Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:287/12.6BELRA-A
Secção:CT
Data do Acordão:07/08/2021
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:EXECUÇÃO DE JULGADO.
APLICAÇÃO DA REGRA DE IMPUTAÇÃO AOS PAGAMENTOS EFECTUADOS PELA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA
Sumário:De acordo com a regra de imputação dos pagamentos efectuados pela Administração Tributária, os montantes pagos são, primeiramente, referidos aos montantes de juros de mora e de juros indemnizatórios em falta e só depois ao montante da dívida tributária a restituir.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acórdão

I- Relatório

A............ intentou, por apenso ao processo de Impugnação Judicial n.º 287/12.6BELRA, a correr termos no TAF de Leiria, que havia determinado a procedência de acção e a anulação dos actos de fixação dos valores patrimoniais tributários impugnados, acção de execução do julgado em referência, no qual formulou o pedido seguinte: «(…) Após o trânsito a AT estava obrigada à reconstituição da situação que existia anteriormente à data das segundas avaliações anuladas por sentença judicial;- A reforma da liquidação do imposto de selo, com o consequente reembolso da diferença, para menos, do imposto devido, bem como dos juros indemnizatórios;- A reforma das liquidações de IMI, com o consequente reembolso do imposto correspondente aos prédios objecto da avaliação anulada, em todos os anos de 2011 a 2016, bem como dos juros indemnizatórios;- A reforma da liquidação adicional de IMI em cobrança em Setembro de 2017;- O pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento do excesso indevido

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, por sentença proferida a fls. 159/162, datada de 23 de Fevereiro de 2018, julgou procedente o pedido de execução de sentença, condenando a Fazenda Pública: // i) na reforma da liquidação de imposto de selo, com o consequente reembolso da diferença; ii) na reforma das liquidações de IMI, com o consequente reembolso do imposto pago relativo aos anos de 2011 a 2017, relativas aos prédios urbanos com os artigos matriciais ....., ....., ....., da freguesia de Leiria (actuais artigos ....., ..... e ....., das freguesias de Leiria, Pousos, Barreira e Cortes). iii) no pagamento dos respectivos juros indemnizatórios desde a data do efectivo pagamento e de juros de mora sobre as quantias efectivamente pagas, os últimos devidos a partir da data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado, que ocorreu em 20/6/2017, até a data da emissão da nota de crédito, à taxa legal equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.

Por meio de articulado de 25 de Setembro de 2018, o requerente peticionou o pagamento da quantia de 60.873,71€ pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Através de articulado datado de 2 de Novembro de 2018, a executada informou aos autos de que já havia dado cumprimento aos efeitos anulatórios, determinados no processo principal – Impugnação Judicial nº 287/12.6BELRA – e reembolsado as quantias indevidamente pagas.

Tal requerimento foi alvo de contraditório por parte do exequente, pugnando pelo cumprimento do julgado.

Em 02 de Dezembro de 2019, foi proferido Despacho no qual o Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria determinou estar o julgado anulatório integralmente cumprido, indeferindo o requerido pelo exequente.

O recorrente interpõe recurso jurisdicional contra o despacho em apreço. Alega em síntese nos termos seguintes:

«Entendemos que a decisão sob recurso por proferida com

1. Ilegalidade:
i) a não respeitar a decisão proferida na impugnação transitada e julgado;
ii) a não entender o pedido inicial do contribuinte;
iii) a não considerar os nºs 3,4 e 5 do CPPT

2. Erro de julgamento:
i) Entender que o contribuinte tinha de provar o pagamento quando os factos teriam de constar do PA;
ii) Não ter entendido o julgador a quais prédios se referia a impugnação, quando o articulado 4º da p.i. identificava claramente:
‘Porém, o requerente é apenas proprietário em 2/3 dos aludidos prédios que passaram a fazer parte da união de freguesias, e que foram por isso, renumerados como se indica:




A razão de ser deste recurso, encontra abrangência na decisão a que nos vimos referindo, e da qual consta: // II. Ao pagamento dos respetivos juros indemnizatórios desde a data do efetivo pagamento e de juros de mora sobre as quantias efetivamente pagas, os últimos a partir da data do termo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado, que ocorreu em 20/6/2017, até à data da emissão da nota de crédito, à taxa legal equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.

12º

Como não foram pagos os juros indemnizatórios e os juros moratórios, aquando do reembolso de €43.925,63, nos precisos termos do artigo 785º do Código Civil, a imputação do pagamento terá de ser feita primeiramente aos juros compensatórios de €12.686,30 e aos juros moratórios de € 2.917,34, no total de €15.603,64, ficando a parte correspondente do reembolso, a vencer juros indemnizatórios e moratórios, até à emissão da nova nota de crédito a processar a favor do contribuinte.

13º

Mantemos, pois, na íntegra, o pedido de pagamento dos valores devidos, até à data em que foi efetuada a nota de compensação [2019.01.03] e relativamente à parte do capital em dívida, ao vencimento de juros indemnizatórios e moratórios, até integral pagamento.»

X

A Fazenda Pública não contra-alegou.

X

O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, foi regularmente notificado.

X

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

X

II- Fundamentação.

2.1. Com vista a resolver a questão solvenda mostram-se provadas as vicissitudes processuais seguintes:
A)    Por meio de sentença proferida em 20.02.2017, no P. 287/12.6BELRA, o TAF de Leiria julgou procedente a impugnação deduzida pelo recorrente contra os actos de avaliação dos lotes de terreno para construção, inscritos sob os artigos matriciais n.º ..... (lote 28), ..... (lote 29) e ..... (lote 30), da freguesia de Leiria, Concelho de Leiria, com fundamento em erro na quantificação – fls. 121/130, dos autos principais.
B)    Por meio de sentença proferida em 23.02.2018, nos presentes autos de execução de sentença, a Fazenda Pública foi condenada no seguinte: «i) na reforma da liquidação do imposto de selo, com o consequente reembolso da diferença e na reforma da liquidação de IMI, com o consequente reembolso do imposto pago relativo aos anos de 2011 a 2017, relativos aos prédios urbanos com os artigos matriciais ....., ....., ....., da freguesia de Leiria (actuais artigos ....., ..... e ....., das freguesias de Leiria, Pousos, Barreira e Cortes). // ii) no pagamento dos respectivos juros indemnizatórios desde a data do efectivo pagamento e de juros de mora sobre as quantias efectivamente pagas, os últimos devidos a partir da data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado, que ocorreu em 20/06/2017, até à data da emissão da nota de crédito, à taxa legal equivalente ao dobro da taxa de juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas» - fls. 159/162.
C)    Em 04/10/2017, a Administração Tributária determinou “SEM EFEITO’’ as 2.a avaliações realizadas aos prédios com os artigos ....., ....., ..... da União de freguesias de Leiria, Pousos, Barreiras e Cortes, nos termos constantes de fls. 26 a 34 dos autos em suporte de papel, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.
D)    Em 04.01.2019, a executada informou os autos do seguinte:


«imagem no original»

E)    A executada informou os autos que foram emitidas novas liquidações de IMI em nome do exequente, tendo o mesmo sido esclarecido sobre as mesmas – fls. 204.
F)    Da demonstração de liquidação de Imposto de Selo resulta o valor a reembolsar de €50.780,84 e valor a pagar €50.854,17 – fls. 206 e verso.
G)    Em 19.02.2019, a executada informou os autos do seguinte:

«imagem no original»


Em 02.03.2019, o requerente afirmou e solicitou o seguinte:
«o que foi processado (não significa pago):
- a título de restituição do imposto…43.925,43
- a título de juros compensatórios ...€2.832,46
-  a título de juros moratórios………..€1.599,58
Soma:…………………………..  ….. €48.357,47 // (…)
Como não foram pagos os juros compensatórios e os juros moratórios, aquando do reembolso de €43.925,63, nos precisos termos do artigo 785° do Código Civil, a imputação do pagamento terá de ser feita primeiramente aos juros compensatórios de €12.686,30 e aos juros moratórios de € 2.917,34, no total de €15.603,64, ficando a parte correspondente do reembolso, a vencer juros compensatórios e moratórios, até à emissão da nova nota de crédito a processar a favor do contribuinte.
Mantemos, pois, na íntegra, o pedido de pagamento dos valores devidos, até à data em que foi efetuada a nota de compensação [2019.01.03] e relativamente à parte do capital em dívida, ao vencimento de juros compensatórios e moratórios, até integral pagamento».
I) Em 14.06.2019, a executada informou os autos do seguinte:






J) O despacho recorrido assentou na fundamentação seguinte:
«Vem agora o Exequente, através do requerimento acima identificado, tendo durante a pendência da ação especificado que o julgado anulatório não se encontra suficientemente executado, na sua ótica, no que diz respeito ao Imposto do Selo e à reforma dessa liquidação, com o consequente pagamento de juros indemnizatórios e moratórios. // Peticiona o Exequente, em concreto, a restituição de uma quantia global de €62.291,05, o que refere em requerimento de 06.03.2019, correspondendo €46.867,41 a imposto, €12.686,30 a juros compensatórios, e €2.917,34 a juros moratórios. // No que diz respeito ao pagamento das quantias relativas a imposto, comprova a Fazenda Pública, por documento junto a fls. 239 do processo físico, que foi restituído ao Exequente o valor de €43.925,43, o que efetivamente não corresponde à quantia que é reclamada pelo Exequente. Vejamos, todavia, se se encontram pagas as restantes quantias para que, no final, possamos mais facilmente calcular qualquer montante que, eventualmente, ainda se encontra em dívida. // Peticiona ainda o Exequente, a título de juros moratórios, o reembolso do valor de €2.917,34, quando apenas se encontra comprovado nos autos, por documento de fls. 238 do processo físico, o pagamento do valor de €1.599,58. // Por fim, pede ainda o Exequente o valor de €12.686,30 a título de juros compensatórios, aos quais manifestamente não tem direito, não só pelo teor da sentença proferida nos presentes autos, mas também pela conjugação das normas legais aplicáveis. Efetivamente, a decisão final proferida neste processo apenas condenou a Administração Tributária ao pagamento de juros indemnizatórios e moratórios. Ademais, dispõe o artigo 35.º da Lei Geral Tributária (LGT) que os juros compensatórios são devidos em caso de atraso na liquidação do imposto imputável ao sujeito passivo, pelo que estes juros apenas poderão ser pagos à Administração Tributária pelo contribuinte, e não o contrário. // Significa isto que, do montante de €62.291,05, o Exequente apenas terá direito a €49.604,75, atenta a impossibilidade legal de lhe serem pagos quaisquer montantes a título de juros indemnizatórios. E, como vimos, a Administração Tributária comprovou o pagamento de €43.925,43 a título de imposto, acrescidos de €1.559,58 a título de juros moratórios, sendo certo que se encontra também devidamente comprovado nos autos, pelos mesmo documentos acima referidos, o valor de €2.833,61 a título de juros indemnizatórios, o que totaliza o montante já pago de €48.318,62. // Significa isto que, atentos os montantes peticionados pelo Exequente e os já pagos pela Administração Tributária, se encontraria ainda em falta o pagamento de um valor de €1.286,13. // Todavia, conforme bem aponta o Exmo. Procurador da República no seu parecer, o Exequente afirma ter pago o valor de €198.982,62 referente à liquidação de IS anulada por força da sentença proferida no Proc. n.º 287/12.6BELRA, quando essa liquidação tem, na realidade, o valor de €197.982,62. Ademais, se bem vemos, essa liquidação de IS refere-se a 10 artigos, quando na impugnação judicial n.º 287/12.6BELRA, e portanto na presente execução de sentença, estão apenas em causa três artigos urbanos, não se retirando do teor da liquidação qual o valor correspondente a estas três verbas que para o caso concreto relevam. Não resultando do documento, exigia-se ao Exequente que, nos termos gerais definidos pelo n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil (CC), comprovasse nos autos o montante por si pago a título de IS relativamente a estes três artigos urbanos, o que não fez. Assim sendo, não resta ao Tribunal outra alternativa que não corroborar a execução do julgado anulatório efetuada pela Administração, afigurando-se estarem restituídos ao Exequente todos os montantes que legalmente lhe eram devidos. // Face ao supra exposto, e afigurando-se estar o julgado anulatório integralmente cumprido, indefiro o requerimento do Exequente de 25.09.2018, por não existir fundamento legal para dar conhecimento do caso concreto ao CSTAF».
K) Em 29.03.2012, o exequente pagou de imposto de selo o montante de €197.982,62 – doc. 1.
L) Em 27.04.2012, o exequente pagou de IMI o montante de €4.279,21 – doc.2.
M) Em 28.09.2012, o exequente pagou de IMI o montante de €4.279,19 – doc. 2A.
N) Em 29.04.2013, o exequente pagou de IMI o montante de €2.897,81 – doc.3.
O) Em 30.07.2013, o exequente pagou de IMI o montante de €2.897,80 - doc. 3A.
P) Em 25.11.2013, o exequente pagou de IMI o montante de €2.897,80 – doc. 3B.
Q) Em 29.04.2014, o exequente pagou de IMI o montante de €2.900, 76 – doc. 4.
R) Em 23.07.2014, o exequente pagou de IMI o montante de €2.900,75 – doc. 4A.
S) Em 28.11.2014, o exequente pagou de IMI o montante de €3.103,81 – doc. 4B.
T) Em 29.04.2015, o exequente pagou de IMI o montante de €3.279,55 – doc. 5.
U) Em 30.07.2015, o exequente pagou de IMI o montante de €3.279,55 – doc. 5A.
V) Em 27.11.2015, o exequente pagou de IMI o montante de €3.279.54 – doc. 5B.
W) Em 27.04.2016, o exequente pagou de IMI o montante de €3.279,40 – doc. 6.
X) Em 28.07.2016, o exequente pagou de IMI o montante de €3.278,37 – doc. 6A.
Y) Em 29.11.2016, o exequente pagou de IMI o montante de €3.294,68 – doc. 6B.
Z) Em 27.04.2017, o exequente pagou de IMI o montante de €2.282,87 – doc. 7.
AA) Em 28.07.2017, o exequente pagou de o montante de €3.282,85 – doc. 7A.
BB) Em 28.11.2017, o exequente pagou de IMI o montante de €934,60 – doc. 7B.
CC) Em 29.09.2017, o exequente pagou de IMI o montante de €16.247,18 – doc.7C.
DD) Em 27.04.2018, o exequente pagou de IMI o montante de €2.514,86 – doc. 9.
EE) Em 20.07.2018, o exequente pagou de IMI o montante de €2.514,84 – doc.9A.
FF) Em 28.11.2018, o exequente pagou de IMI o montante de €2.514,78 – doc.9B.


X
2.2. Direito
2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre o alegado erro de julgamento em que terá incorrido o despacho impugnado, ao considerar cumprido o julgado exequendo.
2.2.2. Está em causa a execução da sentença referida em A), nos termos definidos pela sentença referida em B). Por outras palavras, está em causa nos autos aquilatar da execução integral da sentença de 23.02.2018, por meio da qual a Fazenda Pública foi condenada na: i) reforma da liquidação do imposto de selo, com o consequente reembolso da diferença e à reforma da liquidação de IMI, com o consequente reembolso do imposto pago relativo aos anos de 2011 a 2017, relativos aos prédios urbanos com os artigos matriciais ....., ....., ....., da freguesia de Leiria (actuais artigos ....., ..... e ....., das freguesias de Leiria, Pousos, Barreira e Cortes). // ii) no pagamento dos respectivos juros indemnizatórios desde a data do efectivo pagamento e de juros de mora sobre as quantias efectivamente pagas, os últimos devidos a partir da data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado, que ocorreu em 20/06/2017, até à data da emissão da nota de crédito, à taxa legal equivalente ao dobro da taxa de juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas.
A este propósito estatui o artigo 173.º do CPTA (“Dever de executar”)[1], o seguinte:« (1) Sem prejuízo do eventual poder de praticar novo acto administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado, a anulação de um acto administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento naquele acto, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter actuado. // (2) Para efeitos do disposto no número anterior, a Administração pode ser constituída no dever de praticar actos dotados de eficácia retroactiva, desde que não envolvam a imposição de deveres, encargos, ónus ou sujeições, a aplicação de sanções ou a restrição de direitos ou interesses legalmente protegidos, assim como no dever de anular, reformar ou substituir os actos consequentes, sem dependência de prazo, e alterar as situações de facto entretanto constituídas, cuja manutenção seja incompatível com a execução da sentença de anulação».
«Como resulta do artigo 173.º, n.º 1, os deveres em que a Administração pode ficar constituída na sequência da procedência do processo impugnatório de um [acto tributário] podem situar-se em três planos: a) reconstituição da situação que existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado; b) cumprimento tardio dos deveres que a Administração não cumpriu durante a vigência do acto ilegal, porque este acto disso a dispensava; c) eventual substituição do acto ilegal, sem reincidir nas ilegalidades anteriormente cometidas»[2].
No caso em exame, o exequente questiona a restituição do valor relativo ao Imposto de selo pago em excesso, bem assim como o pagamento de juros indemnizatórios e de mora.
Do probatório resulta que as liquidações de IMI e a liquidação de I. Selo foram reformadas e substituídas por novas liquidações que atendem aos vpt, entretanto, apurados[3].
Dos elementos coligidos nos autos resulta que o montante do I. Selo pago em excesso foi restituído [€43.925,43[4]], bem assim como os juros de mora e os juros indemnizatórios, seja por relação ao IMI, seja por referência ao I. Selo [5].
A presente intenção recursória centra-se sobre o segmento decisório relativo à restituição do I. Selo e juros (V. conclusões e alínea H).
Os montantes restituídos estão sujeitos as regras seguintes:
i) No que respeita à restituição do imposto pago em excesso[6], «[a] administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei»[7].
ii) No que respeita ao pagamento de juros indemnizatórios, «[e]m caso de anulação judicial do acto tributário, cabe à entidade que execute a decisão judicial da qual resulte esse direito determinar o pagamento dos juros indemnizatórios a que houver lugar. // Os juros indemnizatórios serão liquidados e pagos no prazo de 90 dias contados a partir da decisão que reconheceu o respectivo direito ou do dia seguinte ao termo do prazo legal de restituição oficiosa do tributo. // Se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea. // Os juros são contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito, em que são incluídos»[8].
iii) No que respeita ao pagamento de juros de mora, «[n]o período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas»[9].
A sentença proferida em sede de execução de julgado condenou a executada «no pagamento dos respectivos juros indemnizatórios desde a data do efectivo pagamento e de juros de mora sobre as quantias efectivamente pagas, os últimos devidos a partir da data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado, que ocorreu em 20/06/2017, até à data da emissão da nota de crédito, à taxa legal equivalente ao dobro da taxa de juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas»,
No presente caso, está em causa a execução da sentença, proferida em 20.02.2017, no P. 287/12.6BELRA, por meio da qual o TAF de Leiria julgou procedente a impugnação deduzida pelo recorrente contra os actos de avaliação dos lotes de terreno para construção, inscritos sob os artigos matriciais n.º ..... (lote 28), ..... (lote 29) e ..... (lote 30), da freguesia de Leiria, Concelho de Leiria, com fundamento em erro na quantificação, transitada em julgado, em 20/06/2017, pelo que o prazo de execução espontânea terminou em 27.10.2017[10].
A data da execução espontânea da sentença referida termina em 27.10.2017; ou seja, são devidos juros indemnizatórios sobre a quantia de I. Selo, reembolsada, de €43.925,43, desde a data de 29.03.2012[11], até 18.01.2019 (data da emissão da nota crédito[12]).
No que respeita aos juros de mora, os mesmos são devidos desde a data do termo do prazo da execução espontânea (27.10.2017), até à data da emissão da nota crédito[13], ou seja, 18.01.2019; pelo que são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas, desde 27.10.2017 até 18.01.2019, incidentes sobre a quantia de €43.925,43.
Salvo no que respeita à restituição do I. Selo pago em excesso, do probatório não resulta comprovado o pagamento das quantias relativas aos juros indemnizatórios e juros de mora, nos termos devidos[14]. Importa ter presente a regra de imputação dos pagamentos efectuados pela executada, prevista no artigo 40.º/4, da LGT. Nos termos do preceito citado, «[e]m caso de o montante a pagar ser inferior ao devido, o pagamento é sucessivamente imputado pela seguinte ordem a: // a) Juros moratórios; // b) Outros encargos legais; // c) Dívida tributária, incluindo juros compensatórios; //d) Coimas». A este propósito, o STA teve ocasião de sublinhar que «[o] regime de imputação de pagamentos previsto no art. 40.º, n.º 4, da Lei Geral Tributária é aplicável às dívidas da administração tributária para com os contribuintes, pagas em execução de julgado».
No caso em apreço, os autos não esclarecem se os montantes pagos a título de juros de mora e de juros indemnizatórios observam as regras enunciadas quanto ao cômputo dos mesmos, pelo que importa apurar, de forma precisa, o quantitativo dos juros de mora e dos juros indemnizatórios, incidentes sobre o montante de €43.925,43, e proceder ao seu pagamento, de acordo com a regra do artigo 40.º/4, da LGT, citada, ou seja, primeiro, os pagamentos são imputados aos montantes de juros de mora e de juros indemnizatórios em falta e depois são imputados ao montante da dívida tributária a restituir. Nada mais sendo devido pela executada, dado que não são devidos juros sobre juros (artigo 560.º do CC).
Motivo porque se impõe julgar parcialmente procedente a presente intenção recursória, com a consequente revogação do despacho impugnado e substituição por decisão que condene a executada no pagamento dos juros de mora e dos juros indemnizatórios devidos, incidentes sobre o montante de €43.925,43, com a observância da regra de imputação do artigo 40.º/4, da LGT.

Dispositivo

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder parcial provimento ao recurso, revogar o despacho impugnado e condenar a executada no seguinte:
i) Efectuar o pagamento dos juros indemnizatórios sobre a quantia de I. Selo, a reembolsar, de €43.925,43, desde a data de 29.03.2012, até 18.01.2019 (data da emissão da nota crédito).
ii) Efectuar o pagamento dos juros de mora devidos desde a data do termo do prazo da execução espontânea (27.10.2017), até à data da emissão da nota crédito, ou seja, 18.01.2019, calculados nos termos do artigo 43.º/5, da LGT.
iii) Efectuar o pagamento da dívida tributária de I. Selo a restituir.
Custas pela executada.
Registe.
Notifique.

O Relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Desembargadoras Lurdes Toscano e Maria Cardoso.

(Jorge Cortês - Relator)

_______________________
[1] Aplicável ex vi artigo 146º/1, do CPPT.
[2] Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2010, pp. 521/522. Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2016, pp. 492/494.
[3] Alíneas C) a F), do probatório.
[4] Alínea H), do probatório.
[5] Alínea I), do probatório.
[6] Apenas o I. Selo está em causa, dado que é o único sobre o qual incide a intenção recursória.
[7] Artigo 100.º/1, da LGT.
[8] Artigo 61.º/3/4/5, do CPPT.
[9] Artigo 43.º/5, da LGT.
[10] «Se outro prazo não for por elas próprias fixado, as sentenças dos tribunais administrativos que condenem a Administração à prestação de factos ou à entrega de coisas devem ser espontaneamente executadas pela própria Administração, no máximo, no prazo procedimental de 90 dias, salvo ocorrência de causa legítima de inexecução, segundo o disposto no artigo seguinte (artigo 162.º/1, do CPTA).
[11] Alínea K), do probatório.
[12] Alínea G), 6, do probatório.
[13] Alínea G), 6, do probatório.
[14] V. alínea I, do probatório, apesar dos esforços do TCAS para esclarecer os cálculos efectuados (despacho de 20.05.2021).