Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:116/17.4BCLSB
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:10/04/2017
Relator:CRISTINA DOS SANTOS
Descritores:ACTO SANCIONATÓRIO EM MATÉRIA DE DISCIPLINA MILITAR
MANIFESTA ILEGALIDADE
Sumário:1. As reclamações como os recursos hierárquicos são procedimentos de 2º grau de natureza impugnatória que têm como objectivo a reapreciação de um acto administrativo anteriormente praticado, em ordem à revisão da situação jurídica conformada pelo acto administrativo impugnado – cfr. artº 159º CPA/1991, artº 185º nº 3/CPA/revisão de 2015.

2. Em sede de processo disciplinar, o recurso hierárquico necessário mais não é do que a impugnação administrativa da decisão sancionatória e, por isso não é o meio processual próprio para requerer meios de prova contra a Acusação – cfr. artºs. 102º, 103º, 105º, 121º e 122º da LO 2/2009, 22.07 (Regulamento de Disciplina Militar).

3. A qualidade de cognição exigida pelo artº 3º a) da Lei 34/2007, 13.08 para o fumus boni iuris traduzida na expressão “acto manifestamente ilegal” mede-se pelo carácter incontroverso (que não admita dúvida), patente (posto que visível sem mais indagações) e irrefragável (irrecusável, incontestável) da presumível invalidade do acto sancionatório em matéria de disciplina militar.

4. Na tutela cautelar administrativa a apreciação do fumus boni iuris requer não apenas a emissão de um juízo sobre a aparência da existência de um direito ou interesse do particular a merecer tutela, como também da probabilidade da ilegalidade da actuação administrativa lesiva do mesmo.

5.O decretamento da providência requerida depende da verificação cumulativa dos três requisitos legais gerais enunciados no artº 120º nºs. 1 e 2 CPTA (fumus boni iuris, periculum in mora e ponderação de interesses), pelo que o decaimento em sede do pressuposto da aparência do bom direito alegado (fumus boni iuris) na vertente da manifesta ilegalidade do acto estatuída no artº 3º a) Lei 34/2007, 13.08, importa a improcedência da acção cautelar.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: Mário …………….., com os sinais nos autos, ao abrigo do regime instituído pelo artº 6º da Lei 34/2007, 13.08, vem instaurar junto do TCAS acção cautelar de suspensão de eficácia da pena disciplinar de 15 dias de proibição de saída, aplicada por despacho de 22.Maio.2017 no âmbito do procº disciplinar nº 01/16 do QC/CFT e mantida por despacho de 17.07.2017 emitido em via de recurso hierárquico.
Para tanto alega, em síntese, que se verifica o requisito cautelar do fumus boni iuris posto que o despacho de 17.07.2017 é nulo “… porquanto foram preteridas todas as diligências requeridas … na parte final do recurso hierárquico necessário …” – artigos 14º, 18º, 21º, 43º, 48º, 49º, 59º, 60º, 69º, 70º da p.i. – bem como do periculum in mora, na medida em que “… se encontra em missão de serviço em Angola quando daí regressar no fim do corrente ano de 2017 … será de imediato compelido a permanecer na Unidade sem sair durante quinze dias …” – artigos 64º, 65º da p.i.
Conclui peticionando a suspensão de eficácia do despacho de 17.JUL.2017 que negou provimento ao recurso hierárquico necessário, por se tratar de acto nulo por preterição de diligências requeridas no recurso hierárquico necessário interposto do despacho de aplicação da pena de 15 (quinze) dias de proibição de saída.

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O Exército Português, Entidade Requerida, deduziu oposição, sustentando que, por não se verificarem os pressupostos cautelares, deve ser indeferido o pedido cautelar.

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A instância é válida e regular.

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Com fundamento no meio de prova documental junto ao processo disciplinar nº 01/16 em dois volumes, apenso aos presentes autos, o Tribunal julga provados os seguintes factos:

A. O Requerente Mário ………………… é Oficial do Exército Português, com o posto de tenente-coronel do quadro especial de Infantaria, “CMD” NIM …………...
B. Por despacho de 27.OUT.2016 emitido pelo Tenente General Comandante das Forças Terrestres António ………………… foi constituído arguido no procº disciplinar nº …./16, pendente no Quartel General do Comando das Forças Terrestres – fls. 4 do 1º vol. do procº disciplinar nº 01/16, apenso.
C. O Requerente Mário …………………… em 28.OUT.2016 foi pessoalmente notificado da constituição de arguido referida supra em B. – fls. 5 do 1º vol. do procº disciplinar nº …/16, apenso.
D. Convocado como testemunha para auto de declarações de 13.DEZ.2016 e estando presente o seu Mandatário constituído no procº disciplinar nº …/16 mediante procuração junta a fls. 87 daqueles autos, o Requerente Mário …………. declarou “(..) que de momento não prestará declarações. (..)” – fls. 85/86 e 87 do 1º vol. do procº disciplinar nº 01/16, apenso.
E. Em 16.DEZ.2016 no procº disciplinar nº 01/16 foi deduzida Acusação contra o Requerente Mário …………….., cujo teor se transcreve:
“(..) Nos termos do Art.° 98.° do Regulamento de Disciplina Militar (RDM), aprovado pela Lei Orgânica n.° 2/2009, de 22 de Julho, é deduzida contra o TENENTE-CORONEL DE INFANTARIA COMANDO NIM …….. MÁRIO …………….., a presente Acusação:
PARTE l
(expositiva)
1. Através da Diretiva N.°04/2016, o Exmo. Comandante do Regimento de Comandos nomeou o TCor Mário ….., aqui arguido, Diretor da Prova Zero do 127° Curso de Comandos (doravante RCmds);
2. O Diretor da Prova Zero é o militar com mais graduação da referida prova, tendo uma função de comando;
3. A Equipa Sanitária é constituída por um médico permanente, dois enfermeiros permanentes e dois socorristas;
4. O médico chefia a Equipa Sanitária e depende, hierarquicamente, do Diretor da Prova;
5. Nos termos do Guião da Prova Zero, é disponibilizado ao médico em apoio à prova um rádio E/R Motorola, sendo-lhe atribuído o indicativo DOC1;
6. No dia 4 de Setembro de 2016, a Equipa Sanitária era constituída pelo Capitão "CMD" Miguel ……. (médico), pelo 1Sargento "CMD" Coelho, pela 2ª Furr Nascimento (ambos enfermeiros), pela Soldado Luz e pelo Soldado Santos (ambos socorristas);
7. No dia 05SET16, o Capitão João ……. era o médico nomeado para prestar apoio à Prova Zero;
8. O Capitão "CMD" Miguel …….. (médico) seria rendido pelo Capitão Médico João ..........;
9. O médico nomeado deve estar presente no início das instruções da manhã, a partir das 07HOO;
PARTE II
(dos factos)
1. No dia 2 de setembro último, foi realizada uma reunião de coordenação para a Prova Zero do 127° Curso de Comandos;
2. Nessa reunião estiveram presentes o TCor Mário .......... (diretor da prova), o Cap Monteiro (comandante da companhia de instrução) e a 2ª Furr Nascimento (enfermeira);
3. O Capitão .........., médico nomeado para o dia 04SET16 e Chefe da Equipa Sanitária, não foi convocado, nem lhe foi comunicado que esta reunião se iria realizar;
4. Nesta reunião foram difundidas as normas e procedimento que regem a realização da Prova Zero;
5. A ausência do Cap Médico .......... na referida reunião teve as seguintes consequências:
a. Desconhecimento, por parte do Cap Médico .........., do conteúdo do Guião da Prova e da Diretiva N°04/2016;
b. Desconhecimento, por parte do Cap Médico .........., da distribuição de rádio portáteis e da existência de uma rede de rádio para efeitos de emergência sanitária;
c. O TCor Mário .........., diretor da prova, não determinou os procedimentos para rendição entre médicos;
d. O TCor Mário .........., diretor da prova, não teve conhecimento de que o Cap Médico .......... não estaria presente desde o início da instrução (07HOO) no dia 04SET16;
6. O Cap Médico .......... e o Cap Médico João ……. coordenaram entre si a rendição às 23HOOdedia 04SET16;
7. O Diretor da Prova não procedeu à verificação da rede de rádio, conforme o determinado no Guião da Prova, não detetando deste modo que o Cap Médico .......... não dispunha de meios para operar na rede;
8. No dia 4 de setembro de 2016, às 07H30, no CTA, local onde decorria a Prova Zero do 127° Curso de Comandos, aos quatro grupos de instruendos era ministrada uma instrução de Ginástica Educativa;
9. O Cap Médico "CMD" Miguel ……, médico nomeado para apoiar a Prova Zero, não esteve presente no inicio da instrução (07HOO), tendo chegado ao CTA por volta das 10HOO, ou seja, duas horas e trintas minutos depois;
10.O TCor Mário .........., sabendo que o Cap Médico "CMD" Miguel .......... não estava no CTA, conformou-se com esta ausência e, na qualidade de Diretor da Prova e único superior hierárquico do Chefe da Equipa Sanitária, não tomou qualquer diligencia para que a Prova Zero se iniciasse com o apoio de um médico. Fosse ele o Cap Médico "CMD" Miguel ……. ou o Cap Médico João …… (que, nos termos da Diretiva N.°04/2016 estava com um nível prontidão de 1 hora);
11. A Prova Zero do 127° Curso de Comandos, dirigida pelo TCor Mário …… e constituída por 67 instruendos, esteve, na parte da manhã, duas horas e trintas minutos sem qualquer apoio médico;
12. Por volta das 16H30, a prova é suspensa devido ao excessivo calor que se fazia sentir e ao facto do Posto de Socorros ter ultrapassado a sua capacidade (a esta hora estavam 22 instruendos no Posto de Socorros);
13. Às 19HOO, o Cap Médico .......... concluí pela necessidade de evacuação de dois instruendos, propondo esta medida ao Diretor da Prova pelas 19H30;
14. Às 20HOO, o Cap Médico "CMD" Miguel ……. informou o Diretor da Prova que se ia ausentar porque na manhã seguinte estaria de serviço ao Serviço de Urgência do Hospital São José;
15. Mais o informou que, às 23HOO o Cap. Médico João ……. chegaria ao CTA, passando a ser este o médico em apoio à Prova Zero;
16. Nesse momento, o TCor Mário ….contactou telefonicamente o Cap Médico João …… solicitando que antecipasse a sua chegada;
17. O TCor Mário .......... consentiu que Cap. Médico Miguel ……… se retirasse, mesmo antes da chegada do Cap Médico João ……, facto que se verificou pelas 20H15;
18. Pelas 20H36, o 2Furr Hugo ……. entra em paragem cardiorrespiratória, sendo nessa altura acionada, via 112, a evacuação do mesmo;
PARTE III
(conclusões)
1. O TCor Mário ….. deveria ter convocado o Cap Médico .......... para a reunião de coordenação que se realizou no dia 02SET16, garantindo a divulgação das normas definidas na Diretiva Nº 04/2016 e no Guião da Prova e coordenando com este todos os procedimentos a serem tomados pelo Chefe da Equipa Sanitária durante a Prova Zero, assim como eventuais problemas na sua execução;
2. O TCor Mário ….. deveria ter realizado a verificação rádio no início da instrução, garantindo que todos os elementos estavam presentes e que a rede estava em condições de ser explorada;
3. O TCor Mário …., perante a ausência do Cap Médico .......... no início da instrução do dia 04SET16, devia ter tomada diligências no sentido de esclarecer a sua falta e ter providenciado a sua substituição através da convocação do Cap Médico João ……..;
4. O TCor Mário …….., na qualidade de Diretor da Prova, deveria ter determinado os procedimentos de rendição entre os Oficiais Médicos, assim como a hora da sua realização, não deixando este procedimento seja determinado por iniciativa destes;
5. O TCor Mário …., perante a gravidade da situação clinica em que se encontravam 22 instruendos e o motivo alegado pelo Cap Médico .......... para se ausentar, não deveria ter autorizado a sua retirada, antes que o Cap Médico .......... se apresentasse no CTA;
PARTE III
(do direito)
1. Com a conduta descrita, o Arguido TENENTE-CORONEL DE INFANTARIA COMANDO NIM ……… MÁRIO ……………. violou o dever de obediência, previsto no artigo 12°, n.°1 e n.°2, alínea a), o dever de autoridade, previsto no artigo 13°, n.°1 e n.°2, alínea a) e b), o dever de tutela, previsto no artigo 15° e o dever de zelo, previsto no artigo 17°, n.°2, alínea e), todos do RDM, cometendo assim uma infração disciplinar a sancionar com uma das penas previstas no Art.° 30.° do RDM.
2. Nos termos do n.° 1 do Art° 99.° do RDM é conferido ao Arguido o prazo de 10 dias úteis para apresentar a sua defesa por escrito, podendo dizer ou requerer o que tiver por conveniente para a mesma e indicar quaisquer meios de prova tendo ainda o direito de constituir defensor.
3. Nos termos do n.° 2 do Art.° 103.° do RDM, serão indeferidas as diligências requeridas, quando sejam meramente dilatórias, impertinentes ou desnecessárias, ou sejam considerados suficientemente provados os factos alegados pelo arguido na sua defesa.
Quartel-General do Comando das Forças Terrestres na Amadora, 16 de dezembro de 2016
O OFICIAL INSTRUTOR (assinatura) (..)” – fls. 95/98 do 1º vol. do procº disciplinar nº …./16, apenso.
F. O Requerente Mário ………… em 19.DEZ.2016 foi pessoalmente notificado da acusação referida supra em E, bem como o seu Mandatário constituído no procº disciplinar nº …/16 – fls. 100 do 1º vol. do procº disciplinar nº…./16, apenso.
G. De 19.DEZ.2016 a 27.DEZ.2016 o Mandatário constituído no procº disciplinar nº …/16 do Requerente teve confiança daqueles autos – fls. 104 do 1º vol. do procº disciplinar nº …/16.
H. Em 28.Dez.2016 o Requerente Mário …………. deduziu a sua Defesa no procº disciplinar nº …/16, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – fls. 105 e 106/118 do 1º vol. do procº disciplinar nº …/16 apenso.
I. Por despacho de 13.ABR.2017 emitido pelo Tenente General Comandante das Forças Terrestres, foi decidido como segue:
“(..) 1. Em cumprimento do meu despacho de 27 de outubro de 2016, constante dos autos a fls. 01, procedeu-se à instrução do presente processo, destinado a apurar a responsabilidade disciplinar do TCOR INF "CMD" NIM ……….. MÁRIO ………………. pela prática dos factos constantes do Relatório Final (a fls.368) do Processo de Averiguações N.° 03/16, deste CFT;
2. Por meu Despacho de 19 de janeiro de 2017, constante dos autos a fls. 183 e 184, e nos termos do artigo 106°, conjugado com o artigo 30°, ambos do RDM, puni o TCOR INF "CMD" NIM …………..MÁRIO ……………. com 20 (VINTE) DIAS DE SUSPENSÃO DE SERVIÇO;
3. Interposto Recurso Hierárquico, foi exarado por Sua Excelência o General Chefe do Estado-Maior do Exército, no Parecer N.° 70/2017 do Departamento de Assessoria Jurídica e Contencioso do GabCEME, o seguinte despacho:
a. «1. Homologo.
b. 2. Com os fundamentos do presente parecer, concedo provimento parcial ao recurso hierárquico e anulo tudo o que foi processado após a folha 148 do processo disciplinar.
c. 3. Devolva-se o processo para os efeitos referidos nos n°s 31 e 32 do presente parecer.
d. Notifique-se o arguido e o seu mandatário.
e. Lisboa, 17/03/2017».
4. Para que se dê cumprimento ao Despacho de Sua Excelência o General CEME, nomeio o Tenente-Coronel Infª NIM …………. Manuel ………………… para que reabra o processo e proceda à realização das diligências mencionadas no Ponto 32 do Parecer N.° 70/2017 do Departamento de Assessoria Jurídica e Contencioso do GabCEME;
Quartel-General do Comando das Forças Terrestres na Amadora, 13 de abril de 2017
O COMANDANTE DAS FORÇAS TERRESTRES (assinatura) (..)”- fls. 149 do 1º vol. do procº disciplinar nº 01/16 apenso.
J. O recurso hierárquico, Parecer nº 70/2017 e despacho de 17.MAR.2017 emitido pelo General CEME de deferimento parcial do citado recurso hierárquico, todos referidos no despacho de 13.ABR.2017 transcrito supra em I e cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos, constam, respectivamente, de fls. 167/191 e 150/168 do 1º vol. do procº disciplinar nº ../16 apenso.
K. O despacho de 17.MAR.2017, emitido pelo General CEME, de deferimento parcial do citado recurso hierárquico, foi notificado ao Mandatário do Requerente constituído no procº disciplinar nº ../16, via correio por ofício nº 3220 de 30.03.17 – fls. 196/197 do 1º vol. do procº disciplinar nº ../16 apenso.
L. As três testemunhas arroladas à matéria do “profissionalismo, carácter e competência do Arguido” oferecidas pela Defesa no articulado supra referido supra em H foram inquiridas e os respectivos autos de inquirição notificados via correio por ofício de 09.05.2017 ao Mandatário do Requerente constituído no procº disciplinar nº …../16 - fls. 206, 208, 209, 211 e 213 do 1º vol. do procº disciplinar nº ……../16 apenso.
M. Em 10.MAI.2017 no procº disciplinar nº …../16 foi elaborado e junto pelo Oficial Instrutor o Relatório disciplinar, cujo teor se transcreve na íntegra
“(..) RELATÓRIO DO INSTRUTOR
I
GENERALIDADES
Em cumprimento do despacho de 13Abr17, do Exmo. Tenente-General Comandante das Forças Terrestres, no seguimento do recurso hierárquico interposto pelo Tenente-Coronel Infantaria "Comando" NIM ……….., Mário …………., procedeu-se a reabertura do presente processo, destinado a apurar a responsabilidade disciplinar do TENENTE-CORONEL DE INFANTARIA COMANDO NIM …………. MÁRIO ……………… pela prática dos factos constantes do Relatório Final (a fls.370) do Processo de Averiguações N.° 03/16, deste CFT, nomeadamente: 1. Não cumprimento do Guião da Prova Zero, nomeadamente:
a. Não ter garantido, antes do início da Prova Zero, que os instruendos fossem sujeitos a uma Revista de Saúde, prevista no Guião da Prova Zero e no horário da 1a semana do 127° Curso de Comandos, excluindo a hipótese de em tempo útil, como Diretor da Prova e nos termos do Guião da Prova Zero, de ser informado das situações criticas que eventualmente possam interferir com a execução da prova, bem como de instruendos que tenham medicação autorizada;
b. Como Diretor da Prova, estando a Equipa Sanitária na sua direta dependência, não garantiu a sua prontidão permanente, através da presença do médico, quando este último se encontrou ausente nos seguintes períodos:
[1] Entre as 07H30 e as 09HOO (cf. declarações do médico);
[2] Entre as 20H30 (cf. declarações do médico), altura em que se ausentou e depois das 22HOO, altura em que regressou (cf. declarações do Diretor da Prova).
c. Como Diretor da Prova, na inquirição como testemunha, referiu não ter competência para autorizar ou deixar de autorizar a hora de chegada do médico, mostrando desconhecer que a Equipa Sanitária, chefiada pelo médico, está na sua dependência direta (o Comandante do Regimento de Comandos refere que é competência do Diretor da Prova autorizar, em situações normais, a eventual ausência do médico, quando solicitado);
d. Na falta de transmissão do médico, ao Diretor da Prova, da situação de cada instruendo avaliado e das recomendações e cuidados a ter com alguns dos casos, este também não procurou conhecer, para apoio a uma eventual tomada de decisão da sua parte.
Mesmo no momento em que o médico lhe transmitiu que iriam ser evacuados dois militares, o Diretor da Prova desconhecia referindo-o no seu auto de declarações, que desconhecia o motivo dessa evacuação;
e. Não garantiu a distribuição dos E/R Motorola a todas as entidades com indicativo atribuído, nomeadamente ao médico, não tendo garantido tão pouco a verificação rádio a ser efetuada diariamente antes do início da instrução conforme fixado no Guião da Prova.
2. Não garantiu o cumprimento da Diretiva N° 04/2016 - Prova Zero do 127° Curso de Comandos, de 25Ago16, na parte que lhe respeitava, nomeadamente por em 311130Ago16, não ter recebido a apresentação dos Chefes das Equipas em apoio na data-hora fixada, não dando conta desta falta ao Comandante do Regimento de Comandos, sendo que este ultimo fixou esta Instrução de Coordenação para, no âmbito particular do apoio sanitário, ser garantida também a apresentação do Chefe da Equipa Sanitária, ou alguém mandatado por este, a fim de receber instruções julgadas convenientes da parte do Diretor da Prova.
II
MATÉRIA DE PROVA
1. O Arguido remeteu-se ao silêncio, não prestando qualquer declaração (a fls. 85), tendo sido feita constar a sua Folha de Matricula (a fls.7 a 30), onde constam as seguintes informações:
a. Condecorações (vide a fls. 12):
(1) Medalha de Comportamento Exemplar grau Prata;
(2) Medalha D. Afonso Henriques;
(3) Medalha de Serviço Distintos;
(4) Medalha de Mérito Militar 2a Classe;
b. Nove Louvores (vide a fls. 12 a 13v);
c. Não consta qualquer pena criminal ou disciplinar (vide a fls. 11);
2. Constituiu como seu mandatário, o Pr. Alexandre ………… (Cfr. Procuração forense a fls. 87);
3. Foram extraídas do Processo de Averiguações N.° 03/16, autenticadas e feitas constar do presente processo, os autos de declarações dos seguintes militares:
a. Cor Infª "CMD" NIM Luís ……………. (a fls. 32 a 36);
b. Cap Infª "CMD" NIM ……….4 Rui ………………… (a fls. 37 a 40);
c. Cap Médico "CMD" NIM ……….. Miguel ……………….. (a fls. 41 a 45).
4. Foram ouvidas em declarações as seguintes testemunhas:
a. Cap Infª "CMD" NIM ………… Rui …………………… (a fls. 82 a 83);
b. Cap Médico "CMD" …………… Miguel …………….. (a fls. 91 a 93);
c. Cor Infª "CMD" NIM ……….. Luís ……………………… (a fls. 146);
d. Maj Infª "CMD" NIM …………… Raul ……………….. (a fls. 147 e 148);
5. Por despacho de 14Abr17 de SExa o General CEME foi concedido provimento parcial ao recurso hierárquico e foi anulado tudo o que foi processado após folha 148 pelo que foram desentranhadas do presente processo folhas a partir da 148 (a fls 198);
6. Decorrente do mesmo despacho foram ouvidas em declarações as seguintes testemunhas:
a. Cap Inf "CMD" NIM ………… Hélder …………….. (a fls. 206);
b. TCor Inf "CMD", na situação de reserva, NIM………. Carlos …………….. (a fls. 208 e 209);
c. TGen, na situação de reforma, NIM ……….. José …………….. (a fls. 211);
III
ACUSAÇÃO
1. Concluída a fase de produção da prova, foi deduzida acusação (a fls. 95 a 98), imputando-se ao Arguido a prática de infração disciplinar decorrente da autoria material dos factos constantes na Parte II, designadamente:
a. O Cap Médico .......... e o Cap Médico João ………. coordenaram entre si a rendição às 23HOO de dia 04SET16;
b. O Diretor da Prova não procedeu à verificação da rede de rádio, conforme o determinado no Guião da Prova, não detetando deste modo que o Cap Médico .......... não dispunha de meios para operar na rede;
c. O Cap Médico "CMD" Miguel .........., médico nomeado para apoiar a Prova Zero, não esteve presente no inicio da instrução (07H30), tendo chegado ao CTA por volta das 10HOO, ou seja, duas horas e trintas minutos depois;
d. O TCor Mário ……., sabendo que o Cap Médico "CMD" Miguel …….. não estava no CTA, conformou-se com esta ausência e, na qualidade de Diretor da Prova e único superior hierárquico do Chefe da Equipa Sanitária, não tomou qualquer diligencia para que a Prova Zero se iniciasse com o apoio de um médico. Fosse ele o Cap Médico "CMD" Miguel …….ou o Cap Médico João ……… (que, nos termos da Diretiva N.° 04/2016 estava com um nível prontidão de 1 hora);
e. A Prova Zero do 127° Curso de Comandos, dirigida pelo TCor Mário …… e constituída por 67 instruendos, esteve, na parte da manhã, duas horas e trinta minutos sem qualquer apoio médico;
f. Às 20HOO, o Cap Médico "CMD" Miguel ……….. informou o Diretor da Prova que se ía ausentar porque na manhã seguinte estaria de serviço ao Serviço de Urgência do Hospital São José;
g. Mais o informou que, às 23HOO o Cap. Médico João ………… chegaria ao CTA, passando a ser este o médico em apoio à Prova Zero;
h. O TCor Mário .......... consentiu que Cap. Médico Miguel ………..se retirasse, mesmo antes da chegada do Cap Médico João .........., facto que se verificou pelas 20H15;
2. Em conclusão, imputa-se ao Arguido a prática de infração disciplinar decorrente da autoria material do seguinte:
a. Não ter efetuado a verificação rádio no início da instrução, garantindo que todos os elementos estavam presentes e que a rede estava em condições de ser explorada;
b. Perante a ausência do Cap Médico .......... no início da instrução do dia 04SET16, não ter efetuado diligências no sentido de esclarecer a sua falta e ter providenciado a sua substituição através da convocação do Cap Médico João ..........;
c. Na qualidade de Diretor da Prova, não ter determinado os procedimentos de rendição entre os Oficiais Médicos, assim como a hora da sua realização, deixando que este procedimento fosse determinado por iniciativa destes;
d. Perante a gravidade da situação clínica em que se encontravam 22 instruendos e o motivo alegado pelo Cap Médico .......... para se ausentar, ter autorizado a sua retirada antes que o Cap Médico .......... se apresentasse no CTA;
IV
DEFESA
1. O Arguido apresentou a sua defesa escrita (a fls. 106 a 144), alegando, com interesse para a causa, o seguinte (transcrição em síntese):
a. "No decorrer da ação de formação da Escola Preparatória de Quadros, ministrada no dia 31 de agosto, a partir das 16h40, pelo referido Cap. Médico .........., dirigida ao arguido e a todos os militares envolvidos na instrução do 127° Curso de Comandos (instrutores e pessoal de apoio) ficou, bem claro, que as diversas fases da instrução da Prova Zero iriam ocorrer nos mesmos locais da realizada para o 126° Curso de Comandos".
Designadamente o local da instalação do Posto de Socorros e o estacionamento das ambulâncias;
Por assim ser, era redundante e, portanto, desnecessária a presença do Cap. .......... na reunião de Coordenação do dia 2 de setembro, e o arguido, não o convocou (este Oficial Médico já acompanhou muitas Provas Zero) "(ponto 23);
b. "Foi aliás com o Cap. Médico .......... que o ora respondente elaborou a Directiva n.° 04/2016, na parte da assistência médico-sanitária, que veio a ser assinada pelo Exmo. Comandante do Regimento de Comandos - esta reunião aconteceu em 24 ou 25 de Agosto." (ponto 24);
c. "Face ao que antecede, e salvo o devido respeito, importa chamar à colação a verdade. Assim, no tocante à alínea a)'1 do n.°5 da Parte II, da douta acusação, e considerando o antedito, o Cap. Médico .......... conhecia o Guião da Prova, por ser o mesmo do curso anterior (126° C.C) e a Directiva nº 04/2016 foi elaborada em conjunto com o arguido.
Quanto à alínea b)2 do n.° 5 tal como aconteceu com o 126° Curso, o Cap. Médico .......... sabia que iriam ser distribuídos rádios portáteis e da existência de uma rede rádio para efeitos de emergência sanitária.
Tanto assim é que, quando chegou, embora tardiamente, ao CTA recebeu do 1°Sargento Saúl Santos o ER/Motorola, que já havia sido testado.
Quanto à alínea c)3 o ora arguido determinou que a rendição dos médicos devia ser sempre feita no CTA." (ponto 25);
d. “Sobre o conteúdo da alínea d)4 do n.°5 o ora respondente recebeu do Cap. Méd. .......... a garantia verbal de que estaria no CTA no início da primeira instrução do dia 4 de Setembro de 2016 (7h30 inicio da ginástica educativa).
Foi, pois, com bastante desagrado, que veio a saber que o Cap. Médico .......... só chegou ao CTA, onde decorria a Prova Zero cerca das 10hOO de 4.9.2017." (ponto 26);
e. "O ora arguido, independentemente de qualquer acordo que tivesse[m] acontecido entre os médicos sublinhou em conversa com o Cap. Médico .........., cerca das 18hOO do dia 4.9.2016, que a rendição de médicos tinha de ser feita no CTA. Aliás, tal procedimento deve ser feito após avaliação dos instruendos que estão a ser assistidos no Posto de Socorros e com a presença dos dois médicos." (ponto 27);
f. "(...)

1 Ponto 5, alínea a) - "Desconhecimento, por parte do Cap Médico .........., do conteúdo do Guião da Prova e da DiretivaN.°04/2016."
2 Ponto 5, alínea b) - "Desconhecimento, por parte do Cap Médico .........., da distribuição de rádio portáteis e da existência de uma rede de rádio para efeitos de emergência sanitária."
3 Ponto 5, alínea c) - "O TCor Mário Mala, director da prova, não determinou os procedimentos para rendição entre médicos."
4 Ponto 5, alínea d) - "O TCor Mário Ma/a, director da prova, não teve conhecimento de que o Cap Médico .......... não estaria presente desde o inicio da instrução (07HOO) no dia 04SET16."

Sobre o inscrito no ponto 6 da Parte II5 da douta acusação o ora respondente desconhecia que os Médicos tivessem coordenado entre si a rendição às 23h." (ponto 28);
g. "O respondente jamais autorizou que o Cap. Médico .......... se ausentasse sem ser previamente substituído pelo Capitão Médico. ...........
Apenas constatou a ausência do Capitão .......... quando o soldado socorrista Santos o informou que tinha chamado o INEM porque o instruendo 2° Furriel Abreu havia entrado em paragem cadiorespiratória.
Foi nesse momento que perguntou ao soldado socorrista Santos onde estava o Cap. Médico .........., o qual respondeu que não se encontrava no Posto de Socorros.
De imediato o ora arguido tentou contatar por telemóvel o Cap. .......... e por falta de resposta deste ligou para o Cap. Médico .......... informando-o da ausência daquele e relatando o que estava a acontecer no Posto de Socorros (chamada do INEM; manobras de reanimação feita pelos enfermeiros e um número elevado de instruendos a ser assistidos), eram 20h42, tendo pedido ao Cap. Médico .......... que contatasse o Cap. Médico .......... e viesse para o CTA." (ponto 29);
h. "Quanto ao inscrito no ponto T6, a propósito da "verificação da rede rádio" importa esclarecer o seguinte.
O teste dos E/R Motorola é feito por cada elemento a quem o equipamento é distribuído.
E o Cap. Médico .......... a partir do momento em que chegou ao CTA e recebeu do 1° Sargento Saúl Santos o E/R Motorola tem o dever de o ligar e testar.
Sendo certo que no Posto de Socorros ficou disponível para os Enfermeiros um E/R e outro, com antena, ficou montado na ambulância cedida pelo Regimento de Transportes." (ponto 31);
i."Quanto ao ponto 9 o respondente, quando deu ordem para iniciar a instrução presumiu que o Cap. Médico. .......... estaria no CTA, designadamente, no Posto de Socorros.
Foi, como se disse supra, com perplexidade que veio a saber que aquele oficial só chegou ao CTA por volta das 10hOO.
Por assim ser, é que não diligenciou pelo chamamento, no início da manhã, do Cap. Médico ........... (...)

5 "O Cap Médico .......... e o Cap Médico João .......... coordenaram entre si a rendição ás 23HOO de dia 04SET16";
6 Ponto 7 - "O Diretor da Prova não procedeu à verificação da rede de rádio, conforme o determinado no Guião da Prova, não detetando deste modo que o Cap Médico .......... não dispunha de meios para operar na rede."

Não colhe, por isso, o inscrito no ponto 107 da Parte II da douta acusação." (ponto 35);
j. "Não corresponde à verdade o inscrito nos pontos 13a 158 da Parte II da douta acusação.
O Cap. Médico .......... nunca propôs ao arguido a evacuação de qualquer instruendo. A posteriori, isto é, já após o decesso do 2° Furriel Abreu é que o arguido soube, em conversa com o pessoal da equipa sanitária que o Cap. Médico .......... havia abordado com essa equipa aquela possibilidade.
Sendo também falso, que o Cap. Médico .......... tenha informado o arguido, ora respondente, que se ia ausentar por estar de serviço, no dia seguinte, no Hospital São José." (ponto 38);
k. " Aliás, se o Cap. Médico .......... tivesse solicitado autorização para se ausentar (...) o arguido não deferia a pretensão porque sabia que no posto de socorros estavam vários instruendos a ser assistidos pela equipa sanitária (...)" (ponto 39);
l. Não é, por isso, verdade o inscrito nos pontos 14 e 15 da referida acusação e o que se plasmou nos pontos 16 e 179 da mesma." (ponto 41)
m. "Não faz, por isso, qualquer sentido o inscrito na Parte III10 (Conclusões) da douta acusação porquanto o Cap. Médico .......... ausentou-se sem autorização do CTA

7 Ponto 10 - "O TCor Mário Ma/a, sabendo que o Cap Médico "CMD" Miguel .......... não estava no CTA, conformou-se com esta ausência e, na qualidade de Diretor da Prova e único superior hierárquico do Chefe da Equipa Sanitária, não tomou qualquer diligencia para que a Prova Zero se iniciasse com o apoio de um médico. Fosse ele o Cap Médico "CMD" Miguel .......... ou o Cap Médico João .......... (que, nos termos da Diretiva N.°04/2016 estava com um nível prontidão de 1 hora):
8 Ponto 13 - "Às 19HOO, o Cap Médico .......... conclui pela necessidade de evacuação de dois instruendos, propondo esta medida ao Diretor da Prova pelas 19H30;"
Ponto 14 - "Às 20HOO, o Cap Médico "CMD" Miguel .......... informou o Diretor da Prova que se ia ausentar porque na manhã seguinte estaria de serviço ao Serviço de Urgência do Hospital São José;" Ponto 15 - "Mais o informou que, às 23HOO o Cap. Médico João .......... chegaria ao CTA, passando a ser este o médico em apoio à Prova Zero;"
9 Ponto 16 - "Nesse momento, o TCor Mário .......... contactou telefonicamente o Cap Médico João .......... solicitando que antecipasse a sua chegada;"
Ponto 17 - "O TCor Mário .......... consentiu que Cap. Médico Miguel .......... se retirasse, mesmo antes da chegada do Cap Médico João .........., facto que se verificou pelas 20H15";
10 Parte III - 1 - O TCor Mário .......... deveria ter convocado o Cap Médico .......... para a reunião de coordenação que se realizou no dia 02SET16, garantindo a divulgação das normas definidas na Diretiva N.°04/2016 e no Guião da Prova e coordenando com este todos os procedimentos a serem tomados pelo Chefe da Equipa Sanitária durante a Prova Zero, assim como eventuais problemas na sua execução;
2 - O TCor Mário .......... deveria ter realizado a verificação rádio no início da instrução, garantindo que todos os elementos estavam presentes e que a rede estava em condições de ser explorada;
3 - O TCor Mário .........., perante a ausência do Cap Médico .......... no início da instrução do dia 04SET16, devia ter tomada diligências no sentido de esclarecer a sua falta e ter providenciado a sua substituição através da convocação do Cap Médico João ..........;
4 - O TCor Mário .........., na qualidade de Diretor da Prova, deveria ter determinado os procedimentos de rendição entre os Oficiais Médicos, assim como a hora da sua realização, não deixando este procedimento seja determinado por iniciativa destes;
5 - O TCor Mário .........., perante a gravidade da situação clinica em que se encontravam 22 instruendos e o motivo alegado pelo Cap Médico .......... para se ausentar, não deveria ter autorizado a sua retirada, antes que o Cap Médico .......... se apresentasse no CTA;

quando tinha ao seu cuidado cerca de duas dezenas de instruendos em situação clínica delicada." (ponto E);
2. Foram ouvidas em declarações as testemunhas arroladas pelo arguido (fls 206, 208 e 209 e 211) havendo a salientar o seguinte:
a. O TGen José Rino
(...) Considera suficientemente explicitados no louvor, o profissionalismo, o carácter e a competência revelados pelo oficial, expressando, designadamente, o melhor espírito de missão, manifestos dotes de caráter, atitude diligente, organizada e dinâmica, e credor da confiança dos superiores hierárquicos (...)
b. O Tenente-Coronel Carlos Bartolomeu
(...) Que nos dois louvores atribuídos ao TCor .......... a quando do desempenho do cargo de Comandante do Destacamento da Apoio de Serviços da FND ISAF e aquando da sua participação na missão de cooperação técnico militar, em Angola, os quais foram por si propostos, constam as qualidades pessoais e profissionais do TCor .........., as quais foram reconhecidas pelas entidades internacionais com as quais teve contacto em questões de trabalho (...)
c. Cap Hélder Brito
(...) Denotou preocupação e interesse do TCor .......... em absorver o máximo de informação sobre as atividades formativas no âmbito do curso Comandos, sendo as principais preocupações do arguido as ligadas com as questões de segurança.
Nas questões ligadas à personalidade do TCor .......... classifica-o sendo uma pessoa ponderada, com bastante iniciativa e cheio de energia.
O TCor .......... é uma pessoa bastante social que procurava sempre criar e manter boas relações interpessoais no grupo que liderava ou com quem trabalhava (...)
V
ANÁLISE
1. Da prova produzida resultou PROVADO;
a. Que o TCor Mário .......... não procedeu à verificação da rede de rádio no início da instrução, conforme o determinado no Guião da Prova, não detetando deste modo se todos os elementos que integram a rede estavam presentes, tinham condições técnicas para operar na rede e eram conhecedores dos procedimentos definidos para explorar a mesma;
b. A não verificação da rede rádio teve como consequência a não deteção da ausência do Cap Médico .......... no início da instrução, elemento essencial desta mesma rede rádio, cujo objetivo principal é a solicitação de apoio sanitário urgente;
c. Que o Cap Médico "CMD" Miguel .........., médico nomeado para apoiar a Prova Zero, não esteve presente no inicio da instrução (07H30), tendo chegado ao CTA por volta das 10HOO;
d. Que o TCor Mário .........., perante a ausência do Cap Médico "CMD" Miguel .........., dado que este não esteve presente na formatura nem se lhe apresentou, na qualidade de Diretor da Prova e único superior hierárquico do Chefe da Equipa Sanitária, não tomou qualquer diligencia para saber do seu paradeiro e para garantir que a Prova Zero se iniciasse com a presença do Chefe da Equipa Sanitária. Fosse ele o Cap Médico "CMD" Miguel .......... ou o Cap Médico João .......... (que, nos termos da Diretiva N.°04/2016 estava com um nível prontidão de 1 hora);
e. Que o TCor Mário .......... só tomou consciência da ausência do oficial médico aquando da sua chegada, pelas 10hOO;
f. Que a Prova Zero do 127° Curso de Comandos, dirigida pelo TCor Mário .......... e constituída por 67 instruendos, esteve, na parte da manhã, duas horas e trintas minutos sem qualquer apoio médico.
2. Da prova produzida NÃO resultou PROVADO:
a. Que às 20HOO, o Cap Médico "CMD" Miguel .......... tenha informado o Diretor da Prova que se ia ausentar porque na manhã seguinte estaria de serviço ao Serviço de Urgência do Hospital São José;
b. Que o Cap Médico "CMD" Miguel .......... tenha informado o arguido que, às 23HOO, o Cap. Médico João .......... chegaria ao CTA, passando a ser este o médico em apoio à Prova Zero;
c. Que o TCor Mário .........., na qualidade de Diretor da Prova, deveria ter determinado os procedimentos de rendição entre os Oficiais Médicos, assim como a hora da sua realização;
d. Que o TCor Mário .........., perante a gravidade da situação clinica em que se encontravam 22 instruendos e o motivo alegado pelo Cap Médico .......... para se ausentar, tenha autorizado a sua retirada, antes que o Cap Médico .......... se apresentasse no CTA.
3. Os factos provados referidos no ponto 1 da Parte VI denotam:
a. Desvalorização da vertente do apoio sanitário como parte integrante da organização da Prova Zero;
b. Falta de cuidado na verificação das comunicações entre a direção da prova, as equipas de instrução e o chefe da equipa sanitária, podendo daqui resultar graves consequências em caso de urgência médica;
c. O desvelo pela garantia de que a Prova Zero se iniciasse sem a presença de um Oficial médico, chefe da equipa sanitária.
4. Constituindo, por isso, infração disciplinar por violação do dever de obediência, previsto no artigo 12°, n.°1 e n.°2, alínea a), o dever de autoridade, previsto no artigo 13°, n.°1 e n.°2, alínea a) e b) e o dever de tutela, previsto no artigo 15°, todos do RDM, cometendo assim uma infração disciplinar a sancionar com uma das penas previstas no Art.° 30.° do RDM.
5. Verificam-se as circunstâncias agravantes das alíneas d) e g) do artigo 40°, do RDM, a qual deverá ser levada em conta na determinação da medida da pena a aplicar;
6. Tem o Arguido a seu favor a circunstância atenuante do seu comportamento exemplar, prevista na alínea b) e d) do artigo 41°, do RDM.
VI
CONCLUSÕES
1. Face ao exposto, conclui-se:
a. Que, com a sua conduta, o Arguido praticou uma infração disciplinar por violação do dever de obediência, previsto no artigo 12°, n.°1 e n.°2, alínea a), o dever de autoridade, previsto no artigo 13°, n.°1 e n.°2, alínea a) e b) e o dever de tutela, previsto no artigo 15°, todos do RDM, cometendo assim uma infração disciplinar a sancionar com uma das penas previstas no Art.° 30.° do RDM;
b. Que o Arguido agiu com perfeito conhecimento da sua qualidade de Diretor da Prova Zero do 127° Curso de Comandos, de todos os seus deveres e competências e da acentuada responsabilidade de comando e de tutela que essa qualidade lhe dá;
c. Que o Arguido agiu com perfeito conhecimento que as suas ações poderiam colocar em causa o bom funcionamento da prova e o garante do apoio prestado a instruendos e instrutores;
d. E fê-lo sendo o militar mais antigo no Campo de Tiro de Alcochete no dia 4 de setembro de 2016;
e. Pelo exposto, considera-se que o Arguido é culpado dos factos que vêm acusado;
f. Na graduação da medida da pena a aplicar, deverá ser tido em conta o disposto no artigo 39° do RDM, bem como as circunstâncias agravantes previstas nas alíneas d) e g) do Artigo 40°, do RDM, nomeadamente a prática da infração em ato de serviço e o maior posto ou antiguidade;
g. Tem o Arguido a seu favor as circunstâncias atenuantes previstas nas alíneas b) e d) do Art.° 41.° do RDM nomeadamente a prestação de serviços relevantes e o seu comportamento exemplar. (..)” - fls. 216/226 do 1º vol. do procº disciplinar nº 01/16 apenso.
N. Por despacho de 22.MAI.2017 emitido pelo Tenente General Comandante das Forças Terrestres, o Requerente Mário ………… .......... foi punido disciplinarmente com 15 (quinze) dias de proibição de saída, despacho cujo teor se transcreve na íntegra:
“(..) 1. Por Despacho de 17MAR17, de Sua Excelência o General CEME, foi dado provimento parcial ao recurso hierárquico interposto pelo TCOR INF "CMD" NIM ………..MÁRIO …………… .......... e, consequentemente, anulado todo o processado subsequente à inquirição do Major ………… (a fls. 148), inclusive o meu Despacho Decisório de 19JAN17 e a pena aplicada de 20 (VINTE) DIAS DE PROIBIÇÃO DE SAÍDA;
2. Foi igualmente ordenado que fosse desconsiderada, para efeitos de eventual punição, toda a matéria relativa à reunião de coordenação ocorrida em 02SET16 e que se inquirissem as testemunhas indicadas pelo recorrente na sua defesa, para que se faça constar dos autos, elementos pertinentes, assim entendidos pelo arguido, que atendam à sua personalidade;
3. Para tanto, em cumprimento do Despacho de Sua Excelência o General CEME, de 29MAR17, mandei reabrir o presente processo, destinado a apurar a responsabilidade disciplinar do TCOR INF "CMD" NIM ……… MÁRIO …………………………………..
4. Assim, desentranhado do presente processo todo o processado desde a folha 148, exclusive, e realizadas as diligências referidas no ponto 2 do presente despacho, cumpre-me, nos termos do artigo 106° do RDM, decidir, o que faço com os seguintes fundamentos:
a. Concordo na íntegra com as conclusões do Oficial Instrutor do processo, pelo que considero toda a matéria como tal consignada no relatório, o qual aqui dou por integralmente reproduzido;
b. Com interesse para a causa, resultou provado:
(1) Que o TCor Mário .......... não procedeu à verificação da rede de rádio no início da instrução, conforme o determinado no Guião da Prova (vide a fls. 127), não detetando deste modo se todos os elementos que integram a rede estavam presentes, tinham condições técnicas para operar na rede e eram conhecedores dos procedimentos definidos para explorar a mesma;
(2) A não verificação da rede rádio teve como consequência a não deteção da ausência do Cap Médico .......... no início da instrução, elemento essencial desta mesma rede rádio, cujo objetivo principal é a solicitação de apoio sanitário urgente;
(3) Que o Cap Médico "CMD" Miguel .........., médico nomeado para apoiar a Prova Zero, não esteve presente no inicio da instrução (07H30), tendo chegado ao CTA por volta das 10HOO, ou seja, duas horas e trintas minutos depois;
(4) Que o TCor Mário .........., perante a ausência do Cap Médico .........., dado que este não esteve presente na formatura nem se apresentou a si próprio, na qualidade de Diretor da Prova e único superior hierárquico do Chefe da Equipa Sanitária, não tomou qualquer diligência para saber do paradeiro do oficial médico, nem para garantir que a Prova Zero se iniciasse com o apoio de um médico. Fosse ele o Cap Médico Miguel .......... ou o Cap Médico João .......... (que nos termos da Diretiva N.° 04/2016 estava com um nível de prontidão de 1hora);
(5) Que o TCor Mário .......... só tomou consciência da ausência do oficial médico aquando da chegada deste ao CTA, pelas 10HOO;
(6) Que a Prova Zero do 127° Curso de Comandos, dirigida pelo TCor Mário .......... e constituída por 67 instruendos, esteve, na parte da manhã, duas horas e trinta minutos sem qualquer apoio médico;
c. Com a sua conduta, o Arguido praticou uma infração disciplinar por violação do dever de obediência, previsto no artigo 12°, n.° 1 e n.° 2, alínea a), do dever de autoridade, previsto no artigo 13°, n.° 1 e n.° 2, alínea a) e b), e do dever de tutela, previsto no artigo 15°, todos do RDM;
d. Verificam-se as circunstâncias agravantes da responsabilidade disciplinar, previstas nas alíneas d) e g), do n.° 1, artigo 40°, do RDM, designadamente, a prática da infração em ato de serviço e na presença de militares inferiores hierárquicos do arguido e o maior posto ou antiguidade deste;
e. E a circunstância atenuante do comportamento exemplar do arguido, prevista na alínea b) e d) do artigo 41°, conjugado com o artigo 29°, ambos do RDM, já que o arguido não tem qualquer pena disciplinar registada na sua Folha de Matricula;
f. Estas circunstâncias atenuantes verificam-se pelos louvores e condecorações constantes da Folha de Matricula (a fls. 12a 13v) e pelas declarações das testemunhas arroladas pelo arguido na sua defesa (a fls. 206 a 211), designadamente:
(1) O TGen Ref José ………………… referiu que considera suficientemente explicitados no louvor que atribuiu ao arguido, o profissionalismo, o carácter e a competência deste;
(2) O TCor Carlos …………….. referiu que propôs os dois louvores atribuídos ao arguido quando este desempenhou a função de Comandante do Destacamento de Apoio de Serviços da FND ISAF, nos quais constam as suas qualidades pessoais e profissionais;
(3) O Cap Hélder ……….. esclareceu que o arguido é uma pessoa preocupada e interessada em absorver o máximo de informação sobre as atividades formativas no âmbito do Curso de Comandos, classificando-o como uma pessoa ponderada, com bastante iniciativa e cheio de energia;
g. Não se verifica uma atenuação extraordinária da pena porque nenhuma das circunstâncias atenuantes verificadas diminui substancialmente a culpa do arguido (artigo 42° do RDM);
h. Também não se verifica qualquer das circunstâncias dirimentes previstas no artigo 43°, do RDM;
i. Assim, atendendo ao elevado grau da ilicitude dos factos, ao grau de culpa do infrator, à responsabilidade decorrente da categoria, posto e natureza do serviço por si desempenhado, à sua personalidade, à sua conduta anterior e posterior, aos resultados perturbadores na disciplina, e às demais circunstâncias em que a infração foi cometida, PUNO o TCOR INF "CMD" NIM ………….MÁRIO ……………. .......... com 15 (QUINZE) DIAS DE PROIBIÇÃO DE SAÍDA.
Quartel-General do Comando das Forças Terrestres na Amadora, 22 de maio de 2017
O COMANDANTE DAS FORÇAS TERRESTRES (assinatura) (..)” - fls. em número de três, não numeradas, a final do 1º vol. do procº disciplinar nº 01/16 apenso.
O. O Mandatário do Requerente Mário ………………. .......... foi notificado do Relatório disciplinar e do despacho de 22.MAI.2017, referidos supra em M e N, via correio por ofício datado de 22.Maio.2017, cujo teor se transcreve na íntegra:
“(..) Assunto: ENVIO DE DESPACHO DECISÓRIO - V/ CLIENTE TCOR INF "CMD" NIM ……….. MÁRIO …………………….. ..........
Exmo. Senhor,
Encarrega-me o Exmo. Tenente-General Comandante das Forças Terrestres de notificar VExa., na qualidade de mandatário do TCOR INF "CMD" NIM …………….MÁRIO ……………. .........., do teor do despacho decisório que proferiu no âmbito do Processo Disciplinar N.° 01/16 deste CFT, no qual o seu cliente é arguido.
Junta-se uma cópia integral do referido despacho e do relatório final do instrutor, e informa-se V. Exa. que poderá apresentar reclamação da pena que foi aplicada ao seu cliente, a qual deverá fazer por escrito no prazo de 15 dias úteis a contar da presente notificação, nos termos do artigo 121.° do RDM, conjugado com o disposto no artigo 191° e seguintes do CPA, dirigida ao Exmo. Tenente-General Comandante das Forças Terrestres.
Poderá, ainda, interpor recurso hierárquico, mediante requerimento escrito, com alegação dos respetivos fundamentos, dirigido ao Chefe do Estado-Maior do Exército, podendo este ser apresentado ao autor do ato ou à autoridade a quem seja dirigido, no prazo de 10 dias úteis a contar da presente notificação, nos termos conjugados dos artigos 122.° e 124.° do RDM e 193° e seguintes do CPA.
Sem outro assunto, subscrevo-me com os meus cumprimentos. (..)” - fls. em número de uma, não numerada, a final do 1º vol. do procº disciplinar nº 01/16 apenso.
P. O Requerente Mário ……………. .......... em 05.06.2017 deduziu recurso hierárquico necessário do despacho sancionatório de 22.MAI.2017 referido supra em N, peticionando “a declaração de nulidade ou a revogação do acto punitivo proferido em 27 de Maio de 2017”, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – fls. em número de 35 (trinta e cinco) não numeradas, do 2º vol. do procº disciplinar nº 01/16 apenso.
Q. Pelo Departamento de Assessoria Jurídica e Contencioso do GabCEME foi elaborado o Parecer nº 183/2017 tendo por objecto o recurso hierárquico interposto pelo Requerente Mário ………. .......... do despacho disciplinar de quinze dias de proibição de saída de 22.MAI.2017, referido supra em N, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, nele se concluindo como segue:
“(..) atendendo ao exposto, ao abrigo das disposições conjugadas dos artºs. 153º nº 1 e 197º nº 1, ambos do Código de Procedimento Administrativo (CPA) e 10º do RDM, concluímos pela improcedência do recurso hierárquico, mantendo-se integralmente o despacho de aplicação do Tenente-Coronel de Infantaria “Comando” NIM ………., Mário …………….. .......... da pena disciplinar de 15 (quinze) dias de proibição de saída, proferido na sequência do Processo Disciplinar nº 01/16 do QG/CFT. (..)” – fls. em número de 14 (catorze) não numeradas, do 2º vol. do procº disciplinar nº 01/16 apenso.
R. No Parecer nº 183/2017 pelo Chefe do Estado Maior do Exército foi exarado em 17.JUL.2017 o seguinte despacho:
“(..) 1. Homologo.
2. Com os fundamentos do presente parecer, nego provimento ao recurso hierárquico e mantenho o despacho de punição. (..)” – fls. primeira das 14 (catorze) não numeradas, do 2º vol. do procº disciplinar nº 01/16 apenso.



DO DIREITO


Atenta a matéria de facto levada às alíneas N, P e R do probatório, da decisão sancionatória de 22.MAI.2017 foi interposto em 05.06.2017 recurso hierárquico necessário, cujo efeito é suspensivo da decisão recorrida (artº 123º nº 2, LO 2/2009, 22.07) sendo que o cumprimento da pena aplicada de 15 (quinze) dias de proibição de saída é de cumprimento imediato logo que negado provimento ao recurso hierárquico por despacho de 17.JUL.2017 (artº 51º nº 1, LO 2/2009, 22.07).


1. artº 3º a) da Lei 34/2007, 13.08 - fumus boni iuris qualificado;

Em matéria de suspensão cautelar de eficácia de despachos de aplicação de sanções disciplinares previstas no Regulamento de Disciplina Militar, aprovado pela Lei Orgânica nº 2/2009, 22.07, o artº 3º a) da Lei 34/2007, 13.08 dispõe que, sem prejuízo do regime do artº 120º nºs. 2, 3 e 5 CPTA,
“ … as providências cautelares … só podem ser decretadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado e seja evidente a procedência da pretensão, formulada ou a formular no Processo principal, por se tratar de: a) acto manifestamente ilegal …” .
O que significa que o regime estatuído pelo artº 3º a) da Lei 34/2007, 13.08 exige um critério de fumus boni iuris qualificado, assente na ilegalidade manifesta do despacho de 17.JUL.2017 de indeferimento do recurso hierárquico interposto pelo Requerente do despacho sancionatório de 22.MAI.2017 referido supra em N, de 15 dias de proibição de saída.
A cognição cautelar assenta num juízo de probabilidade quanto à existência do direito acautelado, isto é, assenta numa aparência de bom direito, ou fumus boni iuris, fundamento jurídico da provisoriedade de direito da decisão cautelar perante a decisão da causa principal, “(..) a provisoriedade resulta como consequência normal do tipo de cognição que o juiz do processo acessório faz sobre o mérito do quid que é objecto do segundo processo: cognição assente na aparência, já que apenas se exige como grau de prova a fundamentação [mera justificação como meio de prova] (..) é sempre provisória de direito perante o juiz da causa principal, já que os seus efeitos de direito são sempre modificáveis e extintos pelo juiz da causa principal (..) no processo em que é emitida, “a cognição cautelar assenta num cálculo de probabilidades quanto à existência do direito acautelado” (..)” (1)
A qualidade de cognição exigida pelo artº 3º a) da Lei 34/2007, 13.08 para o fumus boni iuris traduzida na expressão “acto manifestamente ilegal” mede-se pelo carácter incontroverso (que não admita dúvida), patente (posto que visível sem mais indagações) e irrefragável (irrecusável, incontestável) da presumível invalidade do acto sancionatório em matéria de disciplina militar.
Dito de outro modo, tenha ou não o requerente em vista a manutenção do statu quo (providência conservatória) ou a sua alteração (providência antecipatória) – o que se decide com base na factualidade alegada que determina os contornos do caso concreto –, é de decretar a providência desde que a determinação e valoração probatória suporte um juízo jurídico de evidência sobre a ilegalidade do acto suspendendo, traduzido pela expressão “manifesta ilegalidade” no texto legal.
O que apenas configura uma exigência de grau, sabido que em sede cautelar administrativa “(..) a apreciação do fumus boni iuris requer não apenas a emissão de um juízo sobre a aparência da existência de um direito ou interesse do particular a merecer tutela, como também da probabilidade da ilegalidade da actuação lesiva do mesmo (..)” isto é a apreciação do fumus boni iuris estende-se sobre a aparente ilegalidade da actuação administrativa assacada pelo particular como lesiva de um direito que lhe assiste. (2)


2. acusação em matéria disciplinar; defesa do arguido;

O Requerente sustenta nos artigos 12, 13, 14, 18 e 69 do requerimento inicial que o despacho de 17.JUL.2017 de indeferimento do recurso hierárquico é nulo por preterição de todas as diligências por si requeridas no recurso hierárquico interposto em 05.06.2017 do despacho sancionatório de 22.Maio.2017.
É patente que o Requerente não sustenta a preterição dos meios de prova arrolados no articulado de Defesa junto aos autos em 28.Dez.2016, constante de fls. 105 e 106/118 do 1º volume do procº disciplinar nº 01/16, tendo por objecto a Acusação contra si deduzida em 16.Dez.2016 - vd. alíneas E e H do probatório.
Em sede de processo disciplinar, uma vez notificado da Acusação, cabe ao Arguido apresentar em articulado próprio de Defesa as razões de facto e de direito contra a factualidade e respectivo enquadramento jurídico deduzidos no despacho de Acusação – vd. artºs. 102ºnºs. 1, 2, 3 LO 2/2009, 22.07.
E dizemos cabe na medida em que o ónus de prova em matéria de direito sancionatório compete à entidade que deduz a Acusação, seja em processo penal salvo disposição expressa de lei em contrário quanto a determinados tipos de ilícito, seja em procedimento disciplinar.
As diligências de prova requeridas pelo Arguido no articulado de Defesa devem ser realizadas no respectivo processo, salvo carácter dilatório, impertinente ou desnecessário das mesmas, a sustentar pelo Instrutor mediante despacho fundamentado, sendo que oficiosamente podem ser ordenadas diligências probatórias julgadas indispensáveis quer pelo Instrutor quer pela Entidade competente para decidir, em ordem à determinação da verdade material dos factos que sustentam quer a Acusação quer a Defesa – vd. artºs. 103º nºs. 1, 2 e 4 e 105º nº 1 LO 2/2009. 22.07.
O que significa que no domínio disciplinar, o momento procedimental próprio para o Arguido exercer o contraditório e levar aos autos a sua versão no confronto com a factualidade indiciada na Acusação contra si deduzida e, no tocante à fase de instrução (fase do processo destinada à produção das provas) especificar as espécies de meios probatórios que apresenta em ordem à demonstração da realidade dos factos por si alegados, é aquando da junção ao processo disciplinar do articulado de Defesa, nos termos da lei adjectiva aplicável que, no caso presente, se mostram estatuídos no artº 99º nº 1 e 102º nºs. 1 e 2, LO nº 2/2009, 22.07.

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Compulsando o processo disciplinar a que se reportam os presentes autos cautelares, verifica-se que as três testemunhas arroladas à matéria do “profissionalismo, carácter e competência do Arguido” no articulado de Defesa levado ao processo disciplinar pelo Requerente em 28.Dez.2016 foram inquiridas e os respectivos autos de inquirição notificados ao Mandatário constituído, via correio por ofício de 09.05.2017, conforme fls. 206, 208, 209, 211 e 213 do 1º vol. do procº disciplinar nº 01/16 – vd. alínea H do probatório -, sendo que o Requerente nada veio suscitar nos autos
No citado articulado de Defesa junto ao procº disciplinar nº 01/16 em 28.Dez.2016, além da prova testemunhal arrolada não foi requerida a produção de quaisquer outras diligências probatórias; pelo contrário, o que se requereu foi o seguinte:
“(..)Todavia, requer-se o seguinte:
L Que sejam tomadas providências quanto ao facto de se ter alterado o Guião da Prova Zero já após o falecimento de dois instruendos;
II. Que, de futuro, à assistência médico-sanitária sejam criadas condições para uma melhor salvaguarda da vida e da integridade física e psicológica dos instruendos e facultada aos instrutores acções de formação com vista aos mesmos conhecerem minimamente os sintomas de um Golpe de Calor e de Hipotermia (caso a instrução venha a ser dada em situações de muito baixa temperatura);
III Que antes de qualquer Prova Zero ou com carga similar seja facultado aos instrutores a previsão meteorológica;
IV. Que o Hospital das Forcas Armadas tenha, em permanência, um serviço de cuidados intensivos apto a receber situações de emergência em que estejam envolvidos militares (não apenas os instruendos dos Cursos de Comandos);
V. Que seja solicitado ao Instituto de Meteorologia do Mar e da Atmosfera a estatística dos últimos 30 anos relativamente a temperaturas que se verificaram na área do Campo de Tiro de Alcochete na primeira semana de Setembro;
VI. Que o mesmo instituto informe qual a temperatura máxima verificada no dia 4.9.2016 na zona da Carregueira/Belas/Sintra. (..)” – vd. fls. 116/117 do procº disciplinar nº 01/16.
Ou seja, afora a questão das temperaturas no Campo de Tiro de Alcochete, o demais são sugestões apresentadas pelo Requerente às Entidades Militares e não meios de prova requeridos no âmbito da Defesa apresentada contra a Acusação contra si deduzida no procº disciplinar nº 01/16.


3. decisão sancionatória; recurso hierárquico necessário;

Como é sabido, tanto as reclamações como os recursos hierárquicos são procedimentos de 2º grau de natureza impugnatória que têm como objectivo a reapreciação de um acto administrativo anteriormente praticado, em ordem à revisão da situação jurídica conformada pelo acto administrativo impugnado – vd. artº 159º CPA/1991, artº 185º nº 3/CPA/revisão de 2015. (3)
Em matéria de procedimentalização da apresentação da Defesa pelo arguido e diligências de prova por este requeridas, da conjugação dos artºs. 102º, 103º, 105º, 121º e 122º da LO 2/2009, 22.07 decorre claramente que o articulado de Defesa tem por objecto o despacho de Acusação na vertente da matéria de facto e enquadramento infraccional imputados ao Arguido a título de violação de deveres militares, nomeadamente os deveres especiais elencados no artº 11º nº 2 e 12º a 24º LO 2/2009, 22.07, enquanto que o recurso hierárquico necessário tem por objecto a Decisão sancionatória na veste de meio impugnatório da fundamentação de facto e de direito das infracções disciplinares imputadas no despacho que determina a pena concreta aplicada ao arguido no processo disciplinar.
O que significa que do ponto de vista jurídico não tem sustentação a tese do Requerente de assacar de invalidade o Despacho sancionatório de 22.MAI.2017 com fundamento em meios de prova requeridos pelo Arguido no recurso hierárquico necessário de 05.06.2017, na exacta medida em que o Arguido, uma vez notificado da Acusação contra si deduzida em 16.Dez.2016, é titular dos direitos subjectivos de defesa concretizados na vertente instrutória, a exercer na fase do procedimento legalmente estatuída para o efeito nos artºs. 99º a 103º LO 2/2009, 22.07, para apresentação da Defesa deduzida contra a Acusação, direito de defesa que o Requerente exerceu mediante a apresentação do competente articulado em 28.Dez.2016 – vd. alínea H do probatório.
O recurso hierárquico necessário interposto pelo Requerente em 05.06.2017 mais não é do que a impugnação administrativa da decisão sancionatória, no caso, do despacho sancionatório de 22.Maio.2017, e por isso, não é o meio processual próprio para requerer meios de prova contra a Acusação de 16.Dez.2016 deduzida no procº disciplinar nº 01/16.
Pelo que vem dito, o despacho de 17.JUL.2017 que negou provimento ao recurso hierárquico necessário interposto pelo Requerente em 05.06.2017 em via de impugnação do despacho sancionatório de 22.Maio.2017, não se mostra inquinado de invalidade fundada pelo Requerente na preterição de diligências de prova por si requeridas no recurso hierárquico.
O mesmo é dizer que não se verifica o requisito cautelar do fumus boni iuris qualificado exigido pelo artº 3º a) Lei 34/2007, 13.08, ou seja, em sede de summaria cognitio a factualidade levada ao probatório não retrata uma manifesta ilegalidade no agir administrativo no tocante às circunstâncias de tempo lugar e modo que suportam o juízo de indeferimento do recurso hierárquico necessário expresso no despacho de 17.JUL.2017 e cuja suspensão vem aqui peticionada, recurso interposto pelo Requerente em 05.06.2017 em via de impugnação do despacho sancionatório de 22.Maio.2017 que aplicou a pena de 15 (quinze) dias de proibição de saída.

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O decretamento da providência depende da verificação cumulativa dos três requisitos legais enunciados no artº 120º nºs. 1 e 2 CPTA (fumus boni iuris, periculum in mora e ponderação de interesses), pelo que o decaimento em sede do pressuposto da aparência do bom direito alegado (fumus boni iuris) na vertente da manifesta ilegalidade do acto estatuída no artº 3º a) Lei 34/2007, 13.08, importa a improcedência da acção cautelar interposta pelo Requerente.



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Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores e Juiz Militar que constituem da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em indeferir o pedido de suspensão de eficácia do despacho de 17.JUL.2017 emitido pelo Chefe do Estado Maior do Exército, de indeferimento do recurso hierárquico necessário interposto em 05.06.2017 do despacho sancionatório de 22.Maio.2017 emitido pelo Tenente General Comandante das Forças Terrestres que aplicou ao Requerente Mário ………. .......... a pena de 15 (quinze) dias de proibição de saída.

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Custas a cargo do Requerente.

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Notifique.

Lisboa, 04.OUT.2017


(Cristina dos Santos) ……………………………………………………………………..

(Ana Celeste Carvalho) ………………………………………………………………….

(Major General José Alberto Martins Ferreira) …………………………………………


(1)Isabel Celeste M.Fonseca, Introdução ao estudo sistemático da tutela cautelar no processo administrativo, Almedina/2002, págs. 93/94 e 97/98.
(2)Ana Gouveia Martins, A tutela cautelar no contencioso administrativo – em especial nos procedimentos de formação dos contratos, Coimbra Editora/2005, pág.43 nota (40).
(3)Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e Pacheco de Amorim, Código de Procedimento Administrativo – Comentado, Almedina/1998, págs. 745/746; Fausto de Quadros e AA, Comentário à revisão do Código de procedimento Administrativo, Almedina/2016, pág. 399.