Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2111/18.7BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:09/12/2019
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:ACIDENTE EM SERVIÇO; ENTIDADE PÚBLICA EMPRESARIAL; SECTOR DA SAÚDE; JUNTA MÉDICA
Sumário:
i) Aos acidentes de trabalho ocorridos com trabalhadores em funções públicas que prestem serviço em entidades públicas empresariais aplica-se o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho e legislação complementar e não no Decreto-Lei nº 503/99, de 20 de Novembro.
ii) Este regime geral é, no entanto, afastado pelo regime especial que se encontra previsto para as entidades públicas empresariais no sector da saúde.
III) É à Junta Médica da CGA, IP que competirá verificar se ocorre incapacidade permanente em resultado de acidente, qualificado como “acidente em serviço”, ocorrido em 25.10.2012 com um médico com a categoria de Assistente Graduado Sénior – Chefe do Serviço de Neurologia - integrado no mapa do Centro Hospitalar de Lisboa Norte, E.P.E, ao abrigo de um contrato de trabalho em funções públicas, enquanto prestava serviço nas instalações da daquele hospital, e fixar o grau dessa incapacidade quando existente (cfr. artigo 38.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11), com vista a estabelecer a pensão devida, a qual consubstanciará reparação do dano sofrido em resultado do acidente de trabalho (cfr. artigo 34.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11).
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

João .......... intentou a presente acção administrativa ao abrigo do disposto no artigo 48.º, n.º 1 in fine, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, contra o Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE e contra a CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, IP, mediante a qual peticionou a condenação destas a assumir a responsabilidade pelo acidente de trabalho, com o inerente desencadeamento do procedimento para a verificação e atribuição da incapacidade permanente e respectiva atribuição da indemnização devida, acrescida de juros de mora.

Por sentença do TAC de Lisboa de 17.05.2019, a acção foi julgada parcialmente procedente, tendo sido fixado o seguinte dispositivo:

Condeno o 2.º Réu ─ Caixa Geral de Aposentações, I.P. (CGA) ─ na verificação e reparação da incapacidade permanente respeitante ao acidente em serviço sofrido pelo Autor a 25/10/2012, devendo para tanto diligenciar pela realização da junta médica destinada à verificação e graduação daquela incapacidade, seguindo-se os demais termos.

b) Absolvo o 1º Réu ─ Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. ─ do pedido.

c) Condeno o 2.º Réu nas custas do processo, calculadas nos termos do art.º 12.º/1/c) do RCP e da tabela I-B do mesmo Regulamento”.

A Caixa Geral de Aposentações vem interpor recurso da mesma decisão, concluindo a sua alegação como segue:

A- Por força do disposto no n.º 4 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, exercendo a Autor funções numa entidade pública empresarial, o regime de proteção em caso de acidente de trabalho que lhe é aplicável é o previsto no Código de Trabalho.

B- Sendo o Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE, uma entidade pública empresarial, sempre se terá de considerar que os seus trabalhadores, independentemente de lhes ser aplicável o regime de proteção social convergente ou o regime geral de segurança social, não se encontram abrangidos por tal diploma, sendo-lhes aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho.

C- Decorre do regime previsto no Código de Trabalho, designadamente dos seus artigos 281.º e seguintes, que, aplicando-se tal regime, não existe qualquer intervenção da Caixa Geral de Aposentações na qualificação da lesão como acidente de trabalho ou na fixação da incapacidade permanente.

D- Pelo que, a responsabilidade pela reparação do acidente em causa não compete, por conseguinte, à Caixa Geral de Aposentações, mas sim à entidade empregadora ou à entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade do risco decorrente de acidentes de trabalho, nos termos do Código do Trabalho.

E- Com aquela norma, evita-se que a CGA tenha de reparar acidentes cujo encargo com a reparação acaba por recair sobre a entidade empregadora, no caso o Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE (cfr. o disposto no artigo 43.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro).

F- A solução consagrada na lei traduz a intenção do legislador de tratar por igual os trabalhadores que exerçam funções em entidades de natureza empresarial, independentemente da natureza do vínculo de que sejam titulares.

G- O n.º 3 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro, veio alterar o regime, determinando que aos trabalhadores das entidades públicas empresariais do SNS que mantenham o regime de proteção social convergente é aplicável o regime previsto no Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, que apenas poderá ser aplicado aos acidentes ocorridos após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro.

H- Pelo que ao decidir de modo diferente, violou a sentença Recorrida o disposto no n.º 4 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro.

O Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE. e o Autor e ora Recorrido contra-alegaram, pugnando pela improcedência do recurso.



Neste Tribunal Central Administrativo, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso, com a manutenção da sentença recorrida.


Com dispensa dos vistos legais, importa apreciar e decidir.


I. 2. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar

- Se o tribunal a quo errou no julgamento de direito ao não ter concluído que a responsabilidade pela reparação do acidente em causa não competia à Caixa Geral de Aposentações, mas sim à entidade empregadora ou à entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade do risco decorrente de acidentes de trabalho, nos termos do Código do Trabalho.



II. Fundamentação

II.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a qual se reproduz ipsis verbis:

a) JOÃO .......... exercia em Outubro de 2012 as funções de médico, com a categoria de Assistente Graduado Sénior – Chefe do Serviço de Neurologia ─ integrado no mapa do Centro Hospitalar de Lisboa Norte, E.P.E, ao abrigo de um contrato de trabalho em funções públicas [hoje Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, E.P.E.] — acordo, cfr. fls. 13/68 e 68/68 do processo administrativo junto pelo CHULN (PA1).

b) No dia 25/10/2012 sofreu uma queda nas instalações daquele hospital que veio a ser qualificada como “acidente de trabalho” a 30/10/2012 — cfr. participação e qualificação a fls. 2, 15e ss./68 e 68/68 do PA1.

c) Aquando da alta atribuída por Junta Médica da ADSE a 29/08/2013 foi proposta a apresentação a Junta Médica da CGA para graduação da incapacidade parcial permanente (IPP) ─ cfr. fls. 11/68 do PA1.

d) Mediante requerimento apresentado pelo Autor, foi determinada, a 2/9/2013, a solicitação de Junta Médica à Caixa Geral de Aposentações para determinação da IPP ─ cfr. fls. 13 e ss./68 do PA1.

e) O 1º R (CHULN) enviou o procedimento referente àquele acidente ao 2.º R (CGA), solicitando a aludida Junta Médica ─ cfr. fls. 12/68 do PA1.

f) Por referência ao Ofício-Circular n.º …/2014 de 09/05/2014 da CGA, o 2º R devolveu, sob ofício de 29/08/2014, o processo relativo ao acidente do Autor ao, então, CHLN, por entender que aquele não se encontrava abrangido pelo regime do Decreto-Lei n.º 503/99, e que «a responsabilidade pela reparação do acidente em causa é da entidade empregadora ou da entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade pelo risco decorrente de acidentes de trabalho, nos termos do Código do Trabalho» ─ cfr. fls. 24/68 do PA1.

g) Sob ofício n.º 00…, de 5 de Fevereiro de 2015, o então CHLN (1º Réu nestes autos) remeteu ao Ministério Público junto do Tribunal do Trabalho de Lisboa o processo de acidente de trabalho do Autor (e de outros), designadamente, para efeitos do disposto no art.º 99.º e ss. do Código de Processo do Trabalho ─ cfr. DOC 3 junto com a PI e fls. 48 e ss./68 do PA1.

h) Esse processo foi devolvido ao CHNL sob despacho do Procurador da República Coordenador, de 20/02/2015, que concluiu pela incompetência, em razão da matéria, das Instâncias Centrais de Trabalho (antes denominadas Tribunais de Trabalho) para conhecer daqueles acidentes em serviço aos quais seria de aplicar o regime jurídico do Decreto-Lei n.º 503/99 ─ cfr. fls. 49 e ss./68 do PA1.

i) Da remessa mencionada na alínea g), e da devolução mencionada na alínea anterior, foi o Autor informado ─ cfr. DOC 3 junto com a PI.

j) O 1º Réu informou ainda o Autor de que havia interposto recurso hierárquico da decisão mencionada em h) para o Conselho Superior do Ministério Público ─ cfr. o mesmo DOC 3.

k) O recurso mencionado na alínea anterior ainda não obteve resposta ─ cfr. informação prestada pelo 1º Reú em audiência prévia.

l) Da remessa mencionada na alínea g) foi também dado conhecimento ao 2º Réu, conforme informação de 16/4/2015, a fls. 61/68 do PA1.

m) Por missiva dirigida pelo Autor ao 2º Réu, e recebida a 8 de Agosto de 2018, indagou aquele se o 2º Réu assumia a responsabilidade respeitante ao sinistro em causa, ao abrigo do regime previsto no Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro ─ cfr. fls. 22 e 23 do PA junto pela CGA, PA2.

n) Por ofício n.º 904/2018, datado de 9/8/2018, respondeu a CGA ao Autor que «o referido o referido acidente, não se encontra enquadrado nos termos do Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro, em conformidade com o disposto no artigo 40.º daquele diploma, uma vez que se trata de um acidente ocorrido em outubro de 2012, anterior à data da sua produção de efeitos (2017-01-01), pelo que, não se encontra abrangido pelo regime do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro» ─ cfr. fls. 29/30 do mesmo PA2.

o) Também o 1º Réu prestou informações ao Autor, a 16 de Agosto de 2018, no sentido de não ter obtido resposta do recurso hierárquico mencionado em j) e de que iriam novamente ser remetidos os processos de acidente em serviço à CGA ─ cfr. DOC 8 junto com a petição inicial.

Conforme melhor se perceberá adiante, o dissentimento do Autor e dos Réus não é factual e assenta antes num desacordo quanto ao âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, por referência ao disposto no art.º 2.º/4, na redação introduzida pelo artigo 9.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, que é questão melhor tratada no âmbito da análise jurídica/fundamentação de Direito.

Foi exarada a seguinte motivação da decisão sobre a matéria de facto:

Analisando agora criticamente o resultado probatório (art.º 607.º/4 CPC), importa referir que a convicção do Tribunal quanto a todos os factos provados vertidos se formou com base na análise do teor dos documentos pontualmente invocados, juntos pelo Autor e constantes dos PAs apensos pelos dois Réus, e na posição expressa pelas partes nos respectivos articulados.



II.2. De direito

A questão controvertida no recurso prende-se com o âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, por referência ao disposto no art. 2.º, nº 4, na redacção introduzida pelo artigo 9.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro.

A resposta dada pelo tribunal a quo e aqui sindicada assentou na seguinte fundamentação:

“(…)

Localizando a questão jurídica de base, importa contextualizá-la historicamente. Assim, a redacção dos art.os 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, antes da redacção dada pela Lei nº 59/2008, de 11 de Setembro, era a seguinte:


«Artigo 1º

Objecto


O presente diploma estabelece o regime jurídico dos acidentes em serviço e das doenças profissionais ocorridos ao serviço da Administração Pública.

Artigo 2º

Âmbito de aplicação


1 — O disposto no presente diploma é aplicável aos funcionários, agentes e outros trabalhadores que sejam subscritores da Caixa Geral de Aposentações e exerçam funções na administração central, local e regional, incluindo os institutos públicos nas modalidades de serviços personalizados e de fundos públicos e ainda nos serviços e organismos que estejam na dependência orgânica e funcional da Presidência da República e da Assembleia da República.

2 — Ao pessoal dos serviços referidos no número anterior, vinculado por contrato individual de trabalho, com ou sem termo, e enquadrado no regime geral de segurança social, aplica-se o regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais constante da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro.

3 — O pessoal contratado em regime de prestação de serviços fica sujeito ao disposto no artigo 3.º da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro, devendo efectuar um seguro que garanta as prestações nela previstas.»

O elemento diferenciador deste regime (originário) era a inscrição na Caixa Geral de Aposentações; estava em causa um sistema dualista quanto ao tratamento dos acidentes em contexto laboral sofridos pelos trabalhadores da Administração Pública: o Decreto-Lei nº 503/99, de 20 de Novembro, era aplicável aos funcionários, agentes e outros trabalhadores ao serviço da Administração Pública que fossem subscritores da Caixa Geral de Aposentações; por sua vez, ao pessoal contratado e inscrito no regime geral de segurança social, era aplicado o regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais constante da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, numa lógica de paridade com o sector privado.

Todavia, com a Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, o sistema previdencial dos trabalhadores da Administração Pública sofreu grandes alterações, tendo deixado de haver inscrições na Caixa Geral de Aposentações, a partir de Janeiro de 2006 [cfr. art.º 2.º desta lei] ─ pelo que, todo o pessoal que iniciou funções a partir de 1 de janeiro de 2006 passou a estar sujeito, obrigatoriamente, a inscrição no regime geral da segurança social. Por outro lado, de acordo com o novo regime de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas ─ aprovado pela Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro ─, a relação jurídica de emprego público passa a constituir-se por duas formas: i)nomeação e ii)contrato de trabalho em funções públicas, correspondendo este último ao regime geral. Por sua vez, o regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas veio a ser aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro ─ que alterou também os artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, adaptando-o aos novos regimes previdencial e de constituição da relação jurídica de emprego público.

Com efeito, cessando a possibilidade de inscrição de trabalhadores na CGA, havia deixado de fazer sentido distinguir os trabalhadores em matéria de acidentes laborais consoante estivessem ou não inscritos na CGA. Por outro lado, determinando a lei que a relação de emprego público apenas se pode constituir através de nomeação ou de celebração de um contrato de trabalho em funções públicas, o artigo 2º/2, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, deixou de fazer referência à Caixa Geral de Aposentações, determinando que o regime constante do referido Decreto-Lei é aplicável a todos os trabalhadores que exerçam funções públicas nas modalidades de nomeação e ou contrato de trabalho em funções públicas, nos serviços da administração directa e indirecta do Estado [cfr. art.º 2.º/1). Assim, a todos os trabalhadores da Administração Pública ─ que detenham uma relação jurídica de emprego público, de nomeação ou de contrato de trabalho em funções públicas ─, independentemente de estarem, ou não, inscritos na CGA, passa a ser aplicável o disposto no Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro.

Nessa mesma alteração, o n.º 4 do artigo 2.º passou a referir que aos trabalhadores que exercem funções em entidades públicas empresariais ou noutras entidades não abrangidas pelo disposto nos números anteriores, é-lhes aplicável o regime dos acidentes de trabalho previstos no Código de Trabalho.

Esta redação do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99 entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2009 [cfr. artigos 9.º e 23.º da, já mencionada, Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro] e mantém-se em vigor.

É, pois, esta a regra geral, desde então, em matéria âmbito de aplicação do regime dos acidentes em serviço (e, correlativamente, quanto ao âmbito de aplicação do regime dos acidentes de trabalho no caso de trabalhadores a exercer funções públicas).

Deste regime decorre também que, no caso dos trabalhadores que exercem funções em entidades públicas empresariais ou noutras entidades não integradas na administração directa ou indirecta do Estado, a lei desconsidera o título que sustenta a relação de emprego ─ que pode ser uma relação jurídico-pública ou não ─ negando, nesse caso, a aplicação do regime dos acidentes em serviço. O critério legal de exclusão de âmbito do regime dos acidentes em serviço, tal como delimitado no art.º 2.º/1, é tão só o da natureza da entidade empregadora pública.

Assim, o n.º 1 do preceito refere a delimitação positiva do âmbito de aplicação do regime; os n.ºs 2 e 3 procedem a uma ampliação desse âmbito a outras situações; e o n.º 4 contém duas regras distintas: i) determina qual o regime aplicável aos «trabalhadores que exerçam funções (…) noutras entidades não abrangidas pelo disposto nos números anteriores»; e ii) introduz um delimitação negativa ao âmbito de aplicação definido pelo n.º 1, excluindo os «trabalhadores que exerçam funções em entidades públicas empresariais», pois que estas ainda se consideram, a par dos institutos públicos, incluídas na administração indirecta do Estado.

Este regime geral foi reafirmado, posteriormente, pela Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas ─ LGTFP ─ [aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho] que, em matéria de acidentes de trabalho e doenças profissionais, determina que aos trabalhadores com vínculo de emprego público a exercer funções públicas nas EPE se aplica o Código do Trabalho e legislação complementar (art.ºs 4.º/5 e 2.º/1/b) da LGTFP). Importa ainda realçar que, de acordo com o disposto no art.º 2.º/1/b), a LGTFP não se aplica às entidades públicas empresariais.

Aplicam este critério geral, nos termos expostos, quanto a entidades públicas empresariais (na área da saúde), os acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 23/08/2012, proc. 09001/12, e de 19/4/2018, proc. 62/17.1BEBJA; e do Tribunal Central Administrativo Norte de 11/04/2014, proc. 01470/11.7BELSB(Porto) ─ que remete para os fundamentos daquele primeiro; ainda o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 24/04/2015, proc. 00626/14.5BECBR, procede à aplicação do mesmo critério numa situação respeitante a um trabalhador dos CTT, S.A. [todos os arestos disponíveis em www.dgsi.pt ].

Sucede que no caso presente vem invocada a pertinência de outros regimes legais conexos com o que vimos seguindo e que ditariam solução jurídica diversa na situação particular dos trabalhadores que exerçam funções públicas, na modalidade de contrato de trabalho em funções públicas (melhor, com vínculo de emprego público), em E.P.E. integradas no Serviço Nacional de Saúde (SNS).

O Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de Dezembro, criou o Hospital de Santa Maria, E. P. E. (entre outras unidades de saúde com a mesma natureza) e aprovou o regime jurídico e os estatutos das unidades de saúde com a natureza de entidades públicas empresariais; o Hospital de Santa Maria, E. P. E. foi mais tarde integrado no Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E., por força do Decreto-Lei n.º 23/2008, de 8 de Fevereiro, ao qual continuou a aplicar-se, «com as necessárias adaptações, o regime jurídico, financeiro e de recursos humanos constante dos capítulos II, III e IV do Decreto -Lei n.º 233/2005, de 29 de Dezembro» [cfr. art.º 5.º/1].

Ora, relativamente ao regime de recursos humanos, cumpre destacar o disposto no art.º 15.º do Decreto-Lei n.º 233/2005, o qual, sob a epígrafe Regime transitório do pessoal com relação jurídica de emprego público, determina que:

«1 - O pessoal com relação jurídica de emprego público que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, esteja provido em lugares dos quadros das unidades de saúde abrangidas pelo artigo 1.º, bem como o respectivo pessoal com contrato administrativo de provimento, transita para os hospitais E. P. E. que lhes sucedem, sendo garantida a manutenção integral do seu estatuto jurídico, sem prejuízo do disposto no Decreto-Lei n.º 193/2002, de 25 de Setembro.

2 - Mantêm-se com carácter residual os quadros de pessoal das unidades de saúde referidas no número anterior, exclusivamente para efeitos de acesso dos funcionários, sendo os respectivos lugares a extinguir quando vagarem, da base para o topo.

3 - Mantêm-se válidos os concursos de pessoal pendentes e os estágios e cursos de especialização em curso à data da entrada em vigor do presente decreto-lei.

4 - O pessoal a que se refere o presente artigo pode optar a todo o tempo pelo regime do contrato de trabalho nos termos dos artigos seguintes.»

Para além deste regime transitório, o artigo 14.º do mesmo decreto-lei define o regime de pessoal das EPE no âmbito da saúde, nos seguintes termos:


«Artigo 14.º

Regime de pessoal


1- Os trabalhadores dos hospitais E. P. E. estão sujeitos ao regime do contrato de trabalho, de acordo com o Código do Trabalho, demais legislação laboral, normas imperativas sobre títulos profissionais, instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho e regulamentos internos.

2 - Os hospitais E. P. E. devem prever anualmente uma dotação global de pessoal, através dos respetivos orçamentos, considerando os planos de atividade.

3- Sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 15.º, os hospitais E. P. E. não podem celebrar contratos de trabalho para além da dotação referida no número anterior.

4 - Os processos de recrutamento devem assentar na adequação dos pro fissionais às funções a desenvolver e assegurar os princípios da igualdade de oportunidades, da imparcialidade, da boa fé e da não discriminação, bem como da publicidade, exceto em casos de manifesta urgência devidamente fundamentada.»

Coerentemente com o regime geral das EPE, este artigo consagra como regime geral do trabalho no âmbito destas EPE o do contrato de trabalho de direito privado.

Por outro lado, este diploma determina ainda [art.º 5.º] que as entidades públicas empresariais que abrange ─ «designadas abreviadamente por hospitais E.P.E.» ─ são, quanto à sua natureza, «pessoas coletivas de direito público de natureza empresarial dotadas de autonomia administrativa, financeira e patrimonial nos termos do regime jurídico do setor empresarial do Estado e das empresas públicas» [n.º 1]; mais acrescenta, quanto ao regime jurídico que lhes é aplicável, que «o regime fixado no presente decreto-lei e nos Estatutos a ele anexos tem caráter especial relativamente ao disposto no regime jurídico do setor empresarial do Estado e das empresas públicas, que é subsidiariamente aplicável com as devidas adaptações» [n.º 3].

Em termos paralelos, também o art.º 70.º do Decreto-Lei 133/2013, de 3 de Outubro ─ que estabelece os princípios e regras aplicáveis ao sector público empresarial, incluindo as bases gerais do estatuto das empresas públicas ─, determina a sua «natureza subsidiária face ao regime aprovado pelo Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de dezembro, atento o caráter especial deste diploma no que respeita às entidades públicas empresariais do sector da saúde».

A aplicabilidade deste regime voltou a ser mencionada em 2008 ─ aquando da criação do Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E pelo Decreto-Lei n.º 23/2008, de 8 de Fevereiro ─ e torna-se extensível às unidades locais de saúde E.P.E. integradas pelo Decreto-Lei n.º 12/2015, de 26 de Janeiro [que alterou e republicou aquele mesmo Decreto-Lei n.º 233/2005], mantendo os, supra mencionados, artigos 15.º e 5.º a sua redacção originária.

Posteriormente, o Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de Fevereiro ─ que aprova o regime jurídico e os estatutos aplicáveis às unidades de saúde do serviço nacional de saúde com a natureza de entidades públicas empresariais, bem como as integradas no setor público administrativo ─, veio revogar o Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de Dezembro [art.º 39.º] e mantém um regime transitório dos trabalhadores com vínculo de emprego público, decalcado do mencionado art.º 15.º; dispõe assim o art.º 29.º do decreto-lei em causa:

«1 - Os trabalhadores com vínculo de emprego público que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, estejam providos em postos de trabalho dos mapas de pessoal das unidades de saúde a que se refere o presente capítulo, mantêm integralmente o seu estatuto jurídico, sem prejuízo do disposto na Lei n.º 35/2014, de 20 de junho [conhecida como Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas].

2 - Os mapas de pessoal das unidades de saúde referidas no número anterior mantêm-se com caráter residual, exclusivamente para efeitos de desenvolvimento da carreira daqueles trabalhadores, sendo os respetivos postos de trabalho a extinguir quando vagarem, da base para o topo.

3 - Mantêm-se válidos os concursos de pessoal que estejam pendentes e os estágios e cursos de especialização em curso à data da entrada em vigor do presente decreto-lei.

4 - Os trabalhadores a que se refere o presente artigo podem optar a todo o tempo pelo regime do contrato de trabalho nos termos dos artigos seguintes.

Por outro lado, determina ainda o art.º 31.º/3 que, aos trabalhadores que, nos termos do artigo 29.º, não tenham optado pelo regime do contrato de trabalho e que mantenham o regime de proteção social convergente (RPSC), é aplicável o Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, isto é, o regime dos acidentes em serviço. De acordo com o art.º 40.º, este decreto-lei reporta os seus efeitos a 1 de Janeiro de 2017.

Importa tão só esclarecer que o mencionado regime de proteção social convergente (RPSC) é um regime fechado de proteção social que abrange os funcionários públicos admitidos até 31 de dezembro de 2005, que estavam sujeitos ao «regime de proteção social da função pública», vulgo, inscritos na Caixa Geral de Aposentações (CGA). Foi criado pela Lei n.º 4/2009, de 29 de janeiro, com efeitos a 1 de janeiro de 2009, a qual determinava igualmente, e entre outros aspectos, que os trabalhadores em funções públicas, que iniciaram atividade profissional na Administração Pública depois de 1 de janeiro de 2006 eram obrigatoriamente integrados no regime geral de segurança social (RGSS). O surgimento desta regulação não pode desligar-se da consagração da figura do contrato de trabalho em funções públicas, como regime regra para os trabalhadores da Administração Pública. Posto este esclarecimento, nada mais importa apurar relativamente ao RPSC por irrelevante para a solução do presente caso.

Após este excurso legal, estão expostas as regras jurídicas nas quais se há-de buscar a solução do caso concreto.

Com efeito, conforme se mencionou, defende o 1º Réu que a situação do Autor não é abrangida pela delimitação negativa constante do n.º 4 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, na redacção introduzida pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro (aquela a que se fará menção daqui por diante).

Esta redação do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99 entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2009 [cfr. artigos 9.º e 23.º da, já mencionada, Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro], e mantém-se em vigor.

Regressando ao caso dos autos, verifica-se que está em causa uma queda sofrida por médico integrado no quadro do Centro Hospitalar de Lisboa Norte, E.P.E. a 25/10/2012 ─ com a categoria de Assistente Graduado Sénior ─ a qual veio a ser qualificada como “acidente de trabalho” [cfr. factualidade em a) e b)]. Este médico exercia funções públicas naquele hospital E.P.E. ao abrigo de um contrato de trabalho em funções públicas e encontrava-se ao abrigo do RPSC, isto é, inscrito na Caixa Geral de Aposentações (CGA) [cfr. ainda a factualidade em c)].

De acordo com o regime dos hospitais E.P.E (definido pelo Decreto-Lei n.º 233/2005) os trabalhadores destes hospitais exercem funções públicas ao abrigo de um contrato de trabalho, nos termos do Código do Trabalho, sujeitos embora ao regime legal de carreira de profissões da saúde, entre outros (cfr. art.º 14.º).

Ora, esse regime define, porém, uma regra ─ de direito transitório material ─ que se extrai do disposto naquele art.º 15.º/1 do Decreto-Lei n.º 233/2005 e determina que os funcionários que estivessem integrados em lugares dos quadros das unidades de saúde transformadas em hospitais E.P.E. (e também o pessoal com contrato administrativo de provimento) mantinham integralmente o seu estatuto jurídico, isto é, o estatuto que detinham no quadro da relação jurídica de emprego público. Quer isto dizer que o seu vínculo de emprego público (e estatuto jurídico associado) terá de se manter como era antes da transformação da unidade de saúde, em cujo quadro se integram, em E.P.E. Esta norma obsta à aplicação da lei nova (LN) em matéria laboral aos funcionários integrados naqueles hospitais ou unidades de saúde, garantindo a manutenção do seu “status quo ante”, o qual abrange até a própria manutenção dos quadros de pessoal apenas para efeitos de acesso daqueles funcionários (cfr. art.º 15.º/2).

Enquanto titulares de uma relação de emprego público, aqueles funcionários foram sendo abrangidos pelas posteriores regulações legais daquela relação, designadamente, passando a exercer funções ao abrigo de um contrato de trabalho em funções públicas – o que determina a aplicação do regime (integral) da nova figura. Por outro lado, a lei consagra ainda a possibilidade de opção (definitiva) pelo regime do contrato de trabalho (de direito privado), que pode ser exercida a todo o tempo (cfr. art.º 16.º).

Ainda, no quadro das empresas públicas ─ como o são as entidades públicas empresariais (E.P.E.) ─, o estatuto do pessoal é também o do regime do contrato individual de trabalho (CIT), numa clara remissão para a aplicação da legislação laboral nestas matérias [cfr. art.º 16.º do Decreto-Lei 558/99, de 17 de Dezembro, regime do sector empresarial do Estado e empresas públicas, cuja redacção se manteve e se encontra vertida no art.º 17.º do Decreto-Lei 133/2013, de 3 de Outubro ─ que o revogou e estabelece actualmente os princípios e regras aplicáveis ao sector público empresarial, incluindo as bases gerais do estatuto das empresas públicas].

A primeira questão que urge colocar nesta sede é a de saber se aquela norma de direito transitório determina uma regulação, da situação do Autor respeitante ao acidente que sofreu, diferente da que resultaria da aplicação do art.º 2.º/4 do regime dos acidentes em trabalho à sua situação (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 503/99, na redacção introduzida pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro). Que o mesmo é dizer que importa determinar se a manutenção integral do estatuto jurídico que o Autor detinha aquando da transformação do Hospital de Santa Maria em hospital E.P.E. ─ no quadro da anterior relação jurídica de emprego público ─, determinada pelo disposto no art.º 15.º/1 do Decreto-Lei n.º 233/2005, o colocaria sob o âmbito de aplicação do regime dos acidentes em serviço (e não ao abrigo do regime dos acidente de trabalho).

O estatuto jurídico que o Autor detinha em sede de relação de emprego público (enquanto funcionário do quadro do Hospital de Santa Maria) ─ que se desenrola hoje no contexto de um contrato de trabalho em funções públicas ─ mantém-se; quer isto dizer que, enquanto se mantiver aquela norma de direito transitório, aquele estatuto jurídico sofrerá tão só as alterações que a lei determinar para as relações jurídicas de emprego público análogas àquela (aplicáveis aos trabalhadores com vínculo de emprego público titulado por um contrato de trabalho em funções públicas). Ora, no âmbito desse estatuto jurídico está, necessariamente, o sistema previdencial e o regime dos acidentes em serviço que assiste aos trabalhadores com vínculo de emprego público ao abrigo de CTFP.

E que dizer das alterações legislativas que tenham em vista os trabalhadores das entidades públicas empresariais (E.P.E.)? Parece que, à luz da mesma garantia resultante daquela norma de direito transitório, estas só poderão aplicar-se na exacta medida em que não contrariem a razão de ser daquela norma, excepto se expressamente tiverem em vista a sua derrogação.

Dito de outro modo, a redação do art.º 2.º/4 do Decreto Lei n.º 503/99, introduzida pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, tem como razão de ser e critério a natureza jurídica da entidade empregadora e destaca as entidades públicas empresariais (para além das que não se inserem na administração directa ou indirecta do Estado, nem na Administração autónoma), para determinar que aos seus trabalhadores se aplica o regime dos acidentes de trabalho.

Sem mais, esta norma teria de regular a situação dos trabalhadores dos hospitais E.P.E. independentemente do título que sustenta a sua relação de emprego. Todavia, não pode desconsiderar-se a natureza especial daquela regulação transitória constante do art.º 15.º/1 do Decreto-Lei 233/2005.

Essa especialidade advém, desde logo, de se tratar de uma regulação transitória que como que cristaliza no tempo (através de um mecanismo próximo da recepção formal) um dado estatuto jurídico de um conjunto de trabalhadores; estatuto jurídico esse que os acompanhará ao longo de toda a sua carreira se não optarem expressamente por outro. Trata-se do estatuto jurídico de trabalhadores da Administração Pública com contrato de trabalho em funções públicas ─ a sua situação laboral terá de seguir tão só a evolução legislativa que nesta sede for surgindo.

A especialidade deste regime é, de resto, consonante com a forma como o legislador regula a situação dos ditos hospitais E.P.E. Com efeito, conforme supra já se assinalou, é o próprio regime do Decreto-Lei n.º 233/2005 que afirma a sua especialidade frente ao regime jurídico do sector empresarial do Estado e das empresas públicas [cfr. art.º 5.º/3], reconhecendo este último a especialidade do regime respeitante às «entidades públicas empresariais do sector da saúde» [cfr. art.º 70.º do Decreto-Lei n.º 133/2013, de 3 de Outubro].

Nesta medida, existindo norma especial que determina que ao Autor se aplique o regime jurídico (geral) aplicável aos trabalhadores (que não de E.P.E.) com contrato de trabalho em funções públicas, a derrogação desse regime especial não pode acontecer por via de lei nova geral, a menos que esta expressamente o indique ─ é esta a regra plasmada no art.º 7.º/3 do Código Civil (CC).

Assim, desse regime especial decorrre, pois, no tocante às regras sobre o âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 503/99, que a situação do Autor se encontra abrangida pelo art.º 2.º/1 pois só a previsão deste é consoante com a manutenção integral do seu estatuto jurídico ─ o, então, estatuto de funcionário público ─ determinada por aquele art.º 15.º/1 do Decreto-Lei n.º 233/2005. Pelo que, ao acidente sofrido pelo Autor deve aplicar-se o regime dos acidentes em serviço constante do Decreto-Lei n.º 503/99.

Chega a uma solução idêntica, mesmo se através de fundamentação não exactamente coincidente, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 31/14.3T8PNF.P1.S1, de 17-11-2016 [disponível em www.dgsi.pt ]. Neste aresto afirma-se a dado passo que o n.º 4 do art.º 2 do Decreto-Lei n.º 503/99 é uma norma que «está claramente direcionada para os trabalhadores das EPE em regime de contrato de trabalho de direito privado, em relação aos quais o regime de proteção relativo a acidentes em serviço é o que resulta do Código do Trabalho, hoje o Código de Trabalho de 2009, e da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro.

A norma daquele n.º 4 não pode ser interpretada no sentido de retirar os trabalhadores das EPE da saúde com relação jurídica de emprego público, do regime da proteção dos acidentes em serviço, que é parte integrante do seu estatuto, conforme acima se referiu.

Na verdade tal interpretação colide diretamente com o teor do n.º1 deste artigo e com o facto de as entidades empresariais em causa integrarem a administração indireta do Estado, mas acima de tudo, com as normas específicas das EPE da saúde acima referidas e que garantiram àqueles trabalhadores a manutenção integral do respetivo estatuto.

A norma daquele n.º 4 do artigo 2.º do Decreto-lei n.º 503/99, de 20 de novembro, não poderá ser lida fora do contexto do regime jurídico concreto que enquadra os trabalhadores que desempenham funções públicas, nomeadamente, no âmbito das entidades públicas empresariais, uma vez que é parte integrante da unidade de sistema que caracteriza o regime jurídico de prestação de trabalho destes trabalhadores.

Tal interpretação colidiria com os princípios em termos de hermenêutica jurídica, violando, claramente, o disposto no n.º 1 do artigo 9.º do Código Civil, que impõe que «a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico» conduzindo ao absurdo de impor a trabalhadores que têm um relação de trabalho de natureza pública um regime de proteção de acidentes em serviço de direito privado.

Acresce que a atribuição do estatuto de EPE aos hospitais, conforme bem se considerou no acórdão do Tribunal de Conflitos acima referido, não retirou os hospitais do âmbito da administração indireta do Estado e não pôs em causa a sua natureza de pessoas coletivas públicas, pelo que os trabalhadores ao serviço destes, com vínculo de natureza pública, sempre serão abrangidos pelo n.º 1 do referido artigo 2.º do Decreto-Lei n,º 503/99, de 20 de novembro.”»

A jurisprudência administrativa nesta matéria também já se pronunciou neste sentido, discordando da demais jurisprudência administrativa mencionada supra. Com efeito, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 25/5/2018, proc. 3326/15.5BESNT faz uma resenha dos acórdãos do Tribunal de Conflitos que se debruçaram sobre a matéria e por apelo ao Acórdão do Tribunal de Conflitos n.º 24/12, de 07-05-2017 e ao, já mencionando, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, acaba por concluir que «há que distinguir, em matéria de acidentes de trabalho nas entidades públicas empresariais, os trabalhadores que detém um vínculo de nomeação ou de contrato em funções públicas, dos restantes, que optaram pela celebração de um contrato de direito privado.

Detendo os referidos trabalhadores um vínculo de nomeação ou de contrato em funções públicas, aplicar-se-á a estes, em matéria de acidentes de serviço, o regime do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20-11. Já quando os trabalhadores detiverem um contrato de direito privado, o regime para os acidentes de trabalho é o que resulta do CT e demais legislação (de direito privado) sobre a matéria.»

Uma última referência ao Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de Fevereiro, que veio revogar o Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de Dezembro: este mantém um regime transitório dos trabalhadores com vínculo de emprego público, decalcado do mencionado art.º 15.º [cfr. art.º 29.º] e determina ainda que, aos trabalhadores que, nos termos do artigo 29.º, não tenham optado pelo regime do contrato de trabalho e que mantenham o regime de proteção social convergente (RPSC), é aplicável o Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, isto é, o regime dos acidentes em serviço [cfr. art.º 31.º/3].

Defende o 1º Réu que se trata de uma norma interpretativa e, nessa medida, com aplicação retroactiva, designadamente ao caso do Autor.

Nos termos do art.º 13.º/1 do Código Civil, «a lei interpretativa integra-se na lei interpretada», ficando apenas a salvo efeitos «já produzidos pelo cumprimento da obrigação, por sentença passada em julgado, por transacção, ainda que não homologada, ou por actos de análoga natureza».

A natureza de “lei interpretativa” daquele art.º 31.º/3 não é assumida pelo legislador. Na verdade, essa qualificação expressa não constitui um requisito da natureza interpretativa da lei. Conforme assinala BAPTISTA MACHADO, «na grande maioria dos casos, porém, o legislador não se preocupa com a classificação como interpretativas de normas que edita, que são efectivamente interpretativas e estão sujeitas, como tais, ao disposto no art. 13.º»; o AUTOR evidencia então os dois requisitos necessários para que uma lei nova possa ser «realmente interpretativa»: 1) «que a solução do direito anterior possa ser controvertida ou, pelo menos, incerta»; e 2) «que a solução definida pela nova lei se situe dentro dos quadros da controvérsia e seja tal que o julgador ou o intérprete a ela poderiam chegar sem ultrapassar os limites normalmente impostos à interpretação e aplicação da lei»; ─ cfr. Introdução ao Direito e ao discurso legitimador, 8ª reimp., 1995, pp. 245 e 247.

De quanto se vem expondo, impõe-se concluir que a controvérsia jurídica não se limita à discórdia entre os intervenientes nestes autos; para alcançar o âmbito factual dessa discórdia, cfr. ainda a factualidade mencionada em h). Por outro lado, em termos de jurisprudência, acabam de ser mencionados acórdãos dos tribunais superiores com entendimentos distintos que evidenciam que a controvérsia associada à interpretação dos n.ºs 1 e 4 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, no tocante aos trabalhadores de E.P.E. na área da saúde.

Por fim, a solução plasmada naquele art.º 31.º/3 do Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de Fevereiro, corresponde, de facto, a uma das interpretações possíveis do regime pré-existente, de resto a propugnada pelo Supremo Tribunal de Justiça e pelo Acórdão do TCAS de 25/5/2018, proc. 3326/15.5BESNT.

Nestes termos, de acordo com os critérios propostos pela doutrina mencionada, é ainda de aceitar a qualificação da norma que extrai do disposto no art.º 31.º/3 do Decreto-Lei n.º 18/2017 como norma interpretativa. Todavia, como resulta da fundamentação que se expendeu, a solução interpretativa adoptada para o presente caso independe dessa qualificação.

Solucionada a primeira questão jurídica suscitada nestes autos, impõe-se averiguar quais as obrigações que impendem sobre os Réus, ao abrigo do regime dos acidentes em serviço, relativamente ao acidente sofrido pelo Autor a 25/10/2012, tendo em mente o peticionado nestes autos. Recorde-se que o Autor vinha pedir a este tribunal que fossem os réus condenados a assumir a responsabilidade pelo acidente de trabalho sofrido pelo Autor e que, para tanto, haveria de ser desencadeado o procedimento para a verificação e atribuição da incapacidade permanente do mesmo; uma vez fixada essa incapacidade, deveria ainda ser-lhe atribuída a respectiva indemnização, acrescida dos juros legais de mora sobre a indemnização que lhe venha a ser arbitrada.

Sobre a responsabilidade pela reparação dos danos em caso de acidente em serviço, dispõe o art.º 5.º do Decreto-Lei n.º 503/99 o seguinte:


«Artigo 5.º

Responsabilidade pela reparação


1 - O empregador ou entidade empregadora é responsável pela aplicação do regime dos acidentes em serviço e doenças profissionais previsto neste diploma.

2 - O serviço ou organismo da Administração Pública ao serviço do qual ocorreu o acidente ou foi contraída a doença profissional é responsável pelos encargos com a reparação dos danos deles emergentes, nos termos previstos no presente diploma.

3 - Nos casos em que se verifique incapacidade permanente ou morte, compete à Caixa Geral de Aposentações a avaliação e a reparação, nos termos previstos neste diploma.»

Nos presentes autos vem peticionada a condenação na responsabilidade pela incapacidade permanente, apesar da referência inicial genérica à responsabilidade pelo acidente de trabalho. Com efeito, conforme decorre da factualidade fixada em b) a e), e g) o 1º Réu providenciou pela qualificação do acidente e pelos trâmites atinentes à assistência médica e às prestações respeitantes ao período de incapacidade total temporária (cfr. artigos 15.º, e 19.º a 21.º do Decreto-Lei n.º 503/99); efectivamente, o Autor não alega qualquer irregularidade nem vem exigir reparação quanto a estes aspectos.

No tocante à incapacidade permanente, dispõe o n.º 3 do transcrito art.º 5.º que é à Caixa Geral de Aposentações que compete a avaliação e a reparação, nos termos previstos no diploma.

A este propósito, inserido no capítulo respeitante à responsabilidade da Caixa Geral de Aposentações, determina o art.º 34.º o seguinte:


«Artigo 34.º

Incapacidade permanente ou morte


1 - Se do acidente em serviço ou da doença profissional resultar incapacidade permanente ou morte, haverá direito às pensões e outras prestações previstas no regime geral.

2 - Quando a lesão ou doença resultante de acidente em serviço ou doença profissional for agravada por lesão ou doença anterior, ou quando esta for agravada pelo acidente ou doença profissional, a incapacidade avaliar-se-á como se tudo dele resultasse, salvo se, por lesão ou doença anterior, o trabalhador já estiver a receber pensão ou tiver recebido um capital de remição.

3 - No caso de o trabalhador estar afectado de incapacidade permanente anterior ao acidente ou doença profissional, a reparação será apenas a correspondente à diferença entre a incapacidade anterior e a que for calculada como se tudo fosse imputado ao acidente ou doença profissional.

4 - As pensões e outras prestações previstas no n.º 1 são atribuídas e pagas pela Caixa Geral de Aposentações, regulando-se pelo regime nele referido quanto às condições de atribuição, aos beneficiários, ao montante e à fruição.

5 - No cálculo das pensões é considerada a remuneração sujeita a desconto para o respectivo regime de segurança social.

6 - A pensão por morte referida no n.º 1 não é acumulável com a pensão de preço de sangue ou com qualquer outra destinada a reparar os mesmos danos, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 41.º

7 - Se do uso da faculdade de recusa de observância das prescrições médicas ou cirúrgicas prevista no n.º 9 do artigo 11.º resultar para o sinistrado uma incapacidade permanente com um grau de desvalorização superior ao que seria previsível se o tratamento tivesse sido efectuado, a indemnização devida será correspondente ao grau provável de desvalorização adquirida na situação inversa.

8 - Se não houver beneficiários com direito a pensão por morte, não há lugar ao respectivo pagamento.»

Já no tocante à confirmação e graduação da incapacidade, determina o artigo 38.º/1 que esta compete à junta médica da CGA, nos seguintes termos:


«Artigo 38.º

Juntas médicas


1 - A confirmação e a graduação da incapacidade permanente é da competência da junta médica da Caixa Geral de Aposentações, que terá a seguinte composição:

a) No caso de acidente em serviço, um médico da Caixa Geral de Aposentações, que preside, um perito médico-legal e um médico da escolha do sinistrado;

b) No caso de doença profissional, um médico da Caixa Geral de Aposentações, que preside, um médico do Centro Nacional e um médico da escolha do doente.

2 - Se o sinistrado ou o doente não indicar o médico da sua escolha no prazo de 10 dias úteis contado da notificação da data da realização da junta médica, este será substituído por um médico designado pela Caixa Geral de Aposentações.

3 - A composição e funcionamento das juntas médicas é da responsabilidade da Caixa Geral de Aposentações, que requisitará o perito médico-legal ao respectivo instituto de medicina legal ou o médico ao Centro Nacional e suportará os inerentes encargos, incluindo os relativos à eventual participação do médico indicado pelo sinistrado ou doente.

4 - Os encargos relativos à participação do médico indicado pelo sinistrado ou doente não podem ultrapassar um quarto da remuneração mínima mensal garantida mais elevada, sendo os relativos aos demais médicos os constantes das respectivas tabelas, caso existam, ou fixados por despacho do Ministro das Finanças.

5 - A determinação das incapacidades permanentes é efectuada de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais.

6 - Nos casos previstos na alínea a) do n.º 1, em que o sinistrado seja militar ou equiparado, o perito médico-legal é substituído, sempre que possível, por um médico indicado pelo competente serviço de saúde militar, com formação específica em medicina legal.

7 - As decisões da junta médica são notificadas ao trabalhador e à entidade empregadora.»

Neste enquadramento, é à junta médica da CGA ─ cuja composição e funcionamento são da responsabilidade da própria CGA ─ que compete verificar (confirmar) se ocorre incapacidade permanente em resultado de acidente, qualificado como acidente em serviço, e bem assim fixar o grau dessa incapacidade, quando existente (cfr. art.º 38.º/1 e 3 do Decreto-Lei n.º 503/99), com vista a estabelecer a pensão devida, a qual consubstanciará reparação do dano sofrido em resultado do acidente de trabalho (cfr. art.º 34º/1do mesmo diploma).

Assim, por aplicação do disposto nestes preceitos, é ao 2º Réu que cabe assumir a responsabilidade respeitante ao acidente em serviço em causa nestes autos, no tocante à reparação da incapacidade permanente, para o que deve diligenciar no sentido de ser o Autor submetido a junta média da CGA para efeitos de verificação e graduação dessa incapacidade.

A conclusão pela atribuição da responsabilidade nestes termos resolve o dissídio jurídico trazido a estes autos, não cabendo ao 1º Réu qualquer responsabilidade por incapacidade permanente em relação ao acidente em serviço, sofrido pelo Autor, em causa nesta acção.

Vem o Autor pedir também a condenação no pagamento da indemnização devida em função da fixação dessa incapacidade, acrescida dos juros legais de mora sobre a indemnização que lhe venha a ser arbitrada.

A condenação do 2º Réu a assumir a responsabilidade pela verificação e reparação da incapacidade permanente já engloba o posterior pagamento da indemnização que venha a ser devida, tendo em conta a verificação e graduação da incapacidade que venha a ser determinada pela junta médica ─ pois que essa é a consequência legal da própria realização da junta médica em causa. Nesta medida, o conhecimento a se deste pedido tem de considerar-se prejudicado; encontra-se igualmente prejudicado o conhecimento do pedido de juros uma vez que, sem o parecer da junta médica ─ que o mesmo é dizer, sem se encontrar verificada e graduada a incapacidade ─ não pode ainda falar-se numa indemnização que seja devida.

Importa, pois, verificar se a sentença recorrida errou ao ter concluído que a responsabilidade pela reparação do acidente em causa competia à CGA e não à entidade empregadora ou à entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade do risco decorrente de acidentes de trabalho, nos termos do Código do Trabalho.

A questão que cumpre nesta sede conhecer reconduz-se à interpretação dos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, na redacção dada pelo artigo 9.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de Dezembro, concretamente em determinar se ao trabalhador em causa é aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, ficando a responsabilidade pela reparação do acidente em causa atribuída à entidade empregadora ou à entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade do risco decorrente de acidentes de trabalho. Ou seja, determinar qual o regime de acidentes de trabalho concretamente aplicável: o do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, ou o estabelecido no Código do Trabalho, por força do disposto no n.º 4 do art. 2.º daquele diploma.

E sobre esta mesma questão já existe jurisprudência deste TCAS, coincidindo a solução encontrada na sentença recorrida com aquela integralmente. Com o que não poderá proceder o recurso. Com efeito, no sentido adoptado pelo tribunal a quo podem ler-se os acórdãos de 6.06.2019 e de 22.08.2019 (para citar os mais recentes), nos processos nºs 505/18.3BEBJA e 2203/17.0BELSB, respectivamente, os quais decidem questões análogas e cuja doutrina é directamente transponível para o caso concreto.

Assim, nos termos permitidos pela lei processual civil, limitar-nos-emos a transcrever o referido acórdão de 6.06.2019, no proc. nº 505/18.3BEBJA (por nós relatado):

“(…)

Sustenta a Recorrente que ao contrário do que se refere na sentença, quando às entidades públicas empresariais ou outras entidades não abrangidas pelos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, é indiferente que os seus trabalhadores exerçam ou não funções públicas, já que, em qualquer dos casos, é-lhes aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho. Donde, sendo a Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, EPE, uma entidade pública empresarial, sempre se terá de considerar que os seus trabalhadores, independentemente de lhes ser aplicável o regime de protecção social convergente ou o regime geral de segurança social, não se encontram abrangidos por tal diploma, sendo-lhes aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho. Pelo que, haverá que concluir, a responsabilidade pela reparação do acidente em causa não compete à CGA, competindo sim à entidade empregadora ou à entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade do risco decorrente de acidentes de trabalho, nos termos do Código do Trabalho. E dada essa realidade jurídica a Caixa Geral de Aposentações deveria ter sido absolvida da instância.

Na sentença recorrida, neste capítulo, exarou-se o seguinte discurso fundamentador:

(…)

Vejamos.

Sustentou-se no acórdão do Tribunal dos Conflitos de 7.06.2016, no proc. n.º 4/16, que sendo o ali demandante “à data do acidente, titular de uma relação jurídica de emprego público no regime de contrato de trabalho em funções públicas com a Unidade Local de Saúde, na qualidade de pessoa coletiva de direito público de natureza empresarial” e como tal sujeito ao “disposto na LVCR [Lei de Vínculos, Carreiras e Remunerações, aprovada pela Lei n.º 12-A/2008 …] e RCTFP (Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 59/2008 …), por força da disposição relativa ao âmbito de aplicação subjetivo e, posteriormente, a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas [aprovada pela Lei n.º 35/2014 …, cuja vigência iniciou em 01.08.2014]”, e o R. “uma pessoa coletiva de direito público de natureza empresarial nos termos do regime jurídico do setor público empresarial do Estado e da Lei n.º 27/2002, de 8 de novembro (…) integrada na administração indireta do Estado e na rede de prestação de cuidados do Serviço Nacional de Saúde, para os efeitos do disposto no Regime Jurídico da Gestão Hospitalar, nos termos do qual, se regem «pelo respetivo diploma de criação, pelos seus regulamentos internos e pelas normas em vigor para os hospitais do SNS que não sejam incompatíveis com a sua natureza jurídica e subsidiariamente, pelo regime jurídico geral aplicável às entidades públicas empresariais» - n.º 1 do artigo 18.º da Lei n.º 27/2002” e que “desde a sua integração no setor público empresarial em 2002/2003, o regime jurídico relativo ao pessoal é o do contrato individual de trabalho, regulado pelo Código do Trabalho e legislação complementar (cfr. art. 12.º do DL n.º 183/2008)”, se impunha ter presente que “à data do acidente de trabalho dos autos (08.11.2012) era aplicável a previsão do Decreto-Lei n.º 503/99 (…), cujo n.º 1 do artigo 2.º dispunha «(o) disposto no presente decreto-lei é aplicável a todos os trabalhadores que exercem funções públicas, nas modalidades de nomeação ou de contrato de trabalho em funções públicas, nos serviços da administração direta e indireta do Estado»”, acautelando-se “no n.º 4 do mesmo artigo 2.º que «(a)os trabalhadores que exerçam funções em entidades públicas empresariais ou noutras entidades não abrangidas pelo disposto nos números anteriores é aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, devendo as respetivas entidades empregadoras transferir a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho nos termos previstos naquele Código»”, e que a “lei de Vínculos, Carreiras e Remunerações (Lei n.º 12-A/2008 …) e o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (Lei n.º 59/2008 …), foram revogados pelas alíneas c) e e) do artigo 42.º da Lei preambular à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (Lei n.º 35/2014, de 20 de junho), que iniciou vigência no dia 01.08.2014, doravante designada por LTFP”, pelo que, do cotejo dos arts. 1.º, 4.º, 5.º, al. b) da referida «LTFP» resulta que esta Lei “é aplicável aos trabalhadores que exercem funções públicas nas entidades públicas empresariais, e que, nos termos do disposto nos respetivos Estatutos, hajam mantido o estatuto jurídico da função pública (...) e que não tenham optado pelo regime do contrato de trabalho (…), como é o caso do trabalhador [em funções públicas] sinistrado/autor nos presentes autos” e que “nesta nova redação, o legislador pretendeu submeter as matérias de acidentes de trabalho e doenças profissionais dos trabalhadores em funções públicas, das entidades públicas empresariais, ao regime abrangido na Lei dos Acidentes de Trabalho - Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro -, regulamentado por força do disposto no artigo 284.º do Código do Trabalho (aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro com as alterações subsequentes)”, sendo que “[c]oncomitantemente, nos termos do disposto no artigo 12.º da LTFP, sob a epígrafe «Jurisdição competente», «(s)ão da competência dos tribunais administrativos e fiscais os litígios emergentes do vínculo de emprego público», como é o caso” (idem , o ac. de 19.01.2017, proc. n.º 10/16).

Isto é, e não relevando aqui a questão da competência em razão da matéria (que não se discute), afirmou-se nesse acórdão: “o legislador pretendeu submeter as matérias de acidentes de trabalho e doenças profissionais dos trabalhadores em funções públicas, das entidades públicas empresariais, ao regime abrangido na Lei dos Acidentes de Trabalho – Lei nº 98/2009, de 4 de Setembro -, regulamentado por força do disposto no artigo 284º do Código do Trabalho (aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro com as alterações subsequentes).”

Sobre esta matéria, em situação similar à presente, decidiu-se recentemente no acórdão de 9.05.2019 deste TCA, no proc, 70/18.5 BEBJA o seguinte:

“(…)

Prescreve o art. 2º, do DL 503/99, de 20/11, na redacção da Lei 59/2008, de 11/9, que:

“1 - O disposto no presente decreto-lei é aplicável a todos os trabalhadores que exercem funções públicas, nas modalidades de nomeação ou de contrato de trabalho em funções públicas, nos serviços da administração directa e indirecta do Estado.

2 - O disposto no presente decreto-lei é também aplicável aos trabalhadores que exercem funções públicas nos serviços das administrações regionais e autárquicas e nos órgãos e serviços de apoio do Presidente da República, da Assembleia da República, dos tribunais e do Ministério Público e respectivos órgãos de gestão e de outros órgãos independentes.

3 - O disposto no presente decreto-lei é ainda aplicável aos membros dos gabinetes de apoio quer dos membros do Governo quer dos titulares dos órgãos referidos no número anterior.

4 - Aos trabalhadores que exerçam funções em entidades públicas empresariais ou noutras entidades não abrangidas pelo disposto nos números anteriores é aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, devendo as respectivas entidades empregadoras transferir a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho nos termos previstos naquele Código.

(…).”

Dispõe-se nas seguintes normas da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei 35/2014, de 20/6 (e na redacção anterior à dada pela Lei 25/2017, de 30/5), o seguinte:

- Art. 1º n.º 6:

“A presente lei é também aplicável, com as necessárias adaptações, a outros trabalhadores com contrato de trabalho em funções públicas que não exerçam funções nas entidades referidas nos números anteriores.”;

- Art. 2º n.º 1:

“A presente lei não é aplicável a:

(…)

b) Entidades públicas empresariais;

(…)”;

- E art. 4º n.º 4,

“O regime do Código do Trabalho e legislação complementar, em matéria de acidentes de trabalho e doenças profissionais, é aplicável aos trabalhadores que exercem funções públicas nas entidades referidas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 2.º” (sublinhados nossos).

Das normas ora transcritas decorre que aos acidentes de trabalho ocorridos com trabalhadores em funções públicas que prestem serviço em entidades públicas empresariais aplica-se o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho e legislação complementar e não no DL 503/99, de 20/11.

Este regime geral é, no entanto, afastado pelo regime especial que se encontra previsto para as entidades públicas empresariais no sector da saúde [cfr. art. 7º n.º 3, do Código Civil (“A lei geral não revoga a lei especial, excepto se outra for a intenção inequívoca do legislador”)], como se passa a demonstrar. [sublinhado nosso]

Conforme decorre da factualidade dada como provada o autor é trabalhador do mapa de pessoal do Hospital José Joaquim Fernandes.

Este hospital, por força do art. 1º, do DL 275/2002, de 9/12, foi transformado em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, com a designação de Hospital José Joaquim Fernandes, SA, abreviadamente designado como Hospital.

Além disso, dispunha o art. 15º, do citado DL 275/2002, o seguinte:

“1 - O pessoal com relação jurídica de emprego público que se encontre a exercer funções no Hospital José Joaquim Fernandes - Beja transita para o Hospital, sendo garantida a manutenção integral do seu estatuto jurídico, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.

2 - O pessoal a que se refere o número anterior pode optar pelo regime de contrato individual de trabalho, no prazo de um ano a contar da data da entrada em vigor do presente diploma, implicando a celebração do contrato de trabalho a exoneração do lugar de origem e a cessação do vínculo à função pública.

3 - A opção a que se refere o número anterior é exercida mediante declaração escrita, individual e irrevogável, dirigida ao presidente do conselho de administração.

4 - Os funcionários que não optem pela aplicação do regime do contrato individual de trabalho mantêm-se integrados nos lugares do quadro de pessoal existente à data da entrada em vigor do presente diploma, vigorando o referido quadro exclusivamente para esse efeito, incluindo a promoção e a progressão nas respectivas carreiras, através de concursos limitados aos funcionários do Hospital.

(…).”

O referido DL 275/2002, de 9/12, foi revogado pelo DL 207/2004, de 19/8, determinando-se neste último:

- no art. 1º:

“1 - É criado o Centro Hospitalar do Baixo Alentejo, com a natureza de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, com a designação de Centro Hospitalar do Baixo Alentejo, S. A., adiante abreviadamente designado como Centro, titular do número de identificação de pessoa colectiva P...........

2 - O Centro integra o Hospital José Joaquim Fernandes, S. A., de Beja, e o Hospital de São Paulo, de Serpa, que, pelo presente diploma, são extintos para todos os efeitos legais e com dispensa de todas as formalidades legais.

3 - Os hospitais referidos no número anterior mantêm as designações originais de Hospital José Joaquim Fernandes e Hospital de São Paulo.”;

- e no art. 15º n.º 6:

“O pessoal que se encontre a exercer funções no Hospital José Joaquim Fernandes, S. A., transita para o Centro e mantém integralmente o seu estatuto jurídico, independentemente da natureza do respectivo vínculo.”.

Por força dos arts. 1º e 2º, do DL 93/2005, de 7/6, e respectivo Anexo, o Centro Hospitalar do Baixo Alentejo, SA, foi transformado em entidade pública empresarial, com efeitos a partir da data da entrada em vigor dos novos estatutos - passando a denominar-se Centro Hospitalar do Baixo Alentejo, EPE -, mais se determinado no art. 4º n.º 2, desse DL 93/2005, que “O pessoal em exercício de funções nas sociedades anónimas transformadas em entidades públicas empresariais mantém o respectivo estatuto jurídico.”.

Através do art. 1º n.º 1, al. b), do DL 183/2008, de 4/9, foi criada, com a natureza de entidade pública empresarial, a Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, EPE – ré nos presentes autos -, por integração do Centro Hospitalar do Baixo Alentejo, EPE, e dos centros de saúde do distrito de Beja, com excepção do centro de saúde de Odemira.

Além disso, prescreve-se no art. 13º, do citado DL 183/2008, de 4/9, o seguinte:

“1 - O pessoal com relação jurídica de emprego público que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, esteja provido em lugares dos quadros do Centro Hospitalar do Alto Minho, E. P. E., do Centro Hospitalar do Baixo Alentejo, E. P. E., do Hospital de Sousa Martins, Guarda, e do Hospital de Nossa Senhora da Assunção, Seia, bem como o respectivo pessoal com contrato administrativo de provimento, transita para a Unidade Local de Saúde do Alto Minho, E. P. E., Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, E. P. E., e Unidade Local de Saúde da Guarda, E. P. E., respectivamente, sendo garantida a manutenção integral do respectivo estatuto jurídico.

(…)

3 - Mantêm -se com carácter residual os quadros de pessoal referidos no n.º 1, exclusivamente para efeitos de acesso dos funcionários, sendo os respectivos lugares a extinguir quando vagarem da base para o topo.

(…)

5 - O pessoal a que se refere o presente artigo pode optar a todo o tempo pelo regime do contrato de trabalho nos termos dos artigos seguintes.”

E determina-se no art. 17º, do mencionado DL 183/2008, que:

“(…)

2 - Relativamente aos funcionários e agentes que não optem pelo regime do contrato de trabalho ou que, nos termos do número anterior, mantenham o regime de protecção social da função pública, a ULS contribui para o financiamento da Caixa Geral de Aposentações, I. P., com a importância que se encontrar legalmente estabelecida para a contribuição das entidades empregadoras com autonomia administrativa e financeira.

Do exposto decorre que à data do acidente de trabalho aqui em causa (16.10.2015), a ré ULSBA, EPE, era - e actualmente continua a sê-lo - uma entidade pública empresarial e o autor nela exercia funções ao abrigo de contrato de trabalho em funções públicas - pois foi-lhe ressalvado por sucessivos diplomas legais a manutenção do respectivo estatuto jurídico de emprego público e nunca terá optado pelo regime do contrato de trabalho -, pelo que, por força do transcrito art. 17º n.º 3, do DL 183/2008, de 4/9, a ré ULSBA, EPE, tinha de observar relativamente ao autor o regime previsto no DL 503/99, de 20/11.

Nestes termos, terá de improceder o recurso jurisdicional interposto pela ré CGA, cumprindo salientar que o regime previsto no art. 31º n.º 3, do DL 18/2017, de 10/2 [dispondo-se nos n.ºs 2 e 3 deste art. 31º o seguinte: “2 - Relativamente aos trabalhadores que, nos termos do artigo 29.º, não tenham optado pelo regime do contrato de trabalho e que, mantenham o regime de proteção social convergente (RPSC), as E. P. E., integradas no SNS asseguram o pagamento das contribuições a título de entidade empregadora, para a Caixa Geral de Aposentações, I. P., e para a ADSE, quando aplicável.”; “3 - Ao pessoal previsto no número anterior integrado no RPSC é aplicável o Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, bem como no Decreto -Lei n.º 118/83, de 20 de novembro, para os organismos dotados de autonomia administrativa e financeira.” (sublinhado nosso)], e ao contrário do alegado pelo ré CGA, não se trata de um regime inovatório, dado que o mesmo limita-se a dar continuidade ao regime que vinha do passado e que se encontrava consagrado maxime no citado art. 17º n.º 3, do DL 183/2008, de 4/9, e no art. 19º n.º 3, do DL 233/2005, de 29/12 [estatuindo-se nos n.ºs 2 e 3 deste art. 19º o seguinte: “2-Relativamente aos funcionários e agentes que não optem pelo regime do contrato de trabalho ou que, nos termos do número anterior, mantenham o regime de protecção social da função pública, os hospitais E. P. E. contribuem para o financiamento da Caixa Geral de Aposentações com a importância que se encontrar legalmente estabelecida para a contribuição das entidades empregadoras com autonomia administrativa e financeira.”; “3-Os hospitais E. P. E. observam, relativamente ao pessoal referido no número anterior, o regime previsto no Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de Fevereiro, e no Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, para os organismos dotados de autonomia administrativa e financeira.” (sublinhado nosso)], tendo este último diploma sido expressamente revogado pelo DL 18/2017 (cfr. o respectivo art. 39º, al. c)).

Julgamos que este entendimento é de subscrever e é o que melhor salvaguarda o regime transitório, expressa e inequivocamente consagrado no artigo 15.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de Dezembro (divergindo-se, portanto, da posição assumida no acórdão de 19.04.2018 deste TCA, no processo 62/17.1BEBJA, subscrito pelo ora relator na qualidade de 1.º adjunto). De acordo com esse dispositivo legal:

“O pessoal com relação jurídica de emprego público que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, esteja provido em lugares dos quadros das unidades de saúde abrangidas pelo artigo 1.º, bem como o respectivo pessoal com contrato administrativo de provimento, transita para os hospitais E. P. E. que lhes sucedem, sendo garantida a manutenção integral do seu estatuto jurídico, sem prejuízo do disposto no Decreto-Lei n.º 193/2002, de 25 de Setembro”.

E diz respeito a todo o estatuto jurídico destes trabalhadores, incluindo o regime jurídico dos acidentes de serviço, como a expressão “manutenção integral do estatuto jurídico”, inequivocamente consagra (neste sentido, o ac. do TCAN de 16.03.2018, proc. nº 2764/10.4BELSB).

No caso que nos ocupa, o acidente ocorreu a 20.12.2012, no exercício de funções nas instalações da ULSLA, detendo a enfermeira sinistrada contrato de trabalho em funções públicas (cfr. o provado em B) e C) supra; o que, aliás, é aceite pelas partes). Ou seja, a enfermeira sinistrada, que ingressou num serviço – desde 6.06.1995 - que hoje integra a ULSLA, é trabalhadora em funções públicas, sendo titular de lugar no mapa de pessoal com relação jurídica de emprego público na ULSLA, exercendo funções na carreira de enfermagem, aplicando-se-lhe subjectivamente a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (aprovada pela Lei nº 35/2014, de 20 de Junho).

Nessa data, encontrava-se em vigor, o Decreto-Lei n.º 238/2012, de 31 de Outubro, que criou a Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, E.P.E., por integração do Hospital do Litoral Alentejano, E.P.E. e do Agrupamento dos Centros de Saúde do Alentejo Litoral e aprovou os Estatutos da nova Instituição. (artigo 1º do DL n.º 238/2012). Nos termos do n.º 1 do artigo 14º do mesmo diploma legal: “[o]s trabalhadores em funções públicas que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, pertencem ao mapa de pessoal do Hospital do Litoral Alentejano, E. P. E., e do Agrupamento de Centros de Saúde do Alentejo Litoral transitam para a ULS do Litoral Alentejano, E. P. E., sendo garantida a manutenção integral do respetivo estatuto jurídico”.

E, como se disse já, integra-se no estatuto jurídico dos trabalhadores em funções públicas que, à data da transformação da Instituição, nela exerciam funções, o Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, que aprovou o regime jurídico dos acidentes em serviço e das doenças profissionais no âmbito da administração pública (neste sentido, v. o ac. deste TCAS de 24.05.2018, proc. nº 3326/15.5BESNT e o ac. do STJ de 17.11.2016, proc. nº 31/14.3T8PNF.P1.S1, aí transcrito).

Pelo que, de acordo com o exposto, terá que improceder o recurso da aqui Recorrente Caixa Geral de Aposentações.

Razões que determinam a improcedência do recurso interposto, devendo manter-se a sentença em conformidade.


III. Conclusões

Sumariando:

i) Aos acidentes de trabalho ocorridos com trabalhadores em funções públicas que prestem serviço em entidades públicas empresariais aplica-se o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho e legislação complementar e não no Decreto-Lei nº 503/99, de 20 de Novembro.

ii) Este regime geral é, no entanto, afastado pelo regime especial que se encontra previsto para as entidades públicas empresariais no sector da saúde.

i) É à Junta Médica da CGA, IP que competirá verificar se ocorre incapacidade permanente em resultado de acidente, qualificado como “acidente em serviço”, ocorrido em 25.10.2012 com um médico com a categoria de Assistente Graduado Sénior – Chefe do Serviço de Neurologia ─ integrado no mapa do Centro Hospitalar de Lisboa Norte, E.P.E, ao abrigo de um contrato de trabalho em funções públicas, enquanto prestava serviço nas instalações da daquele hospital, e fixar o grau dessa incapacidade quando existente (cfr. artigo 38.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11), com vista a estabelecer a pensão devida, a qual consubstanciará reparação do dano sofrido em resultado do acidente de trabalho (cfr. artigo 34.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11).



IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da secção do contencioso administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 12 de Setembro de 2019



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Pedro Marchão Marques


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Paula de Ferreirinha Loureiro


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Jorge Pelicano