Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06205/12
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:01/29/2013
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:EFEITO SUSPENSIVO DO PROCESSO DE IMPUGNAÇÃO.
ARTº.103, NºS.4 E 5, DO C.P.P.T.
COMPETÊNCIA PARA APRECIAÇÃO DO PEDIDO DE DISPENSA DE PRESTAÇÃO DE GARANTIA.
Sumário:1. O efeito suspensivo do processo de impugnação incidente sobre o acto tributário que lhe é objecto, tal como a suspensão da execução fiscal, constituem direitos do contribuinte que se enquadram no âmbito do princípio constitucional da efectividade da tutela judicial (cfr.artºs.20, nº.1, e 268, nº.4, da C.R.Portuguesa; artº.9, nº.1, da L.G.T.). Mais se dirá que o nosso sistema jurídico-fiscal actual não faz depender a reclamação ou a impugnação do prévio pagamento do tributo/dívida exequenda em causa, assim não vigorando, no seu pleno rigor, o princípio do “solve et repete”.
2. O artº.103, nº.4, do C.P.P.T., refere-se ao efeito suspensivo do processo de impugnação sobre o acto tributário objecto do mesmo (cfr.artº.255, do anterior C.P.T.). O efeito suspensivo da impugnação da liquidação, no caso de ser prestada garantia, nos termos dos nºs.1 a 5 e 9, do artº.199, do C.P.P.T., deve estar reportado à suspensão do processo de execução fiscal, tal pressupondo que o processo executivo já está instaurado. E, por maioria de razão (dado que o pedido de dispensa de prestação de garantia pressupõe a notificação do executado para a prestar), o mesmo se dirá da possibilidade de deduzir pedido de dispensa de prestação de garantia na p.i. de processo de impugnação e ao abrigo do citado artº.103, nº.4, do C.P.P.T.
3. A tal conclusão se chega desde logo, porquanto, no cálculo do montante da garantia a prestar se devem levar em consideração somente vectores que pressupõem a instauração da execução fiscal (cfr.artº.199, do C.P.P.T.), como seja, o valor da dívida exequenda, o valor dos juros de mora até ao limite de cinco anos (juros de mora estes que somente se computam a partir do termo do prazo de pagamento voluntário da liquidação - cfr.artº.86, nº.1, do C.P.P.T.) e as custas devidas no processo de execução fiscal, que devem ser contadas até à data do pedido de prestação de garantia, sendo que nem todos estes elementos serão do conhecimento ou poderão ser calculados pelo Tribunal, designadamente as custas devidas no processo de execução fiscal.
4. A consagração pelo legislador fiscal da possibilidade de prestação de garantia no âmbito do processo de impugnação, está sempre condicionada pela instauração prévia do processo de execução fiscal, atenta a necessidade de utilização dos critérios e termos constantes do citado artº.199, do C.P.P.T., na fixação do montante da garantia a prestar, normativo que pressupõe a existência do dito processo executivo e, por consequência, que já tenha ocorrido o termo final do prazo de pagamento voluntário do tributo em causa, pois que, só findo este prazo, é extraída certidão da dívida para efeitos de instauração de execução (cfr.artºs.88, nºs.1 e 4, e 162, ambos do C.P.P.T.).
5.Também o elemento sistemático de interpretação vai no sentido de idêntica conclusão, porquanto, tanto as normas constantes da L.G.T. (cfr.artº.52), como do C.P.P.T. (cfr.v.g.169, 170, 183-A, 199), que consagram a possibilidade de prestação de garantia, pressupõem a instauração do processo de execução fiscal e a consequente suspensão deste, enquanto expressão do mencionado princípio constitucional da efectividade da tutela judicial.
6.A competência para apreciação do pedido de dispensa de prestação de garantia cabe ao Órgão da Execução Fiscal, como resulta dos próprios termos do artº.170, do C.P.P.T. (cfr.artº.52, nº.4, da L.G.T.), e está em sintonia com a repartição de competências entre os Tribunais Tributários e Administração Fiscal que resulta dos artºs.149 e 151, do C.P.P.T. Na verdade, a regra que se extrai destas normas é a de que aos Tribunais Tributários estão reservadas as matérias de carácter jurisdicional, a apreciação de litígios entre os intervenientes processuais. A decisão sobre o pedido de dispensa de prestação de garantia, como a própria decisão sobre a sua idoneidade, não configuram, à partida, qualquer litígio ou qualquer discordância, entre os sujeitos processuais, pelo que a intervenção do Tribunal só poderá ocorrer posteriormente, na sequência de uma eventual decisão de indeferimento do pedido de dispensa, o qual materialize antagonismo de posições sobre aquela pretensão.
6. Visualizando-se como possível o pedido de isenção de prestação de garantia formulado ao abrigo do artº.103, nº.4, do C.P.P.T., tal pedido somente pode ser deduzido após a instauração de processo de execução fiscal, sendo competente para a sua apreciação o Órgão da Execução Fiscal, que não o Tribunal onde foi instaurado o respectivo processo de impugnação judicial.

O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
A..., com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto despacho proferido pela Mmª. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, estruturado a fls.36 da certidão incluída neste processo, através do qual admitiu liminarmente a p.i. de impugnação que originou os presentes autos, mais tendo declarado a incompetência do Tribunal para apreciar o pedido de dispensa de prestação de garantia formulado pelo recorrente no final do articulado inicial, em virtude de tal pedido dever ser dirigido ao Órgão de Execução Fiscal, nos termos do artº.170, nº.1, do C.P.P.T.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.37 a 45 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-O legislador fixou dois regimes diversos de prestação da garantia idónea a fim de obter o efeito suspensivo;
2-Um primeiro através da atribuição de tal efeito ao pro­cesso de impugnação judicial, previsto no artº.103, nº.4, outro ao órgão de execução fiscal, conforme dispõe o artº.169;
3-Quanto ao primeiro, não restam dúvidas que é ao Tri­bunal que cabe diligenciar na sua apreciação e a final atri­buir o efeito devido;
4-Mister é que o contribuinte o tenha pedido e o faça até ao termo do prazo para pagamento voluntário;
5-O que no caso vertente sucedeu, pois, a presente impugnação judicial foi instaurada antes de aquele ocorrer;
6-Ora, ao decidir-se que a competência para apreciar o pedido de isenção de garantia compete ao órgão de exe­cução fiscal, como dispõe o artº.170, nº.1, fez-se aplicação de normativo que não é o aplicável ao caso vertente, por­quanto é ao Tribunal Tributário que compete apreciá-lo, con­forme lhe foi pedido na respectiva petição inicial e o prevê o artº.103, nº.4, sob pena de, a ter-se por boa tal tese, este normativo ficar sem possibilidade de obstar a que seja instaurada execução fiscal pela dívida tributária cuja liqui­dação o recorrente impugnou através da atribuição do efeito suspensivo à impugnação judicial onde pretende ver dis­cutida a bondade da mesma, ficando assim afectados os seus interesses enquanto contribuinte, o que como é óbvio o legislador tributário não pretendeu ao editar a norma ver­tida no artº.103, nº.4, ora violada;
7-Termos em que, devem V. Ex.as julgarem proce­dente o presente recurso jurisdicional e, em consequência, revogarem a decisão recorrida, substituindo-a por outra, em que determine a apreciação do pedido de isenção da prestação de garantia formulado pelo impetrante na res­pectiva petição de justiça com que instaurou a presente impugnação judicial de liquidação de I.V.A.;
8-Assim decidindo, farão, como sempre, a melhor JUSTIÇA.
X
Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de se conceder provimento ao recurso e se revogar o despacho recorrido (cfr.fls.60 a 62 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.64 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.

X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
Apontando a decisão do presente recurso, este Tribunal dá como provada a seguinte matéria de facto:
1-Em 27/1/2012, foi registada no sistema informático a p.i. de impugnação apresentada pelo recorrente, A..., com o n.i.f. 107 501 589, tendo por objecto liquidações de I.V.A. e juros compensatórios relativas ao 1º. e 2º. trimestres de 2007, cujo termo final do prazo de pagamento voluntário ocorreu em 31/1/2012 e no montante total de € 15.197,92 (cfr.p.i. junta a fls.2 a 24 dos presentes autos; documentos juntos a fls.32 a 35 dos presentes autos);
2-No final do articulado inicial identificado no nº.1 o impugnante/recorrente deduziu o pedido de dispensa de prestação de garantia a que se refere o artº.199, nº.1, do C.P.P.T., mais alegando que não dispõem de quaisquer bens ou direitos susceptíveis de serem penhorados, a fim de obter o efeito suspensivo com a instauração da presente impugnação judicial, pedido esse deduzido ao abrigo dos artºs.103, nº.4, e 199, nº.3, do C.P.P.T., e 52, nº.4, da L.G.T. (cfr.p.i. junta a fls.2 a 24 dos presentes autos);
3-Em 15/3/2012, a Mmª. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa estruturou despacho liminar com o seguinte conteúdo:
“(…)

Admito liminarmente a presente Impugnação.

*
Notifique o Exmo. Senhor Representante da Fazenda Pública para, no prazo de 90 dias, apresentar Contestação, solicitar a produção de prova adicional e remeter ao Tribunal o processo administrativo [artigo 110°, n°1 e 111° do CPPT].
*

O pedido de dispensa de prestação de garantia deve ser dirigido ao órgão de execução fiscal, atento o disposto no artigo 170°, n°1 do CPPT, sendo este Tribunal incompetente para conhecer do mesmo.
(…)”
(cfr.documento junto a fls.36 dos presentes autos).
X
Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto estruturada supra, no teor dos documentos referidos em cada um dos números do probatório.
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, o despacho recorrido admitiu liminarmente a p.i. de impugnação que originou os presentes autos, mais tendo declarado a incompetência do Tribunal para apreciar o pedido de dispensa de prestação de garantia formulado pelo recorrente no final do articulado inicial, em virtude de tal pedido dever ser dirigido ao Órgão de Execução Fiscal, nos termos do artº.170, nº.1, do C.P.P.T.
X
Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.685-A, do C.P.Civil; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do julgado, alegando em síntese e como supra se alude, que deduziu impugnação judicial antes do termo do prazo para pagamento voluntário das liquidações que lhe são objecto. Que apresentou pedido de dispensa de prestação de garantia visando a declaração do efeito suspensivo da impugnação ao abrigo do artº.103, nº.4, do C.P.P.T. Que é ao Tribunal Tributário que compete apreciar tal pedido, e não ao Órgão de Execução Fiscal, sob pena de este normativo ficar sem possibilidade de obstar a que seja instaurada execução fiscal pela dívida tributária cuja liqui­dação o recorrente impugnou através da atribuição do efeito suspensivo à impugnação judicial onde pretende ver dis­cutida a bondade da mesma. Que se encontra violada a norma constante do citado artº.103, nº.4, do C.P.P.T. (cfr.conclusões 1 a 6 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo, supõe-se, consubstanciar erro de julgamento de direito do despacho recorrido.
Vejamos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
O efeito suspensivo do processo de impugnação incidente sobre o acto tributário que lhe é objecto, tal como a suspensão da execução fiscal, constituem direitos do contribuinte que se enquadram no âmbito do princípio constitucional da efectividade da tutela judicial (cfr.artºs.20, nº.1, e 268, nº.4, da C.R.Portuguesa; artº.9, nº.1, da L.G.T.). Mais se dirá que o nosso sistema jurídico-fiscal actual não faz depender a reclamação ou a impugnação do prévio pagamento do tributo/dívida exequenda em causa, assim não vigorando, no seu pleno rigor, o princípio do “solve et repete”.
O artº.103, nºs.4 e 5, do C.P.P.T., na actual redacção introduzida pela Lei 15/2001, de 5/6, consagra o seguinte:
ARTIGO 103.º
Apresentação. Local. Efeito suspensivo
(…)
4 - A impugnação tem efeito suspensivo quando, a requerimento do contribuinte, for prestada garantia adequada, no prazo de 10 dias após a notificação para o efeito pelo tribunal, com respeito pelos critérios e termos referidos nos n.os 1 a 5 e 9 do artigo 199.º.
5 - Caso haja garantia prestada nos termos da alínea f) do artigo 69.º, esta mantém-se, independentemente de requerimento ou despacho, sem prejuízo de poder haver lugar a notificação para o seu reforço.
(…)

É hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (cfr.artº.9, do C.Civil; artº.11, da L.G.Tributária; José de Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, Editorial Verbo, 4ª. edição, 1987, pág.335 e seg.; J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1989, pág.181 e seg.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de C.T.Fiscal, nº.174, 1996, pág.363 e seg.).
Toda a norma deve ser interpretada na perspectiva que melhor responda ao resultado que com a mesma se visa obter, sendo esta a sua “ratio legis”. Por outro lado, haverá também que levar em consideração as circunstâncias que ditaram a necessidade de se aprovar o preceito a interpretar, isto é, a sua “occasio legis”. Por último, e no que ao caso concreto diz respeito, haverá que levar em conta, na interpretação da norma em questão, o denominado elemento sistemático, havendo aqui que chamar à colação o conjunto de regras ou princípios que se condicionam, restringem ou desenvolvem mutuamente e enformam todo o sistema jurídico inerente ao processo judicial tributário.
O normativo em exame refere-se ao efeito suspensivo do processo de impugnação sobre o acto tributário objecto do mesmo (cfr.artº.255, do anterior C.P.T.). O efeito suspensivo da impugnação da liquidação, no caso de ser prestada garantia, nos termos dos nºs.1 a 5 e 9, do artº.199, do C.P.P.T., deve estar reportado à suspensão do processo de execução fiscal, tal pressupondo que o processo executivo já está instaurado. E, por maioria de razão (dado que o pedido de dispensa de prestação de garantia pressupõe a notificação do executado para a prestar), o mesmo se dirá da possibilidade de deduzir pedido de dispensa de prestação de garantia na p.i. de processo de impugnação e ao abrigo do citado artº.103, nº.4, do C.P.P.T.
A tal conclusão se chega desde logo, porquanto, no cálculo do montante da garantia a prestar se devem levar em consideração somente vectores que pressupõem a instauração da execução fiscal (cfr.artº.199, do C.P.P.T.), como seja, o valor da dívida exequenda, o valor dos juros de mora até ao limite de cinco anos (juros de mora estes que somente se computam a partir do termo do prazo de pagamento voluntário da liquidação - cfr.artº.86, nº.1, do C.P.P.T.) e as custas devidas no processo de execução fiscal, que devem ser contadas até à data do pedido de prestação de garantia, sendo que nem todos estes elementos serão do conhecimento ou poderão ser calculados pelo Tribunal, designadamente as custas devidas no processo de execução fiscal (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P. Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.336 e seg.).
Nestes termos e por outras palavras, a consagração pelo legislador fiscal da possibilidade de prestação de garantia no âmbito do processo de impugnação, está sempre condicionada pela instauração prévia do processo de execução fiscal, atenta a necessidade de utilização dos critérios e termos constantes do citado artº.199, do C.P.P.T., na fixação do montante da garantia a prestar, normativo que pressupõe a existência do dito processo executivo e, por consequência, que já tenha ocorrido o termo final do prazo de pagamento voluntário do tributo em causa, pois que, só findo este prazo, é extraída certidão da dívida para efeitos de instauração de execução (cfr.artºs.88, nºs.1 e 4, e 162, ambos do C.P.P.T.).
Também o citado elemento sistemático de interpretação vai no sentido de idêntica conclusão, porquanto, tanto as normas constantes da L.G.T. (cfr.artº.52), como do C.P.P.T. (cfr.v.g.169, 170, 183-A, 199), que consagram a possibilidade de prestação de garantia, pressupõem a instauração do processo de execução fiscal e a consequente suspensão deste, enquanto expressão do mencionado princípio constitucional da efectividade da tutela judicial.
De resto e salvo melhor opinião, antes da instauração do processo executivo o sujeito passivo de imposto não apresenta qualquer interesse digno de tutela que o legitime a deduzir um pedido de prestação de garantia visando a suspensão da executoriedade do acto tributário por excelência que é a liquidação.
Passando, especificamente, ao exame do pedido de dispensa de prestação de garantia, dir-se-á que o legislador fiscal, sempre que consagra a possibilidade de isenção da prestação de garantia por parte do contribuinte, confere o poder de decisão de tal situação, em primeira linha, à A. Fiscal, que não ao Tribunal, mais estruturando um regime específico para o efeito, consagrado no artº.52, nº.4, da L.G.T. (cfr.artº.170, do C.P.P.T.).
A competência para apreciação do pedido de dispensa de prestação de garantia cabe ao Órgão da Execução Fiscal, como resulta dos próprios termos do artº.170, do C.P.P.T. (cfr.artº.52, nº.4, da L.G.T.), e está em sintonia com a repartição de competências entre os Tribunais Tributários e Administração Fiscal que resulta dos artºs.149 e 151, do C.P.P.T. Na verdade, a regra que se extrai destas normas é a de que aos Tribunais Tributários estão reservadas as matérias de carácter jurisdicional, a apreciação de litígios entre os intervenientes processuais. A decisão sobre o pedido de dispensa de prestação de garantia, como a própria decisão sobre a sua idoneidade, não configuram, à partida, qualquer litígio ou qualquer discordância, entre os sujeitos processuais, pelo que a intervenção do Tribunal só poderá ocorrer posteriormente, na sequência de uma eventual decisão de indeferimento do pedido de dispensa, o qual materialize antagonismo de posições sobre aquela pretensão (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.236).
Após a instauração da execução, a prestação de garantia pode ser dispensada pela Administração Tributária, a requerimento do executado, nos casos em que a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou for manifesta a falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que, em qualquer dos casos, a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado (cfr.artº.52, nº.4, da L.G.T.). Para obter a dispensa de prestação de garantia, o interessado deverá requerê-la, em conformidade com o preceituado no citado artº.170, do C.P.P.T. (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.178).
O examinado procedimento de isenção de prestação de garantia, está previsto no citado artº.52, nº.4, da L.G.Tributária, norma em que se consagra a possibilidade da Administração Tributária, a requerimento do executado, poder isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou existindo manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que, em qualquer dos casos, a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado. Por outras palavras, admite-se a dispensa da prestação de garantia a efectuar pelo Órgão da Execução Fiscal, em caso de manifesta falta de meios económicos do executado ou, mesmo quando este disponha de meios económicos suficientes, a prestação de garantia lhe cause ou possa causar prejuízo irreparável, circunstância que obviamente lhe cabe provar. Por sua vez, a forma de o executado obter a dispensa da prestação da garantia está prevista no artº.170, do C.P.P.Tributário (cfr.ac.S.T.A.-Pleno da 2ª.Secção, 17/12/2008, rec.327/08; ac.T.C.A. Sul, 21/2/2012, proc.5329/11; António Lima Guerreiro, Lei Geral Tributária anotada, Rei dos Livros, 2000, pág.243; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, pág.182).
Concluindo, para ser deferido o pedido de dispensa de prestação de garantia é necessário que se satisfaçam três requisitos, cumulativamente, embora dois deles comportem alternativas, pelo que o executado deverá na petição tê-los em conta:
1-Que haja uma situação de inexistência de bens ou a sua insuficiência para pagamento da dívida exequenda e do acrescido;
2-Que essa inexistência ou insuficiência não seja imputável ao executado;
3-Que a prestação da garantia cause prejuízo irreparável ao executado ou que seja manifesta a sua falta de meios económicos.
Face ao disposto no artº.342, do C.Civil, e no artº.74, nº.1, da L.G.Tributária, é de concluir que é sobre o executado, que pretende a dispensa de garantia, invocando explícita ou implicitamente o respectivo direito, que recai o ónus de provar que se verificam as condições de que tal dispensa depende, pois tratam-se de factos constitutivos do direito que pretende ver reconhecido, contrariamente ao que defende a reclamante/recorrente. De resto, o texto do artº.170, nº.3, do C.P.P.Tributário, aponta no mesmo sentido, ao estabelecer que o pedido deve ser instruído com a prova documental necessária, o que pressupõe que toda a prova relativa a todos os factos que têm de estar comprovados para ser possível dispensar a prestação de garantia seja apresentada pelo executado, instruindo o seu pedido, pois a prova de todos esses elementos é necessária para o deferimento da sua pretensão. Em regra, o pedido de dispensa de prestação de garantia deve ser formulado no prazo de quinze dias concedido para a sua prestação, conforme resulta dos artºs.169, nº.2, e 170, nº.1, ambos do C.P.P.Tributário (cfr.Diogo L. Campos e Outros, L.G.T. comentada e anotada, 4ª. edição, 2012, pág.427 e seg.; Carlos Paiva, O processo de Execução Fiscal, Almedina, 2008, pág.251 e seg.; Rui Duarte Morais, A Execução Fiscal, 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.85 e seg.).
Voltando ao caso concreto, defende o impugnante/recorrente que o pedido de dispensa de prestação de garantia visando a declaração do efeito suspensivo da impugnação por si formulado ao abrigo do artº.103, nº.4, do C.P.P.T. (saliente-se que, no caso concreto, o pedido formulado pelo recorrente não reúne, manifestamente, os requisitos consagrados no examinado artº.52, nº.4, da L.G.T.), deve ser conhecido pelo Tribunal Tributário, que não pelo Órgão da Execução Fiscal.
O Tribunal “a quo”, no despacho recorrido, entende que não tem tal competência, mais fundamentando a sua decisão no artº.170, nº.1, do C.P.P.T. (cfr.nº.3 do probatório).
Ora, atento tudo o relatado supra, deve concluir-se que, visualizando-se como possível o pedido de isenção de prestação de garantia formulado ao abrigo do artº.103, nº.4, do C.P.P.T., tal pedido somente pode ser deduzido após a instauração de processo de execução fiscal, sendo competente para a sua apreciação o Órgão da Execução Fiscal, que não o Tribunal onde foi instaurado o respectivo processo de impugnação judicial.
Sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão.
X
DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
X
Condena-se o recorrente em custas.
X
Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 29 de Janeiro de 2013


(Joaquim Condesso - Relator)

(Lucas Martins - 1º. Adjunto)


(Aníbal Ferraz - 2º. Adjunto)
Vencido. Concederia provimento ao recurso, porque, em síntese:
- a intervenção do tribunal, imposta pelo art. 103 n.º 4 do CPPT, deve respeitar e concomitantemente assegurar o cumprimento dos critérios e termos referidos, entre outros, no n.º 3 do artigo 199 do CPPT, sobre a isenção da prestação da garantia, relevante para aspectos de eficácia suspensiva da tramitação de processos tributários
- já defendi (e mantenho) que o exercício da faculdade prevista no artigo 103 n.º 4 do CPPT pode obstar à instauração do processo de execução fiscal – cfr. Ac. TCAN de 27/03/2008, proc. 01832/07. 4BEPRT (www.dgsi.pt)