Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:180/20.9BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:09/17/2020
Relator:MÁRIO REBELO
Descritores:ISENÇÃO DE GARANTIA.
REQUISITOS.
ÓNUS DA PROVA.
Sumário:1. De acordo com a nova redação do art.º 52º/4 LGT, o benefício da isenção depende de dois pressupostos, a provar pelo Requerente, em alternativa: (i) existência de prejuízo irreparável decorrente da prestação da garantia ou (ii) falta de bens económicos para a prestar.

2. Demonstrando o Requerente um destes pressupostos, a AT pode deferir o pedido “desde que não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado“.

3. A prova deste facto negativo cabe, agora, à Autoridade Tributária.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


RECORRENTE: C...........
RECORRIDO: Autoridade Tributária
OBJECTO DO RECURSO:
Sentença proferida pelo MMº juiz do TAF de Leiria que julgou improcedente a reclamação deduzida contra o ATO DO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
que indeferiu o requerimento de dispensa de prestação de garantia para suspensão de processo de execução fiscal no PEF n.° ............

CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:
A) A douta sentença julgou improcedente a reclamação apresentada contra o ato (despacho) do órgão de execução fiscal, que indeferiu o requerimento de dispensa de prestação de garantia para suspensão de processo de execução fiscal que apresentou no PEF n. ...........;
B) Entendeu a Meritíssima Juíza do tribunal "a quo” que cabia ao reclamante comprovar a sua incapacidade para garantir a dívida exequenda, nomeadamente através da prova da impossibilidade de constituir as garantias legalmente admitidas;
C) No entanto, o entendimento segundo o qual o contribuinte, para poder beneficiar da isenção de prestação de garantia, necessitaria de comprovar que não pode prestar nenhuma das garantias legalmente admitidas é, salvo o devido respeito, um entendimento infundado.
D) Assim, constituiria a exigência de uma prova diabólica ter de comprovar que não consegue prestar garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer outro meio suscetível de assegurar os créditos do exequente.
E) O legislador, ao admitir a possibilidade de prestar garantia através dos referidos meios e através de qualquer outro meio que possa constituir garantia do processo executivo, não quis colocar no contribuinte o ónus da prova diabólica ou impossível de não lhe ser possível prestar todos e cada um dos referidos meios de garantia.
F) Na douta sentença recorrida entende-se que deveria ter sido considerada como provada a impossibilidade do ora recorrente ter prestado garantia bancária, com base no facto de que foi comprovado pelo ora recorrente que não lhe era possível prestar garantia bancária, sendo, por isso, legítimo e legalmente admissível que pudesse beneficiar da isenção de prestação de garantia.
G) Acresce que o ora recorrente, ao juntar os comprovativos das despesas que por si são suportadas mensalmente, nomeadamente com os créditos que detém junto do M........... (créditos à habitação), responsabilidades parentais e pagamento dos planos prestacionais aprovados no âmbito de outros processos de execução fiscal, a que acrescem as penhoras do vencimento e saldo bancário, acrescido da declaração do banco em como não era autorizada a constituição de garantia bancária, faz prova que se verificam as condições de que a dispensa de prestação de garantia depende;
H) Ora, tendo o ora recorrente feito a prova documental necessária para provar que não tem bens económicos para prestar garantia, caberia à AT provar que essa insuficiência teve origem na atuação dolosa do interessado (tal como é o entendimento do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no âmbito do processo n.° 254/19.9BELRS) o que não fez;
I) O recorrente alegou e demonstrou ter diligenciado no sentido de obter a garantia idónea para garantir a dívida em cobrança coerciva e acrescido, que a mesma foi recusada, facto este que conjugado com as dívidas por si suportadas junto das entidades bancárias, responsabilidades parentais, planos prestacionais a decorrer junto da AT a acrescer às penhoras ao seu vencimento e saldo bancário, demonstra a sua insuficiência de bens e o prejuízo irreparável na prestação da garantia, pelo que se verificam os pressupostos legais de que depende a dispensa de prestação de garantia, previstos nos termos do n.° 4 do artigo 52° da LGT.
J)  A douta sentença recorrida fez incorreta aplicação do n° 4 do artigo 52° da LGT.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta decisão recorrida, determinando-se a anulação do despacho do OEF que indeferiu o requerimento de dispensa de prestação de garantia para suspensão do processo de execução fiscal no âmbito do PEF n.° ............

CONTRA ALEGAÇÕES.

A Fazenda Pública não contra alegou.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA pronunciou-se pela improcedência do recurso.

II QUESTÕES A APRECIAR.

O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou ao julgar improcedente a reclamação contra o despacho de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:

1.1. Contra o aqui Reclamante foi instaurado o processo de execução fiscal n.° ..........., para cobrança coerciva de IRS do ano de 2018 no montante de € 20.067,26 - Cft. Informação de fls. 59 e ss. dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzida;

1.2. O Reclamante requereu junto do órgão de execução fiscal o pagamento da dívida exequenda em 36 prestações mensais, alegando:

Pagamento em prestações que constitui fundamento de suspensão da execução mediante a prestação de garantia ou dispensa da sua prestação, nos termos do art.° 170 º do CPPT e art.° 52.° da LGT.

Sucede que o executado não tem rendimentos, poupanças, ou bens suficientes para prestar garantia, sendo que a dívida ascende a € 20.640,61 a que acresce 25%, no total a garantir de € 26.555,55.

Assim, o executado apenas detém a propriedade da sua habitação própria e permanente, i.e., do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ……, da União das Freguesias de Leiria, Pousos, Barreira e Cortes, descrito na Conservatória do Registo Predial de Leiria sob o n.° ….., conforme caderneta predial e cópia informativa da descrição que se juntam como documentos um e dois. O VPT do prédio urbano em apreço perfaz o valor de € 156.813,92, sendo que se encontram registadas duas hipotecas voluntárias ao B..........., S.A., registadas através das Ap. 7 e 8, ambas de 2007/06/25, nos montantes máximos assegurados de € 190.000,00 e de € 75.000,00.

Desta forma, o prédio de que o executado é titular não constituiu garantia idónea, acrescendo o facto de ser a sua habitação própria e permanente.

Os rendimentos auferidos pelo executado são afetos às despesas mensais correntes de consumo de bens essenciais, como sejam a água, luz e gás, da sua residência, alimentação e deslocações, bem como às prestações mensais relativas aos empréstimos ao Banco M..........., que perfazem os valores de € 413,39 e € 163,33, conforme documento três.

O executado tem ainda a seu cargo responsabilidades parentais dos seus dois filhos, sendo que despende cerca de € 846,00 mensais a título de pensão de alimentos (conforme resulta do mod. 3 de IRS de 2018 que se junta como documentos quatro).

Acresce ainda que o executado se encontra a realizar o pagamento dos planos prestacionais aprovados no âmbito dos processos executivos n.°s………..,       ………… ,      ………….., ………….., cujo valor mensal perfaz os montantes de € 132,17, € 516,29, € 119,02, € 562,14, respetivamente. Assim, dos rendimentos auferidos pelo executado, para além de fazer face às supracitadas despesas, é subtraído o valor das obrigações prestacionais com os processos que correm contra si, no valor global de € 1.329,62.

Por outro lado, o executado não tem forma de constituir garantia bancária, uma vez que tal valor não lhe é autorizado pela banca para esse fim, conforme documento que se protesta juntar.

Desta forma, o executado não dispõe de meios para poder prestar garantias.

Em face de todo o exposto, a autorização de dispensa de prestação de garantia é o único meio de o executado poder cumprir cabalmente com as prestações já autorizadas e as que se vencerão, isto porque, não sendo autorizada, seguir-se-ão atos de cobrança coerciva, nomeadamente de penhora das suas contas bancárias. No entanto, é nas suas contas bancárias que o executado recebe os seus rendimentos e é apenas com base nestes que cumpre as suas obrigações legais supra descritas, as suas despesas de consumos básicos bem como o pagamento dos planos prestacionais já autorizados.

Neste contexto, a não autorização da dispensa de prestação de garantia resultará num avultado prejuízo para o executado, tanto a nível pessoal como profissional, uma vez que lhe será praticamente impossível cumprir com os seus compromissos caso lhe sejam penhoradas as suas contas bancárias, a acrescer à penhora, já realizada, do seu vencimento.

Importa ainda referir que a situação da insuficiência de bens e rendimentos não é da responsabilidade do executado, no sentido em que o seu comportamento nos últimos anos não visou a diminuição de património ou garantia de credores.

- Cft. Docs. de fls. 30 a 33 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

1.3.      O Reclamante juntou declaração emitida pelo banco M..........., com o seguinte teor:

Na sequência da proposta de crédito apresentada por V. Exa., identificada em epígrafe, informamos que, após apreciação da mesma, consideramos não estarem reunidas as condições necessárias para a sua aprovação.

No entanto, ficamos disponíveis para uma reapreciação desta proposta, caso V. Exa. considere que existem outras informações adicionais que o justifiquem.

- Cft. Doc. de fls. 35. dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido.

1.4.      Na sequência do pedido de dispensa de garantia formulado pelo Reclamante, foi em 2020.01.06 informado o seguinte:

EXECUTADO: C........... NIF-…………….

PEF-...........-REQUER DISPENSA DE GARANTIA NOS TERMOS DO ARTIGO 52° N°4 DA LGTE 199° N°3 DO CPPT.

Com pagamento em prestações

Relativamente ao pedido apresentado pelo contribuinte em epígrafe através da sua mandatária Dra. M..........., no serviço de Finanças de Leiria 1 em 2019-11-20 e enviado a esta Direção de Finanças em 2019-11-28 Comunicação n°……….., cumpre-me informar:

O executado vem requerer dispensa de prestação de garantia nos termos do n° 4 do artigo 52° da LGT e consequentemente a suspensão do processo executivo ..........., em virtude de ter requerido o pagamento em 36 prestações mensais por despacho do Chefe do Serviço de Finanças, datado de 2019-10-28.

DO PEDIDO:

Requer a suspensão do processo de execução fiscal com dispensa de prestação de garantia nos termos do n° 3 do artigo 199° do CPPT e do n° 4 do artigo 52° da LGT;

Invoca como fundamentos do pedido:

- não ter rendimentos, poupanças, ou bens suficientes para garantir o processo;

- apenas detém a propriedade da sua habitação própria e permanente, que se encontra onerada com - 2 hipotecas voluntárias, pelo que considera não constituir garantia;

- Tem responsabilidades parentais onde despende cerca de € 846,00 mensais;

- Encontra-se a cumprir planos prestacionais no valor mensal de € 1,329,62;

- A autorização de dispensa é o único meio de poder cumprir com as prestações já autorizadas;

- Que não tem forma de constituir garantia Bancária, uma vez que tal valor não lhe é autorizado pela banca para esse fim, conforme documento que protesta juntar;

- Que a não autorização de dispensa de prestação de garantia resultará num avultado prejuízo para o executado, tanto a nível pessoal como profissional, uma vez que lhe será praticamente impossível cumprir com os seus compromissos caso lhe sejam penhoradas as contas bancárias, a acrescer à penhora, já realizada do seu vencimento,

- Que a situação de insuficiência de bens e rendimentos não é da responsabilidade do executado, no sentido de que o seu comportamento nos últimos anos não visou a diminuição do património ou garantia de credores.

DOS FACTOS:

A divida diz respeito a IRS do ano de 2018, cuja quantia exequenda ascende a € 20.067,26, a que acrescem juros de mora e custas processuais contados até à data, e encontra-se a ser exigida no processo supra indicado, sendo o valor da garantia a prestar de € 23.251,54;

DA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL;

PEDIDO DE ISENÇÃO:

A lei n° 42/2016, de 28-12, procedeu à alteração do n° 4 do artigo 52° da LGT, prevendo agora que “a administração tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia, nos casos da sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deve a atuação dolosa do interessado.

Nestes termos, a dispensa de prestação de garantia depende da verificação dos sequintes pressupostos:

- Prejuízo irreparável causado pela prestação de garantia,

Ou,     

- Manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, mas desde que não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado, sendo esta uma condição de verificação necessária.

CONCLUSÃO:

Estamos perante duas condições não cumulativas:

a) A prestação de garantia vir a causar prejuízo irreparável; ou

b) Manifesta falta de meios económicos revelados pela insuficiência de bens penhoráveis desde que não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado, sendo esta uma condição de verificação necessária:

Quanto ao primeiro pressuposto, o executado juntou aos autos declaração bancária do M..........., que considera não estarem reunidas as condições necessárias para aprovação de garantia bancária, no entanto não provou o prejuízo irreparável que a prestação de garantia viria a causar caso fosse prestada, não deve ser analisado em função da falta de meios financeiros suficientes como invoca a requerente, mas sim do prejuízo que resultaria da sua apresentação, prova que não foi feita.

Quanto à falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, verifica-se através dos vários sistemas informáticos da AT, que é titular do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo n° …… , da União de freguesias de Leiria, Pousos, Barreira e Cortes , com o VPT de € 156.813,92, que proveio do artigo urbano ….. da freguesia da Barreira, trata-se de casa de morada de família, o mesmo situa-se em Urbanização do Vale Grande, lote 56 - Telheiro, ………. Leiria, que coincide com a morada do executado. Por consulta à certidão da CRP, verifico que o mesmo se encontra onerado com duas hipotecas, registadas a favor do B..........., SA", registadas sob AP, 7 de 25-06-2007, com o máximo assegurado de € 246.050,00 e AP 8 de 25-06-2007, com o máximo assegurado de € 97.057,50, verifica-se no entanto através de declaração do M........... que a divida dos dois empréstimos totaliza atualmente o valor de € 195.508,93 ainda assim um valor superior ao VPT do prédio (€ 156.813,92) por consulta à modelo 3 do IRS do ano de 2018, verifica-se que auferiu o rendimento anual no valor de € 64.008,57 categoria A e de € 107.523,23 categoria B, com a atividade de médico clinica geral (CAE 7014).          

Por consulta ao SIP (Sistema Informático de Penhoras Eletrónicas), o vencimento da categoria “A" está penhorado com data de 20-06-2018, nos seguintes PEF'S ………..,…………… , ……………,…………… e………, com o valor de 33.984,84, sendo o valor atual em dívida de € 10,993,17.

Baseando-se o pedido no pressuposto da manifesta falta de meios económicos, e sendo este alternativo ao pressuposto de que a prestação de garantia lhe causa prejuízo irreparável, é suficiente que seja verificado o pressuposto invocado, em simultâneo com o pressuposto da não existência de fortes indícios de atuação dolosa do executado para a insuficiência ou inexistência de bens.

Contudo o sujeito passivo auferiu no ano 2018 rendimentos da categoria "A” e “B" no total de € 171.531,80, tem despesas fixas anuais num total de € 34.720,88 (efetua pagamentos em prestações no total anual de € 15.955,44; pensões de alimentos no valor anual de € 11.844,00 e prestações por empréstimos no valor anual de € 6.920,64), verifica-se ainda que existe uma penhora ativa sobre o vencimento da categoria "A" a favor da AT) nos PEF'S -…………………., ……….. e…………., no montante de € 33.984,84, sendo a divida atual nos referidos processos de € 10.993,17

Abatendo todas as despesas fixas ao valor anual auferido, apura-se um rendimento líquido de € 136.811,72.

Assim, o facto do bem imóvel ser a habitação própria do executado não é inibidor nem da penhora pela AT nem que o executado proceda à constituição de garantia do crédito tributária por hipoteca voluntária com declaração pelo executado para efeitos de cessão do impedimento de realização da venda, nos termos do n° 6 do artigo n° 244° do CPPT.

Não existem indícios que a insuficiência dos bens se deveu à atuação dolosa do executado, no entanto e conforme atrás se informa, o sujeito passivo auferiu no ano 2018 rendimentos de categoria A e B, no total de € 171.523,23 e por consulta ao sistema informático, nomeadamente às obrigações acessórias - DMR o executado no ano 2019, auferiu até à presente data rendimentos da categoria "A" no valor de € 60.816,29.

Em face do exposto e salvo melhor opinião, sou de parecer que o pedido de isenção de prestação de garantia vai no sentido de indeferimento, uma vez que existem rendimentos em nome do executado, contudo a competência de decisão é do Chefe de Finanças.

COMPETÊNCIA PARA A DECISÃO:

Tendo em conta o disposto no n° 9 do artigo 199°, conjugado com o artigo 197° do CPPT e ainda de acordo com as instruções transmitidas pela DSGCT através do e-mail datado de 16-03-2012, é o Chefe do Serviço de Finanças, por competência delegada pelo Diretor de Finanças de Leiria, competente para apreciar e decidir sobre o pedido de dispensa de garantia, cabendo ao Chefe de Divisão de Justiça Tributária por delegação de competências do Diretor de Finanças Adjunto pronunciar-se sobre a idoneidade da mesma.

O CSF, pronuncia-se por: “Considerando que o executado solicitou a dispensa de garantia fazendo a prova necessária da sua insuficiência económica para garantir os autos, estão, salvo melhor opinião, reunidos os pressupostos para que se para que se decida pelo deferimento de tal pedido"

É quanto me cumpre informar.

À consideração superior.

- Cft. Doc. De fls. 26 e ss. dos autos, que aqui se da por integralmente reproduzido.

1.5. Na sequência da do requerido em 1.4, e com base na informação que antecede, a Chefe de Divisão pronunciou-se nos seguintes termos:

Concordo com a informação,

Sendo o bem imóvel, a habitação própria do executado só por si, não é inibidor nem da penhora pela AT nem que o executado proceda à constituição de garantia do crédito tributário por hipoteca voluntária com declaração pelo executado para efeitos de cessão do impedimento de realização da venda, nos termos do n° 6 do artigo n° 244° do CPPT. Só após a constituição da garantia se pode aferir da sua suficiência para suspensão dos autos e decisão de pedido de dispensa.

Além disso, também o documento bancário emitido pelo B.... apenas comprova a não aprovação de um pedido, mas não se conhecem os termos nem o montante do mesmo, pelo que não se comprova que a incapacidade de prestação de garantia com garantia bancária.

Assim sendo, pronuncio-me pelo indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia, contudo a decisão final é do Chefe de Finanças de Leiria 1, no âmbito da delegação de competências do Diretor de Finanças .

- Cft. Doc. De fls. 26 e ss. dos autos, que aqui se da por integralmente reproduzido.

1.6. Sobre a informação que antecede recaiu despacho de concordância do Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Leiria 1 - Cft. Doc. De fls. 26 e ss. dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido.

1.7. Pelo ofício n.° 24/03, datado de 2020.01.07, foi a reclamante notificada da decisão do Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Leiria 1 de 2020.01.06, que indeferiu o pedido de isenção de prestação de garantia, e da informação que esteve na base daquela decisão - Cft. Doc. 1 junto com a petição inicial, que se da por integralmente reproduzido.

Embora o Reclamante não tenha junto quaisquer documentos comprovativos da propriedade da casa morada de família, nem das despesas que suporta mensalmente, nem das importâncias por si auferidas, face à não impugnação da liquidação de IRS de 2018, e a posição assumida pela Fazenda Pública na informação de fls. 26 e ss. Dos auto, consideram-se provados, por não controvertidos, os seguintes factos:

1.8. O Reclamante é proprietário do prédio urbano, inscrito na matriz sob o artigo ……. da união de freguesias de Leira, Pousos, Barreira e Cortes, com o valor patrimonial de € 156.813,92, sito em Urbanização………., Lote 56, Telheiro ……… Leiria, que coincide com a morada do executado.

1.9. O imóvel identificado em 1.8. encontra-se onerado com duas hipotecas, ambas registadas a favor do B..........., SA, para garantia do capital máximo de € 246.050,00 e € 97.057,50, totalizando atualmente o valor dos créditos em dívida o montante de € 195.508,93.

1.10. Em 2018 o reclamante declarou na declaração modelo 3 de IRS um rendimento bruto de trabalho dependente no montante de € 64.008,57 e um rendimento bruto de trabalho independente de € 107.523,23.

1.11. O reclamante suporta mensalmente os seguintes encargos:

- Prestações relativa a empréstimos contraídos junto do Banco M...........: €413,39 e € 163,33, num total de € 576,72;

- Pensões alimentos: € 846,00;

- Pagamentos de planos prestacionais aprovados no âmbito dos processos executivos n.°s……, …….., ……. e ………….. nos montantes de € 132,17, €516,29, € 119,02 e 562,14 respetivamente, num total de € 1.329,62.

2. FACTOS NÃO PROVADOS        

Não se vislumbram outros factos alegados, cuja não prova releve para a decisão da causa.

3. MOTIVAÇÃO

O Tribunal fundou a sua convicção na análise crítica dos documentos referidos em cada ponto do probatório supra, não impugnados, no alegado pelas partes, tendo também em conta o disposto nos artigos 72.° a 76.° da Lei Geral Tributaria, e 342.° do Código Civil.

FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

O Executado (ora Recorrente) apresentou no Serviço de Finanças de Leiria 1 pedido de isenção de garantia alegando não ter rendimentos, poupanças ou bens suficientes para prestar garantia, sendo que a dívida ascende a € 20.640,61 a que acresce 25%, no total a garantir de € 26.555,55. Acrescentou que apenas é proprietário do……., afeto a sua habitação própria e permanente, cujo VPT é de € 156.813,92 onerado com duas hipotecas voluntárias ao B...., para garantia dos montantes máximos de € 190.000,00 e 75.000,00, razão pela qual tal prédio não constitui garantia idónea. Os rendimentos auferidos pelo executado são afectos às despesas mensais correntes de consumo de bens essenciais. Ainda tem  a seu cargo responsabilidades parentais dos seus dois filhos, despendendo cerca de € 846 mensais a título de pensão de alimentos e  paga as prestações aprovadas nos planos prestacionais no âmbito de processos de execução fiscal que totalizam € 1.329,62.

Acrescenta não ter forma de constituir garantia bancária uma vez que tal valor não lhe é autorizado pela banca, conforme documento que protestara juntar e que a não dispensa de prestação de garantia resultará num avultado prejuízo tanto pessoal como profissional.

O pedido foi indeferido com fundamento no parecer dos serviços, que sintetizamos em três argumentos:

- O Requerente auferiu no ano de 2018 um rendimento líquido de € 136.811,72 (depois de abatidas as despesas fixas);

- É proprietário de um bem imóvel destinado à sua habitação própria mas tal não inibe a respetiva penhora nem constituição de hipoteca voluntária a favor da AT;

- O documento bancário emitido pelo B.... apenas comprova a não aprovação de um pedido, mas não se conhecem os termos nem o respetivo montante.

O Requerente reclamou para o TAF de Leiria advogando a  subida imediata por a sua retenção a tornar absolutamente inútil. E quanto aos fundamentos de discordância do indeferimento alegou que o  (i) imóvel destinado a habitação própria está onerado com duas hipotecas voluntárias cuja dívida ultrapassa o VPT do imóvel, pelo que não tem idoneidade para garantir a dívida exequenda; (ii) comprovou nos autos que o B.... indeferiu o pedido de constituição de garantia bancária, significando isso que o Banco não concede garantia bancária independentemente do valor, tanto mais que a AT penhorou o seu vencimento, bem como a sua conta bancária no M…………, sem que o pudesse ter feito (iv) por outro lado, os rendimento auferidos pelo executado são afetos às despesas mensais correntes de consumo de bens essenciais, despesas relativas  às prestações mensais de relativas aos empréstimos ao M..........., pagamento de planos prestacionais aprovados no âmbito de processos de execução fiscal, bem como responsabilidades parentais a título de pensão de alimentos. Por isso, não é verdade que se apure um rendimento líquido de € 136.811,72 depois de abatidas todas as despesas fixas ao valor anual auferido.  

A MMª juiz indeferiu a reclamação considerando, no que respeita à casa de morada de família, que dado o direito que nesta matéria lhe assiste, o executado “não pode ser coagido pela Administração Tributária a prescindir dessa garantia, nem a sua recusa em dela prescindir pode constituir fundamento de indeferimento de pedido de dispensa de prestação de garantia”

E quanto à não comprovação da incapacidade de prestar garantia bancária, que a AT diz apenas   comprovar a não aprovação de um pedido, sem que se conheçam os termos ou o respetivo montante, referiu não existirem motivos “...para acreditar que a Reclamante tenha apresentado um qualquer pedido de prestação de garantia não relacionado com o processo de execução fiscal no âmbito do qual foi requerida a dispensa de prestação de garantia, não existem motivos para duvidar da legitimidade do documento junto para comprovar nos autos de execução fiscal a impossibilidade de obter uma garantia bancária por forma a garantir a dívida exequenda e acrescido e assim lograr a suspensão da execução.” Daí que, como consequência, “... deveria ter sido considerada comprovada a impossibilidade de obtenção de garantia bancária por parte do Reclamante, pelo que andou mal o órgão de execução fiscal ao considerar não comprovada esta incapacidade no seu despacho de concordância de 2020.01.6, que expressamente remete para os "motivos e fundamentos expostos na informação, e em conformidade com o aduzido no despacho do Senhor Chefe de Divisão da Justiça de Tributaria da Direção de Finanças de Leiria”.

Em todo o caso, a pretensão não foi reconhecida pela MMª juiz pois  não sendo a penhora de bens e a garantia bancária garantia idónea, havendo outras como o seguro caução, e não demonstrando a sua incapacidade financeira para suportar esse tipo de encargo, forço é concluir que o Reclamante não cumpriu com o ónus de prova que sobre si recaia, nos termos do artigo 74º n.º 1 da Lei Geral Tributária e 342º do Código Civil.

O Executado/Recorrente não se conforma. Defende que impor-lhe o ónus de provar que não pode prestar nenhum das garantias legalmente admitidas é um entendimento infundado e constituiria mesmo uma “prova diabolica”. Por outro lado, tendo a sentença admitido a impossibilidade de o Recorrente prestar garantia bancária com base no documento emitido pelo B...., e considerando as despesas mensais que por si são suportadas mensalmente, cumpriu com a sua carga probatória de insuficiência de bens para prestar a tal garantia. Deste modo, cabia à AT o encargo de provar que essa insuficiência teve origem na atuação dolosa do interessado, o que não fez. 

Delineadas as questões que nos são colocadas e o contexto em que surgem, passemos à sua análise.

Nos termos do artigo 52.º, n.º 4 da LGT, (com a redação que lhe foi dada pela Lei n.º 42/16, de 28/12) a administração tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada por insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a actuação dolosa do interessado.

Na anterior redação (decorrente da Lei 62- B/2012, de 31/12), o texto deste nº 4 dizia o seguinte: «4 - A administração tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado.»

Assim, o executado que pretenda obter a suspensão da execução e ser dispensado de prestar a respetiva garantia, deve dirigir o pedido ao órgão da execução fiscal, devidamente fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária (cfr. artigo 170.º/1 e 3 do CPPT).

Tal é o que resulta do regime geral de repartição do ónus da prova [artigo 342.º do Código Civil e artigo 74.º/1LGT] e, bem assim, do referido artigo 170.º/ 3 do CPPT, de onde podemos concluir que a prova dos pressupostos para a dispensa de prestação da garantia incumbe ao executado, uma vez que se trata de factos constitutivos do direito que pretende ver reconhecido.

Considerando o exposto, o benefício da isenção fica dependente de dois pressupostos, a provar pelo Requerente, em alternativa: (i) existência de prejuízo irreparável decorrente da prestação da garantia ou (ii) falta de bens económicos para a prestar.

Demonstrado um destes pressupostos, a AT pode deferir o pedido “desde que não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a actuação dolosa do interessado“, cabendo, agora, a prova deste facto negativo à Autoridade Tributária.

Começando pela questão do imóvel destinado a habitação própria, a AT entendeu que o mesmo é suscetível de penhora podendo ser oferecido em garantia e que só após a constituição desta se pode aferir da sua suficiência.

O Executado, por seu turno, furta-se à oneração do imóvel com fundamento em que o mesmo tem registadas duas hipotecas voluntárias cujas dívidas garantidas ascendem a € 213.527,76, valor que ultrapassa o VPT do imóvel que é tão só de € 156.813,92, daí que, no seu entender, não pode revestir qualquer garantia idónea.

A MMª juiz entendeu que o OEF não poderia indeferir a dispensa de prestação de garantia com fundamento na existência de tal imóvel, uma vez que “legalmente conferida a proteção da casa morada de família, poderá eventualmente o executado, se assim o entender, abrir mão dela. Mas não pode ser coagido pela Administração Tributária a prescindir dessa garantia, nem a sua recusa em dela prescindir pode constituir fundamento de indeferimento de pedido de dispensa de prestação de garantia”.

Todavia, devemos notar que o imóvel destinado a habitação própria do Executado é um bem suscetível de penhora (cfr. art. 219º/5 CPPT), embora a respetiva venda apenas possa ocorrer nas condições previstas no art. 244º CPPT. Como tal,  poderá também ser oferecido em garantia se o interessado nisso tiver interesse.

Por isso, não acompanhamos totalmente a argumentação da MMª juiz quando afirma que o Executado  não pode ser coagido pela Administração Tributária a prescindir dessa garantia. Na verdade, não há qualquer coação sobre o Executado para prescindir da garantia legal (impedimento legal de venda do imóvel, exceto perante requerimento do Executado nesse sentido: cfr. art. 244º/6 CPPT) que apenas oferece em garantia o que entende.

Dito isto, também estamos em crer que perante os ónus que sobre ele recaem, a garantia que o mesmo poderá constituir é, de facto, reduzida e, se desacompanhada da declaração de renúncia prevista no art. 244º/6 CPPT, não tem mesmo qualquer idoneidade para o efeito[1].  

Por outro lado, o Executado juntou documento emitido pelo Banco B.... segundo o qual não estão reunidas as condições para aprovação do crédito solicitado, sem que  tenha junto documento comprovativo do montante solicitado (cfr. factos provados n.º 13).

A MMª juiz contudo, entendeu não existirem motivos “...para acreditar que a Reclamante tenha apresentado um qualquer pedido de prestação de garantia não relacionado com o processo de execução fiscal no âmbito do qual foi requerida a dispensa de prestação de garantia, não existem motivos para duvidar da legitimidade do documento junto para comprovar nos autos de execução fiscal a impossibilidade de obter uma garantia bancária por forma a garantir a dívida exequenda e acrescido e assim lograr a suspensão da execução”.

Com o devido respeito, não acompanhamos a douta sentença nesta ilação. O documento junto pelo Executado/Requerente comprova que o “crédito Assinatura Garantia Bancária” não foi aprovado, mas não indica, nem é possível extrair do documento, qual o montante e os termos em que foi pedido. E mesmo depois de ter sido notificado do despacho que indeferiu o pedido e dos seus fundamentos, o Executado/Requerente não juntou documento que comprovasse o montante e os termos em que foi solicitado ao Banco. 

Diz o Reclamante que do teor da declaração resulta que o Banco não emite qualquer garantia ao reclamante independentemente do valor (petição inicial, itálico nosso). Porém, sdr, não nos parece que tal conclusão possa ser extraída, com um mínimo de propriedade, do teor da informação comunicada pelo Banco ao Executado.

Daí que atendendo ao encargo probatório que recai sobre o Requerente não acompanhamos a conclusão extraída pela MMª juiz e apenas podemos concluir não se encontrar devidamente comprovada a impossibilidade do Requerente obter garantia bancária para garantir a dívida exequenda.

Mas há mais. A AT considerou que o Executado dispunha de um rendimento líquido mensal de € 136.811,72 depois de abatidas todas as despesas fixas ao valor anual auferido. Porém, a MMª juiz tomando em consideração os encargos mensais que o Reclamante diz suportar identificou um rendimento disponível “na ordem dos € 6.700,00 mensais”, o que equivale ao montante disponível anual de 80 400,00 para uma garantia a prestar de € 26.555,55.

Ou seja, mesmo considerando todas as despesas que o Executado diz suportar, no final, o rendimento disponível é de € 80 400,00 (anuais) enquanto o valor da garantia a prestar é de € 26.555,55.

Esta desproporção entre o rendimento e o encargo revela claramente –a nosso ver, pelo menos - que o Executado não demonstrou a impossibilidade de obter garantia idónea para suspender a dívida exequenda e acrescido nem impossibilidade de prestar nenhuma das outras garantias legalmente admissíveis (cfr. art. 199º/1 CPPT).

Assim se concluindo que a sentença deve ser confirmada com a presente fundamentação.

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAS em negar provimento ao recurso e com a presente fundamentação confirmar a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 17 de setembro de 2020.

(Mário Rebelo)



(Patrícia Manuel Pires)



(Susana Moniz Barreto)

_____________________


[1]Ac. do STA n.º  01291/18.6BEPRT de 24-10-2018 Sumário: I - Não faz sentido apreciar da idoneidade da garantia oferecida, quando consistente na penhora da casa de morada de família, se à partida não tiver havido renúncia ao direito a que se refere o nº 6 do artº 244º do CPPT, introduzido pela Lei 13/2016 de 23 de Maio, pois que o bem não sendo vendável não tem qualquer valor económico e, assim sendo, nunca poderá ter idoneidade para servir de garantia, pelo que o trabalho de aferir da mesma é despiciendo e inútil.