Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:11977/15
Secção:CA-2º JUÍZO
Data do Acordão:05/14/2015
Relator:PAULO PEREIRA GOUVEIA
Descritores:AUDIÊNCIA PRÉVIA, PERICULUM IN MORA
Sumário:I – A audiência prévia dos interessados não se presume; prova-se a partir dos respetivos documento ou do registo administrativo da eventual audiência oral.

II- A mera alegação da requerente de que a redução do seu rendimento põe seriamente em causa a sua estabilidade financeira e, consequentemente, a sua capacidade de pagar as suas despesas básicas e essenciais, é manifestamente insuficiente para que se possa concluir, num juízo necessariamente perfunctório, pela probabilidade da ocorrência de prejuízos.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul:
I. RELATÓRIO
· MARIA ………………., com os demais sinais nos autos, intentou
Processo cautelar contra
· INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P.
Pediu ao T.A.C. de Almada o seguinte:
Suspensão de eficácia do acto administrativo, de 03/11/2014, que determinou a sua afectação à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Lisboa Oriental, com efeitos a partir do dia 17/11/2014.
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Por decisão cautelar de 9-1-15, o referido tribunal decidiu indeferir o pedido cautelar.
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Inconformada, a requerente recorre para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:

« (Imagem)»
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O recorrido contra-alegou, concluindo:
1. Inconformada com a douta sentença do Tribunal a quo que indeferiu a sua pretensão, veio a A. recorrer da mesma, utilizando como fundamentos para o seu recurso a alegação de que a sentença proferida deve ser revogada "por ser evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular na ação principal, por estar em causa um ato manifestamente ilegal (alínea a) do nº1 do artigo 120° do CPTA)"; "ou caso assim não se entenda seja alterada a sentença quanto à verificação do periculum in mora."
2. Porém, a falta de razão da Recorrente para ver proceder as suas pretensões é por demais patente. Nada há na douta sentença ora recorrida que indicie a violação de qualquer norma jurídica, nem a Recorrente o demonstra ou concretiza.
3. Por outro lado, também não se nos afigura que o Tribunal a quo tenha incorrido em erro na fixação da factualidade relevante para a decisão da previdência cautelar interposta, nem, do mesmo modo, tenha errado no julgamento da mesma e na sua subsunção às normas jurídicas aplicáveis in casu.
4. É que, mesmo entendendo que os factos constantes dos artigos 65.º a 67.º do requerimento inicial tivessem sido considerados como factos provados, nada neles prova que haja qualquer impedimento para que a Recorrente possa exercer funções na Comissão de Protecção de Crianças Jovens em Risco de Lisboa-Oriental, uma vez que detém licenciatura adequada para o efeito, conforme foi sobejamente elencado na oposição deduzida pelo Requerido.
5. O mesmo acontece, de igual modo, com as restantes invalidades e vícios assacadas à sentença;
6. Assim, não é efetuada em sede de recurso, tal como não o foi no requerimento inicial, prova de que a douta sentença proferida tenha errado ao julgar que a falta de assinatura da informação que fundamenta o despacho de 03 de novembro de 2014 não tem a capacidade de determinar a nulidade deste ato;
7. Em conformidade, considera-se, também, em concordância total com a douta sentença, que a fundamentação do despacho de 3 de Novembro de 2014 foi suficiente e a sua notificação foi eficaz, não tendo existido qualquer violação do disposto nos artigos 68°, n°1, 123° n°1, 124° e 125° do Código do Procedimento Administrativo.
8. Assim como, também em consonância com a decisão contida na douta sentença, se considera que foi respeitado o direito de audiência da Recorrente, em fase anterior à prolação do Despacho de 03 de novembro de 2014,
9. Pelo que o Tribunal a quo decidiu, e muito bem, pela não verificação dos requisitos exigidos quer pela alínea a) e pela alínea b), 1.ª parte, do n.º 1 do art.º 120.º do CPTA, quer do periculum in mora, para que se concluísse que fosse manifesta a procedência da ação principal e que o não decretamento da providência comportaria para a Requerente prejuízos superiores aos que resultariam do seu decretamento para os interesses antagónicos em presença.
10. E a Recorrente volta a não comprovar a verificação dos requisitos exigidos, quer pela alínea a) e pela alínea b) 1ª parte do nº1 do artigo 120° do CPTA, quer do periculum in mora, limitando-se, isso sim, a tecer considerações de valor, vagas e abstratas, sem qualquer preocupação em demonstrar/provar a existência destes requisitos de verificação obrigatória.
11. Concluindo, não SE verifica - e nem a Recorrente prova, à semelhança do acontecera no requerimento inicial - a existência destes requisitos (para mais, cumulativos), que poderiam legitimar a procedência do recurso e o acesso a este tipo de processo de caráter urgente, o que não se concede.
12. Assim, por não se verificarem os requisitos exigidos, quer pela alínea a) do n°1 do artigo 120° e da alínea b) 1ª parte do CPTA, quer do periculum in mora, cumulativos para que a providência cautelar possa ser decretada, por não assistir qualquer direito à Recorrente que mereça ser tutelado, e por inexistirem quaisquer invalidades ou vícios na sentença ora recorrida, deverá a mesma ser integralmente mantida, por justa, legal e fundamentada.
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O Exmº representante do Ministério Público junto deste Tribunal foi notificado para se pronunciar como previsto na lei de processo.
Cumpridos os demais trâmites processuais, importa agora apreciar e decidir em conferência.
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Este tribunal tem sempre presente o seguinte: (i) o primado do Estado democrático e social de Direito material, num contexto de uma vida socioeconómica submetida ao bem comum e à suprema dignidade de cada pessoa; (ii) os valores ético-jurídicos do ponto de vista da nossa lei fundamental (1); (iii) os princípios estruturantes do Estado de Direito (ex.: a juridicidade, a segurança jurídica (2) e a igualdade (3)); (iv) as normas que exijam algo de modo definitivo e ou as normas que exijam uma otimização das possibilidades de facto e de direito existentes no caso concreto (4), através de uma ponderação racional e justificada (5); e (v) a máxima da unidade e coerência do nosso sistema jurídico (6), bem como, sempre que possível e necessário, as máximas metódicas da igualdade e da proporcionalidade (7).
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QUESTÕES A RESOLVER
Os recursos, que devem ser dirigidos contra a decisão do tribunal a quo e seus fundamentos, têm o seu âmbito objetivo delimitado pelo recorrente nas conclusões da sua alegação de recurso, alegação que apenas pode incidir sobre as questões que tenham sido apreciadas pelo tribunal recorrido (ou que devessem ser aí oficiosamente conhecidas).
Temos, pois, de apreciar o seguinte contra a decisão do tribunal a quo:
- Erro na selecção da matéria de facto (cfr. artigos 65 a 67 do RI e docs. nº 4 e 5);
- Erro na aplicação da al. a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA ao ato administrativo suspendendo (que a recorrente chama de "erro no julgamento da matéria de facto"), com referência
à falta de audiência prévia,
à falta de fundamentação (por haver nulidade consequente por causa da remissão para uma informação nula – cfr. artigos 123º/1-g), 131º/1 e 133º/2-i) do CPA), e
ao desrespeito pelo conteúdo funcional da profissão da ora recorrente como técnica superior de reinserção social (cfr. DL 204-A/2001, Anexo II; e os docs. referidos nos artigos 12 a 16 da alegação do recurso);
- Erro quanto ao julgamento dos prejuízos (periculum in mora).
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II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1. FACTOS PROVADOS segundo o tribunal recorrido
1
A requerente é técnica superior de reinserção social do Instituto da Segurança Social, I.P. [acordo].
2
Em 07/10/2013, a Chefe do Sector Amadora-Lisboa do Centro Distrital de Lisboa do Instituto da Segurança Social, I.P., Dra. Susana ………., propôs ao Director do Núcleo de Infância e Juventude, Dr. Miguel …………, a transferência imediata da requerente para a Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Lisboa Oriental [documento de fls. 118 e 119 dos autos].
3
Após o parecer favorável do Director do Núcleo de Infância e Juventude e da Directora da Unidade de Desenvolvimento Social e Programas, a proposta referida em b) foi aceite pela Directora do Centro Distrital de Lisboa [documento de fls. 120 e 121 dos autos].
4
Em 21/08/2014, o Presidente da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Lisboa-Oriental enviou um email para o Centro Distrital de Lisboa, onde consta, designadamente, o seguinte:
“(…)
«(Imagem)»

(…)” [documento de fls. 130 dos autos].
5
Na sequência do email referido em d), em 03/09/2014, o Presidente da Comissão Nacional de Crianças e Jovens em Perigo, Dr. Armando Leite, enviou para o Centro Distrital de Lisboa um email com o seguinte teor:
«(Imagem)»

[documento de fls. 129 dos autos].
6
Em 28/10/2014, a requerente teve uma reunião com o Director da Unidade de Desenvolvimento Social e Programas e com o Director do Núcleo de Infância e Juventude [documento de fls. 22 dos autos].
7
Por despacho do Director da Unidade de Desenvolvimento Social e Programas do Centro Distrital de Lisboa, de 03/11/2014, exarado na Informação n.º144/2014, datada de 29/10/2014, foi determinada a afectação da requerente à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Lisboa Oriental [documento de fls. 19 a 21 dos autos].
8
O despacho referido tem o seguinte teor: “Visto. Atento o teor da presente Informação, bem como os pareceres nela exarados sou a concordar e autorizar nos termos propostos” [documento de fls. 19 a 21 dos autos].
9
Na Informação referida consta, designadamente, o seguinte:
“(…)
«(Imagem)»

[documento de fls. 19 a 21 dos autos].
10
A mesma Informação não se encontra assinada de forma manuscrita [documento de fls. 19 a 21 dos autos].
11
O despacho e a Informação referidos foram enviados para a autora através de email, onde consta o seguinte: “De acordo com orientação do Sr. Director de Unidade e como solicitado no mail infra, junto se anexa despacho superior relativo à sua afectação à CPCJ de Lisboa Oriental” [documento de fls. 22 dos autos].
12
Até à sua afectação à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens, a requerente integrava a Equipa Tutelar Cível do Sector-Amadora Lisboa do Centro Distrital de Lisboa do Instituto da Segurança Social, I.P. [documento de fls. 19 a 21 dos autos].
*
Continuemos.
II.2. APRECIAÇÃO DO RECURSO
Aqui chegados, há melhores condições para se compreender o recurso e para, de modo facilmente sindicável, apreciarmos o seu mérito.
Vejamos, pois.
A.
Do erro na selecção da matéria de facto (cfr. artigos 65 (8), 66 (9) e 67 (10) do RI; doc. nº 4/in DR-2ª-30/5/2008 e doc. nº 5)
Desde já, refere-se que o invocado DL 204-A/2001 foi substituído pelo DL 126/2007 e este pelo DL 215/2012.
O teor de tais 3 artigos do r.i. consubstancia-se no seguinte:
- O teor do artigo 66 é matéria jurídica contida no cit. DR-2ª série;
- O mesmo é de dizer do teor do artigo 66 com excepção da sua parte final, que é uma conclusão que não consta dos docs. 4 e 5 cits. para onde a requerente remete, nem, note-se, tem qualquer relevância (controvertido ou não) ante o teor dos DL citados, DL que não distinguem funções em matéria tutelar cível de funções da protecção em risco;
- O teor do artigo 67 é meramente conclusivo e relacionado com o acabado de dizer.
Por isso, não se trata de matéria a integrar na "factualidade relevante", a provar ou provada.
Neste ponto, improcede o recurso.

B.
Do erro na aplicação da al. a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA ao ato administrativo suspendendo de 3-11-2014 (que a recorrente chama de "erro no julgamento da matéria de facto"), com referência à falta de audiência prévia, à falta de fundamentação (por haver nulidade consequente por causa da remissão para uma informação nula – cfr. artigos 123º/1-g), 131º/1 e 133º/2-i) do CPA), e ao desrespeito pelo conteúdo funcional da profissão da ora recorrente como técnica superior de reinserção social (cfr. DL 204-A/2001, Anexo II; e os docs. referidos nos artigos 12 a 16 da alegação do recurso)
Como é sabido, o artigo 120º/1-a) do CPTA refere-se a ilegalidades (concretas) simples, manifestas e inquestionáveis. Se o juiz cautelar encontrar uma ilegalidade (anulabilidade ou nulidade) desse tipo deverá decretar a tutela cautelar. É, na verdade, uma tutela urgente sumária e provisória (cfr. Paulo Pereira Gouveia, in C.J.A. nº 94, pp. 81 ss, a p. 85).
B.1.
Está provado que não houve audiência prévia, em violação dos artigos 100º ss do CPA.
É simples e claro. Aliás, seria muito fácil ao requerido provar a sua ocorrência.
Os tribunais não devem recear tal conclusão concreta em casos como o presente. E contra não basta invocar aquilo que hoje está, em abstracto, no artigo 163º/5 do novo CPA, sob pena de nunca ser manifestamente evidente, agora em concreto, qualquer vício de forma ou de procedimento (sem prejuízo de os institutos do "aproveitamento do acto administrativo anulável (11), da "redução da discricionariedade a zero" e do "aproveitamento de actos administrativos predominantemente discricionários” (12) poderem se referir também aos pressupostos do acto predominantemente discricionário e motivos do conteúdo do acto predominantemente discricionário; cfr. o Ac. do STA de 26-10-2010, P. nº 473/10, e hoje ISABEL CELESTE FONSECA, "Tramitação e formalidade…", in CJA, nº 100).
Seria defraudar a lei processual.
No caso presente, com efeito, não tem fundamento algum a Mmª juiza a quo ter presumido que ocorreu uma audiência oral na referida reunião (facto nº 6). Nada aponta nesse sentido.
Por outro lado, não está indiciariamente provada qualquer factualidade que permita "acenar" minimamente com a possibilidade real de irrelevância deste vício de procedimento:
-o ato não é legalmente vinculado,
-o caso concreto apurado não aponta apenas para esta solução,
-nada indicia, na matéria de facto apurada, que os interesses e objectivos que a audiência prévia visa tutelar não foram prejudicados mas sim acautelados por outra forma (qualquer),
-não se provou indiciariamente que, sem a audiência prévia, o ato teria este conteúdo.
Neste ponto, procede o recurso.
B.2.
Não é simples e evidente que o ato não está fundamentado.
Na verdade, tem a fundamentação da respectiva Informação, a qual, para efeitos do CPA, não é um acto administrativo. E, logo, não interessa, para efeitos dos artigos 123º/1-g), 131º/1 e 133º/2-i) do CPA, que ela esteja ou não assinada manuscritamente.
Da respectiva Informação constam as razões pelas quais foi determinada a afectação da requerente à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Lisboa Oriental, quais sejam, e em suma, a necessidade de afectar um elemento do Instituto da Segurança Social, I.P. à referida Comissão, a situação da requerente, designadamente, ao nível da relação com a chefia, no Sector onde desempenhava funções, bem como a adequação das competências técnicas e pessoais da requerente para a função. Atento o teor da mesma Informação, não surge como manifesta a alegada contradição dos fundamentos apresentados para a afectação da requerente à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Lisboa Oriental, uma vez que a invocada menor produtividade da requerente, a deterioração da sua relação com a chefia directa e o desrespeito das orientações superiores quanto à não utilização dos espaços de atendimento da cidade de Lisboa não se mostra contraditória com a afirmação de que a requerente detém competências técnicas e pessoais para o correcto desempenho da função na referida Comissão e que possui larga experiência na área tutelar cível.
Neste ponto, improcede o recurso.
B.3.
Relativamente ao conteúdo funcional do cargo da recorrente, o invocado DL 204-A/2001 foi substituído pelo DL 126/2007 e este pelo DL 215/2012.
E em tais normativos não se vê como é que há ilegalidade, nessa sede do conteúdo funcional legal, em a A.P. determinar o exercício de funções em matéria de protecção de crianças e jovens em risco, em vez da área tutelar cível.
Neste ponto, improcede o recurso.

C.
Do erro quanto ao julgamento dos prejuízos (periculum in mora)
Nesta sede também, os ónus da alegação e da prova cabem ao requerente.
Alega a requerente que a sua afectação à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Lisboa Oriental pode converter-se numa situação irreversível que a impeça de voltar a exercer, durante um período mais ou menos longo, as funções específicas da sua carreira, daqui resultando sérios e graves prejuízos para a valorização e desenvolvimento da sua carreira profissional, para além dos prejuízos evidentes em termos de bom nome, reputação, idoneidade, dedicação e competência profissional.
Ora, além de não ser correcta tal conclusão relativa ao conteúdo funcional, a requerente não concretiza quais os prejuízos para a valorização e desenvolvimento da sua carreira profissional que podem resultar da sua afectação à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Lisboa Oriental, uma vez que o exercício de outras funções que, na perspectiva da requerente, não são específicas da carreira em que se encontra integrada, não representa, por si só, um prejuízo.
Por outro lado, caso o desenvolvimento da carreira profissional da requerente venha a ser prejudicado, sempre a mesma carreira poderá ser reconstituída se a requerente lograr obter vencimento na acção principal, designadamente, através da sua progressão para o índice remuneratório que auferiria se não fosse a sua afectação à já referida Comissão e da sua promoção à categoria que lhe corresponderia caso a mesma afectação não tivesse tido lugar.
Por outro lado, não se vislumbra em que medida as afirmações constantes da Informação para que remete o acto suspendendo são susceptíveis de causar prejuízos no bom-nome, reputação, idoneidade, dedicação e competência profissional da requerente, desde logo, porque a mesma corporiza, unicamente, um juízo efectuado pela entidade requerida para efeitos de afectação de um trabalhador à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Lisboa Oriental, não sendo imputada à requerente qualquer conduta que se possa qualificar de grave, e não resulta dos autos que a mesma Informação seja do conhecimento público.
A mera alegação da requerente de que a redução do seu rendimento põe seriamente em causa a sua estabilidade financeira e, consequentemente, a sua capacidade de pagar as suas despesas básicas e essenciais, é manifestamente insuficiente para que se possa concluir, num juízo necessariamente perfunctório, pela probabilidade da ocorrência de prejuízos, sendo que estamos, nesta sede, perante a falta de concretização, ao nível da alegação fáctica, dos prejuízos e não, apenas, perante uma situação de falta de prova dos mesmos, que poderia, eventualmente, ser obtida através da produção de prova testemunhal. Com efeito, a requerente não refere qual é o valor do rendimento mensal do seu agregado familiar e quais as despesas concretas que tem de suportar mensalmente, de forma a se poder concluir que o valor que passará a auferir, caso lhe seja retirado o suplemento remuneratório, é insuficiente para fazer face àquelas.
Neste ponto, improcede o recurso.
*
III. DECISÃO
Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juizes do Tribunal Central Administrativo Sul, de harmonia com o disposto nos artigos 202º e 205º da Constituição, em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão cautelar recorrida e decretar a suspensão da eficácia do ato administrativo com a fundamentação aqui exposta.
Custas a cargo do recorrido.
Lisboa, 14-5-2015


(Paulo H. Pereira Gouveia - relator)


(Nuno Coutinho)


(Carlos Araújo)

(1) Cfr. PAULO OTERO, Manual de Direito Administrativo, Coimbra, Almedina, Vol. I, 2013, pp. 345-355 e 432-449.
(2) Cfr. Ac. do T.C. Nº 128/2009.
(3) Cfr. Acs. do T.C. Nº 39/88, Nº 186/90, Nº 310/2000, Nº 491/2002 e Nº 187/2013; ROBERT ALEXY, A Theory of Constitutional Rights, trad., Oxford, O.U.Press, 2002, pp. 44 ss, 394-395 e 414.
(4) Cfr. ROBERT ALEXY, “Direitos fundamentais e princípio da proporcionalidade”, in: O Direito, Ano 146º (2014), IV, Lisboa, pp. 817-834.
(5) Quanto maior for o grau de não realização ou de afetação de uma norma-princípio, maior deve ser a importância da realização da norma-princípio colidente (O Direito, Ano 146º, IV, Lisboa, pp. 817-834).
(6) Cfr. MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, Introdução ao Direito, Coimbra, Almedina, 2012, pp. 359 ss, 426 ss, 451 ss e 461 ss.
(7) Cfr. PAULO PEREIRA GOUVEIA, “O método e o juiz…”, in: O Direito, Ano 145º (2013), I/II, Lisboa, pp. 51 ss.
(8) 65º - Acresce ao exposto que a Requerente e outras técnicas superiores de reinserção social foram reafectas ao Instituto de Segurança Social na sequência da transferência para este Instituto das competências de assessoria técnica aos tribunais em matéria tutela cível, anteriormente pertencentes ao Instituto de Reinserção social, hoje Direcção-Geral de Reinserção Social (documento n.° 4).
(9) 66º - Conforme resulta claramente do disposto no Despacho n.° 15073/2008, de 6 de Maio (documento n.° 4), e dos trabalhos preparatórios (documento número 5), a Requerente foi reafecta ao ex-Centro Regional de Segurança Social de Lisboa e Vale do Tejo, actual Centro Distrital de Segurança Social de Lisboa, para o exercício de funções em matéria tutelar cível.
(10) 67º - E não para o exercício de funções em matéria de protecção de crianças e jovens em risco.
(11) Ac. do STA de 30-3-1995, P. nº 32214.
(12) Ac. do STA de 7-7-2002, P. nº 46611.