Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07622/14
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:10/01/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:I.R.C.
REGIME SIMPLIFICADO DE DETERMINAÇÃO DO LUCRO TRIBUTÁVEL.
ARTº.53, DO C.I.R.C., NA REDACÇÃO RESULTANTE DA LEI 60-A/2005, DE 30/12.
OPÇÃO INICIAL DO SUJEITO PASSIVO PELO REGIME GERAL.
Sumário:1. O regime simplificado de determinação do lucro tributável em sede de I.R.C. encontra consagração no artº.53, do C.I.R.C., e foi introduzido no sistema fiscal pela Lei que procedeu à reforma da tributação dos rendimentos (Lei 30-G/2000, de 29/12). Este regime consiste numa forma de determinação do rendimento a tributar, obtido por pessoas colectivas residentes em território português que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, sujeitas ao regime regra de tributação em I.R.C. e cuja actividade empresarial seja de pequena dimensão, ou seja, cujos proveitos, no exercício anterior, não hajam excedido o valor de € 149.639,37, mais não tendo optado pelo regime normal de determinação do lucro tributável baseado na contabilidade organizada, o qual está previsto no artº.17 e seg. do C.I.R.C. O rendimento a tributar resulta da aplicação de determinados coeficientes aos proveitos (vendas, prestação de serviços e outros) obtidos pelas entidades às quais seja aplicável. A lei apenas presume os custos, aceitando, em princípio, como reais os proveitos apurados pelo contribuinte. O regime simplificado dispensa, pois, o registo e comprovação dos custos suportados, que são presumidos em função dos proveitos, introduzindo uma considerável simplificação no plano das obrigações acessórias dos sujeitos passivos.

2. As empresas são sempre obrigadas a dispor de contabilidade organizada (cfr.artº.115, nº.1, do C.I.R.C.), só tendo sentido que, por regra e como sistema base, o lucro seja apurado com base no regime de determinação do lucro real, o qual resulta de imperativos constitucionais (cfr.artº.104, nº.2, da C.R.Portuguesa), em virtude do que se deve admitir que apenas por verdadeira, consciente e formalizada opção se aplique o regime simplificado (de forma secundária, portanto). Pelo que, desde logo se conclui que o sistema simplificado de tributação somente se deve considerar constitucional se revestir cariz optativo, porque de outra forma violaria o dito princípio da tributação segundo o rendimento real, previsto no artº.104, nº.2, da C.R.Portuguesa. Portanto, a opção pelo regime simplificado deve sempre pertencer ao sujeito passivo de imposto.

3. De acordo com o artº.53, do C.I.R.C., na redacção resultante da Lei 60-A/2005, de 30/12, pode o aplicador do direito chegar à conclusão que a opção efectuada pelo contribuinte na declaração de início de actividade pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável releva para o período de três exercícios, atento o disposto nos nºs.7 e 8 do preceito.

4. Da exegese da citada norma pode concluir-se que, verificando-se uma expressa opção pelo regime geral do sujeito passivo, esta mantém-se válida por um período de três exercícios, susceptível de renovação e só a inclusão automática no regime geral é que não se encontra sujeita àquela regra de validade por três exercícios, cessando logo que se verifiquem os pressupostos legais para a aplicação do regime simplificado.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
X
O DIRECTOR-GERAL DOS IMPOSTOS deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.80 a 88 do presente processo, através da qual julgou totalmente procedente a presente acção administrativa especial intentada pelo recorrido, "S……….. - Sociedade ……………, L.da.", visando acto administrativo em matéria tributária que consistiu no indeferimento de pedido de reenquadramento no regime geral de tributação em sede de I.R.C. e a partir do exercício de 2008.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.106 a 108 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1- A douta Sentença recorrida errou na sua fundamentação, porque;
2-Na sua declaração de início de actividade, a recorrida optou expressamente por ficar enquadrada no regime geral de tributação em I.R.C. No entanto e porque durante o primeiro exercício não obteve lucros e nada comunicou, teve de transitar, ope legis (n° 1 do art. 53 do CIRC, por remissão do seu n° 9), para o regime simplificado, pelo que a mesma ficou enquadrada no regime de tributação simplificada nos três exercícios seguintes;
3-Ora, a única forma de impedir esse enquadramento imposto por lei e para ficar de novo enquadrada no regime geral, a recorrida teria de lançar mão do mecanismo previsto na alínea b), do n° 7, do art. 53, do CIRC, assente na entrega, até ao fim de Março de 2008, da declaração de alterações, pois só assim ficaria de novo enquadrada no regime geral;
4-No entanto e porque a recorrida não se utilizou dos mecanismos legais referidos no número anterior, a lei impunha-lhe, obrigatoriamente, o enquadramento no regime simplificado a partir do exercício de 2008;
5-Ao fim e ao cabo, tudo se resume a uma diferença de interpretação e aplicação das regras legais directamente aplicáveis. Assim, o entendimento do recorrente é o que consta na conclusão anterior, sendo o do M.mo Juiz "a quo" diametralmente oposto;
6-Em face do exposto, deverá revogar-se totalmente a sentença recorrida, porque carente, em absoluto, de qualquer apoio legal e, em consequência, dar-se absoluta razão ao entendimento da Administração Tributária, nos termos e condições expressos nos nºs.2 a 4 supra.
X
Contra-alegou o recorrido (cfr.fls.115 a 122 dos autos), o qual pugna pela confirmação do julgado e termina estruturando as seguintes Conclusões:
1-O recorrente vem interpor recurso da decisão proferida pelo Tribunal "a quo", alegando que, porque a recorrida não se utilizou dos mecanismos legais referidos, a lei impunha-lhe, obrigatoriamente, o enquadramento no regime simplificado a partir do exercício de 2008;
2-Da matéria considerada provada apenas se poderá concluir que a ora recorrida cumpriu todas as obrigações legais para o respetivo enquadramento no regime geral de tributação em sede de IRC, para o exercício de 2008;
3-O Tribunal "a quo" deu como provado, designadamente, que:
a) Em 4/6/2007, a A. procedeu à entrega da declaração de início de atividade;
b) Naquela declaração procedeu à opção pelo regime geral de tributação em sede de IRC, tendo assinalado no respetivo quadro 19 a opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável em sede deste imposto;
c) O volume total de proveitos correspondente ao primeiro exercício tributável de 2007 não ultrapassou o montante de € 149.639,37;
d) A Administração Fiscal promoveu a alteração do enquadramento da A., para efeitos da determinação do seu lucro tributável no exercício seguinte (2008), tendo-a enquadrado no regime simplificado de tributação;
4-Nos termos do disposto no art.° 53 do Código do IRC, é permitido aos sujeitos passivos optar pelo apuramento do lucro tributável de acordo com as regras definidas para o regime simplificado de tributação;
5-De acordo com o disposto no n.° 1 daquele art.° 53, o regime simplificado de tributação é aplicado aos sujeitos passivos de IRC que satisfaçam cumulativamente os seguintes requisitos:
a) exerçam a título principal uma actividade comercial, industrial ou agrícola;
b) não estejam isentos de IRC nem sujeitos a algum regime especial de tributação;
c) não estejam obrigados à revisão legal de contas;
d) apresentem no exercício anterior ao da aplicação do regime um volume total de proveitos inferior a € 149.639,37;
e) não optem pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável;
6-No exercício do início de atividade, o enquadramento no regime simplificado faz-se, verificados os demais pressupostos, em conformidade com o valor total anual de proveitos estimado, constante da declaração de início de atividade, caso não seja exercida a opção a que se refere o n.° 1 do art.° 53 do Código do IRC, ou seja, a opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável;
7-A opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável deve ser formalizada:
a) na declaração de início de actividade;
b) na declaração de alterações, até ao fim do 3.° mês do período de tributação do início da aplicação do regime;
8-Aquela opção é válida por um período de três exercícios;
9-No caso da ora recorrida, foi feita aquela opção na declaração de início de atividade, no local respetivo (ou seja, no quadro 19), foi estimado o volume total anual de proveitos, foi indicado que possui contabilidade organizada e foi identificado o respetivo técnico oficial de contas;
10-Tendo optado pelo regime geral de determinação do lucro tributável na declaração de início de atividade, e sendo válida essa opção, por um período de três exercícios, a recorrida não pode deixar de estar enquadrada naquele regime no exercício de 2008;
11-Pelo que o ato de indeferimento do requerimento apresentado pela recorrida não pode deixar de ser considerado ilegal, face ao disposto no art.° 53 do Código do IRC;
12-Considerando a prova produzida, bem como o direito aplicável à questão em apreço, a decisão proferida pelo Tribunal "a quo" não poderia ser outra que não a procedência da ação e, em consequência, condenar a entidade demandada a enquadrar a A. no regime geral de determinação do lucro tributável no exercício de 2008;
13-Termos em que deve ser julgado improcedente o presente recurso, mantendo-se a decisão recorrida, fazendo assim V/ Exas. a COSTUMADA JUSTIÇA!
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.136 e 137 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.83 a 86 dos autos - numeração nossa):
1-Em 4/6/2007, a autora procedeu à entrega da declaração de início de actividade (cfr.documento junto a fls.15 a 18 dos presentes autos);
2-Na declaração a que se refere o número anterior, procedeu à opção pelo regime geral de tributação em sede de IRC, tendo assinalado no respectivo quadro 19 (cujo texto é "Reunindo os pressupostos de inclusão no regime simplificado de tributação previsto no [...] art° 53.° do Código do IRC, assinale:") a opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável, em sede deste imposto (cfr.documento junto a fls.15 a 18 dos presentes autos);
3-O volume total anual de vendas estimado era de € 4.230.000,00 (cfr.documento junto a fls.15 a 18 dos presentes autos);
4-No entanto, o volume total de proveitos correspondente ao primeiro exercício tributável de 2007, não ultrapassou o montante de € 149.639,37 (cfr.documento junto a fls.19 a 22 dos presentes autos);
5-A Administração Fiscal promoveu a alteração do enquadramento da autora, para efeitos da determinação do seu lucro tributável no exercício seguinte (2008), tendo-a enquadrado no regime simplificado de tributação (cfr.documento junto a fls.23 dos presentes autos; documento junto a fls.1 a 4 do processo instrutor apenso);
6-Não se conformando com aquele enquadramento no regime simplificado, a autora apresentou um requerimento, através do qual pedia a alteração do seu enquadramento para o regime geral de tributação, face à opção efectuada na declaração de inscrição no registo (cfr.documento junto a fls.14 dos presentes autos);
7-Pelo ofício 3084, de 18/02/2009, o Chefe de Divisão da Direcção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas indeferiu o requerimento a que se refere o número anterior, nos termos seguintes (cfr.documento junto a fls.10 a13 dos presentes autos):
"(...)
Relativamente ao vosso pedido acima identificado, no uso de competências subdelegadas (Despacho publicado no Diário da República II Série nº.38 de 2008-02-22), informa-se que o mesmo é indeferido por ausência de base legal, considerando o seguinte:
1. O sujeito passivo, declarou o de início de actividade em 2007-06-04 e indicou para efeitos de enquadramento em IRC, um volume total anual de proveitos estimados superior a € 149.639,37 (30.000 contos), tendo ficado enquadrado no regime geral por imposição legal.
2. Tendo ficado enquadrado no regime simplificado de determinação do lucro tributável nos exercícios de 2008, 2009 e 2010 o sujeito passivo vem solicitar o reenquadramento dos referidos exercícios no regime geral de determinação do lucro tributável.
3. Em sede de IRC, de acordo com o n.° 1 do art.º 53 do Código do IRC, revisto e aprovado pelo DL 198/2001, de 3 de Julho, ficam abrangidos pelo regime simplificado de determinação do lucro tributável os sujeitos passivos que reúnam as seguintes condições:
a) Exerçam, a título principal, actividade comercial, industrial ou agrícola;
b) Não estejam isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação (transparência fiscal, com excepção das sociedades de profissionais expressamente abrangidas pelo regime simplificado, nos termos do n. ° 13 do artigo acima referido e regime especial de tributação dos grupos de sociedades);
c) Não estejam obrigados à revisão legal de contas;
d) Apresentem, no exercício anterior ao da aplicação do regime, um volume total anual de proveitos inferior ou igual a 149 639,37 euros;
e) Não optem pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável.
4. A opção pela aplicação do regime geral deve, de acordo com o n. ° 7 do art. ° 53° do CIRC, ser formalizada:
a) Na declaração de início de actividade;
b) Na declaração de alterações referida nos artigos 110 e 111 do Código do IRC, até ao fim do mês de Março, tendo sido aberta uma excepção relativamente ao exercício de 2001, em que o prazo foi prorrogado até ao final do mês de Junho, por despacho Ministerial, de 13 de Fevereiro.
5. Nos termos do n.° 2 do art.° 53° do CIRC, no exercício do início de actividade, o enquadramento do sujeito passivo num dado regime de determinação do lucro tributável é efectuado em conformidade com o valor total anual de proveitos estimado, constante da respectiva declaração de início de actividade. Assim, nestas situações, a indicação da opção pelo regime geral apenas será válida se o sujeito passivo reunir todos os pressupostos referidos no n.° 1 do art. ° 53 do CIRC, nomeadamente se o valor total anual de proveitos estimado for inferior ou igual a € 149.639,37. No caso daquele valor estimado ser superior ao limite legal, o sujeito passivo fica enquadrado no regime geral de determinação do lucro tributável, não por opção, mas por obrigação legal.
6. Nos termos do n.° 1 do art° 53 do CIRC, quando o enquadramento no regime geral de determinação do lucro tributável resultar de imposição legal (e não de opção legalmente válida), o enquadramento no exercício seguinte será efectuado tendo em conta o volume de proveitos efectivo obtido no exercício imediatamente anterior.
7. O valor total anual de proveitos efectivamente obtido pelo sujeito passivo no exercício de 2007, € 0,00 ficou aquém da estimativa efectuada para esse exercício e abaixo do limite legal estabelecido de € 149.639,37, facto que, nos termos do nº. 1 do art.° 53 do CIRC, implicou a alteração de enquadramento do sujeito passivo para o regime simplificado de determinação do lucro tributável a partir do exercício de 2007 e por três exercícios consecutivos (cf. Redacção do n. ° 9 do art. ° 53 do CIRC), face à ausência de opção pelo regime geral efectuada no prazo e termos legais.
8. Com efeito, e querendo optar pelo regime geral de determinação do lucro tributável, o sujeito passivo deveria tê-lo feito nos termos da al.b) do n.° 7 do art° 53 CIRC, através da entrega de declaração de alterações até ao fim do mês de Março de 2008, o que não se verificou, sendo considerados legalmente irrelevantes os fundamentos invocados pelo sujeito passivo.
9. Nos termos do n.°10 do art° 53 do Código do IRC, cessa a aplicação do regime simplificado quando o limite do total anual de proveitos a que se refere o n.° 1 for ultrapassado em dois exercícios consecutivos ou se o for num único exercício em montante superior a 25% desse limite, caso em que o regime geral de determinação do lucro tributável se aplica, por obrigação legal, no exercício seguinte ao da verificação de qualquer destes factos. Mais se informa, que enquanto o enquadramento no regime geral resultar de obrigação legal, o enquadramento em cada exercício subsequente terá de ser efectuado anualmente, tendo por base o volume de proveitos efectivo obtido no exercício anterior.
10. Assim se conclui que o requerente ficou enquadrado no regime geral por imposição legal no exercício de 2007 e no regime simplificado a partir do exercício de 2008, por ausência de opção para o outro regime.
11. Mais se informa que, nos termos do art. 72 da Lei n° 64-A/2008, de 31 de Dezembro, (Lei que aprovou o OE para 2009), por estar abrangido no regime simplificado no exercício de 2009, poderá renunciar a este regime na declaração periódica de rendimentos referente a este exercício, bastando assinalar, para o efeito, o regime geral de determinação do lucro tributável, ou manter-se no regime simplificado até ao final do período de três exercícios ainda a decorrer, excepto se deixarem de se verificar os respectivos pressupostos ou ocorrer alguma das situações previstas no nº 10 do art. 53 do Código do IRC, caso em que cessa a aplicação deste regime nos termos aí contemplados.
12. Considerando que apenas são apreciados factos e argumentos invocados pelo sujeito passivo e que a proposta de decisão decorre da mera interpretação das normas legais aplicáveis ao caso, às quais os Serviços se encontram estritamente vinculados, é de dispensar a audição do interessado nos termos da al. a) do ponto 3 da Circular da DGCI nº 13/99, de 8 de Julho, em conformidade com o disposto na al. b) do n. ° 4 do artigo 68 da Lei Geral Tributária (LGT).
(...)";
8-A petição inicial que originou os presentes autos foi apresentada em 21/05/2009 (cfr.data de envio constante de fls.2 dos presentes autos).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Para a decisão da causa, sem prejuízo das conclusões ou alegações de matéria de direito produzidas, de relevante, nada mais se provou…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…Todos os factos têm por base probatória, o exame dos documentos referidos em cada ponto, o processo administrativo e o acordo das partes…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida considerou, em síntese, julgar totalmente procedente a presente acção administrativa especial e, consequentemente, condenou a Entidade Demandada a enquadrar a A. no regime geral de determinação do lucro tributável no exercício de 2008.
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Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O apelante discorda do decidido aduzindo, em síntese e conforme supra se alude, que na sua declaração de início de actividade a recorrida optou, expressamente, por ficar enquadrada no regime geral de tributação em I.R.C. No entanto e porque durante o primeiro exercício não obteve lucros e nada comunicou, teve de transitar, ope legis (nº.1 do artº.53, do C.I.R.C., por remissão do seu nº.9 do mesmo preceito), para o regime simplificado, pelo que a mesma ficou enquadrada no regime de tributação simplificada nos três exercícios seguintes. Que a única forma de impedir esse enquadramento imposto por lei e para ficar de novo enquadrada no regime geral, a recorrida teria de lançar mão do mecanismo previsto na alínea b), do nº.7, do artº.53, do C.I.R.C., assente na entrega, até ao fim de Março de 2008, da declaração de alterações, pois só assim ficaria de novo enquadrada no regime geral. No entanto e porque a recorrida não se utilizou dos mecanismos legais referidos, a lei impunha-lhe, obrigatoriamente, o enquadramento no regime simplificado a partir do exercício de 2008. Que tudo se resume a uma diferença de interpretação e aplicação das regras legais directamente aplicáveis ao caso concreto (cfr.conclusões 1 a 5 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
O regime simplificado de determinação do lucro tributável em sede de I.R.C. encontra consagração no artº.53, do C.I.R.C., e foi introduzido no sistema fiscal pelo diploma legal que procedeu à reforma da tributação dos rendimentos (Lei 30-G/2000, de 29/12). Este regime consiste numa forma de determinação do rendimento a tributar, obtido por pessoas colectivas residentes em território português que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, sujeitas ao regime regra de tributação em I.R.C. e cuja actividade empresarial seja de pequena dimensão. Por outras palavras, cujos proveitos, no exercício anterior, não hajam excedido o valor de € 149.639,37, mais não tendo optado pelo regime normal de determinação do lucro tributável baseado na contabilidade organizada, o qual está previsto no artº.17 e seg. do C.I.R.C. O rendimento a tributar resulta da aplicação de determinados coeficientes aos proveitos (vendas, prestação de serviços e outros) obtidos pelas entidades às quais seja aplicável. A lei apenas presume os custos, aceitando, em princípio, como reais os proveitos apurados pelo contribuinte.
O regime simplificado dispensa, pois, o registo e comprovação dos custos suportados, que são presumidos em função dos proveitos, introduzindo uma considerável simplificação no plano das obrigações acessórias dos sujeitos passivos (cfr.José Guilherme Xavier Basto, I.R.S. Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, pág.182 e seg.; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao I.R.C., Almedina, Novembro de 2009, pág.171 e seg.; José Carlos Gomes Santos e Susana S. Rodrigues, Regimes simplificados de tributação dos rendimentos profissionais e empresariais - objectivos, modalidades e experiências, C.T.Fiscal, nº.417, pág.131 e seg.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 6/5/2009, rec.127/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/6/2007, proc. 1639/07; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/2/2011, proc.4407/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/3/2012, proc.5287/12).
Revertendo ao caso dos autos, deve, em primeiro lugar, fazer-se a exegese da norma constante do artº.53, do C.I.R.C., na redacção resultante da Lei 60-A/2005, de 30/12, a aplicável ao caso "sub judice" (cfr.artº.12, nº.1, do C.Civil):
Artº.53
(Regime simplificado de determinação do lucro tributável)

1 - Ficam abrangidos pelo regime simplificado de determinação do lucro tributável os sujeitos passivos residentes que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, não isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação, com excepção dos que se encontrem sujeitos à revisão legal de contas, que apresentem, no exercício anterior ao da aplicação do regime, um volume total anual de proveitos não superior a 30.000.000$ (€ 149.639,37) e que não optem pelo regime de determinação do lucro tributável previsto na secção II do presente capítulo.
2 - No exercício do início de actividade, o enquadramento no regime simplificado faz-se, verificados os demais pressupostos, em conformidade com o valor total anual de proveitos estimado, constante da declaração de início de actividade, caso não seja exercida a opção a que se refere o número anterior.
3 - O apuramento do lucro tributável resulta da aplicação de indicadores de base técnico-científica definidos para os diferentes sectores da actividade económica, os quais devem ser utilizados à medida que venham a ser aprovados.
4 - Na ausência de indicadores de base técnico-científica ou até que estes sejam aprovados, o lucro tributável, sem prejuízo do disposto no n.º 11, é o resultante da aplicação do coeficiente de 0,20 ao valor das vendas de mercadorias e de produtos e do coeficiente de 0,45 ao valor dos restantes proveitos, com exclusão da variação de produção e dos trabalhos para a própria empresa, com o montante mínimo igual ao valor anual do salário mínimo nacional mais elevado.
5 - Em lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças são determinados os indicadores a que se refere o n.º 3 e, na ausência daqueles indicadores, são estabelecidos, pela mesma forma, critérios técnicos que, ponderando a importância relativa de concretas componentes dos custos das várias actividades empresariais e profissionais, permitam proceder à correcta subsunção dos proveitos de tais actividades às qualificações contabilísticas relevantes para a fixação do coeficiente aplicável nos termos do n.° 4.
6 - Para os efeitos do disposto no n.° 4, aplica-se aos serviços prestados no âmbito de actividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas, bem como ao montante dos subsídios destinados à exploração, o coeficiente de 0,20 aí indicado.
7 - A opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável deve ser formalizada pelos sujeitos passivos:
a) Na declaração de início de actividade;
b) Na declaração de alterações a que se referem os artigos 110° e 111 °, até ao fim do 3. ° mês do período de tributação do início da aplicação do regime.
8 - A opção referida no número anterior é válida por um período de três exercícios, findo o qual caduca, excepto se o sujeito passivo manifestar a intenção de a renovar pela forma prevista na alínea b) do número anterior.
9 - O regime simplificado de determinação do lucro tributável mantém-se, verificados os respectivos pressupostos, pelo período mínimo de três exercícios, prorrogável automaticamente por iguais períodos, salvo se o sujeito passivo comunicar, pela forma prevista na alínea b) do n. ° 7, a opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável.
10 - Cessa a aplicação do regime simplificado quando o limite do total anual de proveitos a que se refere o n.º 1 for ultrapassado em dois exercícios consecutivos ou se o for num único exercício em montante superior a 25% desse limite, caso em que o regime geral de determinação do lucro tributável se aplica a partir do exercício seguinte ao da verificação de qualquer desses factos.
(...).

Antes de mais, se dirá que é hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (cfr.artº.9, do C. Civil; artº.11, da L.G.Tributária).
Nos termos do artº.53, nº.4, do C.I.R.C., a determinação do rendimento tributável resultará da aplicação de indicadores objectivos de base técnico - científica para os diferentes sectores da actividade económica. Estes indicadores não foram ainda aprovados e na sua ausência o rendimento tributável apura-se de acordo com um regime simplificado provisório que era o resultante da aplicação dos coeficientes (regime em vigor em 2008 - cfr.artº.12, do C.Civil) de 0,20/20% ao valor de vendas de mercadorias e de produtos. Por sua vez, aos restantes rendimentos provenientes desta categoria, excluindo a variação de produção e dos trabalhos para a própria empresa, aplicava-se o coeficiente de 0,65/65% (ex:Vendas em 2008 = € 75.000,00/Rendimento tributável = € 75. 000,00 x 0,20 = 15.000,00).
Ainda de acordo com a norma sob exegese, pode o aplicador do direito chegar à conclusão que a opção efectuada pelo contribuinte na declaração de início de actividade pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável releva para o período de três exercícios, atento o disposto nos nºs.7 e 8 do preceito (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 21/5/2008, rec.10/08; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 14/7/2010, rec.268/10; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 5/7/2012, rec.840/11; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao I.R.C., Almedina, Novembro de 2009, pág.174).
Por outro lado, recorde-se que as empresas são sempre obrigadas a dispor de contabilidade organizada (cfr.artº.115, nº.1, do C.I.R.C.), só tendo sentido que, por regra e como sistema base, o lucro seja apurado com base no regime de determinação do lucro real, o qual resulta de imperativos constitucionais (cfr.artº.104, nº.2, da C.R.Portuguesa), em virtude do que se deve admitir que apenas por verdadeira, consciente e formalizada opção se aplique o regime simplificado (de forma secundária portanto). Pelo que, desde logo, se conclui que o sistema simplificado de tributação somente se deve considerar constitucional se revestir cariz optativo, porque de outra forma violaria o dito princípio da tributação segundo o rendimento real, previsto no artº.104, nº.2, da C.R. Portuguesa. Portanto, a opção pelo regime simplificado deve sempre pertencer ao sujeito passivo de imposto (cfr.J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 3ª. edição, 2007, pág.328; Luís Cupertino, O Regime Simplificado no Imposto sobre o Rendimento: Enquadramento e Questões, Fisco, nº.119/121, 2005, pág.145 e seg.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 23/6/2010, rec.1032/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/3/2012, proc.5287/12).
Em síntese, da exegese da norma pode concluir-se que, verificando-se uma expressa opção pelo regime geral do sujeito passivo, esta mantém-se válida por um período de três exercícios, susceptível de renovação e só a inclusão automática no regime geral é que não se encontra sujeita àquela regra de validade por três exercícios, cessando logo que se verifiquem os pressupostos legais para a aplicação do regime simplificado.
Revertendo ao caso dos autos, tendo a sociedade recorrida efectuado a opção pelo regime geral na declaração de início de actividade (em 2007 - cfr.nºs.1 e 2 da matéria de facto provada), tal escolha mantém-se válida para o ano de 2008.
Em conclusão, tendo por base a declaração de início de actividade identificada nos nºs.1 e 2 da matéria de facto provada e o disposto no artº.53, nº.8, do C.I.R.C., a Fazenda Pública deveria ter enquadrado a sociedade "S………. - Sociedade ………….., L.da.", no ano fiscal de 2008, no regime geral de tributação em sede de I.R.C., levando em consideração tudo o explanado supra.
Rematando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o recurso sob exame e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 1 de Outubro de 2014


(Joaquim Condesso - Relator)
(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)

(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)