Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2269/09.6BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:12/16/2021
Relator:LINA COSTA
Descritores:PRESTAÇÕES DE DESEMPREGO,
PERÍODO DE CONCESSÃO,
PRESTAÇÃO INICIAL E ACRÉSCIMOS,
RESTITUIÇÃO PELO EMPREGADOR.
Sumário:I. No artigo 63º do Decreto-Lei nº 220/2006, de 3 de Novembro, a “totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego” refere-se ao período de concessão das prestações de desemprego a que o trabalhador tenha direito e não ao valor inicial destas sem acréscimos, com pretende a Recorrente;
II. Um beneficiário de prestações de desemprego pode vir a ter direito a mais que um período de concessão da prestação de desemprego, mas, na sequência imediata da atribuição ou reconhecimento desse direito, desconhecendo a Segurança Social se assim se verificará, o ex-empregador só é notificado para proceder ao pagamento da totalidade das prestações de desemprego relativas ao primeiro desses períodos que, necessariamente, inclui os acréscimos previstos no artigo 37º do mesmo diploma legal;
III. A Segurança Social só pode exigir da entidade patronal, ao abrigo do art.° 63° do Dec. Lei n° 220/2006, o reembolso das prestações a que o trabalhador teve efectivamente direito e não do que corresponderia à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego;
IV. O que não significa que, verificado o ilícito, a Segurança Social não possa ordenar a reposição do montante já pago ao trabalhador como ordenar que seja depositado, antecipadamente, o valor que, previsivelmente, irá ser pago e que o devedor não esteja obrigado a proceder a esse pagamento. O que não quer dizer que, nessas circunstâncias, o montante pago antecipadamente não possa ser devolvido se se constatar que o trabalhador – por qualquer razão - perdeu o direito ao subsídio e, por esse motivo, a Segurança Social cessou o seu pagamento e que o empregador não possa reivindicar essa devolução.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

L…, S.A., devidamente identificada como Autora nos autos de acção administrativa especial, que instaurou contra o Instituto da Segurança Social, IP, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional do acórdão de 10.12.2012, do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que julgou a acção parcialmente procedente, anulando o acto impugnado e absolvendo a Entidade demandada dos pedidos condenatórios formulados.
Na acção foram formulados os seguintes pedidos condenatórios:
«II. Cumulativamente, requer-se ..., nos termos do artigo 47º, nº 2 alínea a) do CPTA, se digne substituir o acto impugnado por outro que:
a) Limite, por um ladom a responsabilidade potencial máxima da A. a i) €22.636,80, no caso do ex-trabalhador P…, e ii) €30.182,40 ou €37.728, no caso do ex-trabalhador R…(…);
b) Limite, por outro lado, a condenação da A. à restituição das quantias que foram ou venham efectivameme a ser pagas pela Segurança Social aos ex-trabalhadores P… e R… durante os respectivos períodos de concessão da prestação iniciai de desemprego;
c) Defira o pagamento em prestações mensais, correspondentes àquelas que, cm cada momento, sejam entregues aos ex-trabalhadores P… c R…, a título de subsídio de desemprego;».

Nas respectivas alegações, a Recorrente formulou as conclusões que seguidamente se reproduzem:

«1.°
A Recorrente recorre do acórdão proferido pelo Tribunal “a quo”, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 141.°, n.° 2 do CPTA, na parte em que este decidiu que “não se verificam os vícios de violação de lei de fundo imputados ao acto impugnado” e, em consequência, decidiu pela improcedência dos “pedidos condenatórios referidos no petitório, alíneas a) e c) da p.i.” e considerou prejudicada o “pedido de notificação da entidade demandada formulado no ponto III do petitório (cfr. p. 19 e 23).
a) DO (ERRADO) CALCULO DO ‘PERÍODO DE CONCESSÃO DA PRESTAÇÃO INICIAL DE DESEMPREGO
2.°
O acórdão recorrido decidiu que o acto impugnado “considerou a totalidade do subsídio de desemprego inicial a que os ex-trabalhadores da [ora Recorrente] teriam direito se o gozassem até ao fim e que, portanto, procedeu em consonância com o artigo 63° do DL 220/2006, que limita a responsabilidade potencial máxima do empregador ao pagamento da prestação inicial de desemprego, prestação inicial essa que inclui (...) os acréscimos que eventualmente seja devidos àquela prestação” (cfr. p. 14).
3.°
Sucede que o Decreto-Lei 220/2006 compreende 3 modalidades distintas de prestações de desemprego: (i) o subsídio de desemprego; (ii) o subsídio social de desemprego (o qual, por sua vez, pode ser inicial ou subsequente ao subsídio de desemprego) e (iii) o subsídio de desemprego parcial (cfr. artigos 3.°, 7.°/1, 37.°/1, 38.° e 39.°).
4.°
Por sua vez, o período de concessão destas modalidades de prestação de desemprego compreende duas parcelas autónomas: por um lado, a prestação inicial de desemprego e, por outro lado, os acréscimos eventualmente aplicáveis (cfr. Decreto-Lei 220/2006, artigos 37.º/1 e 39.°).
5.º
Ao contrário do decidido pelo acórdão recorrido, o artigo 63.° do Decreto-Lei 220/2006, limita a responsabilidade potencial máxima do empregador ao pagamento da prestação inicial de desemprego, excluindo-se, portanto, os acréscimos ao período de concessão que eventualmente sejam devidos.
6.°
Logo, o acórdão recorrido ao considerar, à semelhança do acto impugnado, que devem ser contabilizados os acréscimos e não apenas a prestação inicial de desemprego para efeitos da responsabilidade prevista no artigo 63.° do Decreto-Lei 220/2006, padece de erro de interpretação de lei, incorrendo em erro de julgamento.
b) DA REDUÇÃO DA RESPONSABILIDADE AOS MONTANTES EFECTIVAMENTE DESEMBOLSADOS PELA SEGURANÇA SOCIAL
7.°
Nesta matéria, o acórdão recorrido entendeu que “se o artigo 63.° estabelece a obrigação do empregador perante a segurança social do pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego, não se nos afigura como correcta a interpretação da lei visada pelo A. [ora Recorrente] de que apenas seria devido o pagamento das prestações efectivamente pagas” (cfr. p. 16).
8.°
A interpretação da lei não deve cingir-se à respectiva letra, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento jurídico, sobretudo tendo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada (Código Civil, artigo 9.°/1).
9.°
O regime previsto no artigo 63.° do Decreto-Lei n.° 220/2006 assume natureza de responsabilidade civil extra-contratual.
10.°
Caso o preceituado em causa pretendesse assumir cariz sancionatório ou punitivo teria necessariamente que consubstanciar uma contra-ordenação ou ilícito criminal, o que manifestamente não sucede (cfr. Lei de Bases da Segurança Social, artigo 80.°).
11.°
Ou seja, é pacífico que o regime de responsabilidade previsto no aludido artigo 63.° tem uma finalidade restitutiva ou reconstitutiva e não sancionatória ou punitiva.
12. °
Aliás, o Capítulo X do Decreto-Lei n.° 220/2006 (sob a epígrafe “'Responsabilidade e regime sancionatório”) é absolutamente claro ao distinguir, por um lado, a responsabilidade reconstitutiva [cfr. Secção I (“Responsabilidade”), artigo 63.° (“Responsabilidade pelo pagamento das prestações”)] e, por outro lado, o eventual regime sancionatório [cfr. Secção II (“Contra- ordenações”), artigos 64.° (“Contra-ordenações”) e 65.° (“Sanção Acessória”)].
13. °
De resto, a própria decisão impugnada (e ora anulada) acaba por reconhecer a natureza meramcnte restitutiva do regime previsto no artigo 63.° do Decreto-Lei 220/2006, porquanto na sua epígrafe se refere a “Restituição de Prestações - Subsídio de Desemprego” e, mais à frente, lê-se que “terá essa entidade empregadora que restituir a totalidade do período de concessão” (realces são nossos), [cfr. doc. n.° 1 junto com a petição inicial e acórdão recorrido, p. 9, número 3 dos Factos Assentes].
14. °
Assim, a consequência do mencionado artigo 63.° teria sempre de limitar-se à dimensão da lesão causada ao Recorrido, pelo que a responsabilidade da Recorrente teria necessariamente que corresponder, na exacta medida, aos danos resultantes da sua pretensa actuação ilícita.
15. °
Em concreto, deveria corresponder à restituição das quantias que foram ou venham efectivamente a ser pagas pela Segurança Social aos ex-trabalhadores P… e R…, a título de subsídio de desemprego, durante os respectivos períodos de concessão inicial.
16.°
Acresce que, por um lado, a condenação da Recorrente no pagamento ao Recorrido de quantias que não foram por este desembolsadas constituiria, de resto, uma flagrante situação de enriquecimento sem causa.
17. °
Por outro lado, a cobrança de montantes às entidades patronais para além dos efectivamente pagos aos beneficiários durante o período de concessão da prestação inicial de desemprego, significaria que a Segurança Social estaria a usar tais receitas como fonte ilícita (porque não prevista na lei) de financiamento (cfr. Lei de Bases da Segurança Social, art. 92.°).
18. °
Em qualquer caso, sublinhe-se que a norma constante do artigo 63.° do Decreto-Lei n.° 220/2006, interpretada (tal como fez o acórdão recorrido) no sentido de que o empregador fica obrigado ao pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego que o beneficiário em causa poderá potencialmente receber da segurança social (e não limitada ao que aquele beneficiário recebeu ou venha efectivamente a receber), é, nessa interpretação, materialmente inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade conjugado com o artigo 63.°/2 e 3 da CRP.
19. °
Pelo exposto, deve concluir-se que o acórdão recorrido, ao confirmar o acto impugnado na parte em que condenaria a Recorrente ao pagamento dos montantes potencialmente pagáveis aos ex-trabalhadores, e não à totalidade dos montantes que venham efectivamente a ser pagos àqueles durante o respectivo período de concessão da prestação inicial de desemprego, incorreu numa errada interpretação do artigo 63.° do Decreto-Lei 220/2006, o que consubstancia erro de julgamento.
20. °
Acresce que o acórdão recorrido, à semelhança do acto impugnado, violou também neste particular o princípio da proporcionalidade na sua vertente da necessidade e da proporcionalidade stricto sensu, conjugado com o artigo 63.°/2 e 3 da CRP e, bem assim, os artigos 483.° e 473.° do Código Civil e 92.° da Lei de Bases da Segurança Social.
NESTES TERMOS E NOS DEMAIS DE DIREITO, QUE V. EXAS. DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVE O PRESENTE RECURSO JURISDICIONAL SER JULGADO PROCEDENTE POR PROVADO E PARCIALMENTE REVOGADO O ACÓRDÃO RECORRIDO, SENDO SUBSTITUÍDO POR OUTRO QUE JULGUE PROCEDENTES TODOS OS PEDIDOS DEDUZIDOS NA PETIÇÃO INICIAL.».

Notificado para o efeito, o Recorrido apresentou contra-alegações, pugnando para que seja negado provimento ao recurso.

O Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, não emitiu parecer.

Com vistos apenas do Exmo. Juiz-Adjunto Carlos Araújo (mas com envio prévio também à Exma. Juiz-Adjunta Ana Paula Martina do projecto de acórdão), o processo vem à Conferência para julgamento.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas nos termos do disposto no nº 4 do artigo 635º e nos nºs 1 a 3 do artigo 639º, do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA, consistem, em suma, em saber se na parte em que decidiu que não se verificam os vícios de fundo imputados ao acto impugnado, a sentença recorrida incorreu em erros de julgamento de direito ao considerar que i) a prestação inicial de desemprego referida no artigo 63º do Decreto-Lei nº 220/2006, de 3 de Novembro, inclui os acréscimos que eventualmente sejam devidos àquela prestação e que ii) a obrigação do empregador, aí prevista, é de pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego.

A matéria de facto relevante é a constante do acórdão recorrido, a qual, por não ter sido impugnada, aqui se dá por reproduzida, nos termos e para os efeitos do disposto no nº 6 do artigo 663º do CPC, ex vi o nº 3 do artigo 140º do CPTA.

i) Alega a Recorrente que o Decreto-Lei nº 220/2006 compreende três modalidade de prestações de desemprego: o subsídio de desemprego; o subsídio social de desemprego; e o subsídio de desemprego parcial; e o período de concessão destas modalidades compreende duas parcelas, a da prestação inicial de desemprego e os acréscimos eventualmente aplicáveis (v. artigos 37º/1 e 39º); o artigo 63º limita a responsabilidade potencial máxima do empregador ao pagamento da prestação inicial do desemprego, excluindo-se os acréscimos indicados; ao considerar o contrário o acórdão recorrido padece de erro na interpretação de lei.

Da fundamentação do acórdão recorrido extrai-se sobre esta questão o seguinte:
«(…) diz que a entidade demandada, na interpretação e aplicação da norma do artigo 63° do Decreto-lei n° 220/2006, somou os acréscimos previstos no n° 1 do artigo 37°, quando o n° 4 da mesma disposição legal claramente distingue entre esses acréscimos e o próprio período máximo de concessão da prestação inicial de desemprego.
(…)
Estabelecem o corpo do n° 1 do artigo 37° do Decreto-Lei n° 220/2006 e dos n°s 2 a 4 deste Decreto-Lei na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n° 68/2009, de 20 de Março, o seguinte:
1 - O período de concessão do subsídio de desemprego e do subsídio social de desemprego inicial é estabelecido em função da idade do beneficiário e, quer para determinação do período de concessão quer dos acréscimos, do número de meses com registo de remunerações no período imediatamente anterior à data do desemprego, nos seguintes termos:
(....)
2 - Para efeitos do disposto no número anterior são considerados os períodos de registos de remunerações posteriores ao termo da concessão das prestações devidas pela última situação de desemprego, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
3 - Nas situações em que o trabalhador tenha retomado o exercício de actividade profissional no decurso dos primeiros seis meses de atribuição das prestações é considerado ainda, na determinação do período de concessão e respectivo acréscimo da prestação de desemprego imediatamente subsequente, o período de remunerações tido em conta na atribuição de desemprego imediatamente anterior.
4 - Nas situações em que o trabalhador não tenha beneficiado dos acréscimos, previstos no n° 1, por ter retomado o trabalho antes de ter esgotado o período máximo de concessão da prestação inicial de desemprego, os períodos de registo de remunerações que não tenham sido considerados relevam, para efeitos de acréscimo do período de concessão de prestações, em posterior situação de desemprego.
Como resulta destes preceitos, os acréscimos (quando a eles haja lugar) fazem parte do período inicial de desemprego. E tanto assim é que o corpo do n° 1 do artigo 37° diz que o período de concessão do subsídio de desemprego inicial, quer para determinação do período de concessão quer dos acréscimos (incluído os acréscimos no conceito de desemprego inicial), é estabelecido em função da idade do beneficiário e do número de meses com registo de remunerações, nos termos explicitados no artigo 37°.
Pode é não haver lugar ao pagamento dos acréscimos se o trabalhador vier a ter emprego no decurso do subsídio de desemprego.
Veja-se que a lei utiliza a expressão subsídio inicial para o distinguir do subsídio de desemprego subsequente, que é o subsídio social de desemprego, sendo que o subsídio social de desemprego também pode ser inicial (cfr. artigos 3º e 7º do DL n° 220/2006).
Alega a A. que a entidade demandada, na interpretação e aplicação da norma do artigo 63° do Decreto-lei n° 220/2006, somou os acréscimos previstos no n° 1 do artigo 37°, afirmando que o n° 4 da mesma disposição legal claramente distingue entre esses acréscimos e o próprio período máximo de concessão da prestação inicial de desemprego.
Mais concretamente, afirma a A. nos artigos 60° a 65° da p.i. o seguinte:

60.º
Uma vez que, à data de apresentação do requerimento, o ex-trabalhador P… tinha 38 anos e registo de remunerações superior a 48 meses, a prestação inicial de desemprego máxima a pagar pela A. é de apenas 540 dias [cfr. Decreto-Lei 220/2006, art. 37°/1, alínea b), primeira parte da subalínea ii)],
61.º
E não os 630 dias a que foi condenada a pagar pela Entidade Demandada (cfr. docs. n.°s 1, 2 e 5), que contabilizou, erradamente, os acréscimos.
62.°
Assim, e tomando como referência o montante diário dc €41,92 (cfr. doc. n.° 2), conclui-se que a responsabilidade potencial máxima da A., nos termos do artigo 63.° do Decreto- Lei 220/2006, é de € 22.636,80.
Por outro lado,
63.º
Uma vez que, à data de apresentação do requerimento, o ex-trabalhador R… tinha 46 anos, a prestação inicial de desemprego máxima a pagar pela A. corresponderia, consoante o referido beneficiário tenha registo de remunerações inferior ou superior a 72 meses, a 720 ou 900 dias [cfr. Decreto-Lei 220/2006, art. 37.º/1, alínea d), subalíneas i) e ii)],
64.º
E não aos 1.140 dias a que foi condenada a pagar pela Entidade Demandada (cfr. docs. n.ºs 1 e 5), contabilizando, erradamente, os acréscimos.
65.°
Assim, e tomando como referência o montante diário de €41,92 (cfr. doc. n.º 2), conclui-se que a responsabilidade potencial máxima da A., nos termos do artigo 63.° do Decreto- Lei 220/2006, é de €30.182,40 ou €37.728, consoante o registo de remunerações, porquanto, e ao contrário do que sucede com o ex-trabalhador P…, o seu registo enquanto trabalhador da A. (desde 15/01/2005 a 30/04/2009, ou seja, inferior a 72 meses) é insuficiente para a aplicação correcta da norma,
Sucede, porém, que a A. parte do pressuposto errado de que os acréscimos não fazem parte da prestação inicial de desemprego.
Mas os acréscimos fazem parte da prestação inicial de desemprego, como já vimos.
Assim, mesmo que se viesse a provar os factos que a A. alega nos artigos 60° a 64° da p.i. (e designadamente, que a R. contabilizou os acréscimos) teríamos que considerar que o R. considerou a totalidade do subsídio de desemprego inicial a que os ex- trabalhadores da A. teriam direito se o gozassem até ao fim, e que, portanto, procedeu em consonância com o artigo 63° do DL n° 220/2006, que limita a responsabilidade potencial máxima do empregador ao pagamento da prestação inicial de desemprego, prestação inicial essa que inclui, como dissemos, os acréscimos que eventualmente sejam devidos àquela prestação.
Nos artigos 50° e 51° da p.i. diz “Ora, no presente caso, nada se encontra, no ofício notificado à A., que permita perceber de que forma se considera que estão reunidos os pressupostos de facto e direito que permitem ao ISS exigir da mesma a restituição da quantia de €74.198,40, Sendo certo que não foi dada qualquer oportunidade à A. de averiguar junto do ISS quais esses pressupostos - os quais, provavelmente, estarão errados, como veremos no capítulo seguinte - já que a mesma não foi sequer ouvida.
Dir-se-ia que a A. estaria a invocar erro sobre os pressupostos de facto quanto ao cálculo da prestação de desemprego de R…, mas, na verdade, não o faz, pois tal invocação é feita em termos meramente hipotéticos e precedida da invocação do vício de falta de fundamentação. Pelo que, adiante, a propósito da apreciação do vício de falta de fundamentação, voltaremos a esta questão.
De qualquer forma, como resulta do artigo 67,° afirma a A. que “o que releva para a decisão da causa é que a entidade demandada, na interpretação e aplicação da norma do artigo 63° do Decreto-Lei n° 220/2006, somou os acréscimos previstos no n° 1 do artigo 37°…”
Ou seja, admite a A. que foram considerados os acréscimos nas prestações iniciais de desemprego dos referidos trabalhadores. E, como já se referiu, os acréscimos fazem parte da prestação inicial de desemprego.».

E o assim decidido é para manter.
Dispunha o artigo 63º do referido diploma, na versão vigente na data a que os factos se reportam que: “Nas situações em que a cessação do contrato de trabalho por acordo teve subjacente a convicção do trabalhador, criada pelo empregador, do preenchimento das condições previstas no n.º 4 do artigo 10.º, e tal não se venha a verificar, o trabalhador mantém o direito às prestações de desemprego, ficando o empregador obrigado perante a segurança social ao pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego.
O “inicial” refere-se ao período de concessão das prestações de desemprego a que o trabalhador tenha direito. E não ao valor inicial destas, com o sentido pretendido pela Recorrente, de sem acréscimos.
Explicitando,
As prestações de desemprego são constituídas pelos: subsídio de desemprego (o subsídio regra); o subsídio social de desemprego (atribuído quando não seja atribuível o subsídio regra ou tenham sido esgotados os períodos de concessão daquele, preenchidos os demais condicionalismos) e o subsídio de desemprego parcial (atribuído quando o beneficiário do subsídio regra exerça uma actividade profissional, nos termos previstos no Decreto-Lei nº 220/2006) – cfr. o referido artigo 7º.
Na sequência da apresentação de pedido de apoio numa situação de desemprego, a segurança social verifica qual das prestações de desemprego o requerente tem direito e determina o período de concessão da mesma em função da idade do beneficiário e do número de meses com registo de remunerações no período imediatamente anterior à data do desemprego, nos termos do referido artigo 37º, que compreende os acréscimos aí previstos.
Quando o ex-empregador do beneficiário do subsídio de desemprego ou o subsídio social de desemprego atribuído, é notificado para pagar as prestações de desemprego deste, é-o por referência ao valor total das prestações calculadas para o primeiro período de concessão a que aquele tem direito que incluem os acréscimos [no mesmo sentido v. o acórdão do STA, de 19.6.2014, no proc. nº 01308/13, in www.dgsi.pt, cujo teor reproduziremos parcialmente infra].
O beneficiário em referência pode vir a ter direito a mais períodos de concessão da prestação de desemprego, mas, na sequência imediata da atribuição ou reconhecimento desse direito, desconhecendo a segurança social se assim se verificará, o ex-empregador só é notificado para proceder ao pagamento da totalidade das prestações de desemprego relativas ao primeiro desses períodos que, necessariamente, inclui os acréscimos previstos relativamente ao mesmo.
Em face do que não procede este fundamento do recurso.

ii) Alega a Recorrente que o tribunal errou ao interpretar o disposto no referido artigo 63º com o sentido de que empregador está obrigado a proceder ao pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego e não ao que efectivamente venha a ser pago aos seus ex-trabalhadores.

Sobre esta questão já se pronunciou o STA no já mencionado acórdão de 19.6.2014, proc. nº 01308/13, no sentido agora defendido pela Recorrente, conforme resulta do respectivo sumário: «A Segurança Social só pode exigir da entidade patronal, ao abrigo do art.° 63.° do Dec. Lei n.° 220/2006, de 3 de Novembro, o reembolso das prestações a que o trabalhador teve efectivamente direito e não do que corresponderia à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego.».
Por relevante [também para a solução dada à questão anterior] aqui reproduzimos da respectiva fundamentação o seguinte: «(…)
O art.º 63.º do DL 220/2006 - cuja epígrafe é «responsabilidade pelo pagamento das prestações» - estatui que “nas situações em que a cessação do contrato de trabalho por acordo teve subjacente a convicção do trabalhador, criada pelo empregador, do preenchimento das condições previstas no n.º 4 do artigo 10.º, e tal não se venha a verificar, o trabalhador mantém o direito às prestações de desemprego, ficando o empregador obrigado perante a segurança social ao pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego.
O que quer dizer que esta norma teve em vista responsabilizar a entidade patronal pelo pagamento do subsídio de desemprego quando ela, dolosamente, convenceu o trabalhador a acordar na resolução do contrato de trabalho apesar de se não verificarem as condições nele previstas. E ao fazê-lo estatuiu que, ocorrendo essa ilegalidade, o pagamento das prestações devidas continuaria a ser feito pela Segurança Social mas que o empregador tinha de a ressarcir por esse pagamento, obrigando-o a pagar o montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego. Deste modo, nos casos em que o trabalhador aceitou ser dispensado convencido pela sua entidade patronal de que se verificavam as condições que permitiam o despedimento colectivo ou a extinção do seu posto de trabalho e, afinal, tais condições não se verificarem o trabalhador continua a ter direito ao subsídio, a ser assegurado pela Segurança Social, mas esta tem o direito de exigir do empregador o montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego.
Ora, é a interpretação deste conceito que separa a Recorrente do decidido no TCA e que, aqui, temos de arbitrar.
O Acórdão recorrido - sufragando anterior jurisprudência do TCA - considerou que, verificado o apontado o ilícito, o empregador tinha de pagar à Segurança Social a totalidade das prestações correspondentes ao período em que o subsídio era devido, mesmo que a trabalhadora o não viesse a receber por, entretanto, ter arranjado novo emprego e, por essa razão, ter perdido o direito a esse subsídio. E que, por ser assim, o acto impugnado não estava inquinado pelas ilegalidades que lhe foram imputadas.
Não se verificava a violação do princípio da proporcionalidade uma vez que inexistia excesso ou “desequilíbrio entre esta medida legislativa e a necessidade objectiva pública de evitar fraudes ou excessos das entidades patronais neste tipo de cessações do contrato de trabalho por livre acordo fundamentadas em motivos que permitam o recurso ao despedimento colectivo ou por extinção do posto de trabalho … cessações essas que dariam e dão naturalmente direito a subsídio de desemprego.” De resto, havia “vinculação legal sobre o réu, pelo que não funciona o limite interno da discricionariedade administrativa que é o princípio da proporcionalidade da Ad. P.”
Depois, não se podia falar em confisco ou sanções visto, por um lado, a Autora ter celebrado livremente com a sua funcionária o acordo que conduziu ao despedimento desta e, por outro, aquela obrigação constituía um ónus legal perfeitamente justificado.
Finalmente, não havia enriquecimento sem causa do Réu porque a letra da lei era o fundamento do pagamento exigido.
A Autora rejeita este entendimento decisão por considerar que a referida norma visa, unicamente, circunscrever o limite máximo do valor devido à Segurança Social nos mencionados casos de despedimento. E que, por ser assim, esse pagamento nunca poderá exceder o montante do subsídio efectivamente pago ao trabalhador visto ele ser a exacta medida do prejuízo sofrido pela Segurança Social.
Sendo assim, e sendo que a trabalhadora aqui em causa só esteve desempregada durante cerca de 120 dias, e sendo, portanto, que só durante esse período a Segurança Social lhe pagou o subsídio a Recorrente só está obrigada ressarcir o Réu do valor que este efectivamente pagou e não a totalidade do montante que teria sido pago se aquela estivesse desempregada durante 570 dias que haviam sido previstos e recebesse subsídio por todo esse período. A não ser assim, uma parte do valor que lhe foi exigido correspondia a “uma multa ou coima destinada a sancionar um comportamento que fosse considerado ilícito do ponto de vista penal ou contra-ordenacional” sem que houvesse tipificação legal dessa sanção e sem que a sua aplicação obedecesse “às exigências legais e constitucionais garantindo, nomeadamente, os direitos de defesa do empregador no âmbito desse processo.”
A exigência ínsita no acto impugnado configurava, assim, para além da violação do princípio da proporcionalidade – visto lhe exigirem o pagamento de um subsídio equivalente a 570 dias quando a Recorrida pagou apenas o correspondente a 120 dias - um acto de confisco e uma clara situação de enriquecimento sem causa por parte da Segurança Social.
A questão que se coloca é, pois, como se vê, a de saber se, por força do que se dispõe no art.º 63.º do DL 220/2006, a entidade patronal está obrigada a pagar à Segurança Social a totalidade das prestações devidas mesmo que – por qualquer razão – o trabalhador tenha perdido o direito à sua percepção e, por essa razão, aquele subsídio não tenha sido pago na sua totalidade.
A resposta a essa interrogação só pode ser a de que o empregador só tem de compensar a Segurança Social pelo valor que esta efectivamente despendeu visto a responsabilidade ora em causa ser indemnizatória e, por essa razão, advir do prejuízo efectivamente sofrido pelo lesado e ter como medida o valor desse dano.
Nesta conformidade, e sendo ilegal ressarcir alguém de um prejuízo que ele não teve (art.º 483.º do CC), é forçoso concluir que se a Segurança Social, por qualquer razão, só pagou uma parte do subsídio de desemprego a que o trabalhador tinha direito a entidade responsável pelo ressarcimento dessa quantia só terá o dever de a compensar por esse valor visto, de outra forma, se estar a exceder o dever indemnizatório do empregador e a provocar um enriquecimento sem causa da Segurança Social.
O Acórdão recorrido entendeu que, no caso, esse princípio não se aplicava justificando esse entendimento com o disposto no art.º 63.º do DL 220/2006 já que nele se lia que, nas circunstâncias dos autos, o empregador fica obrigado perante a Segurança Social ao pagamento do montante correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego e esta totalidade só pode ser interpretada como correspondendo ao montante global do subsídio que era devido.
Não nos parece, porém, que aquela norma possa ser lida dessa maneira.
Desde logo, porque, como já se disse, a mesma teve por finalidade responsabilizar o empregador pelo pagamento do subsídio de desemprego nos casos em que, fraudulentamente, convenceu o trabalhador a cessar, por acordo, o seu contrato de trabalho sem que se verificassem os requisitos que permitiam o seu despedimento e não sancioná-lo por essa conduta ilegal. Ou seja, o escopo único daquela norma foi afastar a hipótese de caber à Segurança Social o pagamento de um subsídio provocado pela conduta dolosa de terceiro e não o ter um efeito punitivo.
Depois, porque, se assim é, a responsabilidade indemnizatória do obrigado tem de ter como limite o prejuízo efectivamente sofrido pelo lesado e como medida o valor desse dano pelo que não fará sentido ressarcir o Réu por um prejuízo que ela não teve.
Finalmente, porque, a não ser assim, o pagamento de quantia diversa daquela que a Segurança Social efectivamente pagou configurava uma sanção não prevista no citado diploma (vd. seus art.ºs 64 a 67.º). O que era ilegal uma vez que as sanções estabelecidas nos apontados normativos não incluem a «punição» que o Acórdão recorrido admitiu.
O que fica dito, porém, não significa que, verificado o ilícito, a Segurança Social não possa ordenar a reposição do montante já pago ao trabalhador como ordenar que seja depositado, antecipadamente, o valor que, previsivelmente, irá ser pago e que o devedor não esteja obrigado a proceder a esse pagamento. O que não quer dizer que, nessas circunstâncias, o montante pago antecipadamente não possa ser devolvido se se constatar que o trabalhador – por qualquer razão - perdeu o direito ao subsídio e, por esse motivo, a Segurança Social cessou o seu pagamento e que o empregador não possa reivindicar essa devolução.
4. No caso, está assente que a funcionária da Recorrente acordou com esta a cessação do seu contrato de trabalho no convencimento, criado pela empregadora, de que a empresa atravessava dificuldades e de que, por isso, se verificavam os requisitos previstos no art.º 10.º do DL 220/2006. Cessação que determinou que a Segurança Social tivesse concedido àquela trabalhadora o subsídio de desemprego de 13,97 euros diários por um período de 570 dias.
Todavia, a Segurança Social constatou que os citados requisitos não ocorriam o que a levou a ordenar a notificação da Recorrente para que ela pagasse 7.962,90 euros (o acto impugnado), correspondentes à totalidade das prestações que a trabalhadora iria receber até final do mencionado período muito embora, como se escreveu no Acórdão, “o período em que efectivamente houve desemprego fosse menor (aqui 4 meses)
Deste modo, e pelas razões já enunciadas, havendo a certeza de que a trabalhadora só esteve desempregada durante 4 meses e que só durante este período recebeu subsídio de desemprego da Segurança Social, esta só pode exigir à Recorrente o montante que, efectivamente, havia pago sob pena de violação do disposto no art.º 63.º do DL 220/2006.
(…)».
Por concordarmos e aderirmos à fundamentação de direito explanada (uma vez que da factualidade assente nos presentes autos nada resulta sobre se os ex-trabalhadores da Recorrente receberam as prestações de desemprego até ao fim dos períodos de concessão, ao contrário do que sucedeu no caso reproduzido) no referido acórdão do STA [reiterados no acórdão do STA de 13.12.2018, proc. 0606/15.3BERLA 0653/18, idem], entendemos que, aplicando tal entendimento à situação em apreciação, o tribunal recorrido errou na argumentação expendida sobre esta questão.
A saber, o Recorrido só podia exigir da A./recorrente, enquanto ex-entidade empregadora dos benificiários do subsídio de desemprego em referência nestes autos, o reembolso das prestações que estes tiveram efectivamente direito, valor que pode ter correspondido ao indicado no acto impugnado ou não, caso não se tenham mantido em situação de desemprego até ao fim dos respectivos períodos de concessão.
Contudo, como também resulta do referido acórdão o que fica dito, porém, não significa que, verificado o ilícito, a Segurança Social não possa ordenar a reposição do montante já pago ao trabalhador como ordenar que seja depositado, antecipadamente, o valor que, previsivelmente, irá ser pago e que o devedor não esteja obrigado a proceder a esse pagamento. O que não quer dizer que, nessas circunstâncias, o montante pago antecipadamente não possa ser devolvido se se constatar que o trabalhador – por qualquer razão - perdeu o direito ao subsídio e, por esse motivo, a Segurança Social cessou o seu pagamento e que o empregador não possa reivindicar essa devolução.
Donde, desconhecendo os efectivos períodos em que o Recorrido pagou os subsídios de desemprego aos ex-trabalhadores da A./recorrente, aquele podia exigir a esta, logo no acto impugnado, o reembolso da quantia correspondente ao período total concedido de subsídio de desemprego, no pressuposto de devolver as importâncias que eventualmente viesse a não pagar àqueles por alteração das condições que o justificasse.
O que significa, na economia do recurso em apreciação, até porque o tribunal a quo julgou a acção procedente e anulou o acto impugnado, manter o acórdão recorrido com a presente fundamentação.

Por tudo quanto vem exposto acordam os Juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e, em consequência manter o acórdão recorrido na ordem jurídica com diferente fundamentação.

Custas pela Recorrente.

Registe e Notifique.

Lisboa, 16 de Dezembro de 2021.


(Lina Costa – relatora)

(Ana Paula Martins)

(Carlos Araújo)