Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:236/19.0BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:07/09/2020
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:NOTIFICAÇÃO ELECTRÓNICA DE SENTENÇA.
Sumário:i) A partir de 16.11.2019 é obrigatória a tramitação electrónica dos processos administrativos e fiscais, no sitaf, nos termos do artigo 24.º/2, do CPTA.
ii) A imposição legal da tramitação electónica dos processos tributários tem em vista facilitar o acesso das partes e dos seus advogados aos autos do processo.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão

I- Relatório

C................, melhor identificado nos autos, veio apresentar reclamação, nos termos dos artigos 276.º, do CPPT, contra o acto do Chefe do Serviço de Finanças de Palmela que procedeu à penhora de saldos bancários no âmbito do processo de execução fiscal nº……………., que correu termos no Serviço de Finanças de Sesimbra, no montante de € 160.740,00.

O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida a fls. 197 e ss., (numeração do SITAF), datada de 27 de Novembro de 2019, julgou improcedente a presente reclamação.

Por meio de requerimento de 01.03.2020, o reclamante suscitou perante o tribunal recorrido a nulidade da notificação electrónica da sentença, alegando que a mesma é ilegal e ineficaz, requerendo que seja promovida nova notificação aos mandatários e ao reclamante, que permita a este beneficiar de prazo de recurso quanto à sentença proferida nos autos de que não tomou conhecimento em tempo útil.

Por meio de despacho de 10.03.2020, o tribunal recorrido indeferiu o pedido de declaração de nulidade da notificação em apreço. Não se conformando com a decisão proferida, o reclamante interpôs recurso jurisdicional. Alega nos termos seguintes:

«1. Este processo é de 2019 e o seu curso processou-se regularmente sempre ao abrigo da Portaria nº 380/2017, de 19 de Dezembro, com a redacção que lhe foi introduzida pela Portaria nº 267/2018, de 20 de Setembro, datando as alterações mais drásticas em termos de prática obrigatória de actos de Mandatário via SITAF da Portaria n.º 4/2020, de 13 de Janeiro.

2. Com efeito, o processo teve início em 15.03.2019, tendo decorrido ao longo de todo o ano de 2019.

3. Foi assim neste contexto legal que as comunicações nos autos se foram processando sempre com a utilização dos meios comuns de registo dos correios e fax ao longo desse ano de 2019, por isso que neste o mandatário do recorrente não só nunca se inscreveu para o efeito na plataforma informática SITAF, como em momento algum desse ano sequer pretendeu vir a fazê-lo (cfr. artigo 22º daquela Portaria nº 380/2017 e com a redacção da 267/2018), sendo diversos os actos processuais praticados via telefax e posterior envio de originais por correio registado, e tendo as notificações (com excepção da que diz respeito à da Sentença Final) sido regularmente remetidas ao Mandatário por via postal registada.

4. Ademais, frise-se que nunca os actos processuais praticados nestes exactos moldes supra descritos conduziram a algum reparo, ou desentranhamento, o que aliás redundaria na nulidade de todo o processado e numa impossibilidade de apreciação e decisão de mérito da causa submetida a juízo!

5. A sentença foi proferida a 27 de Novembro e transmitida electronicamente dois dias depois, mas naturalmente o mandatário nessa ocasião não a recebeu nem soube de nada a esse propósito.

6. A 12 de Fevereiro já de 2020 e imprevistamente, o Banco M…………. transmitiu ao recorrente que, em cumprimento do ordenado pelo respectivo órgão de execução no processo fiscal ………….., considerava penhorada à ordem dessa entidade a conta de valores mobiliários com o número …………………. e com a especificação de ACÇÕES/ORDINÁRIAS/.................., número de títulos ………………, no montante de 93.296,20 euros.

7. Compreensivelmente alarmado, o recorrente dirigiu-se logo ao Serviço de Finanças de Sesimbra, para apurar qual o motivo dessa penhora, pois tinha sido informado exactamente em sentido contrário da suspensão de tal penhora.

8. Foi então e só então que logicamente se sentiu impelido a outorgar substabelecimento com reserva numa Colega já equipada com acesso ao SITAF e foi esta quem assim lhe comunicou que efectivamente a sentença de 27 de Novembro de 2019 seguira electronicamente 2 dias depois.

9. Bruscamente assim surpreendido e indignado com aquela violação frontal do seu direito de defesa e da sua mais legítima expectativa a propósito, por isso que o falado nº 2 do artigo 22º da Portaria nº 380/2017, na versão da 267/2018, só veio a ser revogado pela Portaria nº 4/2020, de 13 de Janeiro e estava portanto em pleno vigor ainda naquele final de 2019, o recorrente tratou de imediato de formular a respectiva reclamação com documentos alusivos e segundo o nº 1 do artigo 199º do Código de Processo Civil, aqui aplicável por força da alínea e) do artigo 2º do CPPT.

10. Na verdade, aquela deslocada notificação electrónica de 29 de Novembro de 2019 é um acto ineficaz, inválido e nulo, para não dizer inexistente, logo incapaz de produzir quaisquer efeitos, por isso que constitui uma séria irregularidade contra norma legal inequívoca e objectiva e na prática equivale totalmente no fundo à omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreve indubitavelmente e assim desencadeou uma influência nociva na decisão e na marcha dos autos (v. nº 1 do artigo 195º ibidem ).

11. Pelo que, é inválida tal modalidade de notificação, à data em que sucedeu, não sendo passível de produzir efeitos na esfera jurídica do Reclamante, sob pena de se ter por violado o artigo 20º da CRP, limitando-se as garantias de defesa do Reclamante.

12. Pelo que, é ostensivamente irregular o acto de notificação da Sentença, devendo a mesma notificação ser anulada e substituída por nova notificação, permitindo ao Reclamante vir exercer a sua defesa futura manifestando a sua reacção à sentença com eventual recurso.

13. Destarte, em face da ineficácia e ilegalidade da notificação electrónica do Mandatário do Reclamante atinente à Sentença proferida nos autos deve a mesma ser anulada por ilegal, inválida e in totum ineficaz, considerando-se não precludido o prazo para recurso ordinário, devendo haver lugar a nova notificação, requerendo-se sejam as futuras notificações - actualmente por via electrónica - remetidas, igualmente ao ora Reclamante e à co-Mandatária do Reclamante detentora de poderes forenses por via de substabelecimento do primeiro Mandatário (com reserva do próprio Mandato).

14. Ora, sendo a notificação um acto processual prescrito legalmente, e mostrando-se omissa (por ineficaz e ilegal no caso vertente, configura uma nulidade, porquanto estamos perante uma irregularidade que é susceptível de influir no destino da causa, como se afigura ser o caso a todas as luzes - artigo 195º n.º 1 do CPC, aplicado subsidiariamente ex-vi artigo 2º alínea e) do CPPT.

15. O Reclamante vem, pois, legal e tempestivamente arguir tal nulidade da notificação da Sentença operada indevidamente por via electrónica, sendo a mesma ineficaz, devendo a mesma ser anulada e substituída por nova notificação da Sentença proferida, anulando-se os actos processuais subsequentes a tal notificação - artigo 199º n.º 1 do CPC, ex vi artigo 2º alínea e) do CPPT.

16. Aquela reclamação foi apresentada no prazo legal certo do mesmo nº 1 do artigo 199º e a senhora juíza recorrida apreciou-a nos termos do nº 3 do artigo seguinte.

17. Fê-lo a 10 de Março de 2020 e incompreensivelmente indeferiu essa reclamação que notoriamente deve ser deferida, por despacho que constitui o objecto do presente recurso e que só pode ser atribuído a decerto involuntária imponderação ou inadvertência quanto às leitura e interpretação claras daquele nº 2 do artigo 22º da Portaria com o nº 380/2017, conforme a Portaria nº 267/2018 e que naquele final de Novembro de 2019 era plenamente vigente.

18. De fato e ao longo desse ano de 2019, nunca o mandatário apresentou peça alguma por transmissão electrónica de dados e também nunca declarou no devido sistema informático de suporte pretender ser notificado apenas por tal via.

19. Esta tese justa do recorrente já mereceu pleno acolhimento textual com aplicação concreta v.g. no magnífico acórdão da 2 a Secção do STA lavrado pelo Senhor Conselheiro Relator Francisco Rothes no processo com o número 02259/06.0BEPRT e curiosamente datado justamente também de 27 de Novembro de 2019.

20. A citação a seguir reproduzida é-o expressis verbis desse estupendo aresto do Supremo Tribunal, estabelecendo os casos de transmissão electrónica de dados dessa época.

a) - nos processos em que o mandatário (...) tenha apresentado uma peça processual por transmissão electrónica de dados ou

b) - quando o mandatário (...) tenha declarado, no sistema informático de suporte à actividade dos tribunais administrativos e fiscais, que pretende ser notificado apenas por transmissão electrónica de dados em todos ou em alguns dos processos respectivos e em que esteja registado no sistema informático como mandatário.

21. Segundo o nº 1 do artigo 131º do Código de Processo e tendo em vista o fim a atingir, os actos processuais devem ser simples, sendo até ilícitas inutilidades (artigo anterior ) e ainda, conhecendo-se a prevalência geral do conteúdo sobre a forma, mostram-se estipulados os princípios da cooperação ( nºs 2 e 4 do artigo 7º ), a boa-fé do artigo 8º e a correcção do artigo seguinte.

22. Ora, não se afigura que a utilização aqui de uma notificação fora da legalidade e da própria realidade, por brusco efeito de surpresa para um destinatário desprevenido, se possa subsumir a qualquer desses cânones legais.

23. Do recurso que desaguou naquele douto acórdão do STA, constam outras ideias relevantes.

24. O STA só não chegou a pronunciar-se sobre esses pensamentos de interesse ad causam e para casos análogos, por isso que entretanto já dera ganho de causa ao argumento nuclear aduzido nesse recurso e essencialmente coincidente com o do presente.

25. Na verdade e sem embargo da sua utilidade, o excessivo rigor impositivo do mecanismo tecnológico não será correcto nem proporcional, por isso que o acesso nem sempre é linear e chega a provocar um complexo procedimento de autenticação, sendo assim susceptível de criar erosão progressiva não só do conhecimento dos actos como da própria tutela jurisdicional efectiva do acesso ao direito do artigo 20º da CRP, em hipóteses como a vertente com exclusão de garantias de defesa, sendo assim conveniente moderar esta exacerbada revolução, de modo a não prejudicar nenhum direito legítimo.

26. Pelo que, nos termos do nº 2 do mencionado artigo 195º do CPC, quando um acto tenha de ser anulado anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente e sem que isso afecte os termos anteriores independentes.

Nestes termos e nos demais de direito e invocando o sábio suprimento, deve o nem por isso menos operoso Despacho de 10 de Março de 2020 ser revogado, por imponderação, inadvertência e ou a inaplicação devida dos preceitos legais objectivos acima indicados, em concreto a Portaria nº 380/2017, de 19 de Dezembro, com a redacção que lhe foi introduzida pela Portaria nº 267/2018, de 20 de Setembro, decorrendo as alterações mais drásticas em termos de prática obrigatória de actos de Mandatário via SITAF da Portaria n.º 4/2020, de 13 de Janeiro.

Destarte, pugna-se pela concessão de provimento ao vertente Recurso, sendo o Douto Despacho Recorrido considerado nulo e, consequentemente, tendo-se por não transitada e, julgado a Douta Sentença final, sendo o Despacho Recorrido substituído por outro que ordene a notificação da Douta Sentença Final, por forma a ser interposto Recurso da mesma, porquanto esta se revela in totum desfavorável à pretensão do ora Recorrente, com o que se fará a esperada e sempre acostumada J U S T I Ç A !»


X

A contraparte não proferiu contra-alegações.
X

O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, foi regularmente notificado e pronunciou-se pela procedência do recurso.

X


Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

X

II- Fundamentação.

A sentença recorrida assentou na seguinte fundamentação jurídica:

« a) Em 23/03/2018 foi proferida sentença no âmbito do Processo nº 15/187/00043 que correu termos na Comarca de Apelação de Rouen - Tribunal de Grande Instância do Havre, da qual consta ter sido o Reclamante condenado por crimes de Evasão Fiscal, nos anos de 2009, 2010 e 2011, tendo sido condenado a pagar a quantia de € 160.740,00 a título de dívida fiscal e € 98.620,00 a título de pena, tendo ainda sido autorizada uma penhora penal no montante de € 98.101,32 na conta da SCP Office Notarial de L’Estuaire (facto que se retira do doc. de fls. 31 a 34 dos autos);

b) Em 07/08/2018 foi emitido pelo Estado Francês um título executivo relativo a créditos àquele Estado, em que é indicado como executado C................, no qual é exigido o pagamento da quantia de € 160.740,00 (cfr. doc. junto a fls. 2 a 7, frente e verso, do processo executivo junto aos autos);

c) Com base no título executivo identificado no ponto anterior foi instaurado em 10/12/2018 o processo de execução fiscal nº …………… em que é executado C................ para o pagamento da quantia de € 160.740,00 (cfr. fl. De rosto do processo executivo junto aos autos);

d) Por ofício cuja data se desconhece concretamente mas posterior a 10/12/2018 foi comunicado ao Reclamante a existência do processo executivo e do montante a pagar por este no prazo de trinta dias (cfr. doc. junto a fls. 14 do processo executivo junto aos autos);

e) Do ofício identificado no ponto anterior consta o seguinte:


«imagem no original»

(cfr. doc. de fls. 9 dos autos);

f) Por ofício de 08/02/2019 foi comunicado ao Reclamante a penhora da quantia de € 166.034,01 que teve por objecto valores imobiliários e depósitos bancários (cfr. doc. junto a fls. 10 dos autos);

g) O Reclamante requereu que lhe fosse remetido o título da dívida exequenda por requerimento de 10/01/2019 e requerendo a revogação do acto de citação (cfr. doc. junto a fls. 16 do processo executivo junto aos autos);

h) Por despacho de 30/01/2019 foi indeferido o requerido (cfr. doc. de fls. 27 do processo executivo junto aos autos);

i) Em 11/02/2019 foi ao Reclamante remetido pelo M………….. um ofício informando que havia sido efectuada uma penhora no montante de € 24.451,73 sobre a conta de depósitos à ordem nº …………. (cfr. doc. de fls. 17 dos autos);

Não se provaram outros factos para além dos que constam da factualidade supra descrita.

A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.»


X

Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, com vista à apreciação do mérito do recurso, mostram-se documentadas vicissitudes processuais seguintes:
j) Em 27.11.2019, o tribunal recorrido proferiu sentença por meio da qual julgou improcedente a reclamação judicial deduzida pelo recorrente contra os actos de penhora dos saldos bancários, praticados no pef n.º……….., que corre termos no Serviço de Finanças de Sesimbra.
k) Por meio de oficio de 29.11.2019, foi dirigida notificação ao mandatário do recorrente, via SITAF, da sentença referida na alínea anterior.
l) Em 01.03.2020, o recorrente dirigiu requerimento ao tribunal recorrido, por meio do qual solicitou a declaração de nulidade da notificação electrónica da sentença, alegando que a mesma é ilegal e ineficaz, requerendo que seja promovida nova notificação aos mandatários e ao reclamante, que permita a este beneficiar de prazo de recurso quanto à sentença proferida nos autos de que não tomou conhecimento em tempo útil.
m) Por meio de despacho de 10.03.2020, o tribunal recorrido indeferiu o pedido de declaração de nulidade da notificação em apreço.

n) O teor do despacho referido na alínea anterior é o seguinte:
«De acordo com o disposto no art. 144º do CPC, aplicável ex vi art. 2o, al. e) do CPPT, todas as peças processuais devem ser entregues através de via electrónica, sendo que apenas em situações de justo impedimentos, as referidas peças podem ser apresentadas em papel ou através de correio electrónico, como determina o disposto no nº 8 do art. 144º.
Com a entrada em vigor da Portaria nº 380/2017, de 19/12/2017, em 04/01/2018 (art. 30º da Portaria), os processos fiscais passaram a ter tramitação obrigatória através da Plataforma SITAF.
Esta circunstância obriga a que os mandatários remetam, obrigatoriamente, as peças processuais através daquela plataforma, passando a ver toda a tramitação do processo e respectivas notificações efectuadas electronicamente.
Não se trata duma faculdade mas duma obrigatoriedade.
Significa isto que o Ilustre Mandatário deveria ter remetido todas as suas peças processuais por essa via e não em papel ou via correio electrónico de dados.
No caso dos autos o Ilustre Mandatário violou este comando.
No caso dos presentes autos, e uma vez que a petição inicial é apresentada no serviço de finanças por disposto no artigo 277º, nº 2 do CPPT, a mesma é remetida ao Tribunal pelo órgão de execução fiscal sendo posteriormente digitalizada, sendo que, a partir desse momento, todo o processo passa a ser tramitado electronicamente, nos termos estabelecidos na supra descrita portaria.
Significa isto que, a partir do momento em que o processo entra no Tribunal, todo o processo passa a regular-se pela portaria supra referida, sendo obrigatória para os Mandatários forenses a remessa das peças processuais via electrónica e as notificações efectuadas de acordo com o ali regulado, ou seja, todas as notificações aos mandatários passam a ser efectuadas electronicamente, em estrito cumprimento da portaria.
Sendo certo que os presentes autos tiveram toda a sua tramitação ao abrigo da Portaria nº 370/2017, estava o Ilustre Mandatário claramente obrigado ao cumprimento da mesma, bem como do disposto no artigo 144º do CPC, aplicável ex vi art. 2o, al. e) do CPPT.
Por outro lado, determina o art. 248º do CPC que as notificações aos mandatários constituídos são efectuadas por via electrónica, sendo que esta se considera efectuada no terceiro dia útil seguinte.
O incumprimento, por parte do Ilustre Mandatário do disposto nos preceitos supra citados, nenhuma relevância pode exercer na notificação electrónica efectuada pela UO deste Tribunal.
No caso dos presentes autos, ao Ilustre Mandatário foi remetida notificação electrónica da sentença proferida nos presentes autos em 29/11/2019 (cfr. fls. 207 do SITAF) pelo que a mesma se considera efectuada no dia 02/12/2019.
Nos termos do disposto no artigo 283º do CPPT o prazo para a interposição de recurso é de 15 dias, contados da notificação.
Significa isto que a sentença proferida nos autos transitou em julgado no dia 17/12/2019. // Nestes termos, indefere-se o requerido».
o) Nos actos processuais praticados pelo mandatário do recorrente nos presentes autos, e aceites como tais, foi utilizado o fax como via de comunicação – fls. 29/37, 63/75, 88/100.
p) A presente reclamação foi instaurada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada em 27.02.2019 – fls. 1 dos autos.
q) O mandatário do recorrente, Dr. F................, encontra-se registado no sitaf – sitaf
r) Os mandatários do recorrente, Dr. F................, e Dra. I................, aderiram ao sistema de notificações electrónicas em 16.11.2019 – sitaf.


X

2.2. Direito

2.2.1. Nos presentes autos, é sindicado o despacho proferido pelo tribunal recorrido que indeferiu a arguição de nulidade da notificação da sentença, referida em k), por a mesma não ter sido remetida ao mandatário do recorrente pela via que entende ser adequada no caso, a qual seria a via postal. O recorrente requer a declaração de nulidade do despacho, proferido em 10.03.2020 (alínea n), do probatório), por meio do qual o tribunal recorrido indeferiu o pedido de declaração de nulidade da notificação em apreço.

2.2.2. A questão a dirimir nos autos consiste em saber se a notificação electrónica da sentença, elevada à alínea k), é oponível ao recorrente, dado que o regime de tramitação electrónica é obrigatoriamente aplicável ao processado em exame, como sustenta o despacho impugnado, ou se a referida notificação deve ser considerada nula e ordenada a repetição da notificação, desta feita, pela via postal registada, como sustenta o recorrente.

Vejamos.

Nos termos do artigo 40.º (“Notificações aos mandatários”), n.º 1, do CPPT, «As notificações aos interessados que tenham constituído mandatário são feitas na pessoa deste da seguinte forma: // b) Nos processos judiciais tributários, nos termos previstos nas normas sobre processo nos tribunais administrativos».

Por seu turno, a Portaria n.º 380/2017, de 19 de Dezembro, veio estabelecer o regime da tramitação eletrónica dos processos nos tribunais administrativos de círculo, nos tribunais tributários, nos tribunais centrais administrativos e no Supremo Tribunal Administrativo.

No preâmbulo da Portaria referida, escreve-se, designadamente, que,
«Relativamente à assinatura de peças processuais pelos mandatários e representantes em juízo, e tendo em consideração as especiais necessidades de desenvolvimentos aplicacionais neste âmbito, é previsto que o regime da presente portaria apenas entrará em vigor no dia 15 de maio de 2018, sendo que, de modo a garantir um período para adaptação dos mandatários a esta nova solução, até dia 15 de junho poderão escolher se assinam as peças processuais nos termos ora previstos ou se não procedem a essa assinatura, aplicando-se nesses casos ainda o regime previsto na Portaria n.º 1417/2003, de 30 de dezembro».

«As notificações aos mandatários e representantes em juízo são realizadas por transmissão eletrónica de dados, nos processos em que o mandatário ou representante em juízo tenha apresentado uma peça processual por transmissão eletrónica de dados; ou quando o mandatário ou representante em juízo tenha declarado, no sistema informático de suporte à atividade dos tribunais administrativos e fiscais, que pretende ser notificado apenas por transmissão eletrónica de dados» (artigo 22.º/2, da Portaria n.º 380/2017, citada).

A Portaria n.º 380/2017, em apreço, entrou em vigor em 04.01.2018 (artigo 30.º) e as peças processuais das partes devem ser apresentadas por via do preenchimento dos formulários disponibilizados no sitaf, a partir de 15.06.2018 (artigos 5.º/3 e 4, e 28.º/2, da Portaria n.º 380/2017, citada).

Estatui o artigo 24.º do CPTA (“Processo electrónico”), aplicável ao processo tributário ex vi artigo 2.º/c), do CPPT, que,

«1 - O processo nos tribunais administrativos é um processo eletrónico, constituído por informação estruturada constante do respetivo sistema de informação e por documentos eletrónicos, sendo os atos processuais escritos praticados por via eletrónica nos termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área justiça.
2 - Os atos processuais que devam ser praticados por escrito pelas partes são apresentados em juízo por via eletrónica, nos termos definidos na portaria referida no número anterior, valendo como data da prática do ato processual a da respetiva expedição».
A presente norma entrou em vigor em 16.11.2019 e é de aplicação imediata (artigos 13.º/2 e 14.º da Lei n.º 118/2019, de 17 de Setembro). Na sequência do normativo referido, o artigo 22.º da Portaria 380/17, citada
[1], determina que: «[a]s notificações por transmissão eletrónica de dados aos mandatários e representantes em juízo são realizadas através do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais administrativos e fiscais, que assegura automaticamente a sua disponibilização e consulta na área reservada do referido sistema disponibilizada em https://www.taf.mj.pt.»

Em face do quadro normativo descrito, a questão que se suscita nos autos consiste em saber se, na presente reclamação judicial, instaurada em 27.02.2019 (alínea p), do probatório), a entrega pelas partes das peças processuais que entendam juntar aos autos deve ser realizada, de forma obrigatória, por via electrónica, o que acarreta a consequente sujeição à notificação electrónica dos actos judiciais (artigo 22.º/2, da Portaria n.º 380/2017, citada). de forma que o eventual incumprimento das regras sobre a apresentação electrónica das peças processuais por parte do mandatário do recorrente não oblitera a sua sujeição à regra da notificação electrónica dos actos judiciais (artigo 22.º/1 e 2, da Portaria n.º 380/2017, citada). O entendimento referido foi seguido pelo despacho objecto de recurso (alínea n), do probatório), o qual é objecto de censura através do presente recurso jurisdicional.

A este propósito, o STA teve ocasião de referir que «[s]e não pode considerar-se que após 1 de Janeiro de 2018 o mandatário judicial apresentou no tribunal administrativo e fiscal onde pendia a impugnação judicial uma peça processual por transmissão electrónica de dados, não pode considerar-se justificada ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do art. 22.º da Portaria n.º 380/2017, de 19 de Dezembro, conjugada com o n.º 1 do art. 28.º da mesma Portaria, a notificação do impugnante, na pessoa do seu mandatário, feita por transmissão electrónica de dados»[2].

Sucede, porém, que a presente orientação não é aplicável ao caso apreço, dado que o quadro legal foi alterado, no sentido da obrigatoriedade da tramitação dos processos judiciais administrativos e fiscais através do sitaf (artigo 24.º do CPTA “Processo electrónico”), norma que entrou em vigor em 16.11.2019 e é de aplicação imediata aos processos pendentes.

No caso em exame, o mandatário do recorrente praticou os actos processuais da parte via fax (alínea o), do probatório). Por meio de oficio de 29.11.2019, foi dirigida notificação, ao mandatário do recorrente, via sitaf, da sentença referida (alínea k). O mesmo encontra-se registado no sitaf (alínea q), tendo aderido ao sistema de notificações electrónicas em 16.11.2019 (alínea r), pelo que teve acesso à notificação em causa.

A notificação em apreço foi praticada ao abrigo dos normativos legais aplicáveis acima referidos, pelo que a mesma não enferma de qualquer vício. A sua efectividade não é posta em causa pelo recorrente.

A tutela judicial efectiva não é posta em causa pela obrigatoriedade da notificação electrónica em causa. Por um lado, o mandatário do recorrente teve acesso à mesma, por outro lado, o recorrente informa existir outra mandatária com poderes de representação “já equipada com acesso ao sitaf”. A imposição legal de tramitação electónica dos processos tributários tem em vista facilitar o acesso das partes e dos seus advogados aos autos, economizando nos meios, encurtando as distâncias, aumentando a transparência e a publicidade dos autos. Pelo que constitui medida potenciadora do acesso ao direito e aos tribunais, não se vislumbrando na mesma qualquer excesso ou desproporção.

Motivo porque se impõe confirmar o despacho sob censura, dado que o mesmo não padece de qualquer erro, ainda que com a presente fundamentação.

Em face dos dados coligidos no probatório

Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.


DISPOSITIVO

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso jurisdicional, e confirmar o despacho reclamado.

Custas pelo recorrente.

Registe.

Notifique.


(Jorge Cortês - Relator)

(1ª. Adjunta)



 (2ª. Adjunta)


__________________


[1] Alterado pela Portaria n.º 4/2020, de 13.01.
[2] Acórdão de 27.11.2019, P. 02259/06.0BEPRT