal a quo que o rappel se integra nas exceções previstas na cláusula 32 do licence agreement porque o rappel constitui um incentivo ao cliente e as exceções aos rebates têm um conteúdo amplo, incluindo-se o rappel, pela sua natureza temporária, cf. fls. 50 da douta sentença recorrida.
II. Resulta da prova produzida nos autos que o rappel constitui um desconto concedido pela Recorrida aos seus clientes quando atingem determinados objetivos comerciais, designadamente, quando o cliente vende um volume de vendas previamente acordado pelas partes numa concreta janela temporal, em tudo idêntico ao rappel geralmente praticado no comércio jurídico.
JJ. No acórdão proferido no processo n.º 86/12.5YQSTR.E1-A.S1, em 2014-05-14, também designado por Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 9/2014, o STJ apreciou o impacto do rappel no preço de compra efetivo, para efeitos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 370/93, de 29 de outubro, entendimento aplicável ao caso sub judice, na opinião da RFP, precisamente por apreciar a relevância do rappel nos preços faturados.
KK. Neste acórdão, esclareceu o STJ que “Segundo o n.º 2 do mesmo artigo, o preço de compra efectivo é o que se obtém deduzindo ao preço que consta da factura de compra os descontos directamente relacionados com a transacção, que se encontrem identificados na própria factura ou, por remissão desta, em contratos de fornecimento ou tabelas de preços e que sejam determináveis no momento da respectiva emissão. // (…)
Um desconto de quantidade traduz-se num abatimento ao preço base de um produto que progride em razão simétrica à das quantidades transaccionadas. Por conseguinte, a quantidade e o produto são elementos que fazem parte do próprio conceito de desconto de quantidade. Por outro lado, o período de vigência do desconto não faz qualquer sentido no âmbito de um desconto de quantidade uma vez que o desconto opera, nos termos acordados pelas partes, sempre que seja atingido o limiar quantitativo fixado.” (sublinhado nosso).
LL. Especificamente sobre o rappel, continuou o STJ que “O ‘rappel’ é geralmente qualificado como desconto de quantidade porque constitui um abatimento na prestação pecuniária do revendedor estruturalmente ligado ao volume de mercadoria por ele adquirida. // Encontra-se, por regra, previsto no contrato geral de fornecimento. // O “rappel” tanto pode ser fixo, isto é, traduzir-se numa dada percentagem que é abatida ao preço das aquisições, como ser baseado num certo volume de aquisições (em euros, quilos, litros, etc., comportando, por vezes, escalões) e progredir à medida do aumento das aquisições. // (…)Como decorre do exposto, o desconto “rappel” é sempre, em qualquer das duas modalidades (condicional ou incondicional), um desconto de quantidade, normalmente previsto no acordo geral de fornecimento, com anterioridade a cada concreto acto de aquisição, podendo concretizar-se tanto no momento da emissão da factura, como posteriormente. // O desconto constitui um efeito de uma condição: a consecução imediata ou num determinado arco temporal de um certo volume de aquisições. «Trata-se, mais precisamente, de uma condição suspensiva subsumível à categoria das condições potestativas a parte debitoris, dado que o evento condicionante é um acto do devedor, cuja verificação desencadeia a produção do efeito (a obtenção do desconto).» [24] // (…) // Não deixando de destacar que se é a própria lei que, nos termos do artigo 3.º, n.º 4, alínea c), afasta o regime geral da venda com prejuízo sempre que o reaprovisionamento de bens se efectue a preço inferior permitindo a substituição do anterior preço efectivo de compra pelo preço resultante da nova factura, «por maioria de razão deve ser admitida a dedução dos descontos ab initio previstos ainda que só supervenientemente se venham a concretizar».” (sublinhado nosso).
MM. Conclui o STJ que “Vê-se, assim, que, nas situações contempladas nos dois acórdãos, se trata de um desconto ‘rappel’, em escalões, baseado num certo volume de aquisições em euros, progredindo o desconto em função do aumento das aquisições em euros e iniciando-se o primeiro escalão em €1.
Também este desconto, em função das quantidades vendidas, se insere na estratégia comercial do fornecedor de estimular a aquisição de produtos por parte do revendedor e, assim, incrementar o seu volume de vendas sendo evidente a relação do desconto com a transacção pelo nexo que se estabelece entre a quantidade de produto adquirida e o desconto.
Existe, com efeito, uma ligação estrutural do desconto ao volume da mercadoria adquirida uma vez que o desconto progride à medida do aumento das aquisições em euros.
A circunstância de o primeiro escalão do desconto se iniciar na unidade não o descaracteriza como desconto de quantidade. E, em função da progressão dos descontos, em escalões, à medida do aumento das quantidades adquiridas, mostram-se destituídas de fundamento as afirmações de que o «desconto não é justificado pela quantidade de produtos adquirida» ou de que «não existe um objectivo quantitativo» para o revendedor beneficiar do desconto que o acórdão recorrido acolhe.
A convenção de o limite mínimo do primeiro escalão se situar na unidade (em euros, quilos, litros, etc.) e o limite máximo do último escalão se situar em 99 999 999 999,00 dá expressão, até com forte carga “simbólica”, a um desconto de quantidade construído no âmbito das relações negociais, tendencialmente duradouras, emergentes de um contrato-quadro, que hoje em dia se estabelecem entre fornecedor e revendedor. // (…)
Fixar jurisprudência nos seguintes termos:
Um desconto ‘rappel’ escalonado, cujo primeiro escalão se inicia na unidade (em euros, quilos, litros, etc.), é um desconto de quantidade que, nos termos dos n.os 2 e 3 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 370/93, de 29 de Outubro, na redacção do Decreto-Lei n.º 140/98, de 16 de Maio, releva para a determinação do preço de compra efectivo, satisfeitas que se mostrem as restantes exigências de se encontrar identificado na factura ou, por remissão desta, em contratos de fornecimento ou tabelas de preços e de ser susceptível de determinação no momento da respectiva emissão.” (sublinhado nosso).
NN. De acordo com o entendimento do STJ, o rappel tem por efeito reduzir o valor de venda dos bens faturados ao cliente (em função do volume de bens que o cliente conseguiu vender aos consumidores) afigurando-se lógico que o rappel afete diretamente o valor faturado pelo fornecedor ao cliente.
OO. Se a aplicação do rappel, seja no imediato, seja no termo de um horizonte temporal, reduz o valor dos bens faturados pelo fornecedor ao cliente, significa que o valor bruto de vendas foi alterado pelo valor do rappel.
PP. Não se compreende, por isso, o entendimento da douta sentença recorrida em julgar irrelevante o rappel para determinação do valor líquido de vendas, ao abrigo da cláusula 32 do licence agreement.
QQ. Entende o Tribunal a quo que o rappel se insere nas exceções aos rebates, nos termos da cláusula 32 do licence agreement. Na realidade, se atendermos às exceções aos rebates, constata-se que a Recorrida explicou que não são descontos relevantes para o valor de vendas líquido (e, consequentemente, para o cálculo das royalties) as bonificações ao consumidor, as promoções temporárias de preço, as promoções de preços ao consumidor e ao comércio e outras de natureza similar, nos termos da cláusula 32 do licence agreement.
RR. As bonificações ao consumidor, as promoções de preço ao consumidor, as promoções temporárias de preço e ao comércio são descontos vocacionados para o consumidor final, muitas vezes inseridas na estratégia comercial, de venda ou de marketing das grandes superfícies relativa a produtos específicos, repercutindo esses custos (os descontos efetuados) no fornecedor.
SS. São esses descontos, mais dependentes da estratégia comercial do cliente e direcionados para a venda ao consumidor, que são excecionados aos rebates previstos na cláusula 32 do licence agreement.
TT. O rappel é um desconto dirigido ao cliente, funcionando como incentivo para o cliente incrementar o volume de vendas do produto. Não é um desconto dirigido ao consumidor ou que resulte da estratégia comercial, de vendas ou de marketing do cliente.
UU. Não se vê porque haveria de se colocar o rappel ao lado das bonificações ao consumidor, as promoções de preço ao consumidor, as promoções temporárias de preço e ao comércio, não fazendo sentido que um desconto que afeta diretamente o valor de venda dos bens possa não ser relevado na determinação do valor líquido das vendas.
VV. Entende o Tribunal a quo que o facto de o rappel ser relativo a “período de tempo determinado e sujeitos a revisão periódica” determina a sua exclusão do conceito de rebates dedutíveis ao valor bruto de vendas.
WW. De facto, sendo o rappel um desconto que resulta do caráter de permanência da relação contratual entre o fornecedor e o cliente, (no caso da Recorrida, fixado em um ano) constituindo um abatimento na prestação pecuniária do cliente estruturalmente ligado ao volume de mercadoria adquirida, dificilmente se pode defender que tem um caráter temporário, no sentido de “momentâneo” ou de “curta duração”.
XX. Afigura-se à RFP que, ao excluir o rappel dos rebates dedutíveis ao valor bruto das vendas, para efeitos de determinação do valor líquido das vendas nos termos da cláusula 32 do licence agreement, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento de facto.
YY. Ainda, sobre o regime de preços de transferência, a AT demonstrou, pela fundamentação de facto e de direito constante no relatório final de inspeção que a existência de relações especiais entre a Recorrida e a SPN conduziu ao estabelecimento de condições contratuais diferentes, no cálculo das royalties a pagar, caso tivessem sido estabelecidas, entre pessoas independentes, cf. teor do relatório do procedimento inspetivo constante do facto provado em R) a fls. 18 e 19 da douta sentença recorrida.
ZZ. Explicam os SIT – e decorre do supra exposto – que ao excluir o rappel dos rebates dedutíveis ao valor bruto de vendas, a SPN impôs à Recorrida uma base de cálculo das royalties que não seria negociada entre partes independentes.
AAA. A SPN conseguiu negociar com a Recorrida uma sobrevalorização artificial do valor líquido de vendas – a base de cálculo das royalties – que não é expectável encontrar entre entidades independentes.
BBB. Afigura-se que os SIT descreveram e fundamentaram devidamente os termos em que normalmente ocorrem operações da mesma natureza entre entidades independentes e em idênticas circunstâncias,
CCC. Resultando que a negociação desta base de cálculo das royalties só foi possível em virtude e por causa das relações especiais existentes entre a SPN e a Recorrida, apurando um lucro tributável diverso do que resultaria caso as partes fossem entidades independentes.
DDD. Recordamos que, de acordo com o entendimento deste Venerando Tribunal Central Administrativo do Sul vertido no acórdão proferido no processo n.º 7049/13, proferido em 2015-02-19, disponível em www.dgsi.pt, é sobre o sujeito passivo que recai o ónus da prova de demonstração do erro ou excesso na quantificação da correção efetuada, nos termos do n.º 3 do artigo 74.º da LGT, tema sobre o qual a douta sentença recorrida é omissa.
EEE. Respeitosamente, ao entender diferentemente, RFP é da opinião que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito, violando o disposto no (à data) artigo 58.º do Código do IRC e do n.º 3 do artigo 77.º da LGT.
FFF. Nestes termos, afigura-se à RFP, que o valor das correções relativas aos créditos incobráveis e aos preços de transferência devem ser expurgados para efeitos do cálculo dos juros indemnizatórios devidos.
GGG. Em face de todo o supra exposto, padecendo a douta sentença recorrida de (i) erro de julgamento de direito ao requalificar os créditos indevidamente contabilizados como incobráveis em provisões para créditos de cobrança duvidosa, em violação do disposto no (à data) artigo 35.º do Código do IRC, (ii) erro de julgamento de facto ao considerar o rappel uma exceção aos rebates previstos na cláusula 32.º do licence agreement, e (iii) erro de julgamento de direito ao considerar que a AT não logrou cumprir o disposto no n.º 3 do artigo 77.º da LGT, não demonstrando de que forma o cálculo dos royalties a pagar pela Recorrida à SPN divergem das condições praticadas por entidades independentes, em violação do disposto no (à data) artigo 58.º do Código do IRC e no n.º 3 do artigo 77.º da LGT, não podendo subsistir no ordenamento jurídico-tributário.
X
A Sociedade Impugnante, ora recorrida, apresentou contra-alegações de fls. 3447 e ss. (numeração do processo em formato digital-sitaf), expendendo, as seguintes conclusões: «
A) O presente recurso foi interposto pela Fazenda Pública, tendo por objeto a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, no processo de impugnação judicial n.º 762/09.0BESNT, referente aos atos de liquidação de IRC e juros compensatórios do período de tributação de 2004, na parte em que a mesma julgou procedente a impugnação, quanto às correções relativas aos “Créditos considerados incobráveis” e aos “Preços de transferência”;
B) No que concerne aos créditos incobráveis, a Fazenda Pública entende que o enquadramento fáctico-tributário feito pelo Tribunal Recorrido lhe estava vedado, na medida em que o contencioso de plena jurisdição não atribui aos Tribunais “a faculdade de alterarem a contabilidade dos impugnantes, apreciando o ato tributário com base num tratamento contabilístico que não existe”;
C) Essa alegação não tem, no entanto, fundamento, pois o Tribunal Recorrido subsumiu os factos por si dados como assentes – e que nem sequer foram contrariados pela Fazenda Pública em sede de recurso – às normas legais e contabilísticas aplicáveis, não estando limitado, nem sendo sequer obrigado, à correspondência entre o procedimento adotado pelo sujeito passivo e as normas que a AT invoca, para fundamentar a correção das declarações entregues por aquele;
D) Acresce que os Tribunais, desde que obviamente obedeçam ao princípio da legalidade e não profiram decisões que sejam contrárias às normas legais aplicáveis, como foi o caso, podem sempre considerar que o procedimento adotado pela AT, em sede inspetiva, foi abusivo ou ilegal, em função dessas mesmas normas, sancionando aquele que foi o procedimento adotado pelo sujeito passivo na situação concreta. Nada disto se encontra vedado aos Tribunais num verdadeiro e efetivo contencioso de plena jurisdição – veja-se por exemplo o Ac. do STA, de 02/12/2015, proferido no recurso n.º0754/15;
E) De resto, mesmo num contencioso de anulação, o Tribunal nunca poderia ficar vinculado a qualificações jurídicas, mas somente à causa de pedir e aos factos por si apurados - veja-se a este propósito o Ac. do STA, de 24/04/1996, proferido no processo n.º 039596;
F) De facto, em função do seu entendimento e da prova que considerou como assente, o Tribunal Recorrido acabou por concluir que, ao invés do que havia sido invocado pela AT, o que estava em causa no relatório de inspeção era “a utilização de provisões para créditos de cobrança duvidosa constituídas nos termos do artigo 35.º do CIRC, que, por ter decorrido o período de 24 meses e por se encontrarem constituídas a 100%, foram levadas a custo”;
G) Pelo que entendeu legitimamente, ao abrigo dos poderes que lhe assistem no âmbito do contencioso de plena jurisdição, que não havia fundamento para aplicar “o regime dos créditos incobráveis regulado no artigo 39.º do CIRC, que implica que os créditos nessas condições sejam levados diretamente a custos, pois, a situação de facto em causa nos autos não se enquadra nesse regime, sendo antes subsumível no artigo 35.º do CIRC”;
H) Ao contrário do que lhe imputa a Fazenda Pública, o Tribunal Recorrido não criou, nem avalizou, qualquer realidade paralela, nem sequer pretendeu direcionar a contabilidade para um caminho distinto daquele que a própria Recorrida trilhou, ou suprir eventuais falhas que essa mesma contabilidade pudesse apresentar;
I) Razão pela qual falece desde logo o argumento da Fazenda Pública de que o Tribunal não podia sancionar a conduta da AT. Não só podia, em face da prova produzida, como se impunha, em função das normas e dos princípios aplicáveis nesta matéria, proceder à anulação da correção em questão;
J) Já no que respeita à demonstração de que o procedimento adotado pela Recorrida foi neutral em termos fiscais, as alegações da Fazenda Pública não trazem nada de novo aos autos, a mais do que havia já sido invocado pela AT em sede de procedimento inspetivo;
K) A Recorrente utiliza o entendimento clássico da AT, de que não é possível deduzir um custo, num determinado exercício, mesmo que fique demonstrado que só dessa forma se poderá assegurar uma tributação efetivamente neutra e da qual não resulte prejuízo para o sujeito passivo ou a arrecadação injustificada de impostos para o Estado;
L) No entanto e como se evidenciou nos autos, designadamente pelo depoimento da referida testemunha J ………………………., estamos perante créditos efetivamente incobráveis, sendo que a contabilização dessa incobrabilidade se encontrava totalmente provisionada em termos fiscais. Ou seja, a anulação destes créditos não teve impacto fiscal, na medida em que a provisão já tinha sido constituída anteriormente e também pelo facto de essa anulação ter tido como contrapartida um proveito de montante igual;
M) Já a Fazenda Pública, ao pretender tributar o custo associado à anulação destes créditos (registados na rubrica #692 – Dívidas incobráveis), origina, como certamente antecipou o Tribunal Recorrido, uma duplicação de coleta, pois o proveito extraordinário associado à utilização da provisão para os créditos em apreço foi já integrado no lucro tributável do período de 2004 e, como tal, sujeito a tributação nesse ano;
N) E esta neutralidade (contabilística) também se verifica no plano fiscal, ao contrário do que sustenta a Recorrente, na medida em que os créditos anulados e aqui em causa encontravam-se em mora há mais de 24 meses e provisionados a 100%, pelo que o respetivo custo foi aceite para efeitos fiscais, aquando da constituição/reforço das respetivas provisões, nos termos do artigo 35º do Código do IRC – facto nunca contestado pela AT nesta ou em anteriores ações inspetivas;
O) De resto, caso a Fazenda Pública também pretendesse contestar essas evidências, teria certamente recorrido da sentença, nesta parte, no que se refere aos factos dados como assentes – o que não aconteceu;
P) A Fazenda Pública faz tábua rasa dos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade, plasmados no artigo 55.º da LGT, bem como, do disposto no n.º 2 do artigo 266.º da CRP”, pois é por demais evidente que da anulação dos créditos em apreço não resulta qualquer impacto fiscal e essa constatação era essencial para a decisão a proferir;
Q) A mesma conclusão resulta do próprio princípio da tributação das empresas segundo o seu lucro real, previsto no n.º 2 do artigo 104.º da CRP;
R) A Fazenda Pública não atribui qualquer relevância à substância económica da operação em apreço, nem ao facto de esta ter configurado uma mera utilização de provisões, conforme foi amplamente demonstrado, e não o reconhecimento da incobrabilidade de créditos;
S) De facto, mais do que o enquadramento dos movimentos contabilísticos relativos à provisão e aos próprios créditos, nas normas plasmadas nos artigos 35.º e 39.º do Código do IRC, importa perceber se a tributação, no ano de 2004, deste custo, representa ou não a reposição da correta situação tributária da Recorrida;
T) Devendo, por esse motivo, improceder o recurso nesta parte;
U) Relativamente à correção dos “Preços de Transferência – Rappel”, não decorre, nem das alegações de recurso, nem das conclusões formuladas pela Recorrente, que tenha sido dado cumprimento ao ónus previsto no artigo 640.º do Código de Processo Civil, desde logo por falta de indicação dos factos que, em concreto, deveriam ter sido incluídos, ou retirados, da factualidade dada como assente;
V) A Recorrente deveria ter assinalado e transcrito os depoimentos que, no seu entendimento, não lograram provar a verificação dos factos controvertidos ou aqueles que eventualmente lograram demonstrar o seu contrário – vide Ac. do TCAS, de 21/05/2015, proferido no processo n.º 08104/14;
W) Quais desses factos a Fazenda Pública considera que não foram provados, em face, por exemplo, da prova testemunhal produzida? E porquê? Que específico meio de prova – porque a Recorrida produziu prova documental e testemunhal - não permitia demonstrar que o rappel estava incluído nas exceções previstas na cláusula 32 do licence agreement?;
X) Nada disto é explicado. Pelo contrário, a Fazenda Pública limita-se a invocar uma série de conceitos e dogmas jurídicos que não têm qualquer aderência à realidade dos factos, tendo tais factos sido devidamente esclarecidos pelas testemunhas inquiridas;
Y) Por que razão refere que o rappel praticado pelas partes está nos antípodas dos descontos previstos na referida cláusula? Algum depoimento testemunhal a levou a alcançar esta conclusão?;
Z) Todas as alegações da Fazenda Pública teriam que ser devidamente sustentadas, por forma a que o tribunal de recurso possa aferir se a sentença enfermou de algum deficit instrutório, caso contrário, trata-se de meras convicções ou de argumentos meramente opinativos;
AA) Ao fundamentar dessa forma o seu recurso, a Fazenda Pública não deu cumprimento ao ónus de alegação a que estava adstrita, por força do mencionado artigo 640.º do CPC;
BB) Quanto ao invocado erro de julgamento, também não pode proceder, pois o Tribunal Recorrido justificou por que razão os descontos de rappel praticados se encontravam englobados nas exceções contratuais previstas pelas partes, na cláusula 32 do Licence Agreement, sendo que a AT não justificou, em momento algum, que as condições acordadas violavam as regras de mercado;
CC) De facto, sendo legítimo que a SPN procurasse assegurar a remuneração dos ativos intangíveis em apreço, mediante a eliminação de fatores resultantes de decisões locais e que, a serem aceites, teriam um impacto não controlado por parte da SPN, nos proveitos desta, a Recorrida acabou por aceitar as condições refletidas no contrato;
DD) A fixação da taxa de royalty em 5% resulta, naturalmente, de uma avaliação por parte da SPN relativamente à atividade da Recorrida e, consequentemente das situações passíveis de serem reconhecidas como um desconto a abater às vendas, nomeadamente de carácter estrutural e aceite pela própria SPN - tendo sido desconsideradas da análise as resultantes de estratégias de vendas locais, cuja gestão e decisão somente cabe à Recorrida. Esta é a explicação dos factos;
EE) A interpretação que a Fazenda Pública faz da referida cláusula 32, não só é abusiva, como não corresponde à vontade das partes, a qual ficou devidamente expressa nestes autos, seja por via da prova documental (veja-se, por exemplo e para além do próprio contrato, a carta junta à p.i. como Documento n.º 60), seja testemunhal;
FF) A cláusula em causa tem de ser enquadrada no âmbito do princípio da liberdade contratual ou negocial, como um corolário do princípio da autonomia privada, só limitado, em termos gerais, nos termos das disposições dos artigos 280.º e seguintes e 397.º e seguintes, todos do Código Civil;
GG) Não estava na disponibilidade da AT requalificar as cláusulas contratuais e interpretá-las de forma diferente da vontade das partes expressa no contrato. Tal como não estava na disponibilidade da Fazenda Pública, sobretudo perante a prova produzida nos autos e que foi dada como assente pelo Tribunal Recorrido, interpretar essas cláusulas de um modo que não corresponde àquela vontade e à prova produzida;
HH) Por fim, quanto à aplicação do regime dos Preços de Transferência, diga-se que ficou desde logo demonstrada a adequação da percentagem acordada (5%), no contexto das especificidades das demais condições, a qual também estava evidenciada no processo de documentação fiscal organizado nos termos previstos no então artigo 58.ºdo Código do IRC;
II) Pelo contrário e conforme o Tribunal a quo bem referiu, a AT não fundamentou a sua correção devidamente, em função da regra específica prevista no artigo 77.º, n.º 3, da LGT;
JJ) De facto e tal como a própria Fazenda Pública refere, a AT limita-se a alegar que “da não consideração do valor efectivo das vendas líquidas, na base de cálculo da contraprestação a pagar pelos direitos de utilização dos activos incorpóreos, resulta uma sobre quantificação dos royalties devidos pela N.............. P............, não indispensável para a realização dos proveitos, e que nenhuma empresa independente estaria disposta a suportar”;
KK) Que método ou operação foram utilizados pela AT para considerar que as “condições” estabelecidas entre as partes aqui em apreço não eram condições normais de mercado? Que operações foram tidas em consideração, para dizer que, numa situação em que interviessem empresas independentes, não seriam fixadas as mesmas regras?;
LL) Apenas refere, em suma, que “é expetável que entre entidades independentes, o valor do rappel concedido aos clientes seja deduzido ao valor bruto de vendas para determinação das royalties devidas, nos termos do contrato de licenciamento respetivo”;
MM) As correções em matéria de Preços de Transferência não se podem basear em expectativas ou meras presunções, mas numa metodologia concreta, na aplicação de regras concretas que permitam aferir das condições de mercado e que normalmente passam pela aplicação preferencial do Método do Preço Comparável de Mercado;
NN) Assim, é por demais evidente que a fundamentação constante do Relatório de Inspeção não é, de forma alguma, suficiente para demonstrar o recurso ao regime dos Preços de Transferência e realizar a correção em apreço, na medida em que ficou por demais demonstrado que a AT incumpriu, nomeadamente e no que ora releva, com o disposto no artigo, 77.º, n.º 3, da LGT;
X
B) Recurso interposto pela Sociedade impugnante.
Nas alegações de fls. 3377 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), a recorrente formula as conclusões seguintes: «(…)
B) O recurso circunscreve-se à parte da sentença que julgou improcedente a correção referente à “Não dedutibilidade fiscal dos custos suportados com a comparticipação ao CAP”, no montante de € 439.645,34;
C) Nesta parte, o Tribunal a quo não colocou propriamente em causa a existência dos gastos relativos ao CAP, mas considerou que o não conhecimento do conteúdo do contrato celebrado entre a Recorrente e o CAP inviabilizava a cabal comprovação e a possibilidade de dedução desses gastos;
D) Contudo, considera a Recorrente que o Tribunal não poderia imputar-lhe o incumprimento desse ónus probatório, para efeitos do enquadramento dos gastos no artigo 23.º do CIRC, ou qualquer insuficiência probatória quanto aos factos por si alegados, quando, podendo fazê-lo, não solicitou à Recorrente a apresentação de prova adicional à que foi junta na p.i. e, especificamente, a apresentação daquele contrato;
E) De facto, a Recorrente não desconhece a regra vertida no artigo 74.º da LGT, nem pretende transferir para o Tribunal um ónus que não cabe na sua esfera de atuação nem nos seus poderes, mas a verdade é que, em face do teor da decisão agora proferida, o Tribunal a quo tinha, salvo o devido respeito, a obrigação de lhe solicitar a produção de prova adicional;
F) A Recorrente ficou com a convicção de que o Tribunal Recorrido tinha percebido a justificação dos custos e a mecânica dos fluxos financeiros subjacentes e, sobretudo, as relações comerciais entre as entidades envolvidas – porque isso decorreu, no entendimento da Recorrente, da própria audiência de inquirição de testemunhas;
G) Sendo que o contrato em causa existe e podia ter sido junto aos autos, caso o Tribunal o tivesse solicitado à Recorrente, justificando obviamente a respetiva necessidade, nomeadamente, por insuficiência probatória ou dúvidas suscitadas na audiência de julgamento realizada.
H) No entendimento da Recorrente, e salvo o devido respeito, o Tribunal deveria ter exercido até ao limite o seu poder de investigação e o princípio do inquisitório, plasmado, desde logo, nos artigos 99.º da LGT e 13.º do CPPT – porque se percebe agora que mantinha dúvidas quanto aos factos relevantes alegados na p.i. e também dos que foram objeto da inquirição de testemunhas – e, nessa medida, deveria ter solicitado à Recorrente que procedesse à apresentação de meios de prova e/ou documentação específicos;
I) De facto, o princípio do inquisitório “tem por objetivo superar insuficiências de alegação e de prova das partes, mas move-se dentro dos limites fixados dos factos alegados e do conhecimento oficioso” – cfr. Ac. do Tribunal Central Administrativo Norte, de 13/07/2017, proferido no processo n.º 39/17.7BEVIS;
J) Mais, os poderes judiciais que estão subjacentes a este princípio devem ser utilizados sempre que o Tribunal considerar que se justifica a sua intervenção, nomeadamente nos casos em que seja previsível a existência de prova adicional à que foi apresentada pelas partes – cfr. Ac. do Tribunal Central Administrativo Norte, no de 29/01/2015, proferido no processo n.º 2419/08.0BEPRT;
K) E, na realidade, a Recorrente facilmente poderia ter obtido – caso fosse esse o efetivo entrave à comprovação dos gastos – aquele contrato, porquanto ele existe, sendo certo que o Tribunal não tinha qualquer motivo para considerar, ou presumir, que o mesmo não existia;
L) Pelo que a decisão proferida pelo Tribunal a quo enferma de ilegalidade, por manifesto deficit instrutório e pela violação do princípio do inquisitório, plasmado entre outros no artigo 99.º da LGT e 13.º do CPPT, devendo ser anulada desde logo com esse fundamento;
M) Mas ainda que se considere que essa prova é efetivamente determinante para a decisão definitiva a proferir nos presentes autos, a Recorrente requereu a junção, a título excecional mas a bem do cumprimento do princípio da verdade material, do Contrato de Venda, Distribuição e Comercialização e do Contrato de Fabrico, celebrados entre a Recorrente e o CAP, no ano de 1990, e que se encontravam em vigor à data dos factos e, bem assim, do contrato que foi celebrado, nos mesmos termos e pelas mesmas entidades, em 28/02/2007, e que viria a revogar o anterior – cfr. Documentos n.ºs 1 a 3 acima juntos;
N) Sem prejuízo disso, a Recorrente mantém o entendimento que a prova que foi realizada nestes autos é suficiente para demonstrar a veracidade dos factos controvertidos, nomeadamente, a natureza e âmbito dos gastos com o CAP e a sua indispensabilidade para a atividade desenvolvida pela Recorrente, pois o teor daquele contrato apenas confirma, de forma redundante, a prova documental e testemunhal realizada, desde logo, os termos escritos do acordo celebrado com o CAP;
O) Ainda assim, a junção daquela documentação, nesta fase de recurso, tem cobertura legal, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 651.º do CPC, na medida em que se tornou relevante, em face da decisão proferida em 1.ª instância e do facto de ter sido imputado à Recorrente a falta de junção desse documento - cfr. exemplificativamente, Ac. TCAS, de 28/11/2013, proc. 6953/13; Ac. TCAS, de 27/3/2014, proc. 2912/09; Ac. TCAS, de 9/6/2016, proc. 8610/15 ou Ac. TCAS, de 25/07/2016, proc. 9718116;
P) Não sendo aceite a junção desta documentação, deverá ser ordenada, ao abrigo dos poderes conferidos pelo n.º 2 do artigo 662.º do Código de Processo Civil, a baixa dos autos à 1.ª Instância, por forma a que o Tribunal Recorrido tenha em consideração a documentação agora junta (e por si considerada como em falta) e profira uma nova decisão de mérito, nesta parte, a qual certamente pugnará pela procedência do pedido formulado pela Recorrente, também nesta parte, em face da junção do documento que o Tribunal de 1.ª Instância qualificou como essencial para a decisão de mérito, quanto à correção em causa;
Q) Acresce ao exposto que, mesmo não tendo analisado o contrato celebrado com o CAP – exclusivamente pelos motivos acima referidos -, a interpretação que o Tribunal Recorrido fez, da prova produzida nos presentes autos e, em concreto, dos depoimentos testemunhais prestados, consubstancia um manifesto e evidente erro de julgamento da matéria de facto;
R) Primeiramente, porque, apesar de o Tribunal Recorrido ter analisado em detalhe o depoimento prestado pela testemunha J …………………….. (considerado “claro e coerente”), destacando vários pontos, não deu como provado qualquer facto relacionado com esse depoimento e, em concreto, com os gastos relativos ao CAP;
S) De facto, até no que respeita à “discrepância” detetada pela AT, a explicação dada por essa testemunha foi perfeitamente aceitável e enquadrável nos procedimentos que foram adotados nos anos subsequentes, nas mesmas circunstâncias e relativamente aos mesmos factos tributários – v. a partir dos 0:49 mins de inquirição;
T) Tendo por base o depoimento desta testemunha, foi possível perceber que a análise que a AT fez nesta matéria – assim como o próprio Tribunal Recorrido – suportou-se em documentos que não podiam ser analisados per se ou de uma forma isolada v. a partir dos 0:51 mins de inquirição;
U) Entre outros factos, ficou demonstrado pela prova documental e testemunhal produzida que, em consequência do novo procedimento adotado, as partes decidiram que os montantes debitados pela Recorrente ao CAP, até à data da implementação da metodologia supra descrita, seriam anulados e incluídos nos débitos mensais, daí tendo resultado a anulação de todos os Avisos de Lançamento anteriormente emitidos;
V) A referida anulação não foi realizada por documento, mas sim por um valor geral, repartido em três Avisos de Lançamento, cujo total excede os valores que haviam sido debitados - factos também demonstrados pelos documentos internos juntos com a p.i., assim como, através da prova testemunhal realizada;
W) A não aceitação deste custo apenas poderia admitir-se no caso de nada ter sido feito, por parte da Recorrente, para regularizar a situação resultante do procedimento acima descrito (anulação excessiva dos débitos que haviam sido efetuados ao CAP, no valor de € 112.266,20);
X) Os débitos e os créditos, que foram analisados pela AT, encontram-se relacionados com um terceiro movimento contabilístico, resultante da implementação da nova metodologia de faturação ao CAP, no âmbito da qual se previa a existência de um débito único para a diversidade de tarefas/atividades desenvolvidas pela Recorrente, onde estariam incluídos, entre outros, os custos inerentes à disponibilização de infraestruturas (espaço e pessoas);
Y) E da análise que fez ao depoimento da testemunha J ……………………., parece resultar que o Tribunal Recorrido teve a mesma perceção, contudo, decidiu em sentido contrário a esse, não dando como provado qualquer facto relacionado com a relação contratual estabelecida pelas partes ou com a contabilização dos gastos, invocando, como único fundamento, o desconhecimento do contrato celebrado com o CAP.;
Z) Acresce a todo o exposto, que a Recorrente realizou a demonstração da correta aplicação retroativa (i.e. com efeitos a 1 de Janeiro de 2004) dos referidos procedimentos, por forma a comprovar que a remuneração da disponibilização de espaço e recursos, efetuada neste ano de 2004, não ficou comprometida pela alteração de procedimentos ocorrida;
AA) Se o que impediu o Tribunal a quo de decidir favoravelmente a anulação desta correção foi a alegada impossibilidade de quantificação dos gastos em causa, a verdade é que a Recorrente procedeu a essa mesma quantificação, explicando, em detalhe e através de documentos internos e prova testemunhal, os motivos para o apuramento da aludida diferença de cerca de € 112.000;
BB) E nem sequer se diga que esta prova não era suscetível de demonstrar a dedutibilidade do custo, pois é mais do que pacífica a jurisprudência nesta matéria, no sentido de aceitar que a mesma seja realizada através de documentos internos e de testemunhas – cfr. Ac. do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 28/03/2019, proferido no processo n.º 69/17.9BCLSB ou o Ac. do Tribunal Central Administrativo Norte, de 26/10/2017, proferido no processo n.º 03234/04;
CC) A explicação da natureza dos custos em causa também foi feita pela Recorrente, tendo sido referido em concreto a que situações os mesmos respeitavam;
DD) Ficou também demonstrado o seguinte:
- Que o valor debitado autonomamente, através de Avisos de Lançamento, emitidos mensalmente entre janeiro e agosto de 2004, originou um proveito na sua esfera, no montante de € 327.379,14, superior ao devido em € 112.266,20;
- Que os valores em apreço foram novamente objeto de faturação, encontrando-se incorporado, nas faturas emitidas entre janeiro e dezembro de 2004, o valor de €434.935,63
- face à complexidade e timing de implementação do novo critério de faturação, estes débitos correspondem aos valores inicialmente calculados, os quais, conforme demonstrado, não correspondiam aos reais, por excesso, em €112.266,20;
EE) Assim e com o intuito de eliminar uma eventual duplicação de proveitos, a Recorrente emitiu três Avisos de Lançamento, cujo valor global corresponde ao valor dos Avisos de Lançamento emitidos entre janeiro e agosto de 2004, no valor de € 327.379,14, bem como, a anulação de parte do débito efetuado em excesso, de € 112.266,20;
FF) Tudo isto foi absolutamente ignorado pelo Tribunal a quo, o qual entendeu centralizar a sua análise, como se viu, no teor do contrato celebrado entre a Recorrente e o CAP, mas do qual, na realidade, não se conseguiria retirar estas conclusões;
GG) Daí o erro de julgamento da matéria de facto em que incorreu o Tribunal a quo, nesta parte, que inclui não ter dado como assentes factos que ficaram inequivocamente demonstrados pela prova documental e testemunhal produzida e que o próprio Tribunal expressamente referiu na sentença, ao analisar o depoimento prestado pela testemunha J ……………………..;
HH) Esses factos são os seguintes:
1. Que o CAP é um agrupamento europeu de interesse económico, constituído entre a Recorrente e a General ……………, que é detentora da marca C…., em 50 % por cada um dos sócios, com o intuito de comercializar cereais de pequeno-almoço;
2. Que o CAP não tem empregados em Portugal, sendo que toda a força de trabalho e organização são fornecidos pela Recorrente;
3. Que o CAP vende o produto que é parcialmente fabricado pela Recorrente, na fábrica de ……….a, o qual é adquirido a sociedades aliadas, fora de Portugal, no âmbito de uma relação comercial estabelecida com a Recorrente;
4. Que no final de cada mês o CAP fatura à Recorrente pelas vendas que esta fez aos clientes do CAP;
5. Que existe um acordo entre as partes, quanto aos serviços que a Recorrente presta ao CAP, designadamente a cedência de instalações e pessoal;
6. Que todos os anos há uma negociação para os custos de estrutura, sendo feito um estudo pelo departamento de controle e gestão, em relação à parte a repartir pelos diversos negócios;
7. Que, quanto ao custo dos cereais, os custos de estrutura assumidos são depois debitados pela Recorrente ao CAP, utilizando-se para a repartição dos custos o método ABC - Activity Based Costing;
8. Que o montante de € 112.000, debitado e posteriormente creditado, resulta do facto de os débitos mensais não contemplarem a totalidade dos custos de estrutura, que poderiam também, em certas situações, não estar já calculados;
9. Que o acordo para a repartição dos custos de estrutura foi feito durante o ano e foi debitado um valor que depois foi corrigido em determinado mês, tendo sido emitidas as notas de crédito para corrigir e acertar o valor então acordado.
II) Sendo dados como assentes esses factos, ou sendo simplesmente retificado o erro de julgamento da matéria de facto, em sede de recurso, deverá ser aceite a dedutibilidade destes gastos, ao abrigo do disposto no artigo 23.º do Código do IRC, pelo facto de terem sido comprovados, assim como, a sua indispensabilidade para a atividade da Recorrente, determinando-se a anulação da decisão recorrida, nesta parte.
X
Não há registo de contra-alegações.
X
A Digna Magistrada do M. P. junto deste Tribunal notificada para o efeito, emitiu parecer no sentido de improcedência de ambos os recursos.
X
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
X
II- Fundamentação
2.1. De Facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: «
A) Em 19.04.1995, a Impugnante formulou um pedido de indemnização cível junto do Tribunal Criminal da Comarca de Lisboa, processo n.º7499/92.5JDLSB, contra Celestino Marques Miranda, no montante de 499.172$00, decorrente da emissão de cheques sem provisão destinados ao pagamento de mercadorias vendidas e entregues ao mesmo, tendo havido transação homologada por sentença de 30.10.1998 (cfr. documentos n.os 50 e 51 juntos com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
B) Através de carta, com data de 25.09.1995, dirigida à sociedade S……………Supermercados, Lda., a Impugnante solicitou o pagamento das faturas n.os A15- 06524 e A15-08829, no montante de 1.949.193$00 (cfr. documento n.º 55 junto com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
C) Através de carta, com data de 25.06.1996, dirigida à sociedade Supermercados F…………….. Lda., a Impugnante solicitou o pagamento da totalidade das prestações referente a um contrato de venda de equipamento no montante de 343.274$00 (cfr. documento n.º 38 junto com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
D) Em 19.09.1996, a Impugnante intentou contra a sociedade Supermercados F …………..Lda., ação declarativa de condenação, no Juízo Civil do Porto, na qual foi peticionado o pagamento do montante de 343.274$00, acrescido de juros de mora (cfr. documento n.º 36 junto com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
E) Em 28.01.1997, a Impugnante formulou um pedido de indemnização cível junto do Tribunal Criminal da Comarca de Lisboa, processo n.º 17984/92.3JDLSB, contra O ……………………., no montante de 276.805$00 (€ 1380,69), acrescido de juros de mora, decorrente da emissão de cheques sem provisão destinados ao pagamento de mercadorias vendidas e entregues ao mesmo, correndo por apenso o processo de execução sob o n.º 17984/92.3JDLSB-A (cfr. documentos n.os 48 e 49 juntos com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
F) Em 02.09.1997, a Impugnante formulou um pedido de indemnização cível junto do Tribunal Criminal da Comarca de Lisboa, processo n.º 3986/94.9JDLSB, contra M ………. e A……………., no montante de 359.987$00, decorrente da emissão de dois cheques sem provisão destinados ao pagamento de mercadorias vendidas e entregues à sociedade F…. – União …………………., Lda. (cfr. documento n.º 46 junto com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
G) Em 01.03.2000, a Impugnante intentou contra o agente comercial C .……………….., ação declarativa de condenação, no Juízo Civil do Porto, na qual foi peticionado o pagamento do montante de 2.699.972$00, acrescido de juros de mora (cfr. documento n.º 44 junto com a petição inicial cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
H) Através de carta, com data de 20.02.2001, dirigida a A ………………., a Impugnante solicitou o pagamento da totalidade das prestações referente a um contrato de venda de equipamento no montante de 715.750$00 (cfr. documento n.º 29 junto com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
I) Através de carta, com data de 02.01.2002, dirigida à sociedade do C……….. –Com. ……… Lda., a impugnante solicitou o pagamento da totalidade das prestações referente a um contrato de venda de equipamento a crédito no montante de €6.814,67 (cfr. documento n.º 24 junto com a petição inicial cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos,).
J) Através de carta, com data de 02.04.2002, dirigida a C ………………, a Impugnante solicitou o pagamento do montante de € 2.992,79, referente à sentença proferida no processo n.º 7499/92.5JDLSB do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa (cfr. documento n.º 52 junto com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
K) Através de carta, com data de 17.12.2002, dirigida a J ………………… a Impugnante solicitou o pagamento da totalidade das prestações referentes a um contrato de venda de equipamento a crédito no montante de € 4.374,22 (cfr. documentos n.os 15, 16 e 17 juntos com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
L) Através de carta, com data de 17.12.2002, dirigida a V ……………, a Impugnante solicitou o pagamento da totalidade das prestações referente a um contrato de venda de equipamento a crédito no montante de € 1.515,39 (cfr. documentos n.os 25 e 26 junto com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
M) Através de carta, com data de 18.12.2002, dirigida à sociedade P ………………, Lda., com o assunto «resolução do contrato n.º ...............187», a Impugnante solicitou, entre outros, o pagamento, do montante de 1.654.281$00, correspondente ao valor de € 8.251,52 (cfr. documento n.º 32 junto com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
N) Em 11.02.2003, a Impugnante intentou contra a sociedade do P ……………….., Lda., ação declarativa de condenação, no Juízo Civil do Porto, processo nº 804/03.2TVPRT, na qual foi peticionado, entre outros, o pagamento do montante de 1.654.281$00, correspondente ao valor de € 8.251,52, acrescido de juros de mora (cfr. documento n.º 30 junto com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
O) Em 26.06.2003, a Impugnante intentou contra A ……………., ação declarativa de condenação, no Juízo Civil do Porto, processo n.º19757/03.OTJPRT, na qual foi peticionado o pagamento do montante de €3.570,15 acrescido de juros de mora (cfr. documento n.º 27 junto com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
P) No ano de 2004, em data não concretamente apurada, a Impugnante intentou contra a sociedade do C …….. – Com. ………… Lda., ação declarativa de condenação, no Juízo Civil do Porto, processo nº 16681/04.3TJPRT, na qual foi peticionado o pagamento do montante de € 6.814,67, acrescido de juros de mora (cfr. documentos n.os 22 e 23 junto com a petição inicial cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
Q) Em 25.05.2004, a Impugnante apresentou queixa-crime de burla e abuso de confiança contra o agente comissionista N ………………, tendo deduzido pedido de indemnização cível no montante de € 15.2825,01 (cfr. documentos n.os 42 e 43 junto com a petição inicial, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
R) Em 30.04.2008, na sequência de ação inspetiva realizada à Impugnante, quanto ao exercício de 2004, foi elaborado o relatório de inspeção tributária, no qual, além do mais, é referido o seguinte:

«III.1.1.3 Créditos incobráveis não aceites como custo fiscal: € 946.218,26
O sujeito passivo contabilizou na conta POC “6920000 - Dívidas incobráveis" o montante de € 946.218,26, que considerou como custo fiscal.
De acordo com o artigo 39º do CIRC "Os créditos incobráveis podem ser directamente considerados custos ou perdas do exercício na medida em que tal resulte de processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência, quando relativamente aos mesmos não seja admitida a constituição de provisão ou, sendo-o, esta se mostre insuficiente”.
A demonstração da verificação destes pressupostos compete ao sujeito passivo através apresentação de certidões judiciais que atestem a incobrabilidade dos créditos, que nos termos Portaria n.º 359/2000, de 20 de Junho, constituem elemento obrigatório do processo documentação fiscal, vulgo Dossier Fiscal, previsto no art.º 121.º do CIRC.
As certidões, a apresentar para provar a incobrabilidade dos créditos em sede de IRC, deve atestar, não apenas, a existência de processo judicial em curso para a recuperação dos créditos mas atestar, que a sentença transitou em julgado, e que existe sentença a declarar incobrabilidade dos créditos, certificando-a expressamente. No caso dos processos de falência deve ser com provado que o crédito anulado foi reclamado pelo sujeito passivo.
Da análise efectuada ao Dossier Fiscal, verifica-se que o sujeito passivo apresenta uma listagem com a indicação do nome do cliente, do valor do montante em dívida, o tipo e o n.º do processo a comarca, repartido por Divisões nos seguintes montantes:
• Divisão Comcafé Sul 3.961,69
• Divisão Gelados 4.674,80
• Divisão Cliente Norte 19.528.13
• TOTAL 28.164,62
Relativamente à listagem da Divisão Cliente Norte, esta é unicamente constituída pelo nome do clientes e o montante em dívida sem qualquer informação adicional relativamente aos processos. Contudo, o sujeito passivo relativamente às dívidas dos clientes M ……………….. e M ……………….. no montante de €586,52 e €334,37, apresenta certidões emitidas pelo 1º e 4º Juízos da Comarca do Porto, respectivamente. Note-se que o sujeito passivo não apresenta qualquer informação relativamente ao restante saldo da conta, no montante de € 918.053,64 (946.218,26 - 28.164,62), como também para todo o saldo da conta não apresenta qualquer decisão do Tribunal, relativamente à incobrabilidade dos créditos. Verificando-se que o sujeito passivo não deu cumprimento à inclusão da documentação comprovativa da incobrabilidade dos créditos no Dossier Fiscal, obrigatória nos termos atrás citados, solicitou-se por escrito a 31 de Maio de 2007, a apresentação dos respectivos elementos justificativos, indicando os movimentos de redução/reposição de provisões, o nome do cliente valor do crédito anulado e a justificação da incobrabilidade.
O sujeito passivo em resposta à notificação apresenta apenas os mesmos documentos que já encontravam no Dossier Fiscal, não tendo até à data apresentado qualquer novo elemento de prova.
As certidões em emitidas pelo Tribunal que apresentou relativamente às dividas de M …………………….. e M…………………….apenas mencionam “que dos autos não consta, até presente data, (sublinhado nosso) que o Autor/Exequente haja recebido qualquer importância para pagamento total ou parcial da quantia em divida”. Por ausência de elementos probatórios, não são aceites para a formação do lucro tributável, as dívidas registadas como incobráveis no valor de €946.218,26 contabilizadas em custos e perda extraordinárias do exercício, por não responder aos requisitos exigidos no artº 39º do CIRC.
Procede-se igualmente à correcção em sede de IVA indevidamente regularizado pelo sujeito passivo a seu favor nos termos do nº 8 do artigo 71º do CIVA (ver ponto III.2.1 do presente relatório).

III.1.1.4 Provisões para créditos em contencioso: € 128.626,96

A correcção inicialmente proposta no Projecto de Relatório foi reduzida na sequência dos elementos apresentados em direito de audição (ver ponto IX.1.1.4)
O sujeito passivo evidencia na sua contabilidade a 31 de Dezembro de 2004 com o provisões para créditos em contencioso, na conta ‘'281100 Prov Div Client - Tribunal", o montante total de €2.842.397,94, sendo que no exercício de 2004 registou com o custo, o valor de €555.579,26, na conta “671100 Prov Dividas Clientes", correspondente ao reforço daquela provisão conforme evidencia também no mapa de provisões entregue, nos termos do n.º3 do artº 121.º do CIRC, com o processo de Documentação Fiscal.
Nos termos da al. a) do n.º1 do art.º34.º do CIRC, podem ser aceites com o custo fiscal, as provisões que tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal que no fim do exercício sejam considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados com o tal na contabilidade. Para efeitos da constituição dessa provisão, nos termos do n.º1 do art.º 35 do CIRC, consideram -se de cobrança duvidosa os créditos em que o risco de incobrabilidade considere devidamente justificado, o que se verifica designadamente quando o devedor tem pendente processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou processo execução, falência ou insolvência (cfr. al. a)) ou quando o crédito tenha sido reclamado judicialmente (cfr. al. b)).
As provisões assim constituídas não devem subsistir quando não se verifiquem os eventos a que se reportam e quando são utilizadas para fins diversos dos expressam ente previstos.
Para aferir do cumprimento dos pressupostos atrás enunciados, indispensáveis ao enquadramento com o encargo fiscal das provisões para créditos de cobrança duvidosa e contencioso, foi solicitado por escrito ao sujeito passivo a 31 de Maio de 2007, a apresentação de uma listagem com a identificação do valor provisionado por entidade, indicando simultaneamente a identificação do processo (Tribunal e n.º do processo) que justificasse o saldo a 31 Dezembro bem com os reforços registados no exercício. Em resposta o sujeito passivo apresentou um conjunto de dois m apas (Anexo III) com parte do elementos requeridos de onde se retira a informação que a seguir se resume:

A — Relativamente ao reforço da provisão no exercício
Da análise das listas atrás referidas que o sujeito passivo apresentou para justificar a existência da provisão em análise, verificou-se que apenas consta para valores de provisão constituída no exercício o montante de €359.418,82.
Conforme já foi referido, o sujeito passivo contabilizou com o custo do exercício com a constituição/reforço desta provisão o montante de €555.579,26.
Atendendo que o sujeito passivo não identificou os clientes para os quais constituiu provisão para os créditos em contencioso no montante total de €196.160,44 (valor do custo total deduzido do valor justificado pelas listas) não é possível aferir a verificação dos pressupostos necessários a que o custo seja elegível para efeitos fiscais. Importa ainda sublinhar que para além da identificação dos créditos provisionados o sujeito passivo tinha ainda de demonstrar que os mesmos apresentam com provado risco de incobrabilidade com a identificação dos processos judiciais através dos quais diligenciou a sua cobrança.
Face ao exposto, não é aceite com o custo fiscal o montante de €196.160,44 referente a provisões para créditos em contencioso por não estarem verificados os pressupostos da al. a) do nº1 artº34º do CIRC.

B - Relativamente a provisões constituídas em exercícios anteriores
Conforme referido anteriormente, o saldo da provisão para créditos em contencioso a 31 Dezembro de 2004 era de €2.842.397,94, que de acordo com informação constante do mapa de provisões que integra o Processo de Documentação Fiscal, foi considerado pelo sujeito passivo com o custo fiscal à data da sua constituição, €555.579,26 em 2004 e € 2.286.818,68 em anos anteriores.
Para controlar se permanecem as justificações que originaram a constituição da provisão foi solicitado ao sujeito passivo conforme se referiu anteriormente, a identificação dos créditos considerados na sua base, contudo este apenas apresentou identificação de créditos no valor total de €1.282.606,53 sendo que €359.418,82 se referem a provisões do exercício, já analisadas na al. A), pelo que do saldo inicial apenas €923.187,71 estão justificados.
Assim, o montante d €1.363.630,97, correspondente à provisão existente que não foi justificada, considera-se com proveito do exercício, para efeitos fiscais, nos termos do nº2 do artº34º do CIRC.
Por outro fado, dos valores justificados pelo sujeito passivo, e na sequência da análise das listas apresentadas constatou-se que, os créditos abaixo indicados, não preenchem os requisito, previstos no n º1 do art.º35 º do CIRC para serem considerados de cobrança duvidosa uma vez que não existe indicação de qualquer contencioso que vise recuperar judicialmente ente os créditos mas apenas a indicação de participações junto da Polícia Judiciária.
A participação à Polícia Judiciária de qualquer ilícito criminal não constitui uma das formas de processo judicial de previstas nas al. a) e b) do n.º1 do art.º35.º do CIRC com o justificativas da qualificação como cobrança duvidosa. Não estando demonstrada a qualificação como de cobrança duvidosa para aqueles créditos, considera-se que não subsistem os riscos que estiveram na origem da constituição da respectiva provisão pelo que também as provisões não devem subsistir. Desta forma, nos termos do n.º2 do art.º34.º do CIRC, devem ser considerados com o proveito do exercício, para efeitos fiscais, as provisões aceites com o custo aquando da sua constituição que não devem subsistir face à não verificação dos eventos que estiveram na sua origem.
Estão nestas condições os créditos no montante de €178,276,33, provisionados por aquele montante, sobre as seguintes entidades:

Nome
Valor Contabilístico
M …………….. (F……….— U. Dist. Prod. Alim.
1.670,90
O ……………………………………….
1.380,69
M………………..
2.489,88
S……………………... Lda
9.722,53
F …………………………………..
4.758,53
Supermercados C ………………….., Lda
11.277,60
S……………. — Com. Prod. P………………….., Lda
59.144,85
M……………………………………………
82.413,86
A……………………………………..
3.990,38
António …………………………………………….
322,25
L……………………………………………….
1.104,86
TOTAL
178.276,33

Em resumo, das provisões para créditos em contencioso existentes no Balanço a 31 de Dezembro de 2004 no montante total de €2.842.397,94, acresce-se na determinação do Lucro Tributável do exercício de 2004 o montante total de € 1.738.067,7 4, correspondente a:
> Custo com reforço de Provisões não elegível para efeitos fiscais nos termos dos n.º1 do art.º34.º e 35.º, ambos do CIRC, por não estar demonstrado corresponderem a créditos em contencioso (€196.160,44);
> Provisão que deve ser considerada com o proveito do exercício para efeitos fiscais, nos termos do n.º2 do art.º34.º do CIRC, por não estar comprovada a necessidade de subsistirem (€178.276,33 +€1.363.630,97).
(…)
O montante da correcção de €1.738.067,74, resulta assim da soma do montante não justificado de €1.559.791,41, (€196.160,44 de provisão do exercício e o restante de provisões de exercícios anteriores que não devem subsistir) e do montante €178.276,33 justificado pelo sujeito passivo mas não enquadrável no conceito de créditos em contencioso do art.º34.º do CIRC.

III.1.1.5 Benefício fiscal - Criação de emprego para jovens: € 85.876,19
O sujeito passivo deduziu o montante de €577.025,56, no campo 234 da Declaração de Rendimentos de IRC modelo 22, a título de majoração dos encargos suportados com a criação líquida de emprego para jovens a que se refere o art.º 17.º do Estatuto dos Benefícios Fiscal (EBF).
O montante indicado decompõe-se, de acordo com o ano a que se reporta a criação líquido de emprego em:
De 2001 - 142.947,27
De 2002 - 319.212,86
De 2003 - 20.473,60
De 2004 - 94.391,83
Total -577.025,56
Relativamente ao cálculo da majoração dedutível
A forma de cálculo deste benefício fiscal sofreu modificações a partir do exercício de 2003, no entanto, no cálculo do benefício dedutível é aplicável a legislação e forma de calcular em vigor à data a que a criação líquida se reporta.
O benefício fiscal com origem na criação líquida de emprego ocorrida em 2001 e 2002 decorre da redacção do art.º17º do EBF em vigor à data e traduz-se na consideração com o custo, para efeitos fiscais, de um valor correspondente a 150% dos encargos suportados com a criação líquida de emprego com a limitação imposta pelo n.º2 do referido artigo ou seja, os custos mensais para efeitos fiscais (custos suportados acrescidos de majoração até 50% ) não podem ser superiores a 14 salários mínimos nacionais (SMN).
A majoração assim determinada tem lugar durante um período de 5 anos a contar da data do início da vigência do contrato, em conformidade com o nº3 do mesmo artigo.
Da análise dos elementos apresentados para suportar o valor do benefício referente à Criação Líquida de Empregos para Jovens nos anos de 2001 e 2002 verificou-se que o sujeito passivo não teve em consideração o limite mensal dos encargos fiscais tendo considerado indevidamente como dedutível, a título da majoração, o correspondente a 50% dos encargos efectivamente suportados em vez de considerar com o majoração apenas a parte dos 50% dos encargos até concorrência do limite mensal (14 SMN).
Assim, conforme cálculos que se apresentam em Anexo IV, reduz-se o valor da dedução efectuada pelo sujeito passivo em € 85.876,19 por excederem o limite previsto no n.º 2 do artº17 do EBF, com a redacção à data da verificação da criação líquida de emprego.

III.1.1.6 Preços de transferência: € 780.318,77
A N.............. registou na conta “62240 - Royalties prod próprios” o montante pago pelos direitos de utilização no âmbito da sua actividade, de marcas, patentes e know-how, cuja propriedade do direito de exploração pertence à Societé …………… N.............. SA (adiante também designada por SPN). Os encargos com a aquisição de tais direitos ascenderam a €18.929.544,51 no exercício de 2004.
Em conformidade com os suportes contratuais destas operações, que constituem parte integrante do Dossier de Preços de Transferência, a contraprestação pela utilização de tais direitos e calculada pela aplicação da taxa de 5%, ao resultado líquido das vendas dos produtos que incorporam os direitos de propriedade industrial licenciados, com exclusão dos montantes de vendas efectuadas a entidades relacionadas que tenham celebrado acordos similares com a SPN.
Esta remuneração é calculada com periodicidade mensal, e a taxa é aplicada indistintamente, sem relevar, relativamente a cada um dos produtos cujas vendas integram a base de cálculo, a proporção e a tipologia de direitos neles incorporados que são objecto do contrato de licenciamento celebrado com a SPN.
De acordo com a cláusula 32. do contrato celebrado, o conceito de vendas líquidas2 deverá ser entendido em conformidade com a definição preconizada pelas International Accountinç Standards (IAS), emitidas pelo International Accounting Standards Committee, e corresponder ao montante das vendas brutas deduzidas de descontos e promoções.
[2 De acordo com o texto original do contrato, na língua inglesa, o conceito de vendas liquidas corresponderá ao gross proceed of sales deduzido de:
- rebates (other than periodical allowances, temporary price promotions, consumer price promotions, trade price promotions and other similar expenses);
- returns accepted by licensee on account of spoilages, breakage or other damage renderin the relevant products unmarketable;
- any taxes on sales.]
O sujeito passivo informou ainda que, aquando da celebração deste contrato, as partes realizaram uma análise cuidada às diversas tipologias de custos associados à força de vendas, marketing e publicidade, de forma a identificar as componentes a incluir na base de incidência dos royalties, as quais, pelo facto de estarem directamente relacionadas com as vendas, deveriam ser registadas na conta “71 - Vendas". Afirmou ainda que a conta "71 - Vendas" é utilizada para o registo do valor bruto das vendas e, entre outros, os descontos comerciais e descontos por ramo.
A N.............. P............ entende não se qualificarem como descontos para efeitos de aferição da base de cálculo dos royalties, as bonificações ao consumidor, as promoções temporárias de preço, as promoções de preços ao consumidor e ao comércio, e outras de natureza similar.
A N.............. P............ alega que entende não serem de considerar na aferição da base de cálculo dos royalties, encargos como actividades promocionais ao comércio, incentivos com objectivos específicos, bonificações pontuais e vales para o consumidor. Afirma que é seu entendimento, bem com da SPN, que estas naturezas de encargos não devem ser consideradas por não consubstanciarem descontos ou devoluções.
Na auditoria tributária realizada ao exercício de 2004, constatou-se que o balancete a 31 de Dezembro evidencia um saldo de €20.760.201,92 na conta “622333 - Rappel alimentação".
Para efeitos de aferição da natureza de encargos nela registados, e da respectiva quantificação foi solicitado ao sujeito passivo que apresentasse o extracto da conta “62233 - Rappel alimentação” tendo a N.............. P............ remetido a esta Direcção de Serviços o balancete de saldo das subcontas associadas, por tipologia de custos.
Em comunicação de correio electrónico datada de 14 de Janeiro de 2008, a N.............. P............ informou a Administração Fiscal de que regista na conta 62 os descontos temporário conforme prática comum do mercado, entre os quais, descontos que devem ser tidos com o de investimento. Mais especificamente, afirma que a conta 622333 acolhe o registo de um conjunto de desconte concedidos e contratualizados de forma temporária aos clientes, e que estão, em algumas situações, associados a contrapartidas.
Adicionalmente, o sujeito passivo informa que engloba nesta rubrica, os incentivos por (…) comummente designados por rappel. Uma vez que o mercado trabalha sobre diferente nomenclaturas com interpretações diversas, a N.............. P............ entende por necessário esclarecer que neste caso específico, o rappel corresponde a descontos temporários concedidos e contratualizados anualmente com as grandes superfícies. A estes incentivos corresponde uma contraprestação efectuada por parte do cliente. O rappel corresponde a um incentivo pago a um cliente, de acordo com determinado objectivo acordado na negociação anual. A este investimento estão associadas contrapartidas, tais com o consultas de informação diversa no portal/site do cliente relativamente a: produtos N.............. comercializados; vendas por loja; vendas por produtos status facturas; consulta de reclamações, entre outros.
Na análise à informação prestada pelo sujeito passivo relativamente aos rappel, constata-se assim que, em substância, a N.............. P............ concede aos seus clientes descontos cuja obtenção depende da prossecução de determinados objectivos de natureza comercial.
Em paralelo, a N.............. P............ poderá obter algum as contraprestações, materializadas no fornecimento de informação de gestão relacionada com a performance comercial dos produtos N.............., no âmbito da actividade de comercialização efectuada pelos seus clientes.
Este conceito de rappel não se afasta do conceito generalizado na linguagem comercial, que recorre a este termo para designar os descontos comerciais atribuídos a clientes em função do volume de transacções comerciais efectivadas ao longo de um determinado período temporal sendo que, no caso específico da N.............. P............, a associação de eventuais contraprestações por parte do cliente, não recaracteriza a substância económica destas operações.
Ou seja, estamos perante operações que se consubstanciam num ajustamento ao montante dos proveitos a que se reporta o desconto concedido, e que foram contabilizados ao longo do período temporal a que o mesmo diz respeito, constituindo, como tal, uma componente negativa das vendas.
Contrariamente à terminologia utilizada pelo sujeito passivo nos esclarecimentos prestados no âmbito do procedimento de inspecção ante reproduzidos, estes descontos não se qualificam com descontos temporários. Com efeito, ainda que calculados tendo por base a performance comercial de um cliente durante um período temporal delimitado e previamente acordado entre as partes estes descontos têm carácter de permanência enquanto subsista a relação contratual estabelecida entre ambos os intervenientes.
Estes descontos comerciais têm por objectivo um maior volume de vendas e a melhoria da expansão da actividade comercial, sendo este procedimento, o resultado de uma normal acção mercantil e não mera liberalidade, de carácter eventual e temporário, por parte da N.............. P.............
Assim sendo, estes descontos não se inserem no conjunto dos que, por terem um horizonte temporal limitado para a sua vigência, não devam ser considerados como um a componente negativa das vendas para efeitos de cálculo dos royalties, em conformidade com o contrato de licenciamento celebrado entre a N.............. P............ e a SPN.
Em face do exposto, enquanto desconto comercial concedido, e na decorrência dos esclarecimentos prestados pela N.............. P............ quanto aos pressupostos de cálculo dos royalties ante reproduzidos, o montante de rappel concedido a clientes deverá ser expurgado da base de cálculo dos montantes a pagar à SPN pelos direitos de utilização de marcas, patentes e know-how que constituem objecto dos contratos de licenciamento.
E tanto assim é, que de acordo com a estrutura conceptual do IASC para a qual o contrato licenciamento faz remissões ao nível da interpretação do âmbito dos conceitos subjacentes, royalties deverão ser calculados com base numa percentagem dos réditos gerados pela entidade que utiliza os activos subjacentes, sendo que, o rédito é mensurado pelo justo valor da retribuição recebida ou a receber tomando em consideração a quantia líquida de quaisquer descontos comerciais e de quantidades concedidos pela empresa (vide IAS 19).
Nesta operação (cedência de direitos de utilização de activos incorpóreos) são intervenientes N.............. P............ SA e a S ……………. N.............. SA. Ambas as entidades são detidas a 100% pela N.............. SA, sendo que, no caso da SPN a detenção ocorre por via directa, e no caso da N.............. P............ ocorre por via indirecta (o sujeito passivo é detido a 100% pela N.............. Espanha que por sua vez é detida a 100% pela N.............. SA). Assim, estas duas em presas em questão enquadram-se no conceito de entidades relacionadas disposto na alínea b) do n.º4 do art.º 58. do CIRC.
De acordo com o número 1 do artigo 58.º do CIRC “(...) nas operações comerciais, efectuadas, entre um sujeito passivo e uma qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações com paráveis”
Do disposto neste normativo legal resulta que, quando entre entidades relacionadas sejam desenvolvidas operações comerciais, estas deverão estar em conformidade com o Princípio de Plena Concorrência.
Ora, da não consideração do valor efectivo das vendas líquidas, na base de cálculo da contraprestação a pagar pelos direitos de utilização dos activos incorpóreos, resulta uma sobre quantificação dos royalties devidos pela N.............. P............, não indispensável para a realização dos proveitos, e que nenhuma empresa independente estaria disposta a suportar.
Com base no balancete de subcontas facultado pela N.............. P............ foi aferido o montante (…) de rappeI concedido a clientes no exercício em apreciação (vide anexo V), que ascende €15.606.375,48. A este valor corresponde uma sobre quantificação do royalties pagos à SPN igual a 5% daquele quantitativo, e consequentemente, uma sobre quantificação do custo contabilizado que concorreu para a formação do lucro tributável, em igual montante.
Com efeito, caso o montante de rappel tivesse sido abatido ao volume de vendas para o cálculo dos royalties, o valor quantificado seria inferior em 5% deste montante, que corresponde neste exercício { quantia de € 780.318,77 (vide anexo V).
Em face do ante-exposto podemos concluir que as condições praticadas no apuramento dos royalties a pagar pela N.............. P............ à Societé des Produits N.............., pelo direito à utilização das marcas, patentes e know-how, que são de sua propriedade, divergem das condições que seriam, praticadas entre entidades independentes, violando assim o princípio de plena concorrência previsto no n.º 1 do art.º 58.º do CIRC.
Assim , e estando cumpridos os requisitos de fundamentação previstos no n.º 3 do art.º 77.º da Lei Geral Tributária, será acrescido ao lucro tributável, do exercício de 2004, o montante de €780.318,77, correspondente a inclusão valor de rappel concedido a clientes, na base de cálculo dos royalties devidos pela N.............. P............ à SPN.

III.1.1.7 Custos não aceites fiscalmente: € 439.645,34
O sujeito passivo durante o exercício de 2004 emitiu créditos à C ……………………de
P............ A.E.I.E. (CAP), a título de "Com participação na utilização do edifício Sede da N.............., conforme deliberação interna de 5 de Janeiro de 1999”, contabilizando a débito da conta ‘‘72512 Prest Serv M N aliadas", o montante de €439.645,34, apresentando como documentos de suporte os Avisos de Lançamento que em baixo se discriminam:
N.º Av. L. a crédito Data Doc Montante
…………..9 30.09.04 418.365,70
……………0 30.10.04 7.045,63
…………..3 30.11.04 14.234,01
TOTAL 439.645,34

O art.º 23.º do CIRC, elenca de uma forma exemplificativa os custos ou perdas a considerar para efeitos fiscais desde que com provadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. Note-se que os custos apresentados nas diversas alíneas do n.º1 do artigo referido indicam os custos que ocorrem com maior frequência, ou seja, aqueles que decorrem da actividade normal do sujeito passivo. Mas para que os custos aí enumerados sejam considerados dedutíveis para efeitos fiscais, são necessários dois requisitos fundamentais:
> Que sejam com provados através de documentos devidamente emitidos;
> Que sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou manutenção da fonte produtora.
A ausência de qualquer de um destes requisitos implica a sua não consideração como custo fiscal.
Em face dos descritivos apresentados nos Avisos de Lançamento anteriormente referidos solicitou-se ao sujeito passivo, a 14 de Janeiro de 2008, cópia da deliberação interna de 5 de Janeiro de 1999, para se aferir ou com provar os montantes creditados à CAP, e cópia de todos o Avisos de Lançamento relativos à com participação da CAP na utilização do edifício da N...............
A 16 de Janeiro de 2008, o sujeito passivo através de correio electrónico envia um documento com a designação de Comunicação Interna que juntamos com o anexo VI, que tem por finalidade conforme o próprio documento indica, verificar se os procedimentos acordados em 1999 anteriormente tendo por base contratos estão a ser adoptados entre a N.............. e a CAP.
A 21 de Janeiro de 2008, o sujeito passivo entrega em mão todos os Avisos de Lançamento solicitados relativos à comparticipação da CAP na utilização do edifício N.............. que no quadro em baixo se apresentam, indicando-se os montantes debitados e creditados na conta “72512 Presl Serv M N aliadas":
(…)
Conforme se verifica no quadro apresentado, os débitos da N.............. à CAP pela comparticipação de despesas no seu edifício, durante o ano de 2004, são inferiores aos créditos também concedidos pela N.............. (CAP, no montante de €112.266,20, o que por si só configura uma natureza contrária à discriminação inscrita nos Avisos de Lançamento e também reveladora que estes custos não são compatíveis com as finalidades pretendidas pelo sujeito passivo.
Relativamente à comunicação interna de 5 de Janeiro de 1999, o documento de suporte indicado nos Avisos de Lançamento e apresentado pelo sujeito passivo com o justificação para a comparticipação da CAP pela utilização do Edifício, verificou-se que este documento não indica, nem discrimina ou justifica quaisquer valores, montantes ou cálculos efectuados de forma a possibilitar a confirmação ou a realidade dos créditos concedidos, apenas refere no ponto 4. que se deve verifica os procedimentos que têm vindo a ser adoptados quanto aos cálculos da quota-parte devida pela CAP no âmbito da utilização das infra-estruturas da N.............. para o desempenho das actividades de ordem administrativa, sistemas de informação e serviços comuns. Note-se que se trata de um a comunicação interna do sujeito passivo, da Direcção Financeira para o Controlo de Gestão, Contabilidade e responsável do CAP efectuada em 1999 para verificação de procedimentos, já acordados e contratados em anos anteriores.
Face ao previsto no contrato e reforçado na citada comunicação interna, decorre da utilização pela CAP de infraestruturas da N.............. o pagamento de uma com participação (proveito da N..............) não sendo normal as situações registadas em sentido contrário.
Da análise efectuada aos documentos de suporte, Avisos de Lançamento e comunicação interna de 5 de Janeiro de 1999 facultada pelo sujeito passivo não foi possível aferir a natureza dos custos ou dos créditos concedidos à CAP, como não ficou com provado que os custos no montante de €439.645,34 relativos aos créditos concedidos são indispensáveis para a realização de proveitos ou para a manutenção da fonte produtora, conforme estipula o n.º1 do artº 23.º do CIRC , pelo que desta forma serão acrescidos ao Lucro Tributável.» (cfr. documento n.º 5 junto com a petição inicial, de fls. 1 a 704 dos autos).

S) Em 20.05.2008, foi emitida a liquidação adicional de IRC n.º 2008 83 10033299, relativa ao exercício de 2004, da qual resultou o valor a pagar de € 780.899,97 (cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial, de fls. 1 a 704 dos autos).
T) Em 09.07.2008, a impugnante apresentou reclamação graciosa da liquidação adicional de IRC e juros compensatórios identificada na alínea anterior do probatório (cfr. documento n.º 6 junto com a petição inicial, de fls. 1 a 704 dos autos).
U) Em 09.07.2008, a Impugnante procedeu ao pagamento por conta parcial, referente ao IRC de 2004, no montante de € 410.319,81 (cfr. documento n.º 7 junto com a petição inicial, de fls. 1 a 704 dos autos).
V) Em 04.09.2008, a Impugnante prestou garantia bancária no valor de € 477.217,30 para suspender o processo de execução fiscal nº 3522200801136488, instaurado para cobrança coerciva de dívida referente a IRC do exercício de 2004 (cfr. documento n.º 8 junto com a petição inicial, de fls. 1 a 704 dos autos).
W) Em 31.03.2009, a Direção de Finanças de Lisboa elaborou uma informação sobre os fundamentos apresentados na reclamação graciosa referida na alínea T) supra, na qual, além do mais, se refere o seguinte:
«3.3- Os factos invocados pelo Contribuinte, na Reclamação Graciosa apresentada, mereceu a seguinte apreciação:
3.3.1 - Créditos incobráveis- € 946 218,26
Não podemos considerar o afirmado pela Reclamante no Ponto 14, quanto à dispensa de verificação dos requisitos previstos no artigo 39º do Código do IRC.
Do ponto de vista fiscal, apenas se aceitam directamente como custos ou perdas do exercício os créditos cuja incobrabilidade resulte de:
• Processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores,
• Processo de execução
• Processo de falência ou insolvência
Haverá, todavia, que observar o disposto na parte final do presente artigo, segundo o qual a aceitação como custos ou perdas do exercício, de forma directa, depende da inadmissibilidade de constituição de provisão para cobranças duvidosas ou, no caso de ser admissível a sua constituição, da respectiva insuficiência. A este respeito, conforme ponto 80 da Reclamação, os créditos já se encontravam totalmente provisionados.
Relativamente ao valor provisionado e sua anulação, o procedimento da I.T. não contraria as orientações e instruções emitidas pela Direcção de Serviços do IRC.
Face ao apurado, no decurso da acção inspectiva, não foi comprovado a situação de incobrabilidade dos créditos, tal como se encontra previsto no artigo 39º do Código do IRC.
Também importa referir, com a Reclamação apresentada, não apresentou tais documentos e elementos de prova.
Note-se que, relativamente ao montante de € 918 053,64, não apresentou Certidão emitida por Tribunal, relativamente a decisão de incobrabilidade dos crédito.
3.3.2 - Provisões para créditos em contencioso - € 128 626,96
Relativamente a cada um dos valores provisionados, cfr. ponto 83, da Reclamação, os documentos apresentados merecem-nos a seguinte apreciação:
Cliente nº ………… - J …………………... Não comprovou a expedição do pedido de pagamento de dívida, de 2002.12.17, por cópia de registo e respectivo aviso de recepção.
Cliente nº ………- L……….. & R…………, LDA. O montante provisionado de €1. 512,98. Não comprovou a expedição do pedido de pagamento de dívida, de 2004.08.11, por cópia de registo e respectivo aviso
Cliente nº …….. – M………………- Ind. Com. P.A., LDA. Não comprovou a expedição do pedido de pagamento de dívida, de 2004.04.22, por cópia de registo e respectivo aviso.
Cliente nº………– J ……………….. Não entregou qualquer documento relativamente a este pedido cliente. Os elementos apresentados respeitam ao Sr. I ………………..
Cliente nº ……….. — Casa ………… - Com. …………., LDA. Não comprovou a expedição do pedido de pagamento de dívida, de 2002.01.02, por cópia de registo e respectivo aviso de recepção. Apresentou também Certidão para efeitos fiscais de 29.04.2003.
Cliente nº …………. – V ………………... Não comprovou a expedição do pedido de pagamento de dívida, de 2002.12.17, por cópia de registo e respectivo aviso de recepção.
Cliente nº ………… - A …………………. Não comprovou a expedição do pedido de pagamento de dívida, de 2001.02.20, por cópia de registo e respectivo aviso de recepção.
Cliente nº ………….. - Pad. …… -Panificação ……….., LDA. Não comprovou a expedição do pedido de pagamento de dívida, de 2001.12.18, por cópia de registo e respectivo aviso de recepção.
Cliente nº …………… - Supermercado ………, LDA. Relativamente a este crédito não apresentou qualquer documento. Apresentou cópia de queixa entrada na Policia Judiciária de Lisboa, entregue a 19.Agosto.1994, por situações litigiosas entre os sócios do Cliente Supermercados …………, LDA e a Sociedade C…………….., LDA.
Cliente nº …………. – N……………... Os documentos apresentados respeitam a Procedimento criminal por apropriação ilegítima e ilícita de valores que recebeu e não entregou à entidade patronal. Neste caso, verifica-se uma situação entidade patronal/colaborador.
Cliente nº ……………- F………….., S.A. Apresenta pedido de indemnização cível, datado de 02.Setembro.1997, tendo por base cheque emitidos sem provisão. Conforme carta, os cheque terão sido devolvidos em 13.10.1993.
Cliente nº ………….. — O ……………... Apresenta pedido de indemnização cível, datado de 28.Janeiro.1997, tendo por base cheque emitidos sem provisão, datados de Maio/1992.
Cliente nº ………. — C ………………. Apresenta pedido de indemnização cível, datado de 19.Abril. 1995, tendo por base cheque emitidos sem provisão.
Cliente nº …………. – S …………. Cópia de queixa apresentada no Departamento e Acção Penal de Lisboa, identificado por NUIPC nº 4488/96.4.JDLSB, com base em cheque emitidos sem provisão
Cliente nº …….. – F ………………. Os documentos apresentados respeitam a C…………….
Do que precede, os documentos apresentados não permitem o enquadramento do custo provisionado nos termos do artigo 35º do Código do IRC

3.3.3 — Majoração da criação de emprego para jovens - € 85 876,19
De acordo com o nº 2 do artigo 17º do EBF, por criação de emprego nos anos anteriores a 2003, o montante máximo dos encargos mensais para efeitos fiscais (custos acrescidos de majoração de 50%), por posto de trabalho, é de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado. Conforme apuramento efectuado pela Inspecção, verificou-se que a Reclamante não teve em consideração o limite mensal dos encargos fiscais.
Com a reclamação não apresentou outros elementos de prova, que permitam outra apreciação.

3.3.4 - Preços de transferência - € 780 318,77.
Nos pontos 225 a 262, informa que a taxa de royalty em 5% resulta, de uma avaliação por parte da SPN relativamente à sua actividade.
Conforme expõe, a questão subjacente à correcção efectuada pela Inspecção é a de qualificar ou não o rappel concedido pela Reclamante nas excepções de descontos previstos no licence agreement, determinando assim a sua inclusão ou exclusão do apuramento quantitativo a pagar à SPN.
Assim sendo, a questão que importa apreciar é a de qualificar ou não o rappel concedido pela Reclamante nas excepções de descontos previstos no licence agreement. Conforme informado pela Reclamante, o rappel corresponde a descontos temporários concedidos e contratualizados com as grandes superfícies.
Assim, o montante de rappel concedido a clientes deverá ser expurgado da base de cálculo dos montantes a pagar à SPN pelos direitos de utilização de marcas, patentes e know-how.
Com base no balancete de subcontas foi apurado o montante total de rappel concedido a clientes, de € 15 606 375,48. A consideração deste montante no apuramento do royalties pagos à SPN, resulta uma duplicação de custo, que em valor corresponde a 5% daquela importância; ou seja € 780 318,77.

3.3.5 - Custos fiscalmente não dedutíveis - € 439 645,34.
O custo em apreço, não aceite para efeitos fiscais, registado a débito da Conta - 72512 -Prestação de Serviços, tem por base os Avisos de Lançamento Nº(s) 34089, 34150 e 34263.
Conforme relatório elaborado pela Inspecção Tributária, a correcção efectuada resultou da inconsistência detectada, face ao texto do mesmo e apreciação de necessidade do custo para obter proveitos, e pela falta de requisitos evidenciados pelos referidos Avisos de Lançamento.
Esta falta não foi colmatada no exercício de direito de audição prévia.
Com a presente reclamação também não apresentou documentos e meios prova relacionados com o custo em apreço. Efectivamente, os documentos apresentados (Estatuto do CAP, Facturas e Notas de Crédito), não respeitam ao custo registado.» (cfr. documento n.º9 junto com a petição inicial, que se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos)
X) Em 08.04.2009, o Diretor de Finanças Adjunto, por delegação, proferiu despacho no sentido de ser facultado à Impugnante o exercício do direito de audição, sobre a intenção de indeferir a reclamação graciosa referida na alínea T) supra (cfr. documento n.º 9 junto com a petição inicial, que se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
Y) Em 07.05.2009, a Impugnante pronunciou-se sobre a intenção de indeferimento da reclamação graciosa, tendo juntado documentos relativos às provisões para créditos em contencioso (cfr. documento n.º 10 junto com a petição inicial, que se dá por integralmente reproduzido, de fls. 1 a 704 dos autos).
Z) Em 27.05.2009, a Direção de Finanças de Lisboa elaborou uma informação sobre a pronuncia da Impugnante referida na alínea anterior do probatório, na qual, além do mais, se refere o seguinte:
«A Informação da Reclamante mereceu-nos a seguinte apreciação:
- Cliente ………………- J…………………………….
Apresentou cópia de carta, cópia do registo e de aviso de recepção, datadas de 17.12.2002 - valor provisionado - € 3 408,39.
- Cliente …………….- L……………& R………….., LDA
Apresentou cópia de carta, cópia do registo e de aviso de recepção, com data 11.08.2004 - valor provisionado - € 1 512,08.
- Cliente …….. – M………………..- Ind. Com. Prod. Alim., LDA
Apresentou cópia de carta e de aviso de recepção, datado de 22.04.2004 - valor provisionado - € 2 268,68.
- Cliente ……………. – J……………………….
Apresentou cópia de cartas e de aviso de recepção, datadas de 22.12.1999 e 25.01.2000, dirigido a I ……………………
- valor provisionado - € 634,29.
- Cliente ………. – C ………………….. - Com. ………., LDA
Apresentou cópia de carta, cópia de registo e de aviso de recepção, datada de 02.01.2002. Remeteu também “Acta de Audiência de Julgamento”, de 05.02.2007
-valor provisionado - € 5 918,11.
- Cliente …………… - V ……………………..
Apresentou cópia de carta e cópia de registo, datada de 17.12.2002
- valor provisionado - 1 360,19.
- Cliente ……… - A ……………………
Apresentou cópia de carta, cópia de registo e de aviso de recepção, datada de 20.02.2001 - valor provisionado
- 3 117,34.
- Cliente …………… - Pad. P…….. - Panificação …………….., LDA
Apresentou cópia de carta, cópia de registo e de aviso de recepção, datada de 20.02.2001
- valor provisionado - 7 031,95.
O Valor global que agora documentado atinge o montante de € 25 251,93.
Relativamente aos documentos apresentados, importa realçar o seguinte:
Com excepção, dos documentos apresentados para o Cliente ……….. — L………… & R……., LDA e Cliente ……- M……………….- Ind. Com . Prod. Alim ., LDA, que são datados de 2004, para todos os restantes Clientes, as diligências relacionadas com o pagamento de créditos são efectuadas em 2000, 2001 e 2002.
Deste modo, à data de encerramento das Contas dos exercícios de 2000, 2001, 2002 e 2003, os valores já teriam sido provisionados, no que diz respeito aos seguintes Clientes:
- Cliente ……………. – J…………………….
- Cliente …………. - Casa do ……………. - Com. …………, LDA
- Cliente …………..- V ……………………
- Cliente ……….. – A………………………….

AA) Em 29.05.2009, o Diretor de Finanças Adjunto, por delegação, proferiu despacho de deferimento parcial da reclamação graciosa referida na alínea T) supra (cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial, de fls. 1 a 704 dos autos).
BB) Em 12.06.2009, através de carta registada com aviso de receção, foi remetido à Impugnante o ofício n.º 047400, da Direção de Finanças de Lisboa, para efeitos de comunicação do deferimento parcial da reclamação (cfr. fls. 922 do PAT em suporte físico).
CC) Em 16.06.2009, foi rececionado na sede da Impugnante o ofício referido na alínea anterior do probatório (cfr. fls. 923 do PAT em suporte físico).
DD) Em 01.07.2009, através de carta registada, a presente impugnação foi remetida ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra (cfr. documentos n.os 2 e 3 da resposta à contestação, de fls. 743 a 753 dos autos).
EE) A Impugnante, ao abrigo de um acordo estabelecido com a casa mãe, faz um pagamento de 5% de royalties, sobre um conceito que é designado por net proceed of sales, que é um conceito de vendas líquidas, onde não se incluem os incentivos com um objetivo específico designados por rappel (cfr. depoimento da testemunha V ……………………).
FF) As dívidas consideradas incobráveis pela Impugnante foram registadas contabilisticamente numa conta POC de dívidas incobráveis e foi reduzida a provisão em montante igual, para garantir a neutralidade contabilística e fiscal (cfr. depoimento da testemunha J …………………….).
GG) A Impugnante tem um processo interno de cobrança e após ser ultrapassado o prazo de pagamento o cliente é contactado por carta, telefone e email, para pagar o montante em dívida, podendo o assunto ir para contencioso caso a cobrança não ocorra no prazo de 180 dias (cfr. depoimento da testemunha S ……………………….).”

X
“FACTOS NÃO PROVADOS// Não existem factos relevantes para a decisão da causa que devam ser considerados como não provados.”
X
“MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO //No que se refere à motivação da matéria de facto, a convicção do tribunal baseou-se na análise crítica de toda a prova produzida no processo, designadamente nas informações oficiais, documentos constantes dos autos e do PAT, que não foram impugnados pelas partes. //Além disso, foi valorada a prova que resultou do depoimento das testemunhas …………………., J …………………. e S …………………….. //A primeira testemunha, V …………………., declarou que em 2004 trabalhava desde a receção da encomenda até à cobrança, encontrando-se esta atividade relacionado com preços e condições de compra, de acordo com políticas comerciais da marca.// Referiu que existe um acordo entre a N.............. e a casa mãe quanto ao pagamento de 5% de royalties, sobre um conceito que é designado por net proceed of sales, um conceito de vendas líquidas.//De acordo com a testemunha, na formação do preço as condições têm que ser equitativas, são públicas, o que quer dizer que todos conhecem as condições comerciais da N.............., portanto, as condições para a formação do preço começam num conceito chamado gross proceed of sales, onde depois existem as chamadas condições gerais de preço. //As condições têm que ser públicas e têm que ser, no conceito, não discriminatórias e acessíveis a todos num determinado canal (canal grossista, o canal retalho, canal cash and carry, cafetarias e hotéis). O net proceed of sales são as vendas líquidas e têm que obrigatoriamente cumprir com os referidos requisitos. //O resto é designado como incentivos por objetivos específicos, é tudo aquilo que é objeto de uma contratação anual com um cliente, que pode ser um contrato anual e depois pode haver um conjunto de atividades, que são refeitas pelos clientes de forma temporária. //No fundo são atividades feitas com os clientes mensalmente ou trimestralmente, tudo isso com objetivos e contrapartidas bem claras e bem definidas, por exemplo de acesso aos limiares das prateleiras (promoções, incentivos com contrapartidas com objetivos comerciais de crescimento das vendas), são condições temporárias com os clientes com objetivo de venda, não fazem parte da política geral de preços. // Referiu, ainda, que na N.............. o rappel é um incentivo com um objetivo específico e não um desconto que é geral e não discriminatório, ao qual qualquer cliente tem acesso. // Por fim, clarificou que o rappel não entra no conceito de vendas líquidas. // A testemunha demonstrou ter conhecimento direto dos factos a que depôs, o seu depoimento foi seguro e esclarecedor, o que permitiu ao Tribunal formar a sua convicção quanto ao facto considerado provado na alínea EE) do probatório. // Quanto ao depoimento da segunda testemunha, J …………………, declarou que é Técnico Oficial de Contas e que trabalha para a N.............. desde 2006, mas já estava na empresa quando ocorreu a inspeção e nessa altura era o responsável do imobilizado da empresa.// Quando questionado sobre a dedutibilidade fiscal dos créditos incobráveis, respondeu que na altura o movimento contabilístico foi feito pelos colegas, que consideraram não ser possível cobrar o montante em dívida após todas as diligências de cobranças realizadas.// A contabilização dessa incobrabilidade totalmente provisionada em termos fiscais, foi registado contabilisticamente numa conta POC de dívidas incobráveis e foi reduzida a provisão em montante igual, ou seja, para garantir a neutralidade quer contabilística, quer fiscal. // Questionado sobre se a anulação destes créditos tem algum impacto fiscal, respondeu que não, porque, a provisão já tinha sido constituída em anos anteriores e o facto desta dívida estar a ser anulada naquele ano teve a contrapartida de um proveito de montante igual. Por isso, quer contabilisticamente, quer fiscalmente, mantinha-se neutral, ou seja, o custo fiscal tinha sido em anos anteriores, no ano em que a provisão foi constituída. // Em relação ao tratamento dos créditos em contencioso, a testemunha referiu que a N.............. tem um departamento que funciona dentro da customer service, que se chama accounts receivable (AR) que trata de toda a dívida com os clientes e faz as tentativas de cobrança através do envio de cartas. Além disso, no negocio dos cafés torrados, a tentativa de cobrança era feita através de um contacto direto dos vendedores com os cafés. // A testemunha esclareceu, ainda, que pode ser cobrado um valor diferente do valor que é provisionado, porque existem um conjunto de negócios (cafés, alimentação e gelados) e clientes com vários negócios em simultâneo. Quando são faturados, o cliente fica com a dívida para todos esses negócios. // O cliente pode pagar faturas de determinado negócio, mas pode haver outros negócios em que ele não está a pagar faturas, por isso, a totalidade da dívida do cliente muitas vezes pode não ser aquela que está em causa porque ele está a pagar parte das faturas. //Quando questionado sobre o que acontece à provisão quando o cliente paga, a testemunha respondeu que é anulada. // Em relação aos encargos que a Autoridade Tributária denomina de rappel a testemunha referiu que tais custos se encontravam registados na conta 62333 (custos com publicidade), são custos que não são considerados rappel, porque se fossem estariam na conta 71 (conta de venda).// Relativamente ao CAP, a testemunha esclareceu que é um agrupamento europeu de interesse económico, constituído entre a N.............. e a General……….., que é detentora da marca CPW (Cereal Partners Worldwide), em 50 % por cada um dos sócios, com o intuito de comercializar cereais de pequeno-almoço. Mais referiu que o CAP não tem empregados em P............, toda a força de trabalho e organização são elementos da N.............. P.............// O CAP vende o produto que é parcialmente fabricado pela N.............., na fábrica de A…….., que é adquirido a sociedades aliadas, fora de P............, e estabelece uma relação comercial com a N...............// Questionado sobre como é feito o encontro de contas, a testemunha respondeu que no final do mês o CAP fatura à N.............. pelas vendas que esta fez aos clientes do CAP. // Quanto aos serviços que a Impugnante presta ao CAP, designadamente cedência de instalações e pessoal, a testemunha referiu que existe um acordo entre as partes. // Todos os anos há uma negociação para os custos de estrutura, porque as estruturas não são estáticas e vão mudando, sendo feito um estudo pelo controle e gestão em relação à parte a repartir pelos diversos negócios. No caso concreto, o custo dos cereais, pode haver um acordo entre a N.............. e a CPW, para assumir determinados custos de estrutura, depois isso é debitado pela N.............. ao CAP, sendo utilizado para a repartição dos custos o método ABC (Activity Based Costing) que tem a ver com chaves de repartição de atividade de acordo com a produtividade. //A testemunha foi, ainda, questionada sobre a discrepância de um montante de cerca de 112 mil euros, debitado e posteriormente creditado, tendo respondido que o que poderá ter acontecido, uma vez que à data não estava na empresa, é que os débitos feitos mensalmente podiam não contemplar totalmente os custos de estrutura, ou por não estarem calculados ainda, ou por não se ter chegado a acordo com o outro sócio.// De acordo com a testemunha, analisando a conta-corrente dessa altura e com documentos que estão no processo, o que dá a sensação é que o acordo para a repartição dos custos de estrutura foi feito durante o ano e foi debitado um valor que depois foi corrigido em determinado mês, tendo sido emitidas as notas de crédito para corrigir e acertar o valor então acordado.// Ainda de acordo com o depoimento da testemunha, da análise da página 23 do documento n.º 5 junto com a petição inicial (relatório de inspeção tributária), parece que a N.............. teve um custo de cerca de € 112.000, o que no seu entender não faz sentido. // O depoimento desta testemunha foi claro e coerente, o que permitiu ao Tribunal formar a sua convicção quanto ao facto considerado provado na alínea FF) probatório. // Quanto ao depoimento da terceira testemunha, S ………………………, declarou que trabalha na N.............. há 22 anos e que em 2004 trabalhava no departamento de cobranças, na parte de backoffice e reporting. // Quando questionada sobre como funcionava, em 2004, o procedimento interno e em contencioso, declarou que existia um processo interno de cobrança. // De acordo com o depoimento da testemunha, a partir do momento em que o prazo de pagamento estipulado a cada cliente era ultrapassado, entravam em contacto com o mesmo por carta, telefone e email, para reaver o dinheiro em dívida. As áreas de negócio (café, gelados e alimentação) eram sempre informadas dessa dívida, porque também eram intervenientes no processo de cobrança. // Referiu, também, que internamente há prazos a cumprir para ir para o contencioso. Decorridos 30 dias sobre os valores vencidos são feitas diligências de cobrança até ao limite de 90 dias, após 180 dias a cobrança vai para o departamento jurídico. No caso de clientes que pagaram com cheques que foram devolvidos, era possível plano de pagamento através de cheque. // O depoimento desta testemunha foi seguro, claro e coerente, demonstrou ter conhecimento direto dos factos a que depôs, o que permitiu ao Tribunal formar a sua convicção quanto ao facto considerado provado na alínea GG) do probatório.»
X
A recorrente/impugnante pretende juntar aos autos três documentos oferecidos com as alegações de recurso. Trata-se de “contrato de venda, distribuição e comercialização”, com data de 28/12/1990, que terá sido celebrado entre “C …………. P............, AEIE” e a N.............. P............, SA, de “contrato de fabrico, com data de 28/12/1990, que terá sido celebrado entre “C …………… P............, AEIE” e a N.............. P............, SA, e de “contrato”, celebrado entre “C ……………. P............, AEIE" e a N.............. P............, SA, com data de 28/02/2007.
«As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância» (artigo 651.º/1, do CPC). Uma vez que a sentença confirmou a correcção em apreço, com base na falta de prova do custo em presença, impõe-se deferir a requerida junção os autos. O que se determina.
Notifique.
X
Nas conclusões do recurso da impugnante é requerido o aditamento ao probatório de um conjunto de factos que a mesma discrimina (alínea HH).
Apreciação. O requerido não é de deferir, porquanto os elementos documentais associados à prova testemunhal ouvida, não permitem afiançar da aderência à realidade dos movimentos contabilísticos invocados. A prova testemunhal (J ………………….) carece, inclusive, de razão de ciência, dado que não exercia funções na empresa, à data dos movimentos contabilístico em referência.
Motivo porque se julga improcedente a presente alegação.
X
Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
HH) Em Junho de 2009, a impugnante e a casa mãe emitiram uma declaração de esclarecimento do General Licence Agreement, com o teor seguinte:

« Imagem no original»

II) Do Relatório Inspectivo, em sede de Direito de Audição, consta o seguinte (pp. 54/56):
« Imagem no original»

X
2.2. De Direito.
2.2.1. A sentença julgou parcialmente procedente a impugnação, determinando a anulação da liquidação adicional de IRC contestada, no que respeita às correcções relativas os itens seguintes: “Créditos incobráveis não aceites como custo fiscal: € 946.218,26” e “Preços de transferência: € 780.318,77”. Manteve, entre outras, a correcção relativa a “(…) custos fiscalmente dedutíveis (comparticipação ao CAP)”.
São interpostos dois recursos jurisdicionais. A Fazenda Pública interpõe recurso contra o segmento que decisório que lhe é desfavorável. A impugnante censura a sentença, na parte em que confirmou a correcção referida em último lugar.
2.2.2. Do recurso da Fazenda Pública.
A recorrente assaca à sentença em crise erro de julgamento na apreciação da matéria e erro de julgamento quanto ao enquadramento jurídico da causa em relação a cada uma das correcções em apreciação (“Créditos incobráveis não aceites como custo fiscal: € 946.218,26” e “Preços de transferência: € 780.318,77”).
2.2.2.1. No que respeita à correcção relativa a “créditos considerados incobráveis”, a recorrente afirma considera que a sentença recorrida deu cobertura à invocação de custos relativos a créditos incobráveis, sem qualquer comprovação. «O que a Recorrida fez contabilisticamente foi reconhecer um crédito incobrável, desreconhecendo um ativo por contrapartida da conta em que se encontravam contabilizadas as provisões anteriormente reconhecidas»; «(…) o sujeito passivo procedeu à requalificação de um custo com provisões para créditos de cobrança duvidosa para um custo com créditos incobráveis cujo regime de aceitação está previsto no artigo 39.º do Código do IRC»; «um crédito não pode ser provisionado para efeitos fiscais, ainda que esteja em mora há mais de 2 (dois) anos e relativamente ao qual tenha sido reconhecida uma provisão de 100% (cem por cento), nas situações em que foi desreconhecido contabilisticamente»; «Caso o sujeito passivo proceda ao desreconhecimento de um crédito sem que se verifiquem os requisitos exigidos para que o mesmo possa ser considerado incobrável para efeitos fiscais (como aconteceu no caso concreto), o gasto associado à incobrabilidade desse crédito – que se encontra a influenciar negativamente o resultado líquido do exercício -, terá, necessariamente, que constituir componente positiva do lucro tributável, ou seja, terá que ser, de acordo com o princípio da legalidade, acrescido ao resultado líquido contabilístico, correção realizada pelos SIT no caso concreto».
Sobre o tema escreveu-se na sentença o seguinte:
«(…) a Autoridade Tributária não contesta que a Impugnante procedeu à utilização indireta da respetiva provisão, mediante lançamentos contabilísticos que consistiram, por um lado, na redução das provisões, pelo valor de € 948.799,43, mediante o registo a débito da conta #28 – Provisão para cobranças duvidosas, por contrapartida do crédito registado na conta #796211 – Utilização de provisões para cobrança duvidosa. // E, por outro lado, na anulação dos respetivos créditos, mediante o registo a crédito da conta #21 – Clientes, por contrapartida do débito da conta #692 – Dívidas incobráveis. // Tendo resultado, neste contexto, da prova testemunhal produzida nos autos, que as dívidas consideradas incobráveis pela Impugnante foram registadas contabilisticamente numa conta POC de dívidas incobráveis e foi reduzida a provisão em montante igual, com o intuito de garantir a neutralidade contabilística e fiscal (cfr. alínea FF)) do probatório). // Verifica-se, igualmente, que a Autoridade Tributária não colocou em causa a constituição das provisões para créditos de cobrança duvidosa, nem que os créditos em causa estivessem em mora há 24 meses, com a provisão constituída a 100% do valor dos mesmos. // A correção da Autoridade Tributária recaiu sobre a forma de contabilização da utilização das provisões por parte da Impugnante, porque foi debitada a conta #692 – Dívidas incobráveis, e, por essa razão, a Autoridade Tributária entendeu que não ficou provada a incobrabilidade dos créditos. // Porém, ao contrário do entendimento da Autoridade Tributária, o que está em causa no relatório de inspeção é a utilização de provisões para créditos de cobrança duvidosa constituídas nos termos do artigo 35.º do CIRC, que, por ter decorrido o período de 24 meses e por se encontrarem constituídas a 100%, foram levadas a custo».
Apreciação. A fundamentação da correcção em exame consta do ponto “III.1.1.3 Créditos incobráveis não aceites como custo fiscal: € 946.218,26”(1)
Os normativos relevantes são os seguintes.
«Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora» (artigo 23.º/1, do CIRC). «Podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes provisões: // a) As que tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal que no fim do exercício possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade» (artigo 34.º, n.º 1, do CIRC(2). «Os créditos incobráveis podem ser directamente considerados custos ou perdas do exercício na medida em que tal resulte de processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência, quando relativamente aos mesmos não seja admitida a constituição de provisão ou, sendo-o, esta se mostre insuficiente» (artigo 39.º do CIRC (3)).
Do probatório resulta o seguinte:
i) As dívidas consideradas incobráveis pela Impugnante foram registadas contabilisticamente numa conta POC de dívidas incobráveis e foi reduzida a provisão em montante igual, para garantir a neutralidade contabilística e fiscal (alínea FF)).
ii) A Impugnante tem um processo interno de cobrança e após ser ultrapassado o prazo de pagamento o cliente é contactado por carta, telefone e email, para pagar o montante em dívida, podendo o assunto ir para contencioso caso a cobrança não ocorra no prazo de 180 dias (alínea GG).
Dos autos resulta que o procedimento contabilístico da recorrida foi o seguinte: inscreveu custos como provisões para créditos de cobrança duvidosa, que posteriormente veio a verificar tratar-se de créditos incobráveis, pelo que, uma vez esgotada a provisão referida, tais créditos devem ser levados a custos, como créditos incobráveis.
Nas palavras da recorrida (4),
«De facto, foi registado na conta do Plano Oficial de Contas (“POC”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 410/89, de 21 de Dezembro, #692 - Dívidas incobráveis, no exercido de 2004, valores correspondentes à anulação dos créditos sobre determinados clientes no montante de €946.218,26. // Importa, no entanto, ter presente que, a 1 de Janeiro de 2004, os referidos créditos se encontravam em mora há mais de 24 meses e provisionados em 100%, nos termos e critérios fiscais previstos no Código do IRC, conforme se pode verificar através da análise dos saldos iniciais evidenciados no mapa de provisões referente ao exercício de 2004 (…). // Neste sentido, em face dos indícios de incobrabilidade existentes à data, a Impugnante procedeu à utilização da correspondente provisão, de forma a anular, em conformidade com as regras de normalização contabilística a que está vinculada, designadamente as regras constantes no POC, o saldo dos respectivos clientes. (…) // Neste contexto, (…) a Impugnante procedeu à utilização indirecta da respectiva provisão, mediante os seguintes lançamentos contabilísticos - constatados e não contestados pelos SIT: // por um lado, na redução das provisões, pelo valor de € 948.799,43 (novecentos e quarenta e oito mil, setecentos e noventa e nove euros e quarenta e três cêntimos), mediante o registo a débito da conta #28 - Provisão para cobranças duvidosas, por contrapartida do crédito registado na #796211 - Utilização de provisões para cobrança duvidosa, e // por outro, na anulação dos respectivos créditos, mediante o registo a crédito da conta #21 - Clientes, por contrapartida do débito da conta #692 - Dívidas incobráveis. // A diferença de € 2.581,17 (dois mil, quinhentos e oitenta e um euros e dezassete cêntimos) apurada entre o valor dos créditos anulados (€ 946.218,26) e o valor das respectivas provisões (€ 948.799,43) respeita ao IVA regularizado nos termos do número 8 do artigo 71º do Código daquele imposto e registado contabilisticamente em conformidade».
Constitui jurisprudência fiscal assente a seguinte:
i) Apesar de não competir à AT corrigir a contabilidade dos contribuintes, mas apenas corrigir a relevância fiscal dos dados contabilísticos, os princípios do inquisitório e da verdade material, impõem-lhe, no âmbito do apuramento da matéria tributável, não só retirar relevância fiscal aos elementos de facto resultantes de actos dos contribuintes que os favoreçam indevidamente, mas também atribuir relevância tributária a situações de facto que os favoreçam». (5)
ii) «Resulta da letra do artigo 39º do CIRC que a consideração de custos ou perdas pela entidade credora, na circunstância de ocorrer um crédito incobrável, está condicionada a que tais créditos resultem de um processo judicial de entre os tipificados na norma. // (…) // Existe no preceito uma exigência específica de “existência de um processo judicial” condicionante da possibilidade de serem relevados na contabilidade da credora os créditos desta, considerados incobráveis, que foi afirmada no preceito de forma inequívoca o que se compreende para evitar abusos ou arbítrio dos sujeitos passivos credores impondo-se a estes uma atitude activa, com vista à cobrança do seu crédito». (6)
iii) «O art. 39.º do CIRC, (…) admitia como custos ou perdas do exercício os créditos que, para além do mais, resultassem incobráveis de processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência». // Essa norma não exige que os créditos em cobrança coerciva mediante processo de execução só possam ser contabilizados como créditos incobráveis mediante sentença com trânsito em julgado que declare a sua incobrabilidade em processo executivo».(7)
A distinção entre os custos relativos à provisão para créditos de cobrança duvidosa (artigo 34.º do CIRC) e os custos relativos a créditos incobráveis (artigo 39.º do CIRC) não está em causa nos autos. A questão que se coloca reside em saber se o procedimento contabilístico da recorrida no sentido de convocar custos com créditos incobráveis que resultam do esgotamento da provisão para créditos de cobrança duvidosa, pode (ou não) ser aceite, do ponto de vista fiscal.
No plano contabilístico, refere-se o “desreconhecimento de créditos incobráveis” (8), nos termos seguintes:
«(…) não se aplicando, para efeitos contabilísticos, a exigência de verificação de uma das condições identificadas no atual parágrafo 31 da NCRF 27 ao desreconhecimento de um «ativo financeiro» que esteja nas condições referidas, uma vez que o elemento já não obedece ao conceito e critérios de reconhecimento de um ativo, permite-se, também para efeitos fiscais que, num cenário de imparidade total, seja removido do balanço e, portanto, desreconhecido, um crédito de cobrança duvidosa que, por estar em mora há mais de dois anos e por ter sido já reconhecida (e aceite fiscalmente) uma perda por imparidade de valor igual ao do crédito, tem uma quantia monetária de zero.
Verifica-se um cenário de imparidade total quando uma entidade, depois de ter efetuado as diligências de cobrança consideradas adequadas e reunir as provas disponíveis, concluir que já não existem expetativas razoáveis de recuperação de crédito». // (…).». No mesmo sentido, afirma-se que «[q]uanto à anulação dos saldos de créditos relativamente aos quais se tenha registado uma perda por imparidade total, (…) [a Administração Tributária considera aceitável] que, «verificando-se a existência de créditos naquela situação, uma vez que foram já aceites na sua totalidade como custo no ano da constituição da provisão, possam, quando a empresa possua fortes razões para os considerar incobráveis, ser abatidos ao seu Activo através da utilização da provisão constituída, sem prejuízo de no futuro, caso venham a ser recebidos, serem considerados como proveitos»
(9). «Uma vez que se encontram em mora à mais de dois anos e constituída a perda por imparidade a 100% e como tal aceite na sua totalidade como gasto nos períodos de constituição, possuindo a empresa fortes razões para os considerar incobráveis e, dada a sua insignificância individual ou qualquer outro motivo se não justifique o levantamento de procedimentos para atestar a sua incobrabilidade nos termos do artigo 41.º do CIRC, poderão ser abatidos no seu ativo através da respetiva utilização, chamando-se a atenção para a necessidade de comunicação ao devedor (n.º 2 do art. 41.º do CIRC) e, sem prejuízo de no futuro, caso venham a ser recebidos, serem considerados como rendimentos (lnf. n.º 1308/90, do SAIR e Saída Geral n.º 011412, de 27.02.98, da DSIRC), devendo os documentos justificativos da anulação integrar o processo de documentação fiscal». (10)
A recorrente não contesta a fiabilidade da contabilidade da recorrida; a sua censura centra-se sobre o método de contabilização dos custos em presença. Todavia, numa situação de imparidade total, a contribuinte seguiu as instruções da própria Administração Fiscal, que permite levar a créditos incobráveis os créditos em situação de imparidade total, devidamente comprovada. A correcção não se pode manter, como se decidiu na instância. A sentença deve ser confirmada.
Motivo porque se julga improcedente a presente imputação.
2.2.2.2. No que respeita à correcção relativa a “preços de transferência”, a recorrente sustenta que a sentença incorreu em erro de julgamento ao anular a correcção em apreço, porquanto a recorrida calculou os royalties a pagar à casa mãe de forma desviante em relação a operações semelhantes ocorridas entre entidades independentes. Censura o facto do desconto de rappel não ser incluído no apuramento das vendas líquidas, para efeitos de cômputo dos royalties em exame. «[S]endo o rappel um desconto que resulta do caráter de permanência da relação contratual entre o fornecedor e o cliente, (no caso da Recorrida, fixado em um ano) constituindo um abatimento na prestação pecuniária do cliente estruturalmente ligado ao volume de mercadoria adquirida, dificilmente se pode defender que tem um caráter temporário, no sentido de “momentâneo” ou de “curta duração”»; «(…) ao excluir o rappel dos rebates dedutíveis ao valor bruto das vendas, para efeitos de determinação do valor líquido das vendas nos termos da cláusula 32 do licence agreement, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento de facto»; «[que] sobre o regime de preços de transferência, a AT demonstrou, pela fundamentação de facto e de direito constante no relatório final de inspeção que a existência de relações especiais entre a Recorrida e a SPN conduziu ao estabelecimento de condições contratuais diferentes, no cálculo das royalties a pagar, caso tivessem sido estabelecidas, entre pessoas independentes».
A este propósito, escreveu-se na sentença impugnada o seguinte:
«(…) // Efetivamente, as exceções previstas na cláusula 32 do Licence Agreement, que têm um conteúdo amplo, permitem enquadrar as situações denominadas de rappel, contratualizados pela Impugnante com os seus clientes por um determinado período de tempo e sujeitos a revisão periódica, dada a sua natureza temporária. // O que significa que não se verificou, quanto à forma de cálculo da base de incidência dos royalties a pagar à SPN, qualquer violação ao estabelecido no Licence Agreement. // Por esta razão, não se pode acolher a conclusão da Autoridade Tributária no relatório de inspeção, de que tais descontos não se inserem no conjunto dos que, por terem um horizonte temporal limitado para a sua vigência, não devam ser considerados como uma componente negativa das vendas para efeitos de cálculo dos royalties, em conformidade com o contrato celebrado entre a Impugnante e a SPN. // Além disso, a Autoridade Tributária não logrou demonstrar no relatório de inspeção em que medida as condições praticadas no apuramento dos royalties a pagar pela Impugnante à SPN divergem das condições que seriam praticadas por entidades independentes, não tendo sido observado o disposto no artigo 77.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária (LGT)»
Apreciação. A fundamentação da correcção em exame consta do ponto «III.1.1.6 Preços de transferência: € 780.318,77» do Relatório Inspectivo (11).
O quadro normativo relevante é o seguinte:
i) «Nas operações comerciais, incluindo, designadamente, operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, bem como nas operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis»(12).
ii) «Quando a Direcção-Geral dos Impostos proceda a correcções necessárias para a determinação do lucro tributável por virtude de relações especiais com outro sujeito passivo do IRC ou do IRS, na determinação do lucro tributável deste último devem ser efectuados os ajustamentos adequados que sejam reflexo das correcções feitas na determinação do lucro tributável do primeiro» (13).
iii) «O sujeito passivo deve adoptar, para a determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o método ou métodos susceptíveis de assegurar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações ou séries de operações que efectua e outras substancialmente idênticas, em situações normais de mercado ou de ausência de relações especiais…» (14).
iv) «Considera-se como método mais apropriado para cada operação ou série de operações aquele que é susceptível de fornecer a melhor e mais fiável estimativa dos termos e condições que seriam normalmente acordos, aceites ou praticados numa situação de plena concorrência, devendo ser feita a opção pelo método mais apto a proporcionar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações vinculadas e outras não vinculadas e entre as entidades seleccionadas para a comparação, que conte com melhor qualidade e maior quantidade de informação disponível para a sua adequada justificação e aplicação e que implique o menor número de ajustamentos para efeitos de eliminar as diferenças existentes entre os factos e as situações comparáveis» (15).
v) «Duas operações reúnem as condições para serem consideradas comparáveis se são substancialmente idênticas, o que significa que as suas características económicas e financeiras relevantes são análogas ou suficientemente similares, de tal modo que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são susceptívies de afectar de forma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efectuar os necessários ajustamentos que eliminem os efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas» (16).
vi) «Em caso de existência de operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, ou de operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo de imposto sobre o rendimento e qualquer outra entidade, sujeita ou não a imposto sobre o rendimento, com a qual aquele esteja em situação de relações especiais, e sempre que haja incumprimento de qualquer obrigação estatuída na lei para essa situação, a fundamentação da determinação da matéria tributável corrigida dos efeitos das relações especiais deve observar os seguintes requisitos: // a) Descrição das relações especiais; // b) Indicação das obrigações incumpridas pelo sujeito passivo; // c) Aplicação dos métodos previstos na lei, podendo a Direcção-Geral dos Impostos utilizar quaisquer elementos de que disponha e considerando-se o seu dever de fundamentação dos elementos de comparação adequadamente observado ainda que de tais elementos sejam expurgados os dados susceptíveis de identificar as entidades a quem dizem respeito; // d) Quantificação dos respectivos efeitos» (17).
A este propósito, constitui jurisprudência fiscal assente a seguinte:
i) «Para que a AT possa corrigir o lucro tributável em virtude de relações especiais entre o contribuinte e outra entidade, necessário se torna que tenham sido estabelecidas condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes e que o lucro apurado na contabilidade seja diverso do que se apuraria na ausência dessas relações» (18).
ii) «A determinação de preços de livre concorrência deve ser efectuada de acordo com uma metodologia específica, cujo critério fundamental é o da comparabilidade, ao mais elevado grau, com operações substancialmente análogas realizadas entre partes independentes» (19) .
iii) «Compete à AT o ónus da prova da existência dessas relações especiais, bem como os termos em que normalmente decorrem operações da mesma natureza entre pessoas independentes e em idênticas circunstâncias, devendo o acto ser anulado se tal prova não for feita, o que significa que a correcção a que se refere o art.º 58º do CIRC não pode, pois, assentar em indícios ou presunções, impondo-se à AT que prove os supra mencionados pressupostos legais para que possa corrigir a matéria colectável do contribuinte ao abrigo de tal regime. // Se a AT opta pelo método do preço comparável de mercado, tem de concretizar qual ou quais as operações entre entidades independentes que serviram de termo de comparação à que foi efectuada pelo sujeito passivo impugnante, e, sendo o caso, quais os factores mais comparáveis dessa operação análoga ou similar entre entidades independentes foram tidos em conta ou relevados, depois de efectuados os ajustamentos necessários a assegurar o “mais elevado grau de comparabilidade”, como preconizado no citado n.º 2 do art.º 58.º do CIRC». (20)
A recorrente invoca a definição de desconto de rappel consignada no Acórdão para uniformização de jurisprudência, do STJ, de 14/05/2014, P. 86/12.5YQSTR.E1-A.S1 (21).
De referir que «[o] princípio da plena concorrência é compatível com a utilização de franjas (bandas) de preço – ou comparáveis parcialmente inexactos. Tal não significa, porém, a aceitação da percepção da realidade por aproximação, com uma margem de erro toleradas pela lei. Não é essa a justificação. A percepção de uma realidade indeterminada consente uma abertura valorimétrica. O preço de mercado mark-to-model corresponde a um valor dentro de uma banda aceitável. Ora, dentro desse espectro valorimétrico não se podem fazer ajustes de preço. A correcção só se justifica se o preço praticado (ou arbitrado pela Administração Fiscal) se afastar dessa banda, por se sustentar em raciocínios e quantificações infundados e inverosímeis perante os dados do caso concreto»(22).
A invocação da recorrente centra-se na necessidade de integrar o valor do rappel no sector alimentar na base de cálculo das vendas líquidas para efeitos de apuramento da percentagem de Royalties a pagar pela recorrida à casa mãe.
Do probatório resulta o seguinte:
i) de acordo com a cláusula 32 do Licence Agreement, o conceito de vendas líquidas corresponderá «[a]o gross proceed of sales deduzido de: (i) rebates (other than periodical allowances, temporary price promotions, consumer price promotions, trade price promotions and other similar expenses); (ii) returns accepted by licensee on account of spoilages, breakage or other damage rendering the relevant products unmarketable; (iii) any taxes on sales» - (v. ponto «III.1.1.6 Preços de transferência: € 780.318,77» do Relatório Inspectivo - alínea R) do probatório).
ii) A Impugnante esclareceu junto da Autoridade Tributária que «[o] rappel corresponde a descontos temporários concedidos e contratualizados anualmente com as grandes superfícies. A estes incentivos corresponde uma contraprestação efectuada por parte do cliente. O rappel corresponde a um incentivo pago a um cliente, de acordo com determinado objectivo acordado na negociação anual» - (v. ponto «III.1.1.6 Preços de transferência: € 780.318,77» do Relatório Inspectivo - alínea R) do probatório).
iii) A Impugnante, ao abrigo de um acordo estabelecido com a casa mãe, faz um pagamento de 5% de royalties, sobre um conceito que é designado por net proceed of sales, que é um conceito de vendas líquidas, onde não se incluem os incentivos com um objetivo específico designados por rappel (alínea EE) do probatório).
iv) Em Junho de 2009, a impugnante e a casa mãe emitiram uma declaração de esclarecimento do General Licence Agreement, da qual consta que o desconto de rappel não integra as componentes a deduzir ao montante das vendas para apurar as vendas líquidas, base de cálculo do valor dos royalties a pagar à casa mãe (alínea HH), do probatório).
Em face dos dados coligidos no probatório, não se vê que a recorrente logre comprovar que o regime da comparabilidade das transacções tenha sido violado no caso. A correcção centra-se sobre o conceito e alcance do desconto de rappel alimentar, para efeitos da interpretação da cláusula 32 do General Licence Agreement. Não é invocada a transacção comparável entre entidades independentes, nem o procedimento de cálculo adequado, nestes casos e qual razão da sua consideração como tal. A invocação de um regime nacional em matéria de descontos de rappel não é, só por si, suficiente, para configurar uma situação de desvio, em razão de relações especiais entre os outorgantes, com transferência sub-reptícia de lucros e evasão fiscal. A Administração Tributária não observou os ónus de demonstração dos pressupostos de aplicação da norma antiabuso em causa. O dever de fundamentação da concreta operação comparável (artigo 77.º/3, da LGT) mostra-se também precludido no caso. Motivo porque a correcção não se pode manter. Como se decidiu na sentença sob escrutínio.
O recurso não é de prover, nesta parte.
2.2.3. Do recurso da impugnante. A recorrente censura a sentença em exame, porquanto a mesma terá incorrido em erro de julgamento quanto ao enquadramento jurídico da causa. Considera que os custos invocados, no âmbito da refacturação efectuada, no quadro das relações de parceria que manteve com “C ………. P............, AEIE”, devem ser aceites.
A este propósito, escreveu-se na sentença sob recurso o seguinte:
«(…) Efetivamente, tal como já tinha sido evidenciado no relatório de inspeção tributária «[a] 16 de Janeiro de 2008, o sujeito passivo através de correio electrónico envia um documento com a designação de Comunicação Interna que juntamos com o anexo VI, que tem por finalidade conforme o próprio documento indica, verificar se os procedimentos acordados em 1999 anteriormente tendo por base contratos estão a ser adoptados entre a N.............. e a CAP. (…) Relativamente à comunicação interna de 5 de Janeiro de 1999, o documento de suporte indicado nos Avisos de Lançamento e apresentado pelo sujeito passivo com o justificação para a comparticipação da CAP pela utilização do Edifício, verificou-se que este documento não indica, nem discrimina ou justifica quaisquer valores, montantes ou cálculos efectuados de forma a possibilitar a confirmação ou a realidade dos créditos concedidos, apenas refere no ponto 4. que se deve verificar os procedimentos que têm vindo a ser adoptados quanto aos cálculos da quota parte devida pela CAP no âmbito da utilização das infra-estruturas da N.............. para o desempenho das actividades de ordem administrativa, sistemas de informação e serviços comuns.» (cfr. alínea R) do probatório). // Foi, pois, perante esta constatação que no relatório de inspeção tributária se concluiu que «[d]a análise efectuada aos documentos de suporte, Avisos de Lançamento e comunicação interna de 5 de Janeiro de 1999 facultada pelo sujeito passivo não foi possível aferir a natureza dos custos ou dos créditos concedidos à CAP, como não ficou comprovado o que os custos no montante de € 439.645,34 relativos aos créditos concedidos são indispensáveis para a realização de proveitos ou para a manutenção da fonte produtora, conforme estipula o n.° 1 do art° 23.° do CIRC , pelo que desta forma serão acrescidos ao Lucro Tributável.» (cfr. alínea R) do probatório)».
Apreciação. A fundamentação da correcção em exame consta do ponto “III.1.1.7 Custos não aceites fiscalmente: € 439.645,34” do relatório inspectivo. São colocadas em causa, seja a efectividade do alegado custo, seja a sua indispensabilidade (artigo 23.º/1, do CIRC). A alegação da recorrente, bem como os elementos coligidos no probatório, não permitem suprir os obstáculos à dedutibilidade do invocado custo referidos no relatório inspectivo. Não existem elementos que permitam rastrear os alegados fluxos financeiros, registados, mas não justificados pela recorrente. Fica por explicar como é que serviços prestados pela mesma a terceiros são geradores de custos na sua contabilidade. O que acarreta o incumprimento, por parte da recorrente, das obrigações de justificação documental da contabilidade (artigo 115.º/3, do CIRC – “Obrigações contabilísticas das empresas”). Por outras palavras, a falta de discriminação do circuito económico-financeiro dos custos em presença não pode ser suprida através de ulteriores diligências de prova a determinar pelo tribunal, como não logra ser suprida através da junção aos autos dos contratos que a recorrente juntou. Não se conhecem os termos das operações invocadas, os montantes das mesmas, as razões dos lançamentos a débito e a crédito na contabilidade. Desconhece-se também o protocolo contabilístico e económico adoptado pela recorrente em relação às prestações efectuadas e-ou recebidas do agrupamento económico em causa. Pelo que a não aceitação dos custos em presença, dada a falta de esclarecimento da natureza concreta dos mesmos não merece censura. A correcção deve ser confirmada.
Em face do exposto o veredicto que fez vencimento na instância deve ser mantido, por não enfermar do erro de julgamento que lhe é assacado.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
Dispositivo
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas por ambas as recorrentes.
Registe.
Notifique.

(Jorge Cortês - Relator)

(1.ª Adjunta – Patrícia Manuel Pires)

(2.ª Adjunto – Vital Brito Lopes)

(1) Alínea R), do probatório.
(2) Vigente à data.
(3) Vigente à data.
(4) V. petição inicial, artigos 42.º a 51.º
(5) Acórdão do STA, de 12-10-2022, P. 045/13.0BUPRT; no mesmo sentido, v. Acórdão do STA, de 18-05-2022, P. 01874/05.4BEPRT
(6) Acórdão do STA, de 11-04-2018, P. 0939/14
(7) Acórdão do STA, de 10-10-2012, P. 0782/12
(8) https://www.occ.pt/pt/noticias/desreconhecimento-de-creditos-incobraveis/
(9) José Alberto Pinheiro Pinto, Fiscalidade, Areal Editores, 5ª Edição, p. 229.
(10) https://www.occ.pt/news/manuais/PreenchimentoMod22IRC.pdf
(11) Alínea R), do probatório.
(12) Artigo 58.º/1, do CIRC (Redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro).
(13) Artigo 58.º/11, do CIRC (Redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro). V. também, artigo 3.º/2, da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21.12.2001
(14) Artigo 58.º, n.º 2 do CIRC, (Redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro).
(15) Artigo 4.º/2, da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21.12.2001.
(16) Artigo 4.º/3, da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21.12.2001.
(17) Artigo 77.º/3, da LGT.
(18) Acórdão do TCAS, de 17.03.2016, P. 04412/10.
(19) Acórdão do TCAS, de 19.02.2015, P. 07049/13.
(20) Acórdão do TCAS, de 30-06-2022, P. 1339/13.0BELRA
(21) Acórdão do STJ, de 14-05-2014, 86/12.5YQSTR.E1-A.S1. Aí se consigna que: «[u]m desconto “rappel” escalonado, cujo primeiro escalão se inicia na unidade (em euros, quilos, litros, etc.), é um desconto de quantidade que, nos termos dos n.os2 e 3 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 370/93, de 29 de Outubro, na redacção do Decreto-Lei n.º 140/98, de 16 de Maio, releva para a determinação do preço de compra efectivo, satisfeitas que se mostrem as restantes exigências de se encontrar identificado na factura ou, por remissão desta, em contratos de fornecimento ou tabelas de preços e de ser susceptível de determinação no momento da respectiva emissão».
(22) Tomás Cantista Tavares, IRC e Contabilidade. Da realização ao Justo Valor, Almedina, 2011, pp. 416/417.