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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06573/13
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:01/08/2015
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IVA; ERRO MATERIAL NA DECLARAÇÃO; REGULARIZAÇÃO.
Sumário:1) Tendo havido erro material imputável ao contribuinte, do qual decorreu a declaração de IVA a pagar superior ao efectivamente pago no fecho do período em causa (Dezembro de 2001) a liquidação adicional impugnada era devida, sem prejuízo do exercício do direito à regularização do imposto, com base na comunicação de crédito, que o contribuinte não accionou, no tempo e modo próprios, facto que lhe é imputável.
2) O accionamento das regularizações a crédito do sujeito passivo é facultativa, mas só poderá ser efectuada no prazo de um ano, que se conta a partir do momento em que o imposto dedutível se torna exigível – artigos 71.º/6, 7.º e 8.º do CIVA.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

I- Relatório
“P ............................ – .............................., SA”, m.i. nos autos, interpõe o presente recurso jurisdicional da sentença proferida a fls. 135/147, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IVA do período de 12.2001, com o n.º ......................., no valor de €7.113,71, relativamente à qual deduziu reclamação graciosa, a qual, por seu turno, foi objecto de indeferimento.
Nas alegações de fls. 186/201, a recorrente formula as conclusões seguintes:
a) O presente recurso tem por objecto a sentença proferida pelo tribunal a quo, o qual, ignorando o pedido de inquirição de testemunhas, decidiu julgar improcedente a impugnação judicial, considerando que, por força do procedimento legal de regularizações, a liquidação adicional não merece qualquer censura.
b) A decisão proferida assenta em dois pressupostos: // i) O pagamento efectuado pelo sujeito passivo aquando da declaração inicial (P1) não corresponde ao montante total do imposto devido, e // ii) não foi negado o direito à dedução devida uma vez que a AT emitiu, a favor do contribuinte, uma regularização a crédito, no montante do imposto alegadamente em falta: €95.150,73. Ora,
c) Salvo o devido respeito, considera a recorrente que mal andou o tribunal a quo, padecendo a sentença proferida de vários vícios que a ferem de nulidade e/ou anulabilidade.
d) Com efeito, são dois os vícios que, no entender da recorrente, fazem com que a sentença proferida deva ser revogada.
e) Em primeiro lugar, pelo facto de a mesma padecer de nulidade decorrente da ilegal preterição da produção de prova solicitada pela aqui recorrente: a inquirição de testemunhas.
f) Com efeito, sem proferir qualquer despacho a prescindir a inquirição das testemunhas, veio o tribunal a quo julgar improcedente a presente impugnação judicial, baseando-se apenas e só, na prova documental carreada para o processo.
g) Desse modo, limitando-se a invocar que «não se mostram provados quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa», foi então a recorrente impedida de, no uso do direito que lhe assiste, comprovar os factos que invoca através do recurso à prova testemunhal.
h) Uma vez que tais factos poderiam/deveriam incluir no exame ou na decisão da causa, considera a recorrente que a sentença proferida padece assim de uma nulidade processual por violação do disposto nos artigos 99.º, da LGT e artigos 13.º, 114.º, 115.º, n.º 1, 118.º e 119.º do CPPT. Sem prescindir,
i) Em segundo lugar, considera a recorrente que a sentença proferida padece igualmente de manifesto erro de julgamento, por errónea aplicação dos factos e do direito.
j) Com efeito, como supra se referiu, a decisão em apreço assenta em dois pressupostos; valor de imposto pago pela reclamante inferior ao devido e emissão de um crédito a favor do contribuinte por força da dedução devida.
k) Ora, sucede que, atenta a factualidade, nem o «valor inicialmente pago pelo sujeito era (…) inferior ao devido» - pois, como resulta do supra exposto, o montante efectivamente a deduzir foi sempre de €297.193,66 e o imposto a favor do Estado e realmente devido foi sempre de €542.649,12.
l) Nem o contribuinte e/ou utilizou o crédito que ficticiamente a AT emitiu em seu nome – facto esse que, repita-se pretenderia demonstrar através da inquirição das testemunhas arroladas.
m) Concluindo: se o imposto devido no período de Dezembro de 2001 foi efectivamente o montante que o contribuinte pagou logo com a apresentação da declaração periódica modelo A (P1) – no montante de €542.649,12 – então é evidente que a liquidação dos €7.113.71, aqui em causa carece de sentido.
n) Até porque o alegado crédito de €95.150,73 – que mais não é do que um reconhecimento do direito a deduzir os €297.193,66 declarados (em todas as declarações emitidas para o período em causa) pela reclamante nunca foi por esta reconhecido/utilizado.
o) Termos em que a manutenção da liquidação consubstanciará acréscimo de imposto indevido, pelo que - salvo melhor opinião – mal andou o tribunal, ao não considerar ilegal a liquidação adicional em causa, quer por violação do direito à dedução, quer por duplicação de colecta, violando, desse modo, o disposto nos artigos 19.º, 26.º e 40º do CIVA.
Não há registo de contra-alegações.
X
A Digna Magistrada do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr. fls. 211/214, dos autos), no sentido da recusa de provimento ao recurso.
Corridos os vistos legais, vêm os autos à conferência para decisão.
X
II- Fundamentação.
2.1.De Facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:
A) A Impugnante exerce a atividade de comercialização de bebidas alcoólicas e encontra-se sujeita ao regime normal de IVA, apresentando as declarações periódicas mensalmente — acordo.
B) Em 06.02.2002 a Impugnante apresentou a declaração periódica modelo
A (P1) respeitante a dezembro de 2001, na qual autoliquidou imposto a favor do Estado no valor de € 542.649,13 com os seguintes elementos, relativos a "Imposto a favor do sujeito passivo":

a) Campo 20: € 1.818,36;
b) Campo 21:€ 1.344,90;
c) Campo 22: € 37.123,48;
d) Campo 40: € 161.756,19;
e) Campos não preenchidos: 23, 24, 61, 65, 67 e 81.
f) Campo 91: € 297.193,66. (Doc.nº 3 junto com a petição inicial)
C) A declaração que antecede foi acompanhada do respetivo meio de Pagamento. (Doc. nº 4 junto com a petição inicial e acordo).
D) Em 09.04.2002 os serviços procederam à correção da declaração
apresentada para o período de dezembro de 2001, apurando imposto a entregar ao Estado no montante de € 637.799,86. (Doc. fls. 50 do processo administrativo tributário).

E) Por ofício nº 188440 de 22.11.2002, da Direção de Serviços de Cobrança
do IVA, foi a Impugnante notificada relativa a
"Anomalias Diversas" relativas ao período de dezembro de 2001, nos termos que se transcrevem:
«(...) Incongruência entre o campo 91 e os valores inscritos na respetiva coluna. A manutenção desta anomalia origina um débito de € 95.150,73 a favor do Estado.
Para que se desencadeie o processo de regularização, deverá enviar declaração de substituição Modelo C, com os valores correios e completamente preenchida, até ao dia 31/12/2002 (…). // Não sendo corrigida a anomalia será, após esse prazo, efetuada a respetiva liquidação adicional, de harmonia com o disposto no art 82º do Código do IVA. (...)» (Doc. nº5 junto com a petição inicial).
F) No dia 10.12.2002 a Impugnante procedeu à entrega de declaração de substituição modelo C (P2), para o período de dezembro de 2001, na qual declarou, em relação a "Imposto a favor do sujeito passivo", o seguinte:
- Campo 20: €1.818,36; -Campo 21: € 1.344,90;
- Campo 22: €37.123,48;
- Campo 24: €95.150,73;
- Campos 23, 40, 61, 65, 67 e 81: não preenchidos;
- Campo 91: € 297.193,66. (Doc. nº 6 junto com a petição inicial).
G) Em 26.12.2002 os serviços tributários procederam a nova correção da
declaração que antecede apurando imposto a entregar ao Estado no montante de €668.878,46. (Doc. fls. 52 do processo administrativo tributário).

H) Na data do fecho do período encontravam-se no sistema duas "regularizações a crédito" respeitantes aos períodos de 01.08 e 01.11, nos montantes de € 86.245,92 e € 1.791,10, respectivamente. (Doc. fls. 16 do processo administrativo tributário).
I) Em 01.06.2003 a Administração tributária procedeu à liquidação adicional para o período de dezembro de 2001, no valor de €7.113,71, com data limite de pagamento de 31.08.2003. (Doc. fls. 42 do processo administrativo tributário e doc. n.º2 junto com a petição inicial).
J) Em 03.07.2003 a Impugnante procedeu à entrega de nova declaração de substituição modelo C (P3), para o período de dezembro de 2001, na qual apurou imposto a favor do Estado no valor de €542.649,13 e declarou, em relação a "Imposto a favor do sujeito passivo", o seguinte:
- Campo 20: € 1.818,36;
- Campo21:€ 1.344,90;
- Campo 22: € 37.123,48;
- Campo 24: €95.150,73; -Campo 40: €161.756,19;
- Campos 23, 40, 61, 65, 67 e 81: não preenchidos;
- Campo 91: € 297.193,66. (Doc. n.º 7 junto com a petição inicial).
K) Em 10.07.2003 a Impugnante apresentou reclamação graciosa da liquidação adicional identificada na al. I) do probatório, alegando que «(...) Este imposto teve como base o preenchimento errado da declaração de IVA a qual foi retificada com o preenchimento do modelo C de IVA, e enviado pela Internet. (...)» (Doc. fls. 2 do processo administrativo tributário).
L) Em 22.07.2003 a Direção de Serviços de Cobrança emitiu uma "Comunicação de Crédito' a favor da ora Impugnante relativamente ao período de 01.12.2001 a 31.12.2001, no valor €95.150,73, indicando como "Motivo' «Crédito resultante do tratamento da declaração periódica de substituição a declaração já entregue». (Doc. n.º8 junto com a petição inicial).
M) Por despacho de 21.03.2006 foi indeferida a reclamação graciosa referida na al. K) do probatório, extraindo-se, em síntese, a seguinte fundamentação: // «5.1.1 — dentro do prazo (...), foi. remetida aos Serviços do IVA a declaração periódica referente ao período de 0112 (Pi) (...); // 5.1.2. uma vez que aquela declaração apresentava um erro de soma no quadro das "deduções"..., foi a mesma retificada pelos serviços, apurando-se imposto a pagar de € 637.799,86, o que originou uma "regularização a débito" (RD) de € 95.150,73 (LA2 – LA1 = 637.799,86 - 542.649,13); // 51.3. posteriormente, foi remetida em 10/12/2002, uma declaração de substituição mod. C (P2), que mais uma vez apresentava um erro no quadro das deduções e, após correcção dos serviços, foi apurado imposto a pagar de €668.878,46, que deu lugar a uma nova "regularização a débito" de €31.078,60 (€ 668.878,46 - € 637.799,86); // 5.1.4. as divergências das declarações em causa têm a ver com o facto de o sujeito passivo ter apenas preenchido na 1a declaração o campo 40 e na 2a apenas o campo 24, independentemente do valor apurado corresponder como se tivessem os dois campos preenchidos; // 5.1.5. contudo, uma vez que na data do fecho, se encontravam disponíveis no sistema, duas "regularizações a crédito" (RC) respeitantes aos períodos de 0108 e 0111, nos montantes de €86.245,92 e €1.791,10, foram estas compensadas na "regularização a débito" (RD) de €95.150,73, originando assim, a liquidação em causa de € 7.113,71; // 5.1.6. esta situação só veio a ser completamente regularizada com a remessa, em 03/07/2003, da declaração de substituição mod. C (P3), onde foi apurado imposto a pagar de €542.649,13, o que origina uma "regularização a crédito" de €95.150,73 (€ 637.799,86 - € 542.649,13) anulando assim a "RD" resultante da P2 de € 31.078,60, (...); // 5.1.7. além do envio destas declarações de substituição mod. C (P2 e P3) ter sido já efectuado fora do prazo estipulado pelo art. 40º do CIVA e art. 8º do Decreto-Lei nº 229/95, de 11 de setembro, também já se tinha verificado em 25/06/2002, o fecho do período, pelo que estas não puderam influenciar o resultado da P1; // 5.1.8. ora, independentemente da obrigatoriedade da remessa de declarações de substituição mod. C, sempre que resulte imposto a favor do Estado, de acordo com o disposto no nº 6 do art. 71º do CIVA, o que aqui está em causa, é o envio dessas declarações após o prazo consignado no já mencionado art. 40º do mesmo diploma legal que origina uma substituição incompleta. (...). // 5.2. Deste modo, a liquidação adicional ora reclamada mostra-se devida. (...)» (Doc. n.º l junto com a petição inicial).
N) A Impugnante foi notificada da decisão que antecede em 30.03.2006. (Doc. fls. finais, não numeradas, do processo administrativo tributário).
O) A presente impugnação judicial foi remetida ao Tribunal em 18.04.2006, via fax - cfr. fls. 3 dos autos.
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Em sede de fundamentação da matéria de facto, consignou-se:
«Factos não provados // Não se mostram provados quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa. // Motivação de facto // A convicção do tribunal, quanto aos factos provados, formou-se com base no teor dos documentos referidos em cada uma das alíneas supra.
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Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
P) Da declaração referida em B) resultava o valor de IVA pagar no montante de €637.799,86, tendo sido acompanhada de meio de pagamento de €542.649,13, ocasionando um valor de IVA em falta de €95.150,73 – fls. 223.
Q) Na declaração de substituição, de 10.12.2002, referida em F) resultava valor superior ao devido - €668.878,46, cujo débito correspondente (€31.078.60), foi entretanto anulado – fls. 224.
R) As regularizações a crédito (a favor do sujeito passivo) referidas no ponto H. totalizavam €88.037,02, tendo sido utilizadas na compensação do valor de IVA em falta de €95.150,73 – fls. 227, 228.
S) A compensação referida na alínea anterior determinou um valor de IVA em falta de €7.113,71 – fls. 227, 228.
T) Com a apresentação da declaração referida em J), foi apurado o IVA a pagar de igual valor ao pagamento efectuado inicialmente pela recorrente – €542.649,13, o que originou a comunicação de crédito no valor de €95.150,73, referida em L) – fls. 225.
U) A liquidação n.º ................., de €7.113,71, referida em I), foi paga em 05.02.2004, no âmbito do processo de execução fiscal n.º ................................ – fls. 230.
V) De Junho de 2003 a Junho de 2004, o contribuinte não apresentou declaração, na qual declarasse regularização a seu favor no montante de €95.150,73 (preenchimento do campo 81) – fls. 233/257.
X
2.2. De Direito.
2.2.1. Nos presentes autos, vem sindicada a sentença proferida a fls. 135/147, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IVA do período de 12.2001, com o n.º ................, no valor de €7.113,71, relativamente à qual deduziu reclamação graciosa, a qual, por seu turno, foi objecto de indeferimento.
2.2.2. Para julgar improcedente a impugnação, a sentença estribou-se na fundamentação seguinte: «Nos presentes autos vem impugnada a liquidação de IVA efectuada pela Administração Tributária para o período de dezembro de 2001, por ter sido constatado pelos serviços, na declaração (P1) apresentada pela impugnante, uma incongruência entre o campo 91 (“Imposto a favor do sujeito passivo”: €297.193,66) e os valores inscritos na respectiva coluna, que somam (€202.204,90), apurando-se uma diferença de €95.150,73 que, acrescida ao valor do imposto que a impugnante liquidou a favor do Estado (€542.649,13), perfaz a quantia de €637.799,86 – cfr. als. B) e D) do probatório. // Da referida incongruência foi a Impugnante notificada por ofício de 22.11.2002, da Direção de Serviços de Cobrança do IVA, no sentido de apresentar a competente declaração de substituição, modelo C, com os valores corretos, até ao dia 31/12/2002, de forma a desencadear o processo de regularização - cfr. al. E) dos factos provados. // Sucede que, na declaração de substituição (P2) que apresentou na sequência daquela notificação, em 10.12.2002, a Impugnante, preencheu o campo 24 com o valor de €95.150,73, que não havia preenchido na 1a declaração (P1) apresentada em 06.02.2002, mas deixou por preencher o campo 40 que havia inicialmente preenchido com o valor de €161.756,19, dando, assim, origem a novos erros de preenchimento que criaram, igualmente, incongruência entre o valor declarado no campo 91 e aquele que resulta do somatório das diversas parcelas da respectiva coluna, conforme se denota da confrontação entre o provado nas alíneas B) e F) do probatório. // Desta feita, os serviços apuraram uma diferença de €126.229,30 (uma "regularização a débito" de €31.078,60, em relação anteriormente realizada) que, acrescida ao valor do imposto que a Impugnante liquidou a favor do Estado (€542.649,13), perfaz a quantia de € 668.878,46 - cfr. al. G) dos factos provados. // A apresentação da declaração periódica com o preenchimento dos campos 24 e 40, com os valores de € 95.150,73 e € 161.756,19, respetivamente, só viria a ocorrer em 03.07.2003, conforme resulta da al. J) do probatório. // Ora, antes disso, em 01.06.2003, a Administração Tributária procedeu à liquidação adicional para o período de dezembro de 2001, no valor de €7.113,71, valor que resulta da diferença entre a regularização a débito no valor de € 95.150,73 e a da sua compensação com as regularizações a crédito existentes no sistema respeitantes aos períodos de 01.08 e 01.11, nos montantes de €86.245,92 e €1.791,10, respectivamente. // No entanto, como se provou na al. L), após a entrega da declaração de substituição (P3) que compreendia o preenchimento simultâneo dos campos 24 e 40, a Direção de Serviços de Cobrança emitiu, em 22.07.2003, a uma "Comunicação de Crédito' a favor da ora Impugnante relativamente ao período de 01.12.2001 a 31.12.2001, no valor €95.150,73. // A Impugnante não se conforma com o procedimento adotado pela Administração Tributária no tratamento das declarações de substituição, considerando que inexiste fundamento legal para a liquidação adicional ora impugnada. // Importa, pois, enquadrar os factos essenciais que se acabam de descrever no regime legal aplicável. // O regime das liquidações adicionais de IVA encontra-se previsto nos artigos 82º a 83º-A do CIVA. Ao caso releva o artigo 82º do CIVA, que dispõe, inter alia, o seguinte: // «1. (...) o chefe da repartição de finanças procederá à retificação das declarações dos sujeitos passivos quando fundamentadamente considere que nelas figura um imposto inferior ou uma dedução superior aos devidos, liquidando-se adicionalmente a diferença. // 2. As inexatidões ou omissões praticadas nas declarações poderão resultar
diretamente do seu conteúdo, do confronto com declarações de substituição apresentadas para o mesmo período ou respeitantes a períodos de imposto anteriores, ou ainda com outros elementos de que se disponha (...)». // Igualmente relevante em matéria de regularização dos erros praticados no preenchimento das declarações, que a Impugnante claramente admite ter perpetrado na 1
a declaração apresentada para o período em causa (na qual não preencheu o campo 24), bem como na declaração de substituição apresentada em primeiro lugar (na qual não preencheu o campo 40), é o Decreto-Lei nº 229/95, de 11 de setembro, que dispõe sobre o pagamento dos reembolsos do IVA e dispõe, ademais, sobre o processo de regularização dos erros praticados no preenchimento das declarações. Assim, resulta do seu art. 8º, sob a epígrafe "Declaração de substituição. Excessos a reportar", que: «1. Os excessos a reportar, bem como as regularizações a crédito, transportados de períodos anteriores, nos termos do n.º 4 do artigo 22.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e do artigo 6. º do presente diploma, só serão tomados em conta quanto incluídos em declarações periódicas apresentadas dentro do prazo legal. // 2. As declarações periódicas apresentadas depois de terminado o prazo legal, em substituição de uma liquidação oficiosa prevista no artigo 83.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado ou de uma declaração periódica anteriormente apresentada, relativamente ao mesmo período do imposto, deverão ser feitas em declaração modelo C, anexa ao presente diploma, devendo ser remetidas ao Serviço de Administração do IVA, nos termos do n.º l do artigo 26.º do referido Código. // 3. O crédito apurado em declaração periódica apresentada depois de terminado o prazo previsto no artigo 40.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado será comunicado pela DSCIVA, de acordo e para os efeitos previstos no artigo 6º. // 4. O crédito resultante de declaração periódica de substituição apresentada depois de terminado o prazo legal previsto no artigo 40. º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, com crédito superior ou débito inferior relativamente à anteriormente apresentada, será comunicado pela DSCIVA nos termos e para os efeitos do artigo 6. º. // 5. Sem prejuízo do disposto no n.º 7 do artigo 71.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, as declarações de substituição apresentadas nos termos do número anterior terão de dar entrada na DSCIVA no prazo de um ano contado da data da apresentação da declaração a substituir». // (…) // No caso, é facto assente que o apuramento do imposto devido feito pela Administração Tributária através da liquidação adicional impugnada não desconsiderou o direito à dedução do IVA suportado pelo sujeito passivo, uma vez que, na sequência da apresentação da declaração de substituição (P3) que compreendia, já, o preenchimento dos campos 24 e 40, gerando a congruência entre o valor indicado no campo 91 e o somatório das parcelas da respectiva coluna, os serviços da Administração Tributária procederam à emissão de "Comunicação de Crédito' a favor da ora Impugnante relativamente ao período de 01.12.2001 a 31.12.2001, no valor € 95.150,73. // Assim, a questão da legalidade ou ilegalidade da liquidação adicional cinge-se, pois, ao cumprimento de regras procedimentais. // In casu, o chefe o serviço de finanças, constatando a inexactidão na declaração P1 apresentada pelo sujeito passivo, pelo facto de o valor inscrito no campo 91 não corresponder à soma das parcelas da respectiva coluna ("deduções"), procedeu em conformidade com o disposto no nº l do artigo 82º do CIVA, retificando a declaração nos termos identificados na al.D) do probatório, apurando, como já se referiu, uma regularização a débito de € 95.150,73. // Sucede que a declaração de substituição (P3) com a correta indicação dos valores na coluna de "deduções" só foi apresentada em 03.07.2003, muito para além do prazo imposto pelo artigo 40º, nº l, al. a) do CIVA, que prevê a entrega da mesma até ao dia 10 do 2º mês seguinte àquele a que respeitam as operações, o mesmo sucedendo com a primeira declaração de substituição entregue (P2). // Deste modo, impunha-se à Administração Tributária que procedesse em conformidade com o disposto no nº l do artigo 82º do CIVA, uma vez que uma eventual declaração de substituição capaz de determinar a alteração dos elementos e valores vertidos na P1, com autoliquidação pelo sujeito passivo, só seria admissível se apresentada no prazo previsto no artigo 40º, nº l, ai. a) do CIVA. É o que resulta, de modo indiscutível, da aplicação conjugada do disposto no art. 40º, nº l, do CIVA com os nºs 3 e 4 do art. 8º do Decreto-Lei nº 229/95. // Assim, a notificação enviada à ora Impugnante em 22.11.2002 pela Direção de Serviços de Cobrança do IVA, para que enviasse declaração de substituição com os valores corretos até ao dia 31/12/2002, destinava-se, tão só, a desencadear o processo de regularização, em conformidade com o disposto no mencionado art. 8º do Decreto-Lei nº 229/95, e não, como pretende fazer crer a Impugnante, para permitir a entrega de declaração de substituição que produzisse, tout court, os mesmos efeitos da declaração apresentada em fevereiro de 2002. // Na verdade, pese embora no nosso sistema fiscal vigore o método da declaração do contribuinte no apuramento da matéria coletável, nem sempre este se fará com base naquela declaração, designadamente, quando do controlo efetuado à sua situação tributária resultar que a matéria coletável apurada na declaração ou com base nos elementos dela constantes não corresponde à realidade, nomeadamente nos casos que o contribuinte declarou deduções superiores às que tinha direito (cfr. art. 82º, nº l, do CIVA). Com fundamento na verificação de que naquelas declarações figura um imposto inferior ou uma dedução superior aos devidos, a Administração Tributária deve proceder à sua correção em conformidade. E, sempre que tenha já decorrido o prazo previsto no art. 40º, nº l do CIVA, o procedimento a seguir é aquele que consta dos artigos 6º e 8º do Decreto-Lei nº 229/95 que, no caso sub judice, foi cumprido, conforme resulta da factualidade provada. // Por fim refira-se que, em face da declaração inicialmente apresentada, dos elementos e valores dela constantes, o pagamento efectuado pelo sujeito passivo não correspondia ao pagamento por inteiro do imposto devido, o que denota o não preenchimento dos requisitos legais de duplicação de coleta, previstos no art. 205º do CPPT. // Por outro lado, sendo certo que, na sequência da entrega da 2a declaração de substituição (P3), a Administração Fiscal emitiu, a favor da Impugnante, uma regularização a crédito no valor de € 95.150,73, resultando, assim reposta a dedução omitida da 1a declaração, não se vê como pode a Impugnante fundamentar a alegação de duplicação de coleta. // Pelo exposto, não merece censura a liquidação adicional efetuada, atenta a não apresentação atempada da declaração de substituição, que conduziu ao procedimento».
2.2.3. Da alegada nulidade por preterição da inquirição de testemunhas arroladas pela impugnante [conclusões a) a h)]
Sob o presente item, a recorrente assaca à sentença em crise nulidade por omissão de inquirição de testemunhas. Nulidade que se bem se compreende o argumento da recorrente seria recondutível ao disposto no artigo 195.º/1, do CPC.
Como se sabe, ao juiz assiste o poder funcional de ordenar as diligências de prova que entenda necessárias à correcta instrução da causa, «segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito». A propósito do poder de realizar (ou dispensar) as diligências de prova que tem por necessárias, consagrado no artigo 114.º do CCPT, refere-se que «[no seu âmbito] incluiu-se o de dever dispensar diligências de prova que tenham sido requeridas, mas que considere desnecessárias (…) O que significa que a decisão em concreto sobre as diligências de prova necessárias para a apreciação do mérito da impugnação será sempre o resultado da apreciação e convicção do juiz da causa em face dos elementos que se apresentem perante si em cada caso, mas terá de basear-se em razões objectivas, pois trata-se de uma decisão sindicável através de recurso» (1).
Compulsados os autos, verifica-se que foi omitido o despacho a dispensar a realização de inquirição de testemunhas. Será que a referida omissão constitui nulidade subsumível ao disposto no artigo 195.º/1, do CPC? Julgamos que a resposta é negativa, seja porque a impugnante, na sequência de notificação para o efeito, proferiu alegações, optando por não invocar a referida nulidade, o que determina a sua sanação (artigos 197.º/2 e 199.º/1, do CPC), seja porque do teor da sentença recorrida resulta que a mesma tomou posição sobre a matéria de facto considerada relevante à correcta integração jurídica da causa, tornando explícitos os fundamentos da sua convicção probatória.
Motivo porque se impõe julgar improcedente a presente arguição.
2.2.4. Do alegado erro de julgamento na medida em que a sentença assentou em dois pressupostos errados, a saber: «valor pago pelo sujeito passivo inferior ao devido e emissão de crédito em favor do contribuinte por força da dedução devida».
Sob o presente item, a recorrente insurge-se contra a sentença recorrida porquanto, considerando o montante declarado e pago ao Estado pela impugnante, como imposto a entregar ao Estado, a liquidação adicional de €7.113,71 carece de sentido.
Vejamos.
No caso sujeito, através da declaração periódica prevista no artigo 40.º do CIVA, o contribuinte declarou e pagou o montante de €542.649,13. Sucede, porém, que a declaração apresentada, bem como a declaração de substituição, continham erros e omissões. Suscita-se a questão de saber se as razões aduzidas pela AF para justificar a liquidação adicional em causa são de molde a garantir a sua subsistência na ordem jurídica.
Estatui o artigo 82.º/1 do CIVA: «Sem prejuízo do disposto no artigo 84.º, o chefe de repartição de finanças procederá à rectificação das declarações dos sujeitos passivos quando fundamentadamente considere que nelas figure um imposto inferior ou uma dedução superior aos devidos, liquidando-se adicionalmente a diferença».
Determina o artigo 8.º, do Decreto-Lei n.º 229/95, de 11.09, diploma que estabelece o regime dos reembolsos em IVA, o seguinte: «1.Os excessos a reportar, bem como as regularizações a crédito, transportados de períodos anteriores, nos termos do n.º 4 do artigo 22.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e do artigo 6.º do presente diploma, só serão tomados em conta quanto incluídos em declarações periódicas apresentadas dentro do prazo legal. // 2 - As declarações periódicas apresentadas depois de terminado o prazo legal, em substituição de uma liquidação oficiosa prevista no artigo 83.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado ou de uma declaração periódica anteriormente apresentada, relativamente ao mesmo período do imposto, deverão ser feitas em declaração modelo C, anexa ao presente diploma, devendo ser remetidas ao Serviço de Administração do IVA, nos termos do n.º 1 do artigo 26.º do referido Código. // 3 - O crédito apurado em declaração periódica apresentada depois de terminado o prazo previsto no artigo 40.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado será comunicado pela DSCIVA, de acordo e para os efeitos previstos no artigo 6.º.».
Determina o artigo 6. º do Decreto-Lei n.º 229/95, citado, o seguinte: «1 - Quando o valor do meio de pagamento for superior ao do imposto apurado pela DSCIVA com base nos valores indicados na declaração periódica correspondente, será a diferença daí resultante comunicada ao sujeito passivo para efeitos da sua compensação nos períodos de imposto seguintes, aplicando-se para a sua utilização a limitação temporal estabelecida no n.º 6 do artigo 71.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, sem prejuízo do disposto no n.º 7 do mesmo artigo. // 2 - A comunicação referida no número anterior só terá lugar quando a diferença apurada seja igual ou superior ao quantitativo indicado no n.º 4 do artigo 88.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, sendo a sua utilização condicionada ao recebimento efectivo da comunicação remetida pela DSCIVA.
Da matéria de facto provada resulta o seguinte:
i) Da declaração periódica apresentada em 06.02.2002 resultava o valor de IVA pagar no montante de €637.799,86, tendo sido acompanhada de meio de pagamento de €542.649,13, ocasionando um valor de IVA em falta de €95.150,73.
ii) Na declaração de substituição de 10.12.2002 resultava valor superior ao devido - €668.878,46, cujo débito correspondente (€31.078.60), foi entretanto anulado.
iii) As regularizações a crédito (a favor do sujeito passivo) referidas no ponto H. totalizavam €88.037,02, tendo sido utilizadas na compensação do valor de IVA em falta de €95.150,73, o que determinou um valor de IVA em falta de €7.113,71.
iv) Em 01.06.2003 a Administração tributária procedeu à liquidação adicional para o período de dezembro de 2001, no valor de €7.113,71 [alínea I].
v) Com a apresentação da declaração referida em J) [2.ª declaração de substituição], foi apurado o IVA a pagar de igual valor ao pagamento efectuado inicialmente pela recorrente – €542.649,13, o que originou a comunicação de crédito no valor de €95.150,73, referida em L), de 22.07.2003.
vi) A liquidação n.º .................., de €7.113,71, referida em I), foi paga em 05.02.2004, no âmbito do processo de execução fiscal n.º .....................................
vii) De Junho de 2003 a Junho de 2004, o contribuinte não apresentou declaração, na qual declarasse regularização a seu favor no montante de €95150,73 (preenchimento do campo 81).
Recorde-se que o accionamento das regularizações a crédito do sujeito passivo é facultativa, mas só poderá ser efectuada no prazo de um ano, que se conta a partir do momento em que o imposto dedutível se torna exigível – artigos 71.º/6, 7.º e 8.º do CIVA.
Donde decorre que tendo havido erro material imputável ao contribuinte, do qual decorreu a declaração de IVA a pagar superior ao efectivamente pago no fecho do período em causa (Dezembro de 2001) a liquidação adicional impugnada, referida em I), era devida, sem prejuízo do exercício do direito à regularização do imposto, com base na comunicação de crédito, referida em L), que o contribuinte não accionou, no tempo e modo próprios [alínea V), do probatório], facto que lhe é imputável.
Não enferma, pois, a referida liquidação adicional, do vício de violação de direito ou de erro nos pressupostos de facto.
Ao decidir no sentido mencionado, a sentença recorrida não merece a censura que lhe é desferida, pelo que deve ser confirmada na ordem jurídica.
Termos em que se impõe julgar improcedentes as presentes conclusões de recurso.
DISPOSITIVO
Acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em, negando provimento ao recurso, confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.

Registe.
Notifique.

(Jorge Cortês - Relator)



(1º. Adjunto)



(2º. Adjunto)


(1) Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado, 6.º Ed., Vol. II p. 254.